Samuel Silva, in Público on-line
Projecto de flexibilidade curricular estreia-se com um mosaico de escolhas por parte das direcções escolares. O PÚBLICO falou com responsáveis de 31 das 235 escolas e agrupamentos envolvidas no projecto. Apostam na aplicação das mudanças às turmas de início de ciclo (1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos).
O novo ano lectivo começa oficialmente na próxima sexta-feira e há, desde já, uma certeza: as escolas vão ser mais diferentes umas das outras. Os projectos de flexibilidade curricular, introduzidos pelo Ministério da Educação como uma experiência pedagógica, entram em funcionamento. E vão ser usados de forma muito diversa pelos professores. Ainda que a generalidade das direcções escolares que entram na experiência tenha optado por aplicar a mudança a todos os alunos de início de ciclo, há casos em que serão constituídas “turmas de teste” para esta estratégia e há até quem vá ter disciplinas semestrais, à semelhança do que acontece no ensino superior.
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A flexibilidade curricular permite, entre outras medidas, que as escolas façam a sua própria gestão de até 25% da carga horária lectiva. Ao longo da última semana, o PÚBLICO falou com responsáveis de 31 das 235 escolas e agrupamentos envolvidos no projecto. Na generalidade dos casos (74% das escolas contactadas), os directores apostaram em aplicar as mudanças a todas as turmas de início de ciclo (1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos), que são aqueles em que legalmente é possível usar os mecanismos de flexibilização. Nos restantes casos (8 escolas) é feito algum tipo de selecção, limitando o número de turmas e alunos envolvidos.
Acesso ao superior implica cuidados extra no ensino secundário
Mas mesmo nos estabelecimentos de ensino que optaram por aplicar este projecto a todos os estudantes, a forma como o mesmo será efectivado é muito variável. O retrato que é possível traçar é, por isso, bastante diversificado.
Várias escolas assumem a dimensão de experiência da novidade introduzida este ano. É o caso do Agrupamento de Pedome, em Vila Nova de Famalicão, que optou por aplicar a medida a duas das suas cinco turmas do 5.º ano. A flexibilidade curricular vai ser testada numa turma com “condições para poder ter bons resultados e sucesso educativo de qualidade”. A outra turma “poderá não vir a apresentar um desempenho escolar e um sucesso de tanta qualidade”, assume o director Fernando Manuel Lopes. A intenção da escola é que, com “dados de partida diferenciados”, possa documentar o impacto do projecto nas aprendizagens.
A experiência da Escola Secundária Alberto Sampaio, em Braga, passa por reforçar o número de horas destinadas ao director de turma em apenas uma turma do 7.º ano. A intenção é semelhante: “Vamos querer ver a diferença que essa alteração possa provocar”, explica o director, João Andrade.
Várias escolas assumem a dimensão de experiência da novidade introduzida este ano. É o caso do agrupamento de Pedome, em Vila Nova de Famalicão, que optou por aplicar a medida a duas das suas cinco turmas do 5.º ano
Convencer os professores
A escolha do Agrupamento de Escolas D. Dinis, em Leiria, teve outra motivação: os resultados dos alunos. A direcção optou por deixar de fora da flexibilidade curricular todos os alunos do 5.º e 7.º anos e também a generalidade dos do 1.º ciclo. Com uma única excepção: a escola EB1 do Arrabalde.
Esta é uma escola pequena — tem 60 alunos e apenas três turmas, já que funciona uma turma mista de 2.º e 4.º anos — que nos últimos anos tem tido maus resultados escolares. A direcção do agrupamento viu na flexibilidade curricular uma possibilidade para inverter essa tendência: “O objectivo desde modelo é ser promotor do sucesso escolar e é nesse sentido que vamos avançar com ele”, explica a directora, Madalena Costa.
Há, porém, outros motivos práticos e não pedagógicos a condicionar as opções das escolas contactadas. Por exemplo, o Agrupamento de Escolas da Senhora da Hora, em Matosinhos, aplicará o projecto em apenas duas de seis turmas do 7.º ano, dada a falta de disponibilidade demonstrada pela maioria dos professores para trabalharem no novo modelo.
O caso mais extremo será, porém, o do Agrupamento de Escolas Grão Vasco, em Viseu. A directora, Inês Campos, é uma entusiasta da flexibilidade curricular — “é um projecto muito válido e estou certa que trará resultados muito positivos” —, mas não encontrou a mesma abertura nos professores do estabelecimento de ensino. Por isso, apesar de estar na lista inicial do Ministério da Educação, não vai integrar esta experiência pedagógica no novo ano lectivo.
