Por João Manuel Rocha, in Jornal Público
Depois do discurso de Merkel sobre fracasso do multiculturalismo, executivo avança com reconhecimento de diplomas de estrangeiros para responder às necessidades da economia
A Alemanha vai reconhecer os diplomas de 300 mil imigrantes qualificados e adoptar novas regras sobre a permanência de estrangeiros, que podem passar pela obrigação de frequentar cursos de integração. As medidas foram ontem anunciadas pelo Governo, depois de, no fim-de-semana, a chanceler Angela Merkel ter afirmado que o multiculturalismo "falhou redondamente".
Perante jovens democratas-cristãos, a chefe do Governo defendeu no sábado que os imigrantes têm de "fazer mais" pela sua própria integração e lembrou que "aqueles que não são capazes de aceitar" que os alemães se sentem "ligados "aos valores cristãos" também "não têm lugar aqui".
O site da revista Der Spiegel fazia ontem eco das opiniões de críticos que viram no tom duro de Merkel uma tentativa para inverter a tendência de perda de popularidade e ir ao encontro de preocupações com a imigração expressas em diversos estudos de opinião. Numa análise ao discurso, assinalava também que, fiel ao seu estilo, a chanceler teve o cuidado de não alienar os elementos mais liberais do seu partido ao expressar apoio a um recente discurso do Presidente alemão, Christian Wulff, que salientou que o islão é "uma parte da Alemanha".
Com as medidas, o Governo procura apaziguar os que, no campo conservador, criticam a suposta fraca integração dos imigrantes, sobretudo dos muçulmanos, mas também ir ao encontro das inquietações dos meios económicos - preocupados com a falta de mão-de-obra qualificada que ameaça a retoma da Alemanha, onde vivem 15 milhões de estrangeiros, 18,4 por cento da população.
O plano de reconhecimento de qualificações de estrangeiros foi anunciada ao jornal Financial Times Deutschland pela ministra da Educação, Annette Schavan, segundo a qual a avaliação das competências não será automática e deve ser feita segundo critérios alemães.
O diário bávaro Süddeutsche Zeitung, que teve acesso ao projecto de lei, escreveu que os candidatos ao reconhecimento de habilitações serão submetidos a testes práticos e teóricos ou a entrevistas. A ministra disse que todos terão oportunidade de ver as suas competência avaliadas, mas o jornal refere que campos como a engenharia e a educação são competência dos estados regionais e não do governo federal.
Dados da Câmara de Comércio e Indústria alemã divulgados pela Reuters indicam que a economia do país carece de cerca de 400 mil trabalhadores qualificados. O instituto de pesquisa económica IW calculou que, no ano passado, a falta de mão-de-obra qualificada custou 15 mil milhões de euros à economia alemã e que, se nada for feito, em 2020 faltarão 250 mil trabalhadores qualificados nas áreas técnicas. Dados referidos pela AFP indicam que, no ano passado, a Alemanha, que já está a pagar o preço do envelhecimento da população e da fraca natalidade, teve um saldo migratório negativo de 13 mil pessoas.


