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23.6.23

“Tenho a pior impressão do que está a ser feito pela direcção executiva do SNS, porque está a ser feito na sombra”

Ana Maia, Anabela Góis (Renascença) e Matilde Fieschi, in Público

O bastonário Carlos Cortes lamenta a ausência de comunicação sobre o que está a ser feito e afirma que sobrecarregar os médicos não vai resolver o problema das urgências.

O Verão ainda não tinha chegado e já os hospitais enfrentavam dificuldades nas urgências por causa da falta de médicos. Na área da obstetrícia, são várias as maternidades com urgências e blocos de partos encerrados; na pediatria o cenário não é muito diferente. “Não podemos sistematicamente achar que sobrecarregando os profissionais de saúde com urgências sucessivas vamos conseguir resolver o problema”, diz o bastonário da Ordem dos Médicos em entrevista ao PÚBLICO e à Rádio Renascença.

A Procuradoria-Geral da República pediu ao Tribunal Constitucional que considere inconstitucional o diploma que estabelece o pagamento das horas extraordinárias. Se acontecer, o ministro da Saúde acha que não vai haver profissionais suficientes para garantirem os serviços. Também está preocupado?

Não conheço o parecer que levou a procuradora-geral da República a fazer esse pedido. O que posso dizer é que neste momento os médicos têm uma sobrecarga, muitas vezes até desumana, para fazer urgências. Posso dar um exemplo que é inaceitável, em que temos médicos internos em formação, alguns deles a fazer estágios em Coimbra ou em Lisboa, que estão a ser pressionados para irem fazer uma urgência ao Hospital do Algarve. Temos de começar a ter muito bom senso sobre esta matéria. Temos de começar a organizar o trabalho em serviço de urgência e ter uma intervenção, porque é verdade que há um problema com a urgência no nosso país. É esse problema que temos de resolver e não podemos sistematicamente achar que sobrecarregando os profissionais de saúde com urgências sucessivas vamos conseguir resolver o problema. O que estamos a fazer, com essa pressão desmedida, é por vezes quase obrigar os médicos a sair do SNS, porque ninguém aguenta fazer várias noites de urgência seguidas.

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9.5.23

Ordem dos Médicos pede reunião urgente ao ministro da Saúde

Vera Lúcia Arreigoso, in Expresso



Organizações Médicas da Saúde Pública querem “esclarecimento dos problemas e necessidades dos médicos de saúde pública e dos serviços de saúde pública”. Em causa está o esvaziamento da Direção-Geral da Saúde noticiado na edição semanal do Expresso de sexta-feira passada

Lideradas pela Ordem dos Médicos, as organizações médicas da Saúde Pública pedem ao ministro da Saúde que as receba com “caráter de urgência”. Querem que Manuel Pizarro faça um “esclarecimento dos problemas e necessidades dos médicos de saúde pública e dos serviços de saúde pública nacionais”.

Numa missiva enviada esta terça-feira pelo gabinete do bastonário da Ordem dos Médicos, depois da notícia do Expresso da edição semanal da passada sexta-feira, é referido que “passado quase um ano desde o último Fórum Médico de Saúde Pública, onde foi feito o alerta para a necessidade urgente de concretização da reforma dos serviços de saúde pública e para o necessário investimento nas degradadas unidades de saúde pública, constata-se que a situação atual está pior do que a denunciada em maio de 2022”. E, critica, “em abril deste ano foi constituído mais um grupo de trabalho para debater a reforma dos serviços de saúde pública, no entanto, o Ministério da Saúde ainda não apresentou as conclusões dos três anos de trabalho do grupo anterior”.

Os especialistas afirmam ainda que “mais preocupante, é o facto de que o Ministério da Saúde ter decidido agora afastar do processo as organizações que representam os profissionais de saúde pública, tornando-o menos representativo e menos transparente”. Ou seja, “coloca em causa a apropriação e consequente implementação pelos profissionais e serviços de saúde pública das conclusões que a atual Comissão da Reforma da Saúde Pública venha a emitir”.

“O Fórum Médico de Saúde Pública constatou igualmente que a desvalorização do papel do médico de saúde pública, já denunciada em 2022, persiste.” E são dados exemplos: “Não existir uma solução definitiva, fora das unidades de saúde pública, para as Juntas Médicas de Avaliação de Incapacidade; não existir investimento e remuneração digna das funções de autoridade de saúde; não haver pagamento do trabalho extraordinário dos médicos de saúde pública e não haver uma nomeação atempada para os cargos de coordenação nacional, regional e local das equipas de saúde pública.”