No Agrupamento de Escolas Grão Vasco, em Viseu, a directora, Inês Campos, é uma entusiasta da flexibilidade curricular, mas não encontrou a mesma abertura nos professores
A flexibilidade curricular vai ser testada em cerca de 20% dos estabelecimentos de ensino. Há escolas que estão ainda a fechar o processo de constituição de turmas e de definição dos moldes de funcionamento dos projectos, pelo que o número total de turmas envolvidas neste primeiro ano lectivo de experiência pedagógica ainda não está fechado. Ao que o PÚBLICO apurou esse número deverá rondar as 2000 turmas.
A aposta dos privados
Das 235 escolas envolvidas, 170 são públicas, às quais se juntam quatro das sete escolas portuguesas no estrangeiro. Outras 61 do ensino privado vão também fazer parte da experiência, o que levou a Associação dos Estabelecimentos do Ensino Particular e Cooperativo (Aeep) a criar um grupo de trabalho para que os seus associados possam “partilhar ideias uns com os outros”, explica o director-geral da associação dos colégios, Rodrigo Queiroz e Melo.
Um desses casos é o do Grupo Ensinus que tem sete instituições diferentes envolvidas no projecto de flexibilidade curricular, entre os quais o Real Colégio de Portugal, o Colégio de Alfragide e o Externato Álvares Cabral. Aí serão criadas novas disciplinas como o Laboratório de Empreendedorismo e Educação Financeira ou Técnicas Laboratoriais de Física e Química e, na Matemática, passará a ser aplicado o método usado em Singapura — que tem por base a compreensão dos conceitos antes de se ensinar procedimentos, utilizando uma abordagem visual e prática.
O Grupo Ensinus tem sete instituições diferentes envolvidas no projecto de flexibilidade curricular. Serão criadas novas disciplinas como o Laboratório de Empreendedorismo
A “grande alteração” que a experiência pedagógica implicará, porém, tem a ver com o professor, considera Teresa Damásio, administradora do Ensinus. “Vai ter obrigatoriamente de alterar a sua metodologia de ensino e permitir maior interdisciplinaridade”, defende.
Para preparar os docentes para essa alteração, o grupo contratou o especialista em mudanças educativas, Javier Aragay, para uma assessoria de três anos, em que dará tutorias mensais aos professores das várias áreas.
Outra das mudanças que vão ser aplicadas nos colégios do Grupo Ensinus é a passagem de algumas disciplinas para um regime semestral. Por exemplo, no 7.º ano os alunos passarão a ter quatro tempos semanais de Geografia na primeira metade do ano lectivo. Esses blocos nos horários são substituídos, no segundo semestre, por aulas de História.
A opção do Ensinus cruza-se com uma discussão que começa a ganhar força no sector: a possibilidade de o ano lectivo passar a ser organizado em dois semestres em lugar dos actuais três períodos. O Agrupamento de Escolas de Freixo, em Ponte de Lima, apresentou o seu próprio calendário escolar para 2017/18, dividido em dois semestres. O primeiro semestre começa a 13 de Setembro — como a generalidade das escolas, ainda que formalmente o ano lectivo comece na próxima sexta-feira, dia 8 — e prolonga-se até 2 de Fevereiro. O segundo estende-se entre 14 de Fevereiro e 19 de Junho. Os alunos mantêm dez dias de férias na altura do Natal e uma semana no Carnaval e Páscoa.
Esta possibilidade não foi aberta pelo projecto de flexibilidade curricular, mas pelo facto de a escola integrar os Projectos-Piloto de Inovação Pedagógica, destinado a um grupo mais restrito de estabelecimentos de ensino, e que reforça a sua autonomia caso adoptem projectos educativos diferenciadores.
Na escola Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, haverá algumas disciplinas semestrais
O presidente Associação Nacional de Directores de Agrupamentos de Escolas Públicas, Filinto Lima, tem sido um dos defensores desta solução. De resto, pretendia fazer o mesmo na escola que dirige, a Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, mas a possibilidade foi negada pelo Governo. Ainda assim, dentro das possibilidades que a flexibilidade curricular prevê, na sua escola haverá também algumas disciplinas semestrais.
