29.10.10

'Bullying' com penas iguais às da violência doméstica

por Patrícia Jesus, in Diário de Notícias
Menores de 16 ficam sujeitos a medidas tutelares educativas, mais velhos podem levar penas de prisão entre um e cinco anos.


O Governo vai avançar para a criminalização do bullying nas escolas. O projecto para criar o crime de violência escolar, aprovado ontem em Conselho de Ministros, adopta uma moldura penal semelhante à que é usada para os crimes de violência doméstica e de maus tratos: ou seja, prevê penas de prisão de 1 a 5 anos para os agressores maiores de 16 anos.

A medida é aplaudida pelos professores. "Os instrumentos de prevenção que existiam não eram suficientes", diz o presidente da Associação Nacional de Professores, João Grancho. E, face ao aumento do número de denúncias, faz todo o sentido avançar para a instituição de "crime público", argumenta.

Para o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), é positivo que se clarifique em que consiste este crime porque pais, professores e até as autoridades de segurança que intervêm nas escolas têm "dificuldade em distinguir o que é bullying e o que não é". Assim, "ou não denunciam, ou denunciam qualquer coisinha".

No entanto, Albino Almeida considera que é necessário analisar melhor o projecto porque vê com preocupação o facto de poder significar penas de prisão para os jovens maiores de 16. Também a representante da Confederação Nacional de Pais e Encarregados de Educação (Cnipe) manifestou a sua preocupação. "Estamos a falar de crianças e adolescentes, não de adultos como quando falamos de violência doméstica. A penalização deve existir mas ser a última opção", alerta Maria João Viseu.

Segundo a tutela, o crime de violência escolar vai incluir "os maus tratos, reiterados ou muito graves, físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, a qualquer membro da comunidade escolar a que também pertença o agressor." Mas antes de enviar a lei para a Assembleia da República, o governo vai ainda ouvir os Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público e a Ordem dos Advogados.

A ministra Isabel Alçada explica que no caso dos menores de 12 a 16 anos - "inimputáveis para efeitos da lei penal" - serão aplicadas, em alternativa, medidas tutelares educativas. Mas para os mais velhos a lei prevê uma pena de 1 a 5 anos de prisão. E nos casos em que se verifique ofensa grave à integridade física ou morte a pena poderá ser agravada entre 2 e 10 anos.

As situações menos graves, no entanto, "deverão ser resolvidas no âmbito da escola, com a responsabilização das famílias e dos alunos", ressalva a governante.

A psicóloga e investigadora Maria Gaspar de Matos, por seu lado, vê alguns perigos na criminalização. "A sociedade tem de se mobilizar no sentido de proteger as vítimas e é evidente que têm de existir regras, mas a criminalização é uma medida de último recurso. Se não for assim é trágico."

Também Sónia Seixas, autora de uma tese sobre bullying, diz que esta "é resposta mais rápida e mais fácil, mas não é certamente a melhor". "Parece-me precipitado. Deve-se sobretudo apostar na prevenção. Claro que isso exige que as escolas tenham meios e a actual conjuntura económica repercute-se na falta de recursos físicos e humanos nas escolas", lembra.