Para os especialistas, “assiste-se ao desrespeito e desvalorização do papel do médico de saúde pública e da estrutura da Saúde Pública em Portugal, sendo a Direção-Geral da Saúde (DGS) o principal exemplo desta desvalorização”. “Após ter tido um papel fundamental na resposta à pandemia, é com apreensão que se verifica um esvaziamento progressivo das competências da Direção-Geral da Saúde. Oito meses após o final do estado de alerta, a DGS tem hoje menor capacidade de intervenção para a proteção e promoção da saúde do que em 2020. As suas competências têm vindo, desde janeiro de 2023, a ser sub-repticiamente transferidas para outros organismos do Ministério da Saúde, pondo em risco a continuidade do planeamento estratégico nacional para a saúde e colocando de parte décadas de experiência adquirida nesta área.”

Os médicos acusam mesmo o Governo de boicote. “Quando se esperava um reforço da capacidade e de recursos da DGS, assiste-se ao atraso aparentemente propositado da nomeação do novo Diretor-Geral da Saúde para que se possa continuar o desmantelamento da instituição.”

18.1.23

Governo quer criar equipas próprias dedicadas às Urgências

 Por Lusa, in TVI

O Governo vai criar equipas próprias dedicadas às urgências “pelo menos” nos hospitais de maior dimensão, disse hoje o ministro da Saúde, apontando esta como uma das “soluções” para colmatar as dificuldades estruturais nestes serviços.

Em declarações aos jornalistas, no Porto, e quando abordado sobre os problemas nas urgências dos hospitais, Manuel Pizarro avançou que está a ser criado um Modelo de Equipas Próprias dedicadas à Urgência “com condições técnicas e remuneratórias mais bem estruturadas”.

“A criação de equipas dedicadas na urgência, pelo menos nas urgências de maior dimensão, pode ser uma solução [para os problemas nestes serviços]. E, não havendo especialidade de Medicina de Urgência, podemos criar estas equipas com condições técnicas e remuneratórias mais bem estruturadas”, disse Manuel Pizarro.

O ministro da Saúde disse que “será criado um modelo que será adaptado conforme as necessidades e as possibilidades de cada local” e usou o exemplo do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), no Porto, para explicar a medida, mas salvaguardando que até neste hospital a equipa tem de ser “aditivada”.

“O Hospital de São João é um dos hospitais do país que tem uma equipa dedicada à urgência, mas essa equipa precisa de ser aditivada. Precisamos de melhorar as condições para que ela continue a funcionar”, disse o governante.

Manuel Pizarro recordou o chumbo, por parte da Ordem dos Médicos, à criação de uma nova especialidade de Medicina de Urgência, mas não teceu comentários sobre a pertinência ou não da criação desta nova especialidade, preferindo apontar quais as medidas a levar a cabo para melhorar os serviços de urgência dos hospitais portugueses.

Médicos no interior do país vão ter melhor salário, casa de graça e internato partilhado

Alexandra Campos, in Público

Doentes crónicos vão poder renovar receitas nas farmácias e estas passam a poder distribuir fármacos prescritos nos hospitais para algumas patologias.

O Ministério da Saúde vai avançar com várias medidas para fixar médicos especialistas no interior do país e outras zonas de baixa densidade demográfica. A partir do início de 2024, os jovens médicos que começam a sua formação na especialidade (internato) nestas zonas passarão uma parte desse período não só no hospital de destino mas também num hospital mais diferenciado, designadamente no litoral, anunciou esta segunda-feira o ministro Manuel Pizarro. Terão ainda salários majorados e casa gratuita, a disponibilizar pela autarquia e o hospital de destino, acrescentou o governante num encontro com jornalistas, no Porto.

Este programa de formação partilhada já está a ser preparado em conjunto com a Ordem dos Médicos (OM) e permitirá, por exemplo, que um médico comece o internato no hospital de Santo António, no Porto, e o prossiga no hospital de Bragança. O ministro está convencido de que esta medida "vai resolver o problema" da falta de especialistas "no médio prazo". "Uma parte destes médicos vai-se fixar, não tenho dúvida nenhuma", disse.

São sete os centros hospitalares abrangidos: as unidades locais de saúde do Nordeste (sede em Bragança), a da Guarda, a de Castelo Branco, a do Norte Alentejano (Portalegre), a do Litoral Alentejano (Santiago do Cacém), a do Baixo Alentejo (Beja) e o Centro Hospitalar da Cova da Beira (Covilhã).