A mudança para um calendário lectivo semestral teria “vantagens evidentes”, defende Filinto Lima. Por um lado, tornaria os dois períodos lectivo equivalentes, acabando com um velho problema de um 3.º período muitas vezes excessivamente curto. Por outro, promoverá o sucesso e terá efeitos positivos na disciplina, acredita: “Hoje em dia, há muitos alunos que chegam ao 3.º período com o destino traçado. Como o tempo é curto sabem que já dificilmente passam ou dificilmente chumbam.”
Como se constrói em contra-relógio uma “experiência pedagógica”?
Síntese do que muda com a nova experiência:
— As escolas podem usar até 25% da carga lectiva para aplicar novos métodos de ensino.
— Podem juntar blocos de tempos para dedicar a projectos específicos (por isso, a percentagem da carga lectiva deve ser calculada anualmente).
— Podem criar novas disciplinas (oferta lectiva complementar, um tempo por semana).
— É também aberta a possibilidade de:
a) Combinação parcial ou total de disciplinas;
b) Alternância, ao longo do ano, de períodos de funcionamento disciplinar com períodos de funcionamento multidisciplinar, em trabalho colaborativo;
c) Desenvolvimento de trabalho prático ou experimental com recurso a desdobramento de turmas;
d) Redistribuição da carga horária das disciplinas, promovendo tempos de trabalho de projecto interdisciplinar, com partilha de horário entre diferentes disciplinas;
e) Organização do funcionamento das disciplinas de um modo trimestral ou semestral;
— No 2.º e 3.º ciclo, devem privilegiar abordagens interdisciplinares.
— No secundário (cursos científico-humanísticos) podem permutar uma das disciplinas bienais e ou uma das anuais da formação específica por disciplinas de um curso diferente do frequentado pelo aluno.
— São introduzidas duas novas áreas: Cidadania e Desenvolvimento; Tecnologias de Informação e Comunicação.
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14.12.15
Estado paga ao privado para ter alunos do público
Alexandra Figueira e Ana Gaspar, in Jornal de Notícias
Em setembro, 44 crianças beneficiárias de rendimento social de inserção (RSI) foram transferidas do Agrupamento de Escolas do Cerco, no Porto, para dois colégios privados.
A mudança, paga por fundos do Estado, transtornou a organização das escolas, que já tinham as turmas formadas. Transferências semelhantes, promovidas pela Qualificar para Incluir (QPI), uma instituição particular de solidariedade social que fiscaliza a atribuição do RSI, tinham já acontecido no ano anterior. O caso é inédito, dizem Filinto Lima, presidente da Associação de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, e Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof.
Em setembro, 44 crianças beneficiárias de rendimento social de inserção (RSI) foram transferidas do Agrupamento de Escolas do Cerco, no Porto, para dois colégios privados.
A mudança, paga por fundos do Estado, transtornou a organização das escolas, que já tinham as turmas formadas. Transferências semelhantes, promovidas pela Qualificar para Incluir (QPI), uma instituição particular de solidariedade social que fiscaliza a atribuição do RSI, tinham já acontecido no ano anterior. O caso é inédito, dizem Filinto Lima, presidente da Associação de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, e Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof.
9.4.15
Escolas sem dinheiro para visitas de estudo
in Jornal de Notícias
O fim do financiamento das visitas de estudo vai impedir muitos alunos de participar nestas atividades, alertou esta quarta-feira a Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas.
No início do ano letivo, o Ministério da Educação deixou de comparticipar diretamente as visitas de estudos dos alunos abrangidos pela Ação Social Escolar e transferiu essa responsabilidade para os orçamentos próprios das escolas (receitas do bar e papelaria).
No entanto, muitos estabelecimentos não têm dinheiro suficiente para as visitas porque "já usam essas verbas para suportar a alimentação de alguns alunos", sublinha o vice-presidente da ANDAEP, Filinto Lima.
Resultado: algumas escolas devem optar por suspender as visitas enquanto outras estão a pedir aos alunos que paguem os passeios, contou à Lusa Rui Martins, da federação de pais do distrito de Viseu (FrapViseu), que teme que a maioria dos estudantes fique impedida de participar.
"Os orçamentos das escolas já são muito reduzidos, o número de alunos carenciados é cada vez maior e por isso as escolas não conseguem suportar mais este encargo. Mais de metade dos alunos não vão poder participar nas visitas de estudo", contou Rui Martins.
