8.12.09

Um planeta mais seguro, um mundo melhor

in Diário de Notícias

Os dois maiores desafios do século XXI são eliminar a pobreza no mundo e evitar o aquecimento global. São dois desafios diferentes, embora relacionados - não resolver um deles implica não resolver o outro. Espero que em Copenhaga sejam dados passos decisivos para construir um planeta mais seguro e um mundo melhor.

O que está em jogo é criar um conjunto de regras a nível internacional que limitem as emissões de gases com efeito de estufa, das quais o CO2 é o mais importante. Sem acção determinada e devidamente coordenada, corremos riscos enormes.

Todos os anos, lançamos 47 biliões de toneladas de CO2 equivalente para a atmosfera. Estas emissões aumentam, ano após ano, a concentração na atmosfera de gases com efeito de estufa. Podemos chegar ao final do século com uma concentração que implique uma probabilidade de 50% de a temperatura média do planeta subir cinco graus.

Limitar este risco dois graus implica reduzir, até 2050, as emissões anuais em mais de metade, de 47 biliões para 20 biliões de toneladas de CO2 equivalente. Há várias maneiras de o conseguir, mas o mais prudente será baixar as emissões para 40 biliões até 2020 e continuar gradualmente até 2050. Não há tempo a perder.

Teremos de adoptar metas quantitativas e repartir os esforços. Os países ricos terão de reduzir as emissões em 80% relativamente a 1990, que é o ano de referência. Países como a China e a Índia vão ter de se comprometer a controlar as emissões de uma forma compatível com um processo de forte crescimento económico e rápida redução da pobreza. Também é preciso assegurar uma transferência dos países ricos para os países pobres de 50 biliões de dólares até 2020 e de 200 biliões até 2050, caso contrário não terão condições para se adaptar.

Não se trata de escolher entre tomar este conjunto de decisões hoje ou daqui a uns anos - a opção é entre agora e agora; quanto mais tempo demorar, maior terá de ser o esforço a fazer no futuro.

Devemos depositar esperança na capacidade de o homem criar um mundo melhor. Hoje, vive-se muito melhor do que há 50 anos. Há 50 anos, havia mais pobres no mundo, muitos países tinham regimes totalitários, mais crianças morriam à nascença e menos jovens tinham acesso ao ensino. O sucesso de Copenhaga seria uma razão adicional para termos esperança - tal significaria a capacidade de controlar um enorme risco que pode hipotecar o futuro das próximas gerações, e isto é muito mais difícil de fazer do que resolver um problema das gerações actuais.

Confio que em Copenhaga os líderes mundiais vão dar passos no bom sentido, apesar de ser impossível conseguir um acordo total. A Europa foi a primeira a adoptar iniciativas e liderou o processo. A Presidência alemã foi decisiva para a adopção de metas vinculativas sobre emissões de CO2 e uso de energias renováveis. A Presidência portuguesa foi decisiva para criar um roteiro tecnológico para criar o modelo de energia do futuro. Os Estados Unidos têm em Obama um presidente com uma visão adulta do mundo, a China tem um Plano Quinquenal e um partido que manda, o primeiro-ministro Singh é um grande estadista e o Presidente Lula está perante a oportunidade de dar ao Brasil o papel no mundo que merece. A opinião pública mundial está muito atenta e mobilizou-se de uma forma excepcional.

A melhor razão para ter esperança é o facto de, se somarmos uma a uma as metas que os diversos países já anunciaram, não estarmos muito longe do necessário. O que importa é dar um carácter vinculativo a todas estas intenções.

Para Portugal, Copenhaga tem enorme importância. Temos de colaborar no esforço europeu, que é muito exigente. Além disso, temos de reduzir a nossa enorme dependência da importação de combustíveis fósseis, o deficit da nossa balança de energia representando quase 5% do PIB.

À partida, tudo isto criava um desafio que parecia inultrapassável. Mas não fizemos o que é habitual. Antecipámos as tendências, identificámos as nossas vantagens comparativas e mobilizámos a sociedade. Estamos um passo à frente no uso das energias renováveis, na forma como olhamos para novas formas de mobilidade e na criação de uma base industrial com vocação exportadora no conjunto de actividades que são necessárias para criar uma relação diferente com o ambiente e a energia. Fui responsável por esta política e sempre tive dificuldade de transmitir a ideia de que o que estava em jogo era muito mais importante do que apostar nas energias renováveis - trata-se de criar uma nova relação com a energia e o ambiente e sermos um dos líderes nesse processo. E Copenhaga ajuda a perceber melhor tudo o que está em jogo.

A maioria dos países representados em Copenhaga está atrás de nós na resposta ao desafio do ambiente e da energia. Muitos consideram-nos um exemplo a seguir. É difícil chegar ao grupo dos líderes, mas é fácil deixar de lá estar. A verdadeira corrida começa no dia em que acabar Copenhaga. Consolidar uma posição de liderança vai exigir em Portugal visão, coragem política, instituições sólidas para desenvolver as políticas, universidades próximas das empresas, uma mobilização geral em torno deste objectivo, nele concentrando os melhores talentos e os recursos disponíveis. Se falharmos, a culpa será de todos.