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16.11.20

Conselho da Europa diz que violência policial é frequente em Portugal e pede “medidas urgentes”

Joana Gorjão Henriques, in Público on-line

Comité Antitortura do Conselho da Europa fez a 11.ª visita a Portugal e concluiu que afrodescendentes e imigrantes são dos que mais sofrem às mãos da polícia. Chefe de delegação diz ao PÚBLICO que já não acredita na Inspecção-Geral da Administração Interna.

A violência policial contra cidadãos detidos, sobretudo afrodescendentes e imigrantes, é algo que acontece frequentemente em Portugal. Mas as autoridades governamentais não reconhecem o problema, adoptando uma postura de negação. As conclusões são do Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa (CPT na sigla inglesa), que visitou pela 11.ª vez Portugal em Dezembro de 2019 e que, mais uma vez, colocou a ênfase na questão dos maus tratos infligidos pelas forças de segurança.

Num relatório que foi publicado esta sexta-feira, escreve: “O CPT considera que não foi feito o suficiente para reconhecer e atacar o real e persistente problema dos maus tratos pelas forças de segurança que existe em Portugal.” Esta é, aliás, uma preocupação recorrente que vem sido referida nos relatórios anteriores. Mais: a “seriedade da informação recolhida na visita de 2019” leva o CPT a pedir a tomada de “medidas imediatas e firmes” pelas autoridades portuguesas, que devem reconhecer que os maus tratos são “um facto, e não o resultado de haver alguns polícias desonestos”. “A cultura policial deve ser robusta o suficiente para rejeitar veementemente a prática de maus tratos entre a sua hierarquia”, afirma-se no relatório.

A maior parte das pessoas com quem falaram diz ter sido bem tratada pela polícia, a prática não é generalizada, só que acontece mais frequentemente do que deveria e de forma sistemática, diz a chefe da delegação, Julia Kozma, em entrevista ao PÚBLICO. A resposta comum das autoridades, diz, “é que existe tolerância zero em relação a estas práticas, mas depois parece haver uma negação de que estes casos acontecem frequentemente”. E sublinha: “Não se trata de um policial que, num ano, infringe a lei. Todos os anos que vimos a Portugal há alegações de mais casos, e provas, e não há suficientemente consciência de que isto está no sistema e é preciso ser atacado. Há relutância em levar alguém a ser punido.”
Agressão de suspeitos para confessarem o crime ou para os punir; estaladas, murros e pontapés ou bastonadas; insultos verbais sobre a cor da pele, algemagem durante horas seguidas durante a detenção ou enquanto os cidadãos estavam detidos foram algumas das queixas mais frequentes e “credíveis” que mereceram a atenção do CPT.

A também advogada diz que “já não acredita” na Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI). “A resposta que tivemos aos nossos casos foi uma desilusão. Parecem ter-se baseado completamente nos relatórios da polícia, não há indicação de que houve algum tipo de investigação. Em todos os casos que referimos dizem ter olhado para os relatórios da polícia, e que foi usada a força de forma proporcional e, portanto, o caso foi encerrado.”

Em geral a resposta das autoridades portuguesas foi insatisfatória, critica. “Fizemos uma série de recomendações que não foram aceites de todo. Por exemplo, que os polícias que estão em operações especiais devem ter identificação” — isto a propósito do caso de um adepto do Boavista que ficou cego depois de uma agressão por polícias, mas em que o tribunal não conseguiu que alguém fosse condenado por ninguém ter sido identificado. Noutras tiveram como resposta “que era a lei”: “A responsabilidade [das autoridades] é aplicar a lei segundo parâmetros de direitos humanos, não chega citar a lei.”
Colegas devem denunciar.

Entre as várias medidas que o CPT elenca está a responsabilização dos oficiais superiores pela sua equipa ou a aplicação de sanções apropriadas, tanto criminais como disciplinares, aos agressores e a quem não previne nem reporta os maus tratos. Sugere ainda que se responsabilize quem sabe, ou deveria saber, que os actos foram praticados, mas não os preveniu ou reportou. Encoraja os agentes a denunciar qualquer situação de violência exercida pelos colegas.

