28.11.19

Risco de pobreza diminuiu para reformados, mas aumentou para empregados e desempregados

Joana Gorjão Henriques, in Público on-line

Dados do Instituto Nacional de Estatística foram divulgados nesta terça-feira. Em 2018, calculou-se que 17,2% da população estava em risco de pobreza, uma ligeira descida em relação aos 17,3% do ano anterior.

O risco de pobreza diminuiu para os reformados, mas aumentou para empregados e desempregados, revelam os mais recentes dados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que acabam de ser divulgados. Dizem respeito a 2018.

Segundo aquele organismo, o risco de pobreza para quem está empregado foi de 10,8% em 2018, mais 1,1 ponto percentual do que no ano anterior. Também entre os desempregados, apesar de o desemprego estar a descer, o risco de pobreza aumentou em quase dois pontos percentuais, de 45,7% para 47,5%.

Para os reformados, porém, diminuiu ligeiramente, em 0,5 pontos percentuais, passando de 15,7% para 15,5%. Também entre jovens com menos de 18 anos se registou uma descida de 19% para 18,5%.

Em geral, o inquérito indica que houve uma diminuição de 0,1 pontos percentuais na taxa da população em risco de pobreza em Portugal, em 2018, passado de 17,3% para 17,2%. E o que significa a taxa de risco de pobreza para o INE? Varia anualmente e em 2018 correspondia à proporção de habitantes com rendimentos líquidos de 501 euros mensais (mais 34 euros que em 2017). Porém, se não existissem as transferências sociais e se contabilizassem apenas os rendimentos do trabalho, de capital e transferências privadas essa percentagem subiria para 43,4% em 2018. Assim, segundo o INE, os rendimentos de pensões de reforma e sobrevivência fizeram descer em 20,7 pontos percentuais essa taxa.

“Apesar da redução do risco de pobreza infantil, em 2018 a presença das crianças num agregado familiar continuava a estar associada a um risco de pobreza acrescido, sobretudo no caso dos agregados constituídos por um adulto com pelo menos uma criança dependente (33,9%) e naqueles constituídos por dois adultos com três ou mais crianças dependentes (30,2%)”, refere ainda o INE.

“De acordo com o indicador que conjuga as condições de risco de pobreza [monetária], de privação material severa e de intensidade laboral per capita muito reduzida [a chamada “exclusão social"], 2.215 milhares de pessoas encontram-se em risco de pobreza ou exclusão social em 2019”. A taxa de pobreza ou exclusão social é idêntica à de 2017: 21,6%​.

Menos desigualdade
O Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, realizado pelo INE, foi pela primeira vez publicado em 2003, ano em que se começou a calcular a proporção de cidadãos que auferiam um rendimento inferior a 60% da mediana nacional. Em 2003 a taxa de pobreza relativa era de 20,4%, percentagem que foi descendo até 2008, quando chegou aos 17,9%. A crise fez disparar estes números, mas em 2017 atingiu-se a taxa mais baixa desde que é feito aquele inquérito, com 17,3%. Voltou agora a baixar.


Outra dado relevante para medir o distanciamento do rendimento mediano de quem é considerado pobre em relação ao limiar de pobreza é a taxa de intensidade da pobreza. Essa diminuiu em 2018: foi de 22,4%, menos 2,1 pontos percentuais do que no ano anterior (24,5%), Ou seja, houve uma “melhoria relativa do rendimento mediano dos mais pobres”, escreve o INE. ​
Quanto à desigualdade medida pelo coeficiente de Gini, houve uma ligeira diminuição de 32,1 para 31,9. O Coeficiente de Gini tem em conta toda a distribuição dos rendimentos e reflecte as diferenças de rendimentos entre todos os grupos populacionais.
Em termos de distribuição geográfica, apenas a Área Metropolitana de Lisboa é que registou uma taxa de risco de pobreza significativamente inferior ao valor nacional: 13,3%, ou seja, menos 3,9 pontos percentuais do que a taxa nacional. Os Açores registaram novamente as taxas de risco de pobreza mais altas, de 31,8%, seguidos da Madeira, com 27,8%.

O risco de pobreza infantil reduziu, mas a presença das crianças num agregado familiar continua a constituir um risco de pobreza acrescido: é de 33,9% num agregado de um adulto com pelo menos uma criança dependente e de 30,2% nos que têm dois adultos com três ou mais crianças dependentes.

40% não podem ter semana de férias
O INE mede também a chamada privação material, desta vez já com dados relativos a 2019. E há melhorias. Este indicador baseia-se em nove itens relacionados com as necessidades económicas e de bens duráveis das famílias. Na taxa geral de privação material, que corresponde às situações em que não existe acesso a pelo menos três dos nove itens considerados (por exemplo, capacidade para manter a casa quente) devido a dificuldades económicas, passou-se de 16,6 para 15,1.