Sublinhando que a falta de especialistas nas zonas de baixa densidade é "muito preocupante", Manuel Pizarro especificou que serão priorizadas as especialidades de medicina interna, cirurgia geral, ortopedia, anestesiologia, ginecologia/obstetrícia, pediatria, radiologia e, eventualmente, psiquiatria, pedopsiquiatria e psiquiatria da adolescência.

Estas são medidas para "produzir resultados numa década", assumiu, enfatizando que, "se não se fizer nada, estas especialidades vão desaparecer" nestas zonas.

Renovar receituário crónico nas farmácias

Manuel Pizarro adiantou ainda que o sistema de "dispensa de medicamentos em proximidade" nos hospitais e a renovação da prescrição de medicação de doentes crónicos, nas farmácias, está "em fase final de implementação".

As farmácias passam a poder distribuir os medicamentos prescritos nos hospitais (e que são só dispensados nestas unidades) para tratamento de algumas doenças e a fazer a renovação das receitas de doentes crónicos passadas pelos médicos de família e outros profissionais do Serviço Nacional de Saúde. Além de ajudar a "descongestionar os centros de saúde", a medida vai ter um "enorme impacto" para as pessoas, que deixam de ter ir ao médico de família ou ao hospital pedir uma nova receita dos medicamentos que tomam habitualmente.

Estudo sobre rede hospitalar

O ministro revelou ainda que vai encomendar a "uma instituição credível" um estudo sobre rede hospitalar que se pretende para 2030, o qual deverá está pronto ainda este ano e que permitirá "dar coerência" às decisões. "É absolutamente claro que precisamos de actualizar a rede hospitalar. Há muitas decisões que foram tomadas de forma casuística" e hospitais que estão subdimensionados para a população que servem, como o de Penafiel, o de Almada e o de Amadora-Sintra, disse.

Questionado sobre se o estudo poderá implicar fechos, o ministro assegurou que está mais concentrado "na requalificação e nas aberturas de novos espaços do que nos encerramentos". No entretanto, "vai avançar o hospital de Lisboa Oriental, está em construção o novo Hospital Central do Alentejo. Vai ainda avançar o novo hospital do Algarve e o novo hospital do Oeste".

16.5.16

Médicos obrigados a emigrar para se tornarem especialistas. Será que voltam?

Alexandra Campos, in Público on-line

Quase um terço dos médicos que saíram do país nos últimos quatro anos na região Norte foram especializar-se no estrangeiro.

Ainda se recorda da aula em que o professor Sobrinho Simões alertou os estudantes que enchiam a sala da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto para a necessidade de começarem a pensar no futuro, porque a era do emprego certo estava a chegar ao fim. Naquela altura, Filipa Rocha desvalorizou. Afinal, tinha optado pelo exigente curso de medicina porque, óptima aluna no secundário (média de 18,53 valores) e livre para escolher qualquer área, este acabava por ser o que oferecia mais saídas profissionais. “Também gostava muito de engenharia, de artes. Mas depois pensei: OK, posso sempre ser artista enquanto sou médica.”

Agora, aos 25 anos, na hora de tomar uma das decisões mais complicadas da sua vida — a área em que vai especializar-se —, a médica de Paços de Ferreira admite que o cenário é “um pouco aterrador”. Apesar da invejável pontuação de 70% obtida na prova nacional de seriação, Filipa foi forçada a desistir de cirurgia pediátrica — há apenas quatro vagas em todo o país — e pondera candidatar-se a cirurgia geral porque quer fazer o internato da especialidade em Portugal.

Com planos diferentes, José Quesado, 24 anos, foi planeando o futuro e já tem tudo programado: para o ano vai para a Bélgica fazer o internato de anestesiologia, uma das especialidades mais cobiçadas e inacessíveis em Portugal. No final do secundário, José também podia ter escolhido a área que muito bem entendesse, engenharia aerospacial, astronomia, física, matemática. Mas medicina prevaleceu. “É um curso abrangente e com boas perspectivas profissionais”, explica o jovem de Barcelos, que se preparou para a temida prova de seriação durante uns escassos quatro meses, ao contrário dos colegas que, ao longo de um duro e longo ano, queimaram as pestanas a decorar cinco capítulos do Harrison (da obra Harrison´s Principles of Internal Medicine).

O Harrison é o obsoleto teste de 100 perguntas de escolha múltipla que serve para ordenar o cada vez maior número de candidatos a vagas de especialidade nos hospitais e nos centros de saúde portugueses. Com a perspectiva da Bélgica sempre em mente — só para se especializar, porque está nos seus planos regressar a Portugal —, José preferiu investir num curso de francês.

José Quesado, 24 anos, foi planeando o futuro e já tem tudo programado: para o ano vai para a Bélgica fazer o internato de anestesiologia, uma das especialidades mais cobiçadas e inacessíveis em Portugal. A escolha deste jovem de Barcelos está longe de ser pouco comum: há cada vez mais jovens médicos portugueses que saem do país para se especializarem no estrangeiro

A escolha de José Quesado está longe de ser pouco comum. Há cada vez mais jovens médicos portugueses que saem do país para se especializarem no estrangeiro. As contas feitas pela Ordem dos Médicos (OM) do Norte, que escalpelizou os motivos de emigração, indicam que quase um terço dos que abalaram nos últimos quatro anos (113 em 351) estão a especializar-se em vários países, sobretudo europeus. No final, ninguém sabe se voltarão ou não a Portugal.
"Hoje pensaria duas vezes"

De ano para ano, para os jovens médicos que terminam o internato de ano comum (o primeiro ano de formação pós-graduada em que fazem de tudo um pouco nas unidades de saúde) torna-se cada vez mais difícil aceder a uma vaga para a sua especialidade de eleição ou mesmo a uma vaga, seja qual for. No ano passado, pela primeira vez, 114 médicos não conseguiram ter lugar num hospital ou centro de saúde para começarem a formação numa especialidade.

Este ano as previsões são mais negras: mais de cinco centenas arriscam-se a ficar sem vaga, porque há 2162 candidatos e as capacidades formativas indicadas pela OM em hospitais e centros de saúde ficam-se por 1651. Centenas de jovens arriscam-se, assim, a permanecer com o estatuto de médicos indiferenciados. Podem perder um ano e voltar a fazer o exame, mas para muitos a alternativa é emigrarem.

“Depois de entrarem em medicina com uma nota altíssima, de fazerem o curso e de o acabarem com boas notas, ficarem sem especialidade é dramático. Hoje é preciso ser-se especialista para praticar uma medicina de qualidade”
Miguel Guimarães, presidente da secção regional do Norte da Ordem dos Médicos

“É a nova forma de emigração. Depois da emigração dos médicos especialistas, agora são os jovens diplomados que estão a sair”, descreve o presidente da secção do Centro da OM, Carlos Cortes. O problema, frisam os responsáveis da OM, é que ir para o estrangeiro deixa de ser uma opção pessoal para ser uma necessidade.

“Depois de entrarem em medicina com uma nota altíssima, de fazerem o curso e de o acabarem com boas notas, ficarem sem especialidade é dramático. Hoje é preciso ser-se especialista para praticar uma medicina de qualidade”, lamenta Miguel Guimarães, que preside à Ordem dos Médicos/Norte. Acreditando que o número de excluídos acabe por ser inferior, porque muitos candidatos desistem e repetem o exame, Miguel Guimarães defende que “o Governo tem a obrigação de dar uma resposta, porque é quem decide as vagas nas faculdades de medicina”.

Com o crescimento exponencial dos candidatos ao longo dos anos — aos médicos que saem em cada ano das faculdades há ainda que somar entre 200 a 300 portugueses formados em universidades no estrangeiro, como Espanha e a República Checa, que regressam para se habilitar, lado a lado com os outros, a uma vaga na especialidade em Portugal —, a entrada na formação pós-graduada vai-se afunilando.

“Se tivesse 18 anos agora, pensaria duas vezes antes de escolher medicina. Há outras profissões bem remuneradas e reconhecidas”, reflecte Edson Oliveira, presidente do Conselho Nacional do Médico Interno, que está a fazer o internato de neurocirurgia num grande hospital de Lisboa e garante que já começa a haver especialistas em excesso nalgumas áreas até há pouco tempo deficitárias, como pediatria e mesmo neurocirurgia.

Se nada for feito, o crescimento dos médicos sem especialidade vai ser exponencial, avisa. Ao aumento do numerus clausus somam-se outros factores que vieram agravar esta contabilidade. Desde 2007, as faculdades começaram a disponibilizar uma percentagem do total de vagas a licenciados em outras áreas (a percentagem passou de 5% nessa altura para 15% em 2011/2012). Isto, somado a mais um contingente especial — que inclui portadores de deficiência, militares, filhos de diplomatas, atletas de alta competição, entre outros —, faz com que o número final dispare.

“Os médicos precisam de formação complementar. É grave que o Estado deixe que estes médicos cheguem ao fim do curso e não sirvam para nada”, considera Alberto Amaral, presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior. Alberto Amaral defende, em simultâneo, a revisão das idoneidades formativas concedidas pela OM. “É preciso criar outras carreiras, de investigação, nos laboratórios”, propõe. Tudo para evitar que se crie uma geração de médicos indiferenciados em Portugal.