17.5.22

Vai fazer-se uma corrente humana pelo oceano: “É a origem da vida, não pode ser o depósito do lixo”

Nicolau Ferreira, in Público

Na quinta-feira, milhares de alunos vão juntar-se perto do mar, do Norte ao Sul do país, para formar a “Corrente do Oceano”, uma iniciativa que comemora o programa educativo Escola Azul e quer chamar a atenção para a importância dos oceanos.

A praia de Miramar, em Vila Nova de Gaia, irá ser um dos pontos mais fortes dessa celebração. Estima-se que cerca de 1800 pessoas se irão juntar ao pé da capela do Senhor da Pedra, no meio da praia, para formarem a corrente. Estudantes das escolas daquele município irão perfazer a maior parte das pessoas, mas haverá também pais e outras pessoas da comunidade.

“Será um alerta que estamos a lançar a todos de que é necessário mudarmos de atitude em relação ao oceano”, explica Cândida Pereira, coordenadora da Escola Azul do Agrupamento de Escolas (AE) de Valadares, de Vila Nova de Gaia, professora do ensino pré-escolar e educadora de infância. “O oceano é a origem da vida, não pode ser o depósito de lixo, há a necessidade de o preservar e de o cuidar.”

Outras escolas do concelho de Vila Nova de Gaia estarão presentes. “Foi uma iniciativa que começou a nível do AE de Valadares e lancei o desafio a outras Escolas Azuis”, conta a coordenadora. Além de Valadares, irá o AE Diogo Macedo, o AE D. Pedro I, a Escola Secundária Dr. Joaquim Gomes Ferreira Alves e o Colégio Nossa Senhora da Bonança. A Escola Secundária Inês de Castro não conseguirá juntar-se na praia de Miramar, mas vai formar uma corrente na praia de Canide.

Para a corrente, os estudantes estão a desenhar em cartazes e cartolinas frases que vão colocar na areia da praia de Miramar. As crianças vão ter ainda a oportunidade de cantar Um mar de futuro, uma canção de Lino Lobão, professor do 1º ciclo do AE de Valadares, e que se pode ouvir aqui.

Impacto na sociedade

No contexto da Escola Azul, os alunos do AE de Valadares já apanharam lixo na praia, alguns fizeram o curso de Guardião do Oceano e para o ano vão iniciar uma parceria com a Escola Electrão, um projecto que promove a reciclagem de objectos electrónicos. “Já se olha para o mar à procura de minérios”, alerta Cândida Pereira. “Mas estes minérios podem ser obtidos se reciclarmos os electrodomésticos e outros aparelhos que vão para o electrão.”

Desde 2020, toda a atividade que vai acontecendo nos estabelecimentos de ensino, no contexto da Escola Azul, salta para fora das escolas a cada 19 de Maio. Deste modo, há uma oportunidade para a comunidade não escolar se aproximar deste programa e do que os alunos desenvolvem ao longo do ano.

“Tentamos fazer uma iniciativa aberta que impacte a sociedade, que dê a importância que o mar tem ou do mal que fazemos ao mar”, explica Raquel Costa, coordenadora do Programa Nacional Escola Azul, da Direcção-Geral de Política do Mar. O dia 19 de Maio foi escolhido para marcar este programa porque fica perto do Dia Europeu do Mar, a 20 de Maio. “Queremos mostrar a toda a comunidade escolar e à sociedade portuguesa a importância que o oceano tem na vida das pessoas e o impacto que as pessoas têm no oceano.”

Em 2020, em pleno confinamento devido à pandemia, o programa pediu aos alunos e às pessoas da comunidade Escola Azul que fizessem um pequeno vídeo onde respondessem à pergunta “Porque é que o mar faz falta?”. A coordenação recebeu mais de mil vídeos, diz Raquel Costa.