Rui Martins critica a decisão do MEC e dá o seu exemplo pessoal: "Neste momento a minha mulher está desempregada e eu não posso mandar a minha filha para a visita de estudo, porque estamos a falar de atividades que podem custar entre 15 a 20 euros".
Filinto Lima diz que "esta não foi uma novidade agradável para as escolas" que agora terão de optar entre "desistir das visitas ou pedir aos alunos que podem para contribuir com mais dois ou três euros de forma a irem todos. Não poderá é haver visitas em que não vão todos".
O problema começou agora a ser mais falado porque é nesta altura do ano que se realiza a maioria das visitas, que "não são passeios, são verdadeiras aulas", lembrou Filinto Lima, sublinhando que "os professores aproveitam estas visitas para consolidar a matéria dada na aula".
Além disso, muitos diretores optam por marcar as visitas de estudo para os dias em que se realizam exames nacionais, como forma de garantir as condições necessárias para os restantes alunos prestarem provas.
Filinto Lima critica o Governo dizendo que "deveria ver a Educação como um investimento e não como uma despesa. Cortar na Educação é um mau princípio".
Os pais exigem que o diploma que definiu esta mudança, que consideram "imoral e injusto" e "que viola a equidade e a igualdade de oportunidades", seja corrigido ou anulado, permitindo aos alunos mais carenciados oportunidades de aprendizagem que de outro modo não terão".
A Lusa contactou o MEC ao início da tarde, mas até ao momento não obteve qualquer comentário.
O fim do financiamento das visitas de estudo vai impedir muitos alunos de participar nestas atividades, alertou esta quarta-feira a Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas.
No início do ano letivo, o Ministério da Educação deixou de comparticipar diretamente as visitas de estudos dos alunos abrangidos pela Ação Social Escolar e transferiu essa responsabilidade para os orçamentos próprios das escolas (receitas do bar e papelaria).
No entanto, muitos estabelecimentos não têm dinheiro suficiente para as visitas porque "já usam essas verbas para suportar a alimentação de alguns alunos", sublinha o vice-presidente da ANDAEP, Filinto Lima.
Resultado: algumas escolas devem optar por suspender as visitas enquanto outras estão a pedir aos alunos que paguem os passeios, contou à Lusa Rui Martins, da federação de pais do distrito de Viseu (FrapViseu), que teme que a maioria dos estudantes fique impedida de participar.
"Os orçamentos das escolas já são muito reduzidos, o número de alunos carenciados é cada vez maior e por isso as escolas não conseguem suportar mais este encargo. Mais de metade dos alunos não vão poder participar nas visitas de estudo", contou Rui Martins.
Rui Martins critica a decisão do MEC e dá o seu exemplo pessoal: "Neste momento a minha mulher está desempregada e eu não posso mandar a minha filha para a visita de estudo, porque estamos a falar de atividades que podem custar entre 15 a 20 euros".
Filinto Lima diz que "esta não foi uma novidade agradável para as escolas" que agora terão de optar entre "desistir das visitas ou pedir aos alunos que podem para contribuir com mais dois ou três euros de forma a irem todos. Não poderá é haver visitas em que não vão todos".
O problema começou agora a ser mais falado porque é nesta altura do ano que se realiza a maioria das visitas, que "não são passeios, são verdadeiras aulas", lembrou Filinto Lima, sublinhando que "os professores aproveitam estas visitas para consolidar a matéria dada na aula".
Além disso, muitos diretores optam por marcar as visitas de estudo para os dias em que se realizam exames nacionais, como forma de garantir as condições necessárias para os restantes alunos prestarem provas.
Filinto Lima critica o Governo dizendo que "deveria ver a Educação como um investimento e não como uma despesa. Cortar na Educação é um mau princípio".
Os pais exigem que o diploma que definiu esta mudança, que consideram "imoral e injusto" e "que viola a equidade e a igualdade de oportunidades", seja corrigido ou anulado, permitindo aos alunos mais carenciados oportunidades de aprendizagem que de outro modo não terão".
A Lusa contactou o MEC ao início da tarde, mas até ao momento não obteve qualquer comentário.
