Por Samuel Silva, in Jornal Público
Responsável do Politécnico de Leiria conclui em doutoramento que maioria dos bolseiros é de famílias com baixas qualificações
O número de estudantes a frequentar as universidades e politécnicos seria muito inferior se não existissem bolsas de estudo. A conclusão é de Miguel Jerónimo, administrador dos Serviços de Acção Social (SAS), do Instituto Politécnico de Leiria (IPL), numa investigação que lhe valeu o doutoramento pela universidade espanhola da Extremadura. A tese revela também que a maioria dos bolseiros provém de famílias com baixas qualificações.
"Sem a Acção Social no ensino su- perior teríamos muito menos estudantes neste nível de ensino com consequências catastróficas ao nível do desenvolvimento da nossa sociedade", defende Miguel Jerónimo. Para este responsável, esses mecanismos são "decisivos para minimizar os efeitos das desigualdades de oportunidades".
A investigação mostra que mais de metade dos bolseiros no superior não receberam esse apoio aquando da frequência do secundário. O facto demonstra que as despesas com o superior são um peso relevante para as famílias, que não é possível ser suportado sem apoios sociais.
Esta tese de doutoramento, aprovada no mês passado na Universidade da Extremadura, centra-se nos estudantes bolseiros dos institutos politécnicos. Além de dados estatísticos, tem em conta também as opiniões de alunos, pais e administradores dos SAS das várias instituições de ensino. Miguel Jerónimo defende que deve fa-lar-se em Acção Social, mais do que em bolsas de estudo, uma vez que os apoios indirectos como o alojamento ou alimentação acabam por ter também um peso decisivo na qualidade do percurso académico dos estudantes carenciados.
A investigação conclui que os estudantes bolseiros são maioritariamente filhos de pessoas com baixo nível de instrução. A maioria dos pais não tem mais do que o 4.º ano de escolari- dade, situação a que se associam também rendimentos muito baixos. "Perante as actuais exigências do mer- cado de trabalho, essa baixa escolaridade coloca os pais dos nossos estudantes mais carenciados numa situação de permanente iminência de desemprego", explica Miguel Jerónimo.
O administrador dos SAS do IPL revela ainda que, nos últimos anos, tem aumentando o desemprego entre os pais dos estudantes bolseiros, afectando muitas vezes pai e mãe em simultâneo. "Configuram situações particularmente graves e problemáticas que podem, como consequência, conduzir ao abandono escolar se não existir uma intervenção dos Serviços de Acção Social", avalia o mesmo responsável.
Miguel Jerónimo fez esta investigação ao longo dos últimos quatro anos. O trabalho ficou concluído no Verão de 2010, antes da publicação do novo regulamento de atribuição de bolsas de estudo. O documento, aprovado pelo Governo em Setembro, veio responder a algumas das ne- cessidades de alteração da política de Acção Social no ensino superior detectadas durante a investigação, nomeadamente o fim dos escalões de atribuição de bolsa. "A aplicação dos escalões era tão escandalosamente injusta e foi tão contestada ao longo de mais de uma década pelos diferentes actores do sistema que seria óbvio que esse aspecto teria de ser contemplado, como foi, no mais recente regulamento", defende Jerónimo.
O investigador considera, no en-tanto, que as alterações feitas pelo Governo "não foram tão longe quanto deveriam", especialmente no que ao processo de candidatura diz respeito. Jerónimo defende um aligeiramento do procedimento e a apresentação de uma única candidatura para o plano de estudos de cada aluno, actualizável anualmente se ocorressem alterações.