26.5.10

Só poupar água combate escassez

Alfredo Maia, in Jornal de Notícias

Futuro do clima vai ser debatido em Mirandela


A seca que atingiu Portugal em 2005, uma das maiores dos últimos 100 anos, deixou uma lição: para responder à escassez de água, que vai agravar-se com as alterações climáticas, não precisamos de multiplicar barragens, mas de gestão racional.

"Temos de ter preparados planos de contingência e os planos de bacia hidrográfica em preparação contribuirão para dar resposta com a identificação de fontes alternativas, como captações subterrâneas de emergência, como se fez em 2005", disse ao JN o ex-ministro do Ambiente, Francisco Nunes Correia.

Considerado um dos maiores especialistas em gestão de recursos hídricos, Nunes Correia, catedrático do Instituto Superior Técnico, é um dos oradores do Simpósio Internacional sobre Respostas à Escassez de Água e à Seca ao Nível das Bacias Hidrográficas sob Futuros Climáticos Incertos, que decorre amanhã e depois em Mirandela.

Organizado pela Sociedade Portuguesa de Simulação Ambiental e Avaliação de Riscos (Sopsar) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), o simpósio conta com a participação de uma centena de especialistas (académicos e gestores) e de utilizadores de água (autarquias, agricultura, indústria e energia, nomeadamente), reflectindo os múltiplos interesses em jogo.

Nunes Correia prevê "uma agudização dos conflitos e dos problemas, porque, justifica, os regimes hidrológicos vão tornar-se mais irregulares", devido às alterações climáticas. "A precipitação média tende a diminuir, mas teremos anos muito húmidos com grandes cheias, a que se seguirão anos de seca", explica, notando tratar-se de "problemas que vão tornar-se mais frequentes".

Embora "típica" do sul da Europa, a seca já é um problema à escala europeia. Os prejuízos dos últimos 30 anos ascendem a 100 mil milhões de euros e só a seca de 2003 causou 8700 milhões de euros, afectando 130 milhões de habitantes, um terço da população europeia.

Na comunicação de amanhã, Nunes Correia falará da experiência da seca de 2005, crise gerida por uma comissão interministerial por si presidida, que mobilizou todos os interessados e permitiu gerir as escassas disponibilidades para satisfazer necessidades de sectores importantes como o turismo e a agricultura, sem prejudicar as populações, garante.

No Algarve, por exemplo, foi possível satisfazer as necessidades do turismo e assegurar o regadio dos pomares de citrinos, de modo a garantir que as árvores não morressem, embora se prejudicasse a produção. Recurso a captações subterrâneas com abertura de furos de emergência, restrições nas captações para rega e recurso a camiões-cisterna para abastecimento a povoações foram algumas medidas do plano de contingência.

O plano beneficiou das barragens entretanto construídas no interior e Nunes Correia assegura que sem elas teria sido pior. As novas, em plano, "darão uma tranquilidade acrescida". Porém, a resposta à escassez "não passa tanto por se fazerem mais e mais barragens, mas por se usar melhor as que temos", diz.