Gomes Fernandes, Arquitecto, in Jornal de Notícias
Como vem sendo hábito nestas situações, sempre que um projecto de alguma controvérsia social falha, os parceiros nele envolvidos desatam a fazer acusações mútuas que nada ajudam à clarificação das causas desse falhanço. Foi o que aconteceu agora no Porto, com o falhanço, previsível, do Programa "Porto Feliz", de reintegração social dos denominados "arrumadores".
Digo previsível, porque o problema era complexo e requeria um alargado consenso político para se implementar com o mínimo de êxito, coisa que não é fácil na Câmara do Porto, com o doutor Rui Rio na Presidência e o PS incapaz de perceber que não pode continuar com o seu estilo de oposição. Daí que o assunto estava "ferido de asa" desde princípio, mais ainda quando a maioria que governa a Câmara fez demasiado alarido e gastou bastante "foguetório" numa festa que nunca percebeu ser uma dolorosa "penitência".
A questão dos arrumadores é social e de autoridade pública, e nem uma nem outra coisa os nossos governantes conseguem assegurar, o que transmite aos cidadãos uma imagem de incapacidade, geradora de repulsa e medo. Tudo se resolveria se o cidadão se sentisse apoiado e protegido quando o assediam pela "moedinha" e, por outro lado, estivesse seguro de que alguém, utilizando os dinheiros públicos, apoiaria e encaminharia no melhor sentido aquele caso social.
Em vez disto, que é um problema de todos, os políticos degladiam-se em escaramuças consumidoras de energia e credibilidade e disparam acusações mútuas e gastadoras de tempo, o mesmo que deveriam consumir a pensar e procurar as melhores soluções. Foi o que aconteceu agora uma vez mais, com o senhor presidente da Câmara a acusar o Governo por um falhanço em que tem, pelo menos, 50% de responsabilidade e a fazer um "birra", não participando no maciço passeio de bicicleta realizado no passado domingo em prol de tão nobres causas.
É certo que ninguém lá viu, também, o doutor Francisco Assis, mas não deixando passar o reparo, não pode deixar de se lembrar ao senhor presidente as responsabilidades derivadas de cargo.
Apetecia-me propor uma alternativa que fosse capaz de travar tal falhanço e ela é tão simples que poucos entenderão porque não tem "pernas para andar" Que o senhor presidente da Câmara abrisse um espaço de debate sobre este tema com a Oposição, suficientemente sério e claro para que fosse capaz de comprometer, pela positiva ou negativa, os seus opositores com a solução do problema. Deixando claro que se não trata de uma questão partidária mas de cidadania, obrigando a que todos dessem os seus contributos e se empenhassem com idêntica seriedade e clareza.
Nada disto se vai passar, como é evidente, porque as visões partidárias são sempre sectoriais e egoístas e, como em toda a festa, todos gostam de lançar "os foguetes", mas poucos se aprontam, ou responsabilizam, a "apanhar as canas". É o que se passa hoje com o "Porto Feliz", o tempo do "foguetório" acabou, a festa foi um fiasco e os que disso deveriam assumir as responsabilidades, sacodem a água para o capote do vizinho, como se um qualquer passe de mágica viesse solucionar o problema.
Não vem e o falhanço acontecido deixa a cidade, e os seus cidadãos, mais desprotegidos, mais ainda se a Câmara virar as costas ao assunto e não procurar forçar as parcerias a manter compromissos, em novos moldes reestudados e renegociados. Ou seja, se a Câmara não assumir a sua quota-parte de erro e responsabilidade e não aproveitar o momento para reflectir e pensar, sempre uma boa maneira de assumir com humildade cívica a perda de uma batalha mas não aceitar a derrota da guerra.
Faz falta ao Porto um alargado consenso para a sua governação e isso é, em primeira linha, a expressão da inabilidade política do presidente da Câmara, mas não só, também da falta de projecto do PS para ser capaz de afirmar a sua capacidade negocial. Assim, não admira que o Porto esteja, cada vez, mais
infeliz!