20.11.13
Ensino público. Autonomia das escolas acaba onde começam as regras de Crato
Por Kátia Catulo, in iOnline
Limites da lei e das finanças desiludem os directores das escolas que assinaram os contratos com o Ministério da Educação
Até ao fim do ano haverá 209 escolas ou agrupamentos da rede pública com novo estatuto. As direcções escolares comprometem-se a atingir metas para melhorar os resultados dos alunos e, como contrapartida, ganham liberdade para decidir sem pedir licença a ninguém. Este é o acordo com o Ministério da Educação. O que vai ser diferente com as escolas que assinaram agora o contrato de autonomia e o que mudou nas primeiras que assumiram esse compromisso em 2007 foi a pergunta que o i fez a cinco directores. "Quase nada", responde Nuno Mantas, das escolas da Boa Água, em Sesimbra, com contrato assinado em Outubro. "Tem sido uma desilusão", acrescenta José Alberto Ramos, director da Secundária João Gonçalves Zarco, em Matosinhos, que há seis anos tem o acordo com a tutela.
O que falta então às escolas para gozar de plena autonomia? "Sempre que quisemos fazer diferente, acabámos por esbarrar na legislação ou nas limitações financeiras", explica José Henrique Lima, da Secundária Eça de Queirós. Ter currículos alternativos ou mais recursos seriam as novas regalias destes estabelecimentos de ensino, mas o director adjunto da escola da Póvoa do Varzim avisa que o que está escrito no papel não é "obrigatoriamente" o que acontece na prática: "Podemos ter, por exemplo novas disciplinas, mas se isso implicar um aumento da carga lectiva dos alunos, ficamos legalmente impossibilitados de tomar essa decisão."
Legislação ou encargos para o Estado são dois dos principais obstáculos à autonomia, alertam os directores. É o exemplo do curso profissional de design de moda que a secundária Eça de Queirós não teve autorização para abrir este ano lectivo: "Tínhamos 80 candidatos, professores e instalações, mas teríamos de fazer algum investimento em actualizações de equipamentos e foi isso que fez a tutela rejeitar a proposta."
Perder a cada ronda Nuno Mantas também está convencido que o novo estatuto não vai fazer muita diferença. A negociação entre o ministério e o agrupamento Boa Água, aliás, teve várias etapas. Começou em Junho e acabou em Outubro. No fim de cada ronda, o director diz que perdeu mais um pouco da sua autonomia. "Pedimos à tutela duas horas lectivas por semana para diversificar a oferta curricular no 3.º ciclo com opções viradas para as matemáticas, artes ou humanidades." Ficaram com uma hora. "Queríamos seleccionar os nossos professores." A tutela disse que sim, desde que se restrinjam só aos contratados. "Pedimos um psicólogo." E ganharam "meio psicólogo", uma vez que o técnico não vai trabalhar a tempo inteiro nas escolas de Sesimbra.
E até as grandes vantagens que as primeiras escolas com autonomia pensaram vir a ter ao passarem a escolher os seus próprios professores transformaram-se grandes desvantagens, conta o director da Secundária Gonçalves Zarco: "A nossa escola pode contratar, mas só depois do concurso nacional quando a maioria dos professores já estão colocados nas outras escolas", critica José Alberto Ramos. Além de verem as suas possibilidades de escolha limitadas, o director da escola de Matosinhos explica que, como têm de recrutar professores depois de todas as outras, nunca conseguiram nos últimos seis anos começar as aulas com todos os docentes colocados: "O que à partida parecia um privilégio transformou-se numa perversidade para a autonomia das escolas."
Perder a cada contrato Limitações legais é queixa que também se repete nesta escola. Basta lembrar - avisa José Alberto Ramos - que para organizar turmas com menos alunos do que o legalmente estipulado, só com autorização da tutela, "mas isso é o que todas escolas têm de fazer". Desde 2007 que o director da secundária de Matosinhos diz que vê a sua autonomia a encolher. Se antes tinham margem para gerir as verbas poupadas nas despesas de funcionamento, esse prémio de gestão foi retirado na renovação do contrato e todas as receitas próprias têm agora de ser entregues ao ministério.
Ainda assim, defende o director do agrupamento de escolas Ferreira de Castro, a autonomia vai permitir uma maior flexibilidade para gerir horários, métodos ou estratégias de avaliação. "Desde que isso não implique ultrapassar as balizas da lei", esclarece António Castel-Branco. São algumas vantagens que, contudo, não chegam para provocar "grandes mudanças" nas rotinas das escolas de Sintra.