Na taxa de privação material severa, que mede a percentagem da população sem acesso a pelo menos quatro dos nove itens, passou-se de 6% para 5,6%.
Os nove itens considerados pelo INE são: não conseguir pagar uma semana de férias por ano fora de casa; não assegurar o pagamento imediato de uma despesa sem recorrer a empréstimo; não conseguir manter a casa adequadamente aquecida; ter em atraso pagamentos de rendas, encargos ou despesas correntes; não ter automóvel; não ter uma refeição de carne, peixe (ou equivalente vegetariano) pelo menos de dois em dois dias; não ter uma máquina de lavar roupa; não ter telefone ou televisão a cores.

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Em 2019, segundo o INE, 40% dos cidadãos vivem em agregados sem capacidade para pagar uma semana de férias por ano fora de casa (valor que desceu 1,3 pontos percentuais em relação a 2018); 33% das pessoas integram agregados onde não há capacidade para assegurar o pagamento imediato, sem recorrer a empréstimo, de uma despesa inesperada de 470 euros ("que corresponde aproximadamente ao valor mensal da linha de pobreza no ano anterior) e 18,9% pertencem a agregados onde não há capacidade para manter a casa adequadamente aquecida.

Já em relação ao pagamento de rendas, 5,8% não conseguem pagá-las a tempo (eram 6,6% em 2018). Por fim, para 2,3% dos portugueses não é possível ter, por razões económicas, uma refeição de carne, peixe ou vegetariana pelo menos de dois em dois dias.

O que mede o INE?
No resumo do inquérito aos rendimentos da população o INE menciona vários indicadores que tem em conta. Os indicadores relativos à pobreza e desigualdade económica foram construídos com base no rendimento monetário anual líquido das famílias em 2018. Excluem-se outras fontes de rendimento, nomeadamente o salário em géneros ou o auto-consumo. Já os dados sobre privação material respeitam ao ano de realização inquérito, ou seja, retratam a situação em 2019. Eis uma explicação breve dos principais indicadores.

O que é a taxa de risco de pobreza?
A taxa de risco de pobreza em 2018 corresponde à proporção de habitantes com “rendimentos monetários líquidos anuais por adulto equivalente” inferiores a 6014 euros (ou seja, 501 euros por mês). Segundo o INE, 17,2% dos portugueses têm rendimentos abaixo desta linha de pobreza de 501 euros mensais.

O que é o rendimento equivalente?
É o resultado obtido pela divisão do rendimento de cada agregado pela sua dimensão em termos de “adultos equivalentes” (uma criança, por exemplo, não “vale” o mesmo nesta conta que um adulto). O "rendimento por adulto equivalente" traduz as diferenças de dimensão e composição das famílias.

O que é a taxa de risco de pobreza ou exclusão social?
É a proporção de indivíduos em risco de pobreza (tal como definido acima) ou que vive em agregados com intensidade laboral per capita muito reduzida ou em situação de privação material severa. São 21,6% da população.

O que é uma “intensidade laboral per capita muito reduzida”?
Consideram-se em intensidade laboral per capita muito reduzida todos os indivíduos com menos de 60 anos que, no período em análise, vivem em agregados familiares em que os adultos entre os 18 e os 59 anos (excluindo estudantes) trabalharam em média menos de 20% do tempo de trabalho possível.

Como se define a taxa de privação material?
É a proporção da população em que se verificam pelo menos três das seguintes nove dificuldades a) Sem capacidade para assegurar o pagamento imediato de uma despesa inesperada próxima do valor mensal da linha de pobreza (sem recorrer a empréstimo); b) Sem capacidade para pagar uma semana de férias, por ano, fora de casa, suportando a despesa de alojamento e viagem para todos os membros do agregado; c) Atraso, motivado por dificuldades económicas, em algum dos pagamentos regulares relativos a rendas, prestações de crédito ou despesas correntes da residência principal, ou outras despesas não relacionadas com a residência principal; d) Sem capacidade financeira para ter uma refeição de carne ou de peixe (ou equivalente vegetariano), pelo menos de 2 em 2 dias; e) Sem capacidade financeira para manter a casa adequadamente aquecida; f) Sem disponibilidade de máquina de lavar roupa por dificuldades económicas; g) Sem disponibilidade de televisão a cores por dificuldades económicas; h) Sem disponibilidade de telefone fixo ou telemóvel, por dificuldades económicas; i) Sem disponibilidade de automóvel (ligeiro de passageiros ou misto) por dificuldades económicas.

E a taxa de privação material severa?
É a proporção da população em que se verificam pelo menos quatro das nove dificuldades descritas na resposta anterior.

Como é feito o inquérito do INE?
O Inquérito às Condições de Vida e Rendimento das Famílias é realizado anualmente através de entrevistas presenciais assistidas por computador. Em 2019, dirigiu-se a 15.454 famílias, das quais 13.570 com resposta completa (com recolha de dados sobre 33 081 pessoas; 28 783 com 16 e mais anos). A operação de recolha decorre normalmente no 2.º trimestre de cada ano. A.S.