27.10.10

Consenso total. OE é insensível à pobreza e irrealista na economia

in iInformação
CES e Unidade de Apoio Orçamental destroem cenário no qual o OE se baseia: a esmagadora maioria dos pressupostos é irrealista, afirmam


Desde que foi apresentado, o cenário macro-económico do Orçamento tem sido criticado 1/1 + fotogalería .O Orçamento do Estado de 2011 (OE/2011) é insensível aos mais pobres, nega a existência de uma recessão no próximo ano, esconde riscos gravíssimos aos quais a economia portuguesa estará exposta nos próximos anos e nada propõe para evitar o agravamento da crise, acusou ontem o Conselho Económico e Social (CES), a plataforma onde têm assento patrões, sindicatos e governo. O CES não está sozinho no ataque ao OE: a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), que trabalha no parlamento, deu também uma machadada nas propostas do governo.

Enquanto isso, as Finanças e o PSD adiaram para hoje as negociações. O CES aproveitou para sublinhar que a não aprovação do OE será ainda mais desastrosa que a aprovação deste mau Orçamento.

O parecer do CES sobre o OE/2011, ontem divulgado, destrói a maior parte das medidas propostas pelo governo no Orçamento. A unanimidade nas críticas surgiu do entendimento entre patrões e sindicatos, uma vez que o governo optou "naturalmente" pela abstenção, explicou José Silva Peneda, líder da instituição. O ex-ministro do Trabalho do PSD disse ao i que, além do acordo genérico, "houve uma grande unanimidade e consenso" em torno das críticas às medidas que penalizam os mais pobres. De facto, o parecer do CES destaca que "nesta proposta de OE não transparecem de forma clara nem uma dimensão económica, nem uma dimensão social", concordaram patrões e sindicatos. O governo absteve-se de votar.

O CES afirma estar preocupado "com o congelamento de todas as pensões, mesmo das pensões sociais, e o impacto que tal medida terá sobre um grande conjunto da população, já particularmente vulnerável a situações de pobreza e exclusão". E vai mais longe: trata-se de "uma medida que não só traduz uma forte insensibilidade social, como configura um desrespeito inadmissível" pelos acordos alcançados em sede de concertação social. O CES dispara também sobre a decisão de congelar o Indexante dos Apoios Sociais (IAS), que serve de base à actualização dos apoios sociais dos quais beneficiam sobretudo as camadas mais desfavorecidas da população. O CES sublinha que esta decisão "terá consequências bastante negativas às quais não pode ficar indiferente, precisamente por afectar as famílias mais fragilizadas e carenciadas".

Embora compreenda e apoie a redução do défice nos próximos anos, o CES nota nas medidas propostas "uma nítida falta de equidade, penalizando-se relativamente mais os estratos sociais de baixos e médios rendimentos". O conselho destaca ainda o corte salarial na função pública como "uma medida injusta, uma vez que faz repercutir só sobre estes trabalhadores grande parte do ónus da redução do défice, a qual a todos beneficia".

Quando aos pressupostos do OE (o cenário macroeconómico), o CES considera- -os nada plausíveis: ao contrário do que diz o governo, o parecer estima que vai haver recessão em 2011, que as medidas de austeridade serão recessivas por vários anos, que o desemprego vai subir mais do que se diz oficialmente, que as receitas de impostos estão subavaliadas. O CES teme que se gere um ciclo de cortes no défice/recessão/novos cortes no défice, criticando o governo por não apresentar medidas que promovam a procura interna e contrariem esta situação.

CRÍTICAS IDÊNTICAS A UTAO deu também uma machadada nas propostas do governo, pondo em causa não só o crescimento do PIB e a meta do défice, mas também a passagem do fundo de pensões da PT para o Estado. No relatório de análise do Orçamento, publicado ontem, a UTAO é bastante clara: "A previsão de crescimento económico constante no Relatório da proposta de OE/2011 não parece ter levado integralmente em conta os muito prováveis efeitos recessivos das medidas restritivas propostas", lê-se no documento, que deixa implícita a possibilidade de Portugal entrar em recessão.

Além disso, diz a UTAO, o défice efectivo de 2010 deverá ficar nos 8% e não nos 7,3% previstos pelo governo, tornando ainda mais exigente o esforço a fazer em 2011. "Atendendo ao elevado montante de medidas temporárias em 2010, o saldo orçamental ajustado desses efeitos constitui uma pior base de partida para alcançar o objectivo do défice de 2010 [4,6%], que assim exigirá um esforço ainda maior de 3,4 pontos percentuais."

O documento aponta também um conjunto de riscos que podem comprometer a meta de 4,6%, exigindo mais austeridade: um agravamento da crise económica, mais despesas sociais com a subida do desemprego e a possibilidade de o crescimento das receitas de capital não corresponder às expectativas do governo, que, segundo o UTAO, não são justificadas.

A UTAO refere ainda os riscos assumidos pelo Estado ao incorporar o fundo de pensões da PT: "A operação envolve também a transferência do risco do acréscimo das responsabilidades com essas pensões, resultante, por exemplo, de aumentos da esperança de vida dos beneficiários, de uma empresa privada para o Estado."