7.2.11

"Apoios à inovação devem ser para empresas com potencial de crescimento"

Por Luisa Pinto, in Jornal Público

Portugal saiu-se bem no ranking europeu da inovação de 2010, divulgado na semana passada, mas ainda não há razões para "embandeirar em arco"

Na leitura que fez do ranking, Eurico Neves - membro e representante de Portugal no Grupo de Política Empresarial da Comissão Europeia e administrador da empresa de consultoria Inovamais - considera que a posição de Portugal mostra que se continua a apostar no modelo científico puro, e a produzir mais doutorados, que as empresas não vão absorver. A prioridade, defende, deverá ser incentivar as empresas a apresentarem-se a candidaturas europeias, que fomentam por si só a internacionalização. E, sobretudo, dinamizar os apoios via capital de risco sobretudo às empresas de cariz tecnológico com grande potencial de crescimento. Resumindo, "tornar inteligente" a atribuição de dinheiros públicos.

Qual foi a primeira leitura que fez do último ranking da Inovação, em que Portugal ocupa a 15.ª posição?

Atentei nos aspectos positivos, claro. Sabemos que Portugal nunca vai liderar este ranking, mas partimos de posições realmente muito baixas, e temos vindo sempre a subir. Em termos de posição global, é uma subida notável. Quando começamos a olhar com mais atenção para os indicadores, percebemos onde não estamos tão bem. E são indicadores que são mais difíceis de recuperar do que são alguns dos outros. Podemos estar um bocadinho mais apreensivos e impedem-nos de embandeirar em arco.

Os indicadores em que Portugal está pior são os dos resultados económicos...

Que são, também, aquele que deveria ser o objectivo fundamental da inovação. Para conseguirmos resultados é preciso criar infra-estrutura, em termos de pessoas, de doutorados, de cooperações, de produção científica. Mas nós apostamos demasiado nesses indicadores. E Portugal tem estado a melhorar nesses indicadores, mas não consegue melhorar nos resultados. Ainda está muito cá atrás... na 23.ª posição. Isso, sem dúvida, é preocupante e mostra algumas debilidades estruturais que não têm sido enfrentadas.

Mas o caminho não teria de ser inevitavelmente este, o de começar pela estrutura para depois ter onde produzir resultados? Ou poderia/deveria ter sido outra?

Essa tendência tem sido seguida nos últimos três a quatro anos, mas agora tem de se começar a seguir outra, que consiga uma melhoria mais rápida nos resultados. Temos assistido a um crescimento constante do investimento em investigação, mas não estamos a assistir a uma melhoria dos resultados económicos. O que quer dizer, porventura, que estamos a investir nos projectos errados. Ou, pelo menos, não estamos a investir naqueles que podem fazer a diferença, criar mais empregos e aumentar as exportações.

Crescemos muito no número de novos doutorados, mas temos um défice nas camadas jovens da população, quer em termos de licenciados, quer em termos de ensino secundário. Temos uma pirâmide que está gorda em cima, o que não é natural. Nota-se que temos uma elite que se dedica à produção científica, e que há quase uma profissão de doutorado, tornou-se uma carreira. Mas que não tem correspondência em termos de necessidades reais que as empresas apresentam em matéria de investigação...

Isso vê-se também pelas patentes e matérias publicadas. Temos um meio científico que está a publicar muito, mas um nível relativamente baixo, apesar das melhorias, em termos de patentes.

Portugal está a dar passos demasiado tímidos nas parcerias entre a investigação e as empresas?

Os vários indicadores mostram que o meio científico está muito virado para dentro, ainda não se virou para a economia real, e esse é claramente um défice que é difícil de corrigir...

Como é que tem de ser feito?

Eu costumo dizer que em Portugal (não só Portugal, mas na Europa em geral) se aplica a lei da gravidade. Aplica-se o investimento em cima e há-de chegar cá abaixo: há dinheiro para projectos científicos, e isto há-de ser convertido em conhecimento, há-de chegar às empresas. Mas este sistema não tem funcionado como seria desejável.

Há mecanismos de financiamento público destinados a projectos de privados. São poucos, não funcionam?

Grande parte desse investimento também é em cooperação com universidades, mas onde não há transferência de conhecimento. Agora, finalmente, vai arrancar algo que é relativamente inovador, a nível europeu, e que é uma entidade de capitais públicos a captar fundos estruturais para investir em fundos privados de capital de risco.

O Sistema de Apoio ao Financiamento e Partilha de Risco na Inovação (SAFPRI) é um mecanismo iniciado em 2008, seleccionou fundos provados em 2009 e gastou todo o 2010 em questões processuais. Arrancou de forma lenta, é certo, mas vai permitir alavancar os capitais de risco e fundos de business angels. Pode ser um impulso grande nesta área específica.

Que verbas vão estar disponíveis para aplicar no âmbito deste programa?

Serão 200 milhões de euros de fundos estruturais, via programa Compete. É o chamado dinheiro estúpido que se vai tornar inteligente. Dinheiro estúpido é aquele em que alguém tem um projecto, o submete às autoridades competentes e recebe um financiamento para fazer aquilo, a três anos, mesmo que entretanto o mundo mude completamente, os objectivos já sejam diferentes. Como não se medem os efeitos...

Não há fiscalização?

É inexistente. Não há responsabilidade, não há retorno. Inteligente é o dinheiro que é dado em conjunto com conhecimento, com saber-fazer e experiência. Em termos europeus, o futuro tem de passar por aqui. Está a ser aprovado em Bruxelas o plano de Inovação para a Europa, para o período 2013 a 2020, e uma das grandes linhas que estão lá é o reforço do capital de risco.

No seu entender, é no capital de risco que há dinheiro inteligente?

Quando refiro dinheiro estúpido, não é pejorativo. Mas aquilo que a Europa precisa é de empresas tecnológicas, de crescimento rápido, e a que normalmente se chama "gazelas".