Alexandra Figueira, in Jornal de Notícias
Se a ideia é boa mas não se arranja dinheiro, o microcrédito pode ser um primeiro passo.
Tem que estar desempregado, ou em vias disso, não ter condições para pedir dinheiro ao banco, nem ter tido problemas com a Banca, estar rodeado de pessoas que o ajudem nos maus momentos e querer mesmo trabalhar por sua conta e risco.
Nos últimos dez anos, mais de um milhar e meio de pessoas nestas condições contactou a Associação Nacional do Direito ao Crédito (ANDC) e viu apoiada a sua ideia para trabalhar por conta própria. O termo oficial é microcrédito e já teve direito a um Prémio Nobel da Paz. Na prática, são pequenos empréstimos para grandes ideias, que, muitas vezes, são simplesmente o que a pessoa melhor sabe fazer.
Faz este mês uma década, a associação assinou o primeiro contrato de financiamento. Os contactos começaram no Porto, mas rapidamente Lisboa se impôs como a cidade onde mais as pessoas excluídas aderiram a empréstimos pequenos (até sete mil euros no arranque) e ao apoio da associação, conta José Centeio, secretário-geral da associação.
Não é para dar lucro, mas também não apoia projectos que acredita estarem votados ao fracasso. Por isso, dos seis mil contactos recebido no ano passado, e dos mil que chegaram a dar alguns passos, só 254 resultaram num contrato de financiamento. "Isto não é caridade, não podemos ter a pretensão de fazer tudo e ajudar todos", justifica José Centeio.
Uma boa ideia não chega para que o negócio siga adiante. Se o candidato a empresário é casado, por exemplo, e a cara-metade não acreditar no projecto, dificilmente será aprovado. "Já recusámos boas ideias por causa do ambiente em torno da pessoa", diz. A triagem feita a candidatos e ideias é só o início do processo. Depois, a associação ajuda na burocracia, fala de marketing e vantagens competitivas, "mas em português que toda a gente entenda", e vai acompanhando todas as semanas, para saber como corre.
O acompanhamento é uma das razões pelas quais a larga maioria dos negócios acaba por vingar. Só uma em cada dez falha, muito menos do que a média das restantes empresas (um terço fecha ao fim de um ano).
Quase todos os que passaram pelo microcrédito recomendam-no, de acordo com um estudo sobre microcrédito em Portugal feito pelo professor da Católica Américo Mendes. Até as pessoas a quem o negócio correu mal. "O drama não é recusar um projecto, é o depois", admite José Centeio. Quem se lança por conta própria também o faz por sua conta e risco. Um empresário (ainda que micro) não recebe subsídio de desemprego, se a empresa fechar.
José Centeio e Américo Mendes concordam que deviam ter um estatuto próprio. Por exemplo, que os primeiros meses fossem de formação para que a pessoa não perdesse o subsídio de desemprego, se o negócio falhar. "Não podemos falar de combate à exclusão social e depois tratar as pessoas como se fossem incluídas", pensa Américo Mendes.
1. Quem pode concorrer?
Desempregados, ou com um emprego precário, sem acesso a empréstimo bancário normal. Não pode ter tido problemas com a Banca e tem que encontrar fiador para 20% do crédito.
2. Quanto se pode pedir?
Numa primeira fase, sete mil euros. Poderá subir até aos 10 mil, mas só quando a empresa já está a funcionar e é necessário reforçar o investimento inicial.
3. Quais as condições?
O juro cobrado é a Euribor a 3 meses mais um "spread". A CGD cobra 2%, além da Euribor, e permite pagar em 36 meses. O Millennium também cobra mais 2%, mas dá 48 meses para saldar a dívida. O BES exige mais 3% e permite o reembolso em 48 meses.
5. A Banca também tem?
O Millennium é o único a ter a sua própria proposta, além do acordo com a associação. Empresta até 17.500 euros por 48 meses, mas não diz quanto cobra de juros.