Por José Manuel Rocha, in Jornal Público
O Fundo Monetário Internacional reviu ontem em alta as projecções para este ano, mas está mais pessimista para 2011
Há boas notícias e más notícias nas projecções intercalares do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a economia mundial. Este ano, a criação de riqueza vai ficar um pouco acima do que fora previsto em Abril passado; em 2011, a tendência será contrária. Razão: a crise dos défices e da dívida soberana que afecta muitos países da zona euro.
O ano em curso não será pior, avisa o organismo, porque o primeiro semestre evidenciou alguma força na retoma, com o produto interno bruto a crescer, em termos mundiais, cerca de três por cento. O mesmo não se passará na segunda metade do ano, com o FMI a prever um crescimento global de apenas 2 por cento. A austeridade começa a produzir efeitos.
"Prevemos que a recuperação económica irá continuar, mas os risco de inversão de tendência estão a crescer rapidamente", defendeu ontem, na apresentação das projecções, o economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard. Quais são esses riscos? Essencialmente, as políticas de austeridade lançada por muito países-membros da zona euro, que terão necessariamente reflexos no consumo interno e, por consequência, uma redução das encomendas às empresas nacionais e estrangeiras que abastecem os respectivos mercados.
O Banco Central Europeu alinha pelo mesmo diapasão. Ontem, na conferência de imprensa a seguir à reunião do conselho de governadores, o líder do BCE, Jean-Claude Trichet, afirmou que prevê para este ano um crescimento moderado e desigual entre os diversos países que integram o clube da moeda única. Pelo 14º mês consecutivo, o banco central manteve a sua principal taxa directora (refi) em um por cento. As outras duas também não registaram mudanças (1,75 por cento para a taxa marginal de crédito e 0,25 por cento para a taxa de depósitos).
Europa a ritmo lento
Do lado do FMI, a projecção de crescimento do PIB mundial para este ano é, agora, de 4,6 por cento - 0,4 por cento acima da previsão avançada no outlook publicado em Abril passado. Para 2011, mantêm-se os 4,3 por cento da anterior previsão.
Este crescimento vai ser essencialmente puxado pelos países emergentes e em desenvolvimento, com variações do produto à volta dos 6,5 por cento. O contributo fundamental para este desempenho virá da Ásia (China, em primeiro lugar, e Índia depois), com o Brasil a dar uma mãozinha. Os Estados Unidos ficam no meio da tabela e a zona euro, bem destacada, no fundo do ranking, com tímidos crescimentos de 1 e 1,3 por cento, em 2010 e 2011, respectivamente.
O FMI atribuiu esta dificuldade da eurolândia em acentuar uma retoma sustentável à crise da dívida soberana e dos défices públicos que atinge vários países da moeda única. As medidas de controlo orçamental que estão a ser postas em prática conduzem, necessariamente, a um corte acentuado do rendimento disponível dos cidadãos, o que acabará por repercutir-se no consumo interno, na produção e nas importações.
O fundo defende que na eurolândia deve manter-se um esforço para garantir a sustentabilidade do sistema financeiro e alinha com as teses da cimeira do G20 no sentido de que as políticas públicas devem ter como prioridade o equilíbrio das finanças públicas e não o crescimento.
"Continuamos com muitas precauções em relação ao ritmo da retoma. Vai depender de como a Europa irá lidar com os problemas financeiros e orçamentais, como será feita a reforma do sistema financeiro e de como os países emergentes irão conduzir a sua política", defendeu Blanchard.