No ano seguinte, propôs-se aos alunos que escrevessem cartas para enviar por correio, a 19 de Maio, dirigidas a empresas que produzem embalagens com palhinhas, como a Compal e a Coca-Cola. Nas cartas podiam ser lidos apelos para que estas empresas passassem a produzir embalagens mais sustentáveis e sem palhinhas, promovendo a saúde dos oceanos. “Teve um impacto enorme”, assegura a coordenadora, com muitas empresas a responderem com cartas aos alunos e algumas a visitarem as escolas para explicarem a situação da produção de embalagens.







ste ano, apesar do gesto ser mais físico e transmitir uma imagem visual – uma corrente –, ele remete para os movimentos internos que acontecem no oceano, com os enormes volumes de água que atravessam milhares de quilómetros, disseminam calor, frio, nutrientes e têm um papel importante na manutenção da sua dinâmica, fundamental para a vida na Terra.




“É o momento simbólico para mostrar que todos juntos fazemos a diferença e que nos podemos mobilizar em prol do oceano”, sublinha Raquel Costa. “É aberto a toda a gente, a toda a sociedade, a todos os grupos. Convidaria as escolas a fazerem convites a outros membros da sociedade a juntarem-se.”




O cordão que vai acontecer na praia de Miramar será possível, justamente, graças à comunidade alargada, que sustentará a logística de juntar 1800 pessoas. A CP vai colocar à disposição dois comboios para transportar cerca de 1000 alunos de várias freguesias do concelho até Miramar. Com a ajuda das juntas de freguesia, várias associações de pais organizaram-se para o transporte de alunos que não poderão ir de comboio.





As Águas de Gaia vão providenciar ecopontos, pontos de enchimento de garrafas de água e casas de banho junto à praia. Monitores do Centro de Educação Ambiental das Ribeiras de Gaia, ligado às Águas de Gaia, vão dar apoio ao evento. Dois voluntários do Grupo de Jovens Líderes do Oceano irão ajudar na organização do cordão. A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, que ajudou no licenciamento do evento, será responsável pelo registo fotográfico e por vídeo do evento e contactou as corporações de Bombeiros de Coimbrões, Valadares e Aguda para estarem presentes no dia.

“Tentámos envolver a comunidade escolar e a comunidade não escolar, como as entidades locais”, avança Cândida Pereira.




Aprender com o surf em Sesimbra




Mais a sul, em Sesimbra, o cordão vai acontecer na praia do Ouro, com o encontro de Escolas Azuis, como o AE Quinta do Conde e o AE Navegador Rodrigues Soromenho, e outras escolas que não estão integradas no programa. A Câmara Municipal de Sesimbra está a organizar o evento e espera reunir 800 pessoas, entre alunos, famílias, estudantes de universidades seniores e idosos que vivem em lares.


Quando chegarem à praia, de manhã, os estudantes poderão realizar jogos de praia e atividades desportivas. Só depois se formará a corrente. O evento serve como comemoração para que se pense nos oceanos “como fonte de vida que não se pode perder”, explica Pedro Delgado, coordenador da Escola Azul da Escola Básica Integrada com Jardim de Infância da Quinta do Conde, de Sesimbra. “Quanto menos olharmos os oceanos como depósito de lixo, maior é a esperança de um mundo de vida”, sustenta o professor de Cidadania e Desenvolvimento do 2.º Ciclo do ensino básico.





Depois, os 70 alunos do agrupamento da Quinta do Conde vão apanhar lixo na Albufeira de Sesimbra, uma actividade que costumam fazer no contexto da Escola Azul. “Prepararmos os jovens através da consciencialização e da cidadania activa”, refere Pedro Delgado.


Já em Lagos, a corrente ocorrerá na avenida dos Descobrimentos, perto do Forte da Ponta da Bandeira. O evento vai ser organizado pela Câmara Municipal de Lagos e espera-se a participação de 600 pessoas, a maioria alunos de Escolas Azuis de várias escolas do pré-escolar até ao 2º ciclo.


“O evento vai trazer o simbolismo da corrente do oceano, a importância dos oceanos e as ameaças que pairam sobre eles”, explica Miguel Figueiredo, coordenador da Escola Azul da Escola Secundária Gil Eanes e professor de Educação Física.


Em Lagos, a literacia dos oceanos corre lado a lado com o desporto, explica Miguel Figueiredo. O programa Escola Azul está associado ao Centro de Formação Desportiva do AE Gil Eanes, também coordenado por Miguel Figueiredo. Este centro tem actividades náuticas, como o surf.

