16.12.09

Apelos a um acordo no meio da confusão

Eduarda Ferreira*, *com Agências, in Jornal de Notícias

Conversações de alto nível tentam conciliar interesses e salvar cimeira


A cimeira esteve até ontem, terça-feira, num impasse. Colocou-se a hipótese de chefes de Estado não figurarem na foto de família do final. Há os empurrões de bastidores e a Casa Branca defende compromissos.

"É o que acontece com as crianças de escola: se têm um prazo alargado para entregar um exercício só o fazem no último minuto". Desta forma, a presidente dinamarquesa da conferência sobre o clima resumiu as dificuldades de entendimento e a falta de propostas conciliatórias dos interesses dos 193 países.

Os impasses nas conversações marcaram os dois primeiros dias desta semana. A expectativa de um ponto de ordem estava ontem colocada no começo das conversações de alto nível. Alguns líderes começaram a afluir a Copenhaga antecipadamente (caso de Lula da Silva, depois de Gordon Brown, logo seguidos pelo australiano Kevin Rudd) e sucedem-se as conversações bi e multilaterais por telefone e videoconferência.

A inquietação quanto aos resultados da cimeira foi expressa também pelo presidente da Comissão Europeia, que considerou "impensável" um cenário inconclusivo. A chanceler alemã Merkel já se confessava "nervosa" sobre a falta de andamento das negociações e o russo Medvedev duvidava que Copenhaga desemboque num acordo vinculativo. Mas a Casa Branca pronunciava-se ontem a favor de um acordo vinculativo.

Na sessão inaugural da conferência a alto nível, o secretário-geral da ONU dramatizou a situação, lembrando que "três anos de esforços devem culminar em acção nestes três dias". Os esforços diplomáticos multiplicam-se. O presidente francês desdobra-se em conversações com os países africanos e com o Brasil, tendo Sarkozy garantido que os estados europeus se encontravam "na mesma linha" que os seus interlocutores do Sul. Idênticas conversações têm sido mantidas com o Brasil, mas este tem vindo a concertar as suas exigências com outro grupo, formado também pela Índia, China e África do Sul. Entretanto, continua o pingue-pongue de acusações entre a China e os EUA. Ban Ki-Moon já ontem se referiu a esta tensão, ao afirmar que os países devem "deixar de apontar o dedo" uns aos outros.

Ontem, depois de dois infrutíferos dias de trabalhos, marcados por suspensões e abandono de delegações, os negociadores mantinham como ponto de partida o "esqueleto" de uma proposta deixada sobre a mesa na sexta-feira passada. O documento assumia-se como proposta de arranque, mas não continha nem metas de emissões de CO2 nem um ano definido para que as emissões atinjam um pico e a partir daí comecem mesmo a descer. Os compromissos financeiros dos países ricos para com as economias pobres também não constavam. Ou seja, estava tudo em aberto.

Aquilo que é entretanto pedido aos 193 participantes ou aos blocos que os representam é que "preencham" o formulário das suas ofertas e exigências. E é neste ponto que a madrugada de hoje pode ter avançado para uma base mais consistente.

Ainda que alguns chefes de Estado já se tenham adiantado para Copenhaga, pesava ontem a hipótese de outros desistirem para não entrar no retrato de família de um fracasso. Obama poderia ser um deles.