2.2.15

Os números do INE e as propostas do FMI

in Público on-line

Entre a realidade e a intrusão política até se percebe a ministra das Finanças.

Entre as várias estatísticas divulgadas pelo INE e o relatório do FMI para avaliar o desempenho do país pós-troika, a semana foi pródiga em números e recados mais ou menos inesperados. O Governo ouviu boas e más notícias e, como sempre acontece nestas ocasiões, tratou de falar do que lhe convém e de omitir tudo o que é revelador da fragilidade das suas políticas. É verdade que o défice está melhor, que o indicador de confiança dos consumidores recuperou para o valor mais elevado desde Maio de 2002 e que o indicador de clima económico também subiu “ligeiramente”, interrompendo um ciclo negativo iniciado em Setembro do ano passado. O desemprego também já teve piores dias, situando-se agora numa taxa de 13,4%, e até daria para Passos Coelho respirar de alívio face aos preocupantes aumentos verificados em Outubro e Novembro de ano passado, não fora a tendência crescente do desemprego jovem, que atinge agora uns astronómicos 34,5% na população entre os 15 e os 24 anos.

Infelizmente, as más notícias não se ficam por aqui. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, o número de pessoas em risco de pobreza aumentou em 2013 em todos os grupos etários e já atinge 19,5% da população, contra 18,7% em 2012. Os grupos mais atingidos são os menores de 18 anos e os desempregados, estes apresentando um risco de 40,5%. Como se estes números não fossem já altamente perturbadores, as estatísticas revelam ainda que se agravou a desigualdade na distribuição de rendimentos.

É neste quadro que surge nesta sexta-feira o relatório divulgado pelo FMI para avaliar o desempenho do país após a saída da troika. Não é um texto tecnocrata, como seria próprio de funcionários de uma instituição deste tipo, é antes e sobretudo um documento político dirigido não só ao Governo, mas também ao principal partido da oposição. O que diz então o FMI? Que a economia vai crescer pouco nos próximos anos, o que não dará para travar a estagnação do mercado de trabalho. Assim sendo, Portugal corre o risco de ver partir os quadros mais bem preparados para a emigração, perdendo com isso qualificações que seriam cruciais para o crescimento. E o que propõe então o FMI para contrariar isto? Manter o factor trabalho sob pressão, revertendo os cortes salariais e o fim da contribuição extraordinária de solidariedade. Apressar os despedimentos na função pública e cortar mais nas despesas sociais. Enfim, o Fundo propõe tudo o que faz fugir a mão-de-obra qualificada para o estrangeiro: baixos salários e fraca protecção social.

Depois de há dois dias o governador do Banco de Inglaterra ter arrasado a política de austeridade da zona euro e de ainda hoje se ter sabido que foi o consumo a grande alavanca de crescimento do PIB dos EUA, o FMI não hesita em criticar o Governo pelo aumento do nosso salário mínimo. E, de caminho, avisar o PS que “o processo de reformas em Portugal tem de ser feito durante muitos anos, independentemente de quem estiver no governo”. Percebe-se que a ministra das Finanças os queira ver pelas costas.