Carla Soares, in Jornal de Notícias
A carência alimentar surge, em tempo de crise, como principal factor de insucesso ou abandono escolar, e a percentagem de alunos atingidos por questões económicas tem aumentado, segundo um levantamento da EPIS - Empresários pela Inclusão Social.
Analisadas as situações prejudiciais aos alunos do 3.º ciclo que são acompanhados pela EPIS, em vários pontos do país, a conclusão aponta para uma subida nos casos de carência alimentar, com os estudantes a irem para as aulas sem nada no estômago. A percentagem passou de 8% em 2008/2009 para 12% em 2009/2010. E, no total, os factores económicos cresceram de 19% para 26% em 2010.
Entretanto, chegam novos casos aos cerca de 70 mediadores. A EPIS, presidida por António Pires de Lima, prevê um aumento de situações de carência alimentar, incluindo fome, no próximo ano devido à crise, ao desemprego crescente e ao aperto de cinto.
Num projecto-piloto, a rede de mediadores, que integra docentes, sociólogos e psicólogos, analisou 20 mil alunos numa dezena de concelhos do Norte, Centro e Sul. Seleccionou seis mil para serem acompanhados.
Destes, identificou "entre 8 a 10% em situações muito graves", disse, ao JN, o director-geral da EPIS, Diogo Simões Pereira. É a partir destes casos mais problemáticos que contabiliza os factores de insucesso e abandono escolar. O director-geral situa a última amostra em 500 estudantes.
"Agora, a diferença é maior", registou, aludindo ao facto de a distância ser menor entre o principal factor (12% para carência alimentar) e o segundo (que continua a ser o absentismo elevado, com 10% contra os 7% em 2008/2009).
Os indicadores económicos são hoje mais 7%. Ou seja, carência alimentar (12%), insuficiência económica (8%) e desemprego (6%) somam 26%. Em 2008/2009, surgia já no topo a carência alimentar (8%). As percentagens eram 6% para insuficiência económica e 5% para o desemprego. Juntos, somavam 19%. As duas últimas situações, destaca o director-geral, são de "potencial carência alimentar", pelo que devem ser analisadas em conjunto. Mas há outras como a violência doméstica (passou de 7% para 8%).
Muitos alunos já são abrangidos pela acção escolar, mas chegam em jejum às aulas. Segundo relatos de mediadores, há situações em que não têm dinheiro para a senha do almoço, mas cujos casos não foram detectados antes por se tratar de uma pobreza escondida.
Pires de Lima, presidente da EPIS desde Maio, explica que os mediadores acompanham estudantes a tempo inteiro, fazendo "a ligação entre o aluno, a escola e a família", e encaminhando-os, quando necessário, para instituições, em estreita colaboração com as autarquias. "Começámos também a trabalhar com o 2.º ciclo", adiantou. Graças à EPIS, criada em 2006, "a taxa de sucesso escolar" entre os seis mil alunos "subiu de 58% para quase 80%", destacou.
Pires de Lima explicou, ainda, que a rede é financiada pelas empresas em 9,4 milhões de euros. A EPIS paga sete milhões, o Ministério de Educação 1,5 e as câmaras 900 mil. O Governo contribui com 30 mediadores. O objectivo da EPIS, diz Diogo Simões Pereira, não é dar dinheiro mas contribuir para uma aplicação "mais eficaz" dos recursos públicos.
A EPIS conta com um Conselho Científico, presidido por José Manuel Canavarro.


