22.2.10

Governo quer reforma de centros de saúde até 2012 para mais de três milhões de pessoas

Por Catarina Gomes, in Jornal Público

Actualmente, é possível que, no mesmo centro de saúde, haja utentes que apenas podem ser atendidos pelo seu médico de família até às 20h00 e, nas mesmas instalações, exista uma Unidade de Saúde Familiar aberta até às 23h00.

A situação já foi referida várias vezes: os centros de saúde têm neste momento dois modos de funcionamento, o que criou "desigualdades" na prestação de cuidados, dependendo do local onde o utente é atendido, reconhece o director da Missão para os Cuidados de Saúde Primários, Luís Pisco. Até ao final de 2012, o Governo conta que a reforma dos centros de saúde esteja terminada e o acesso seja mais igualitário, mesmo que a homogeneização tenha que ser imposta.

A reforma dos centros de saúde arrancou em 2006, com o ministro Correia de Campos, assentando sobretudo na criação de uma nova forma de organização interna nos centros de saúde - as chamadas Unidades de Saúde Familiar (USF). Neste modelo, um pequeno grupo de médicos, enfermeiros e administrativos podia, voluntariamente, auto-organizar-se propondo-se prestar cuidados até um máximo de 18 mil utentes.

Condições? Cada médico de família teria que alargar a sua lista de 1550 utentes para 1750, de modo a dar resposta a pessoas até aí sem clínico; os médicos comprometiam-se a substituir-se uns aos outros em caso de falta de um deles; a equipa assumia a prestação de um número definido de actos à sua população (desde citologias a vigilância de doentes diabéticos) e a ter horários adaptados ao seu meio envolvente, o que permitia a abertura até mais tarde durante a semana e, em alguns casos, ao fim-de-semana. Por seu lado, os profissionais envolvidos neste modelo recebem reforços de remuneração, o que significa que, também em termos salariais, se criaram dois sistemas.

Até ao momento estão a funcionar 232 Unidades de Saúde Familiar, que abrangem cerca de 30 por cento da população (2,9 milhões). Mas a meta traçada já pela actual ministra da Saúde, Ana Jorge, era ter 250 USF no terreno até final de 2009. "Não temos tido capacidade para colocar no terreno todas as candidaturas", admite o director da Missão, Luís Pisco.

Em resultado da reforma, 350 mil utentes ganharam médico de família, referem números oficiais. Mas continua a desconhecer-se exactamente quantos portugueses ainda não têm clínico assistente: uma das últimas estimativas do Ministério da Saúde, do ano passado, apontava para entre 450 mil a 500 mil pessoas.

Em resultado das transferências de médicos de centros de saúde convencionais para USF, quantos utentes ficaram sem médico assistente? Luís Pisco admite que isso possa ter acontecido muito pontualmente, uma vez que muitas das USF ficaram precisamente à espera de abrir para assegurar que o médico transferido fosse substituído. Dos 1.642 médicos que fazem parte de USF, cerca de 80 por cento já estavam no centro de saúde onde continuaram a exercer funções, sublinha. E apenas 20 por cento resultaram de transferências. Estão também abrangidos 1.666 enfermeiros e 1.309 administrativos.

Há 400 candidaturas a USF e 301 aceites para avaliação. Mas, sendo um modelo voluntário, chegará uma altura que deixará de haver candidatos, admite Luís Pisco. "Se os profissionais não se querem organizar, os serviços são obrigados a fazê-lo".

Por essa razão o Governo criou uma espécie de plano B: as chamadas Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados, que pretendem que o sistema "fique mais parecido com as USF e o utente não note diferenças". Ou seja, esgotado o voluntarismo de médicos que se oferecem para alargar a sua lista de utentes, o Governo vai tentar aproximar deste modelo os profissionais que ficaram de fora da reforma.