Vantagens extra "O quotidiano não se vai alterar muito, teremos uma maior autonomia para gerir por exemplo o currículo, mas a margem de liberdade não é muito grande", conta Maria Gabriela Silva, do agrupamento Filipa de Lencastre, em Lisboa. Se no final deste processo, há mais lamúrias do que motivos para festejar resta perceber então porque é que as direcções escolares aceitaram o desafio que o ministério lançou no início deste Verão. A maior fatia dos pedidos ficou pelo caminho, mas entre uma ronda negocial e outra, os directores dizem que acabaram por conquistar mais alguns recursos e vantagens extra do que as outras escolas.
O agrupamento Filipa de Lencastre ganhou um psicólogo a tempo inteiro, o que para a directora foi uma conquista histórica: "No ano passado tínhamos um a meio tempo para 1500 alunos e nos anos anteriores nenhum." As escolas vão finalmente poder contar com um técnico para fazer orientação vocacional dos alunos e para trabalhar com a equipa de ensino especial. O acordo vai permitir ainda contratar um professor que irá entrar nas salas do 2.º ciclo, acompanhar alunos, articular estratégias com professores ou fazer propostas para melhorar o ensino.
Uma assistente social para acompanhar sobretudo alunos e famílias carenciadas foi a principal vantagem que a Secundária Eça de Queirós teve com os dois contratos de autonomia assinados em 2007 e 2012. Ou uma terapeuta da fala para a integrar a equipa de ensino especial e um professor de português para apoiar os alunos imigrantes foram os prémios para as escolas Ferreira de Castro, em Sintra.
Limites da lei e das finanças desiludem os directores das escolas que assinaram os contratos com o Ministério da Educação
Até ao fim do ano haverá 209 escolas ou agrupamentos da rede pública com novo estatuto. As direcções escolares comprometem-se a atingir metas para melhorar os resultados dos alunos e, como contrapartida, ganham liberdade para decidir sem pedir licença a ninguém. Este é o acordo com o Ministério da Educação. O que vai ser diferente com as escolas que assinaram agora o contrato de autonomia e o que mudou nas primeiras que assumiram esse compromisso em 2007 foi a pergunta que o i fez a cinco directores. "Quase nada", responde Nuno Mantas, das escolas da Boa Água, em Sesimbra, com contrato assinado em Outubro. "Tem sido uma desilusão", acrescenta José Alberto Ramos, director da Secundária João Gonçalves Zarco, em Matosinhos, que há seis anos tem o acordo com a tutela.
O que falta então às escolas para gozar de plena autonomia? "Sempre que quisemos fazer diferente, acabámos por esbarrar na legislação ou nas limitações financeiras", explica José Henrique Lima, da Secundária Eça de Queirós. Ter currículos alternativos ou mais recursos seriam as novas regalias destes estabelecimentos de ensino, mas o director adjunto da escola da Póvoa do Varzim avisa que o que está escrito no papel não é "obrigatoriamente" o que acontece na prática: "Podemos ter, por exemplo novas disciplinas, mas se isso implicar um aumento da carga lectiva dos alunos, ficamos legalmente impossibilitados de tomar essa decisão."
Legislação ou encargos para o Estado são dois dos principais obstáculos à autonomia, alertam os directores. É o exemplo do curso profissional de design de moda que a secundária Eça de Queirós não teve autorização para abrir este ano lectivo: "Tínhamos 80 candidatos, professores e instalações, mas teríamos de fazer algum investimento em actualizações de equipamentos e foi isso que fez a tutela rejeitar a proposta."
Perder a cada ronda Nuno Mantas também está convencido que o novo estatuto não vai fazer muita diferença. A negociação entre o ministério e o agrupamento Boa Água, aliás, teve várias etapas. Começou em Junho e acabou em Outubro. No fim de cada ronda, o director diz que perdeu mais um pouco da sua autonomia. "Pedimos à tutela duas horas lectivas por semana para diversificar a oferta curricular no 3.º ciclo com opções viradas para as matemáticas, artes ou humanidades." Ficaram com uma hora. "Queríamos seleccionar os nossos professores." A tutela disse que sim, desde que se restrinjam só aos contratados. "Pedimos um psicólogo." E ganharam "meio psicólogo", uma vez que o técnico não vai trabalhar a tempo inteiro nas escolas de Sesimbra.
E até as grandes vantagens que as primeiras escolas com autonomia pensaram vir a ter ao passarem a escolher os seus próprios professores transformaram-se grandes desvantagens, conta o director da Secundária Gonçalves Zarco: "A nossa escola pode contratar, mas só depois do concurso nacional quando a maioria dos professores já estão colocados nas outras escolas", critica José Alberto Ramos. Além de verem