9.7.09

Serviços públicos mais procurados do que há sete anos

IC, in Jornal de Notícias

Estudo revela que cresceu 20% o recurso aos centros desaúde, com efeitos no aumento dos tempos de espera.

A Associação Nacional de Farmácias (ANF) conseguiu cumprir 51 de 60 compromissos assumidos em 2005. Definira-os como resposta ao Governo socialista recém-empossado e cujo primeiro anúncio fora a liberalização da propriedade da farmácia, à qual a ANF se opunha. Dos nove compromissos por cumprir, quatro devem-se à falta de cooperação do Governo. Entre eles estão dois dos que, até hoje, mais polémica têm causado, como a prescrição pelo nome da substância activa, para aumentar o consumo de genéricos. A medida foi, um ano depois, assumida pelo próprio Governo no Compromisso com a Saúde, mas mal saiu do papel. Apenas consta da legislação que entrou agora em vigor sobre dispensa de medicamentos em doses individualizadas, mas cuja aplicação depende da vontade das farmácias e só em Lisboa. Até ontem, não havia candidatos. Outra medida por realizar é a dispensa nas farmácias de fármacos só distribuídos nos hospitais. Está num projecto de diploma que está paralisado no Ministério da Economia.

A procura dos serviços públicos de saúde aumentou 20% em sete anos, o que poderá explicar "o prolongar das demoras das marcações" e "das listas de espera", conclui um estudo do sociólogo Manuel Villaverde Cabral.

O inquérito "Acesso, avaliação e atitudes da população portuguesa - evolução entre 2001 e 2008" envolveu 3039 entrevistas e visou traçar um retrato do "Estado da Saúde em Portugal". Além de avaliar a percepção dos portugueses sobre a sua própria saúde, procurou quantificar o acesso físico e económico aos serviços. E conclui que diminuiu o número de pessoas que dizem ter um bom estado de saúde. Uma percepção que pode explicar quer a maior procura dos serviços, quer o facto de ter subido 36% o número de pessoas que afirmam fazer algo para melhorar o estado de saúde, tal como aumentaram entre os portugueses com mais de 50 anos as medições da pressão arterial (de 84 para 91%) e do nível de colesterol (de 72 para 85%).

Assim, segundo o trabalho - ontem apresentado na sessão comemorativa dos 30 do Serviço Nacional de Saúde organizada pelo Ministério da Saúde -, 65,3% da população recorreu aos centros de saúde no ano passado, contra 54,3 em 2001. Uma "pressão acrescida" que "tem como consequência o prolongar das demoras das marcações e, às vezes, das listas de espera", analisa o autor do estudo, o sociólogo Manuel Villaverde Cabral.

E os resultados provam-no: enquanto em 2001 metade dos inquiridos diziam ter conseguido consulta no centro de saúde no mesmo dia da marcação, no ano passado foram apenas 30%. E se, há sete anos, 40% diziam que a espera pela consulta não fora demorada, em 2008 já só 18,2% revelavam essa condescendência. E metade disse mesmo entender que deveria ter sido visto pelo médico antes ou muito antes da consulta.

Quanto ao recurso a consultas hospitalares, cresceu de 21,7 para 27,6%, com correspondente aumento do tempo de espera. Esta percepção estende-se à espera por cirurgias: em 2001, cerca de 13% diziam aguardar mais de três meses, número que subiu para 31,6% em 2008. Além disso, é mais comum a necessidade de recorrer a um hospital mais afastado para consultas de especialidade, facto que Villaverde Cabral atribui à reorganização do sistema e consequente aumento da mobilidade dos doentes no sentido de ter consulta mais rapidamente.

Apesar disso, o sociólogo conclui que o acesso "melhorou sensivelmente": as queixas têm hoje um peso muito menor na avaliação global dos cuidados, tidos como "bons".