Lê-se ainda que “o CPT recomenda que o ministro da Administração Interna e as direcções da GNR, PSP e SEF passem uma mensagem forte de que os maus tratos a pessoas detidas é ilegal, não-profissional e será sujeito a sanções apropriadas”. A mensagem deve ser igualmente transmitida pela ministra da Justiça e pelo director nacional da Polícia Judiciária, acrescenta.
Entre várias recomendações estão ainda a de a GNR e PSP desenvolverem programas para reforçar os laços comunitários, nomeadamente em áreas com uma elevada proporção de imigrantes e afrodescendentes.

O baixo número de condenações levam o CPT a sugerir também melhoria na rapidez da investigação das queixas pelo Ministério Público, o que requer mais meios humanos. Num dos vários exemplos, o CPT lembra o do major Carlos Botas, da GNR, acusado de torturar quatro cidadãos — foi um caso para o qual o CPT chamou a atenção em 2012, 2013 e 2016, acusando as autoridades de não fazerem investigação. O caso foi reaberto por causa dos avisos do CPT, o oficial foi condenado, mas, em 2019, o Tribunal da Relação anulou a decisão por causa de uma formalidade.

O documento de quase 60 páginas foi transmitido em Julho às autoridades portuguesas. Houve encontros com vários representantes dos ministérios da Justiça e da Administração Interna e da IGAI. Entre os vários pontos das respostas dadas, Portugal afirmou que a IGAI tem o Plano de Prevenção de Práticas Discriminatórias, que os directores das respectivas polícias transmitem a mensagem aos agentes de que os maus tratos “colidem” com a missão e dever profissional e que todas as queixas são investigadas.

Prisões repletas

O CPT também é bastante crítico em relação às prisões, nomeadamente ao número de presos e sobrelotação dos estabelecimentos prisionais, apontando o dedo a Caxias, Porto e Setúbal, que continuam a ter graves problemas: “Pessoas vulneráveis foram detidas nestas três prisões em muito más condições, em espaços com menos de 3 m2 e confinados às celas mais de 23h por dia.”
A recomendação de fecharem o Hospital-Prisão de Santa Cruz do Bispo mantém-se, como em relatórios anteriores: “Os pacientes estavam em condições ultrajantes”, sublinham. O Governo respondeu que os ministérios da Justiça e da Saúde designaram um grupo de trabalho para fazer alterações à Lei de Saúde Mental.

27.7.20

De Alcindo Monteiro a Bruno Candé. Crimes contra as "vidas negras" em Portugal

Marta Grosso , Ricardo Vieira

Para Bruno Candé Marques, um ator negro de 39 anos, com três filhos menores, a morte chegou depois de várias ameaças e insultos racistas, denuncia a família. É na zona de Lisboa que acontece a maioria dos casos de violência contra negros.

Numa altura em que o debate sobre a violência racial assume um lugar proeminente nas bocas do mundo, depois da morte do afroamericano George Floyd às mãos da polícia de Minneapolis, Portugal ficou em estado de choque com o assassinato de Bruno Candé Marques.

Não há contabilidade exata das mortes de negros em Portugal por motivações raciais. Organizações de afrodescendentes relatavam à ONU, em 2016, a existência de dezenas de casos, desde a morte de Alcindo Monteiro nos anos 90.

Mais recentemente, Mamadou Ba, do SOS Racismo, referia pelo menos 10 mortes, nos últimos 15 anos, às mãos da policia. Lembramos alguns dos casos mais mediáticos.

Bruno Candé Marques, um ator de 39 anos, que tinha escapado à morte depois de um atropelamento do qual ainda estava a recuperar, foi baleado "em várias partes do corpo" e não resistiu. O crime aconteceu em plena via pública. O autor, um homem com cerca de 80 anos, foi detido no local.

Os vizinhos dizem que o suspeito – que não ofereceu resistência às autoridades – concretizou, nessa tarde, as ameaças que vinha a fazer há alguns dias.

A família exige "justiça célere e rigorosa" perante um crime que considerou "premeditado e racista" e a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, fala num "um crime horrível, um assassinato violento, racista". Ao jornal "Público", a PSP disse que, até ao momento, não tem qualquer informação que comprove a acusação.

Bruno Candé Marques vivia no Casal dos Machados, na freguesia do Parque das Nações (concelho de Lisboa), e foi assassinado ali perto, em Moscavide (concelho de Loures).

A morte chocou o país e a comunidade artística, em particular. Não é um caso único de violência em Portugal, mas se nuns os contornos raciais parecem evidentes, noutros são apontados motivos fúteis ou estão relacionados com ações policiais.

Giovani Rodrigues (21 de dezembro de 2019)

O jovem cabo-verdiano de 21 anos foi encontrado caído na Avenida Sá Carneiro, em Bragança, mais de meio quilómetro e alguns minutos a pé do bar Lagoa Azul, onde terá estado com um grupo de amigos e onde terá começado uma desavença.

O caso chegou às autoridades locais como um possível alcoolizado caído na rua sem menção a agressões ou ferimentos, segundo comandante dos bombeiros locais.

Só depois de chegar ao local e avaliar a vítima é que a equipa de emergência descobriu um ferimento na cabeça e “verificou que se tratava de um possível traumatismo craniano”.

Giovani Rodrigues acabaria por morrer a 31 de dezembro, no Hospital de Santo António, no Porto. Os vários suspeitos da autoria desta morte estão em prisão preventiva, a aguardar julgamento.

Apesar de o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, garantir que a morte de Luis Giovani Rodrigues não está relacionada com "nacionalidades ou raças", muitos acreditam que o crime terá tido motivações racistas.

Wilson Neto (novembro de 2013)

Foi perseguido e esfaqueado na estrada de Benfica, em Lisboa, por aspirantes a “hammerskins” (um grupo da supremacia branca formado em 1988 nos EUA), diz o Ministério Público no despacho de acusação.

Quando saía do autocarro, às 6h15 da manhã, Wilson ouviu alguém abordá-lo de um carro: “Tens a mania que és engraçado.”

O jovem começou a correr sem responder à provocação. Mas, sem forças, acabou por cair por terra. Foi então alcançado pelos elementos do grupo que, “indiscriminadamente, lhe desferiram inúmeros socos e pontapés por várias partes do corpo, e ainda facadas na coxa esquerda”.

Quando este desfaleceu junto a uma parede, já do outro lado da rua, os arguidos “voltaram a desferir-lhe socos e pontapés por várias partes do corpo, facadas no abdómen e tórax e ainda golpes com uma chave de rodas na mão esquerda”.

Ficou inanimado no solo. “Já chega”, afirmou um dos arguidos.

Wilson Neto sofreu fraturas e múltiplas lacerações e feridas – lesões que lhe impuseram um período de doença de 60 dias, com 30 dias de afetação da capacidade de trabalho.

Segundo o Ministério Público, os ferimentos que sofreu poderiam “determinar a sua morte”, já que os arguidos “visaram partes do corpo” onde sabiam “encontrar-se órgãos vitais”.

E apenas agiram assim, “porque o ofendido é de raça negra, denotando com as suas condutas total ausência de responsabilização e desprezo pela vida humana”, lê-se ainda na acusação divulgada pelo jornal "Público".

Abril de 2014 – senegalês agredido por cabeças rapadas

Seis meses depois, também em Lisboa, alguns dos arguidos no caso de Wilson Neto agrediram um cidadão senegalês, vendedor ambulante, mais uma vez aproveitando a “superioridade numérica” para lhe tirarem os bens que vendia, antes de este ser conduzido ao hospital pelo INEM.

Aconteceu na Rua Diário de Notícias, no Bairro Alto, na madrugada de uma sexta-feira de abril.

O Ministério Público fala em crimes para cumprir “ritos de iniciação”. Entre 2013 e 2017 (já depois de 20 membros de um grupo de “hammerskins” terem sido detidos, ainda que sem prisão preventiva) terão sido cometidos dezenas de crimes raciais.

Em junho deste ano (2020), o Ministério Público acusou um grupo de 27 homens por homicídio qualificado e crimes raciais cometidos, pelo menos, desde 2015.

Foram ainda indiciados por ofensas à “integridade física qualificada, incitamento à violência, dano com violência, detenção de arma proibida, roubo, tráfico de estupefacientes e tráfico de armas”.

Mas nem todos os suspeitos foram detidos para serem julgados. O processo tem 18 vítimas.

Os indivíduos promoviam a "superioridade da raça branca" e estarão ligados aos “Hammerskins” – um grupo que, de acordo com o Ministério Público, “perfilha a ideologia nazi, apelando e exaltando a superioridade da raça branca, pretendendo expulsar ou impedir a entrada em Portugal de todas as minorias étnicas, bem como agredir os nacionais negros e ciganos”.

Os elementos são homens entre os 24 e os 50 anos com as mais variadas profissões. Diz o Ministério Público que só podem candidatar-se a um lugar neste grupo “indivíduos do sexo masculino, com idade superior a 18 anos que sejam, única e exclusivamente descendentes de caucasianos, até onde seja possível identificar essa característica”.

“O grupo perfilha a ideologia nazi apelando e exaltando a superioridade da raça branca, pretendendo expulsar ou impedir a entrada em Portugal de todas as minorias étnicas, bem como agredir os nacionais negros e ciganos.”

Alcindo Monteiro (10 de junho de 1995)

É dos casos mais conhecidos de morte às mãos do racismo. Alcindo Monteiro tinha 27 anos e era natural de Cabo Verde. Foi morto à pancada, com pontapés na cabeça, por ter uma cor de pele diferente dos seus agressores.

Tudo aconteceu numa noite em que o país comemorava o Dia de Portugal e das Comunidades e um grupo de extrema-direita distorciam essa efeméride com um jantar para assinalar o dia da raça, no Bairro Alto, em Lisboa.

Alcindo Monteiro foi encontrado inconsciente na Rua Garrett, no Chiado. O espancamento provocou hemorragias, lesões traumáticas crânio-encefálicas e fraturas.

Acabou por morrer no dia 11 de junho, às primeiras horas da madrugada.

Casos de polícia…

Mas nem todos os casos em que um negro perdeu a vida foram suscitados por grupos de extrema-direita. Há também situações que envolvem operações policiais.

Agressões na esquadra de Alfragide (fevereiro de 2015)

A 20 de maio de 2019, o Tribunal de Sintra condenou oito dos 17 polícias da Esquadra de Alfragide, concelho da Amadora, acusados de agressões e sequestro de seis jovens da Cova da Moura, em 2015, mas absolveu-os dos crimes de racismo e tortura.

O coletivo de juízes aplicou a sete dos arguidos penas de entre dois meses e cinco anos de prisão, suspensas na sua execução por igual período, pelos crimes de sequestro, de ofensa à integridade física qualificada, de falsificação de documento, de injúria e de denúncia caluniosa.

A um dos arguidos, o coletivo de juízes determinou que a pena de um ano e meio fosse efetiva, por este arguido já ter sido condenado no passado.
Oito polícias condenados no caso da esquadra de Alfragide. Foto: Miguel A. Lopes/Lusa

Musso (maio de 2013)

Musso foi detido em maio de 2013 por um alegado furto no interior de um supermercado. Foi libertado no mesmo dia, mas, uma semana mais tarde, dava entrada no Hospital Amadora-Sintra, onde ficaria internado durante alguns dias.

O jovem queixava-se de dores de cabeça e de ter sido torturado pelos agentes da polícia.

Acabaria por morrer um mês mais tarde, ainda internado no hospital.

A PSP abriu um inquérito ao caso, mas ninguém foi responsabilizado.

Elson Sanches – “Kuku” (4 de janeiro de 2009)

Na ronda durante a noite, uma equipa da PSP da Amadora detetou um carro que se encontrava furtado e por apreender. Entre os jovens que seguiam no veículo estava Elson Sanches, um jovem de 14 anos conhecido por “Kuku”.

Seguiu-se uma perseguição policial no bairro de Santa Filomena e “Kuku”, que fugia, foi apanhado. Minutos depois, era baleado pela polícia.

De acordo com uma análise forense, a arma encontrava-se a menos de 20 centímetros da sua cabeça.

Não havendo testemunhas, a acusação do Ministério Público levou o agente responsável pelo disparo a tribunal, num julgamento que se arrastou ao longo de quase quatro anos.


O relatório da Polícia Judiciária afastava a hipótese de legítima defesa e apontava para a existência de um crime de homicídio não qualificado, mas negligente. O Ministério Público pediu a condenação do agente, que acabou por ser absolvido.

O caso de Elson "Kuku" Sanches vem mencionado num relatório do Conselho da Europa, que refere a existência de "manipulação de provas" no processo.

Nuno Manaças Rodrigues – “Mc Snake” (15 de março de 2010)

Às 4h00 da madrugada, o ‘rapper’ Nuno Manaças Rodrigues, mais conhecido como "Mc Snake", fugiu de uma operação STOP junto à doca de Santo Amaro, em Lisboa.

O agente Nuno Moreira e mais quatro polícias perseguiram o fugitivo, até que conseguiram atravessar a carrinha policial à frente do carro, na Radial de Benfica.

Os agentes saíram da carrinha quando Nuno Manaças se preparava para fazer inversão de marcha e fugir novamente.

O agente Nuno Moreira disparou uma vez para o ar e duas vezes sobre o automóvel, acabando por atingir mortalmente o ‘rapper’.

Em junho de 2011, o PSP foi condenado a 20 meses de prisão com pena suspensa, pelo crime de homicídio por negligência grosseira.

Um caso semelhante aconteceu em 2017, quando uma perseguição policial teve um final fatal. Uma mulher morreu atingida no pescoço pela PSP, em Lisboa.

A vítima mortal foi abatida por engano, depois de a viatura em que seguia ter sido confundida com uma outra, envolvida num assalto a uma caixa multibanco.

De acordo com o comunicado da PSP emitido na altura, por volta das 3h35, na zona da Encarnação, em Lisboa, foi detetada uma viatura que aparentava corresponder às características da viatura suspeita, cujo condutor desobedeceu à ordem de paragem.

As autoridades lamentam a "morte da cidadã envolvida na ocorrência", que não estava relacionada com o assalto que esteve na origem da perseguição policial.

Carlos Reis (26 de março de 2003)

É mais um caso de fuga a uma operação STOP. Eram 22h45 quando Carlos Alberto Costa Reis e a mulher, Marlene Silva, não respeitaram a ordem de paragem.

Aos 20 anos, Carlos Alberto Costa Reis foi atingido na cabeça por um agente da PSP, numa rotunda do Bairro do Zambujal, em Alfragide (concelho da Amadora).

A mulher, com 18 anos e grávida, também ficou ferida.

Segundo a polícia, os agentes da PSP dispararam “para o ar” e “em direção ao carro na tentativa de o imobilizar”. Foi nessa altura que atingira o condutor.

O Comando Metropolitano da PSP refere ainda que, durante a tentativa de fuga, a vítima mortal tentou “atropelar um dos agentes” envolvidos na operação.

O polícia e o condutor foram transportados ao Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa. Carlos Reis acabou por morrer internado.

27.4.20

Agressões em lar de jovens em Coimbra

in SicNotícias

PSP abriu inquérito sobre a ação policial

A PSP abriu um inquérito para apurar as agressões de um agente a um menor de um lar de acolhimento em Coimbra. A agressão terá ocorrido na última madrugada, depois de a polícia ter sido chamada ao Lar de São Martinho.

22.1.20

Tolerância zero para o ódio e a violência policial

Fernando Teixeira, in Público on-line

Neste Portugal onde o racismo anda à solta e de mão dada com todo o tipo de intolerância, não nos podemos dar ao luxo do silêncio e da complacência. É preciso combater o populismo em todas as suas frentes.

Pela internet mais um vídeo de alegada violência e abuso policial em Portugal. A particularidade reside no facto de um polícia encorpado se encontrar em cima, e de forma violenta, de uma pessoa negra. Talvez por isso o senhor agente não achasse que esta senhora merecesse o mesmíssimo tratamento do que qualquer outra pessoa. A mim pouco me importam as circunstâncias ou as razões que levam à detenção porque, se esta é levada a cabo, é para o ser com dignidade, e não me parece que tenha havido resistência à detenção. Aliás, como poderia? É certo que as conclusões mais certeiras e credíveis irão sair de um inquérito que, certamente, irá ser aberto na senda deste abuso, mas tal não impede que, à luz do Portugal de agora, não possamos nós tirar as ilações indispensáveis para compreendermos que a intolerância e o ódio não podem encontrar em nós o silêncio.

É preciso ser-se muito alheado da vida para não se perceber que o país está diferente, que o ódio, seja ele racial, étnico ou político, tem encontrado na praça pública vozes de legitimação e instigação ao pensamento rudimentar do “nós e eles”. O crescente número de afirmações e práticas inadmissíveis na vida pública são um sinal de que quando nos deixamos adormecer em democracia, corremos o risco de acordar em ditadura. Não quero com isto dizer que vivemos num estado totalitário, longe disso, mas o facto é que temos assistido nos últimos anos a muitos episódios de violência policial, como os casos do bairro da Jamaica ou da esquadra de Alfragide.

Mas o mais preocupante é que tais actos encontram conforto na própria Assembleia da República, onde André Ventura insta à intolerância e à política do medo, medo contra os imigrantes, medo contra pessoas de outras cores, medo contra os ciganos. A extrema-direita tem-se imiscuído na vida da sociedade, dando corpo ao Movimento Zero, por exemplo, no seio das forças policiais. Este movimento inorgânico e sem rosto é a ponta da espada que a extrema-direita enverga para nos lançar outra vez no obscurantismo. É incompreensível que este movimento ainda exista e não tenha sido já desmantelado. É incompreensível que estejamos a ser lançados uns contra os outros, diariamente, nos jornais e nas televisões com discursos populistas e inflamados que encontram em muitos o silêncio.

“É preciso ser-se muito alheado da vida para não se perceber que o país está diferente, que o ódio, seja ele racial, étnico ou político, tem encontrado na praça pública vozes de legitimação e instigação ao pensamento rudimentar do 'nós e eles'.”

Não, a extrema-direita combate-se, não se ignora. Quando a sociedade dá sinais de impunidade perante o discurso de ódio e a violência, mais fácil é a sua propagação e, consequentemente, mais difícil conter os seus efeitos. Vejamos o caso de Suzana Garcia, que todos os dias tece considerações inenarráveis sobre alegados crimes cometidos, onde julga e condena em praça pública antes de qualquer tribunal. Aliás, se alguém perder um pouco de tempo a ouvir esta rubrica percebe que, para Suzana Garcia, a solução está no aumento das penas, por exemplo, para possibilitar a prisão preventiva a quase todos os crimes; ou, então, a castração química. É um discurso que está há tempo a mais nas televisões dos portugueses. Não pode ser normal ou banal alguém insultar alegados agentes de crimes em directo sem que exista uma consequência para quem o faz.

Neste Portugal onde o racismo anda à solta e de mão dada com todo o tipo de intolerância, não nos podemos dar ao luxo do silêncio e da complacência. É preciso combater o populismo em todas as suas frentes. Desengane-se quem acha este meu texto dramático ou exagerado, dramático é levar porrada da polícia devido à condição social ou à cor de pele e não se poder defender. Isso, sim, é dramático.

11.7.17

Violência policial: "Todos viraram as costas!"

Valentina Marcelino, in DN

A Comissão de Alerta Precoce para a Cova da Moura, criada em 2015, nunca apresentou resultados. PSP não comenta

O caso de 5 de fevereiro de 2015 foi mais um entre muitos de violência policial de que se queixam, recorrentemente, os moradores da Cova da Moura. Este teve a particularidade de, além de uma dimensão invulgar - quer pelo número de agentes envolvidos quer pela brutalidade motivada pela xenofobia e racismo assumidos - ter como vítimas também jovens integrados, trabalhadores e estudantes, ativistas em associações cívicas do bairro.

Em sua defesa vieram nomes públicos sonantes, como o do sociólogo Boaventura Sousa Santos e de várias organizações de direitos humanos, como o SOS Racismo, manifestando-se em protesto em frente da Assembleia da República. Da parte do governo PSD-CDS, na altura no poder, chamaram-se as associações e residentes do bairro, sentando-os à mesma mesa com as autoridades policiais.

O Alto-Comissariado para as Migrações (ACM) e a Comissão para a Igualdade contra a Discriminação Racial pediram à IGAI a abertura de processos contra os polícias. Foi criada, ainda pelo Ministério da Administração Interna (MAI), uma Comissão de Alerta Precoce para a Cova da Moura, juntando polícias, autarquias e associações de imigrantes, que levaram testemunhos de uma "sistemática" brutalidade policial e racismo sobre os residentes, que se tinham agravado nos últimos anos.
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No passado dia 5 de fevereiro, quando se completaram dois anos dos incidentes, o gabinete da atual ministra não respondeu ao pedido do DN para saber sobre o trabalho da Comissão, remetendo para a Junta de Freguesia Águas Livres/Buraca - coordenadora da dita Comissão - os esclarecimentos. Apesar das insistentes solicitações do DN, por mail e telefone, a junta nunca respondeu.

O ACM, por seu lado, garantia que foram tomadas várias medidas, entre elas "a aproximação entre os moradores africanos e as forças de segurança, através de abordagens primárias. No bairro, que chegou, em tempos, a ser um exemplo do dito "policiamento de proximidade" da PSP, com a cooperação intensa da Associação Moinho da Juventude, nenhum esforço foi notado.

Lúcia Gomes, a advogada dos seis jovens agredidos, escrevia nessa data, no blogue Manifesto 74: "As associações falharam, deixaram de estar, de falar sobre o assunto. Todas as personalidades que se indignaram, à data, desapareceram. O Alto-Comissariado para as Migrações nunca sequer lá pôs os pés para falar com ninguém ou intervir e se disser que o fez, mente. Todos viraram as costas, fingindo que não há racismo, não há violência, não há tortura."

Da parte da Direção Nacional da PSP tudo continuou como se nada tivesse acontecido. Os polícias agressores continuaram na esquadra e não houve notícia de mudança nos critérios de recrutamento e formação dos agentes destacados para aquelas áreas sociais sensíveis. Contactado pelo DN, o gabinete do diretor nacional, Luís Farinha, disse que não respondia. A IGAI, por seu lado, que acabou por arquivar o inquérito, prometeu, conforme o DN chegou a noticiar, um manual de boas práticas e formação especial para os agentes que fazem policiamento neste género de bairros, a começar pela Cova da Moura. Como em tudo o resto, nada que fosse notado pelos habitantes deste bairro, às portas de Lisboa, com uma maioria de habitantes de origem cabo-verdiana.

O medo persistiu e persiste em 2017, "num mundo em que um jovem deixa de sair à rua porque não quer encontrar a polícia nem que no bairro o acusem de pôr o bairro em perigo porque enfrentou a polícia. (...) Num mundo onde dizem a um semelhante que deve ser exterminado, que não é pessoa", testemunhou Lúcia Gomes.