Queremos mostrar a toda a comunidade escolar e à sociedade portuguesa a importância que o oceano tem na vida das pessoas e o impacto que as pessoas têm no oceano Raquel Costa, coordenadora do Programa Nacional Escola Azul



As turmas daquelas escolas podem inscrever-se no programa: têm uma sessão sobre os oceanos e, depois, experimentam fazer surf na praia. “Achamos que conseguimos passar melhor a mensagem porque damos algo que os jovens gostam, o surf. A isso juntamos a literacia dos oceanos”, defende o coordenador.

Defender o que é seu em Olhão


Em Olhão, esperam-se cerca de 1000 participantes no Jardim dos Pescadores. “Vamos até ao jardim e vamos fazer o logo [logótipo] da Escola Azul”, explica Manuela Valentim, coordenadora da Escola Azul Alberto Iria e professora de inglês e de Cidadania e Desenvolvimento. O agrupamento organizou o evento com o apoio da Câmara Municipal de Olhão. “Vamos envolver todo o agrupamento escolar, o pré-escolar e a escola E.B. da Culatra.”


Estudantes de várias idades vão posicionar-se no jardim para construir as ondas e as letras do logótipo, à volta deles irá formar-se a corrente de pessoas pelo oceano. Um drone será usado para filmar o desenho de corpos que será visível a partir do ar. Seis embaixadores da Escola Azul vão ainda receber medalhas e certificados por um membro da Câmara Municipal de Olhão. “Na altura da entrega das medalhas, os embaixadores dos oceanos deixam uma mensagem em nome de cada escola”, diz Manuela Valentim.




Além de dia 19, durante toda a semana, a Escola Básica Dr. Alberto Iria vai ter a Semana Azul com várias actividades, como a pintura de um mural coordenada pelo artista grafitter Sen, de Olhão, e um workshop de culinária sobre receitas sustentáveis. Na sexta-feira, a comemoração do Dia Europeu do Mar vai passar por actividades desportivas e a colecta de lixo na praia.








Os objectos que a escola tem vindo a recolher nestas acções não vão para o ecoponto. “Com o lixo que trouxemos, estamos a construir uma tapeçaria que vai ser inaugurada no Dia Mundial dos Oceanos”, a 8 de Junho, explica Manuela Valentim. Várias escolas estão a fazer tapeçarias a partir do lixo que irão ficar patentes na Fábrica da Cerveja, em Faro, a partir de 9 a 12 de Junho, no contexto do Festival do Novo Bauhaus Europeu.

Todas estas actividades, a começar pela Corrente do Oceano, servem para alertar para a “protecção da biodiversidade, o consumo sustentável e o perigo da poluição”, argumenta Manuela Valentim. A professora quer fomentar uma relação de protecção dos mais novos com o que está próximo, nomeadamente a ria Formosa. “Não queremos a ria nem as águas poluídas”, diz a coordenadora, sublinhando a importância de os alunos “defenderem o que é seu”.

Na quinta-feira, outros ajuntamentos importantes vão acontecer em Matosinhos, Oeiras, Setúbal, Faro e na Madeira. Mas as correntes serão muitas mais. Se quiser partilhar com o PÚBLICO fotografias das Correntes do Oceano de quinta-feira por todo o país, pode enviá-las para o e-mail azul@publico.pt.

Quanto menos olharmos os oceanos como depósito de lixo, maior é a esperança de um mundo de vida. Pedro Delgado, coordenador da Escola Azul da EBI da Quinta do Conde, Sesimbra



“Quase todas as escolas azuis vão marcar o dia”, explica Raquel Costa. Associações ou grupos que queiram integrar o evento poderão enviar um email para a coordenação do programa (escolas@escolaazul.pt) e, em seguida, serão encaminhados para as Escolas Azuis geograficamente mais perto e que vão realizar a actividade. Há apenas um pedido, refere a coordenadora: “Peço que as pessoas levem simbolicamente uma roupa azul e também um apontamento amarelo, porque estamos a aproveitar a iniciativa para simbolizar a paz pela Ucrânia.”