5.1.10

Quinze mil à espera de encontrar lugar num lar

por Rita Carvalho, in Diário de Notícias

Há milhares de idosos que vivem sozinhos, sem protecção da família nem cuidados básicos, e nem sequer estão sinalizados pela rede social, não beneficiando de qualquer apoio. Mas para os que procuram lugar num lar, o Estado também não tem resposta. "Estima-se que haja 15 mil pessoas em lista de espera", adianta ao DN Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (IPSS).

Para acolhimentos temporários, as solicitações das famílias são cada vez maiores, nomeadamente em tempo de férias. Mas para estes casos não há sequer hipótese, diz Lino Maia, pois a maioria das IPSS não disponibilizam este serviço. A resposta pode ser apenas encontrada nos privados, e não sai barata, pois a maioria não precisa só de alojamento, mas de cuidados de saúde específicos.

O abandono nas alturas festivas resulta por isso, muitas vezes, na morte dos mais frágeis. O delegado regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, António Tavares, confirma que há sempre um elevado número de mortes de idosos nesta época. Mas a causa não está apenas no frio e nos problemas de saúde que se agravam com ele. Às vezes uma simples queda não socorrida a tempo pode resultar na morte. O problema é um misto de vários factores: solidão, falta de cuidados básicos de alimentação e de enfermagem, dificuldades de locomoção ou de visão. E muita tristeza, acrescenta. Um sentimento que se agrava numa época como o Natal, em que os mais velhos se sentem ainda mais rejeitados pela família.

"Há situações de desespero. As pessoas desistem, deixam de comer, de se levantar da cama. Algumas suicidam-se", acrescenta o técnico que, enquanto delegado de saúde, acompanhou vários casos de enforcamento. "Há muitos casos dramáticos que não são sinalizados porque as pessoas escondem até ao limite", acrescenta Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas, sublinhando o aumento da pobreza envergonhada. "Há um enorme espírito de sacrifício de muitos idosos que recusam queixar-se, mesmo quando são abandonados pelos filhos e netos".

Em Lisboa, por exemplo, as carências da terceira idade não são apenas realidades em bairros antigos e degradados. Em zonas como Alvalade, há famílias com casas boas, até com tapetes de Arraiolos na parede, mas cujos donos não têm dinheiro para comer, denuncia a responsável de uma instituição que presta apoio na capital. Muitas vezes, amigos e familiares nem sabem das dificuldades.

O presidente da Cáritas critica ainda o que diz ser um modelo de sociedade que só defende os que são "produtivos e competitivos" para o produto interno bruto do País e abandona os que "são considerados uma despesa supérflua". Há histórias dramáticas, conta. De familiares que ficam com o complemento solidário para idosos dos filhos ou se recusam a deixar que a instituição onde estes estão lhes preste os cuidados adequados.

Mas este não é só um problema de pobreza nem de falta de recursos financeiros, diz o presidente da Cáritas. Há pessoas que têm relações cortadas com os familiares mais próximos ou vivem fechadas em si. Os casos de saúde mental também são cada vez mais preocupantes, diz Eugénio Fonseca. Para doentes com alzheimer ou parkinson não há quase resposta na rede pública. O número de idosos apoiados pelos serviços sociais tem vindo a crescer, seja através da rede de cuidados continuados, dos lares ou do apoio domiciliário. "Mas ainda não temos uma política de apoio à família", lamenta, acrescentando que a solução tem de passar pela recuperação das relações de vizinhança e de proximidade.