1.11.09

Empresas estão a dar menos ao apoio social

Por Natália Faria, Jornal Público

A Liga Contra a Sida aderiu ao Facebook para angariar receitas. Não é uma rendição às novas tecnologias: é uma tentativa de compensar a diminuição dos donativos líquidos das empresas


Definitivamente, a solidariedade não pode estar à espera dos donativos das empresas. A crise fez com que estas, mais preocupadas em pagar salários, diminuíssem para metade os donativos em dinheiro às instituições particulares de solidariedade social (IPSS). Resultado: muitas viram-se obrigadas a dizer não aos pedidos de ajuda dos que lhes batem à porta.

"Muitas das empresas que costumavam contribuir faliram ou reduziram os postos de trabalho. Outras, que contribuíam semestralmente, passaram a contribuir anualmente", conta Bárbara Diogo, da Liga Nacional Contra a Fome, dizendo que a instituição está a recusar pedidos de comida porque deixou de a poder adquirir.

A tendência atravessa o país e os diferentes tipos de instituições. "Já vamos no sétimo mail a pedir às 500 empresas que são sócias o pagamento da quota. Metade alegou indisponibilidade financeira e sente-se que as respostas são honestas: muitas empresas estão mesmo sem poder pagar os 300 euros de quota", conta Eugénia Saraiva, presidente da Liga Portuguesa Contra a Sida (LPCS).

Para garantir que a Linha SOS Sida vai continuar a funcionar, a LPCS recorreu ao Facebook como plataforma alternativa de angariação de receitas. "Também criámos um número - o 760 50 10 30 - através do qual as pessoas podem ajudar. Se o dinheiro não começar a entrar, vai ser difícil ajudar as 450 famílias que estamos a apoiar neste momento".

Por enquanto, a Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC) continua a as-segurar todas as suas actividades, apesar de "os pedidos de ajuda finan-ceira terem duplicado", segundo o presidente da instituição, Vítor Veloso. Mas isto só acontece porque a LPCC soube combater a dependência relativamente às empresas e tem no peditório nacional que decorre este fim-de-semana a principal fonte de receita. "Fugimos à dependência exclusiva das empresas porque a maior parte dos empresários apoia mais depressa um concerto rock do que uma obra social", justificou Veloso. Motivo? "O retorno em termos de impacto mediático é maior", responde Veloso, para defender que diferentes tipos de mecenato deveriam merecer diferentes tipos de incentivo, em sede fiscal. "Neste momento, apoiar o combate ao cancro ou à fome é a mesma coisa que apoiar um concurso de fotografia e não devia ser assim".

Madalena Duarte, da Ajuda de Ber-?ço, não vê necessidade de mais incentivos ao mecenato. "As empresas que fazem doações, em géneros ou dinheiro, recebem incentivos até 150 por cento do valor do donativo, o que me parece mais do que suficiente", sustenta a responsável pela instituição que, no ano passado, apoiou 1300 grávidas e as respectivas famílias.

Já Lino Maia, da Confederação Na-cional das Instituições de Solidariedade, está a fazer figas para que a di-minuição da ajuda das empresas seja compensada pelo aumento dos donativos por via dos 0,5 por cento do IRS liquidado aos contribuintes. "Até há poucos meses, as IPSS que quisessem candidatar-se a essa ajuda tinham que renunciar à recuperação do IVA, mas isso agora acabou e acredito que há aqui margem para uma maior generosidade". Em 2007, recorde-se, o Estado entregou 1,7 milhões de euros a IPSS escolhidas pelos contribuintes - o Ministério das Finanças disse não dispor ainda dos valores de 2008.

Menos optimista, Eugénio Fonseca, da Caritas Portuguesa, não acredita que os donativos via IRS cheguem para debelar os efeitos da crise. "Nós vamos tendo como ajudar porque, desgraçadamente, muitas das empresas que faliram doaram o espólio à Caritas". Que soluções? "Uma delas, enquanto a economia não retoma o seu curso normal, pode ser redireccionar alguns programas do QREN [apoios comunitários] para garantir ajuda às vítimas da crise."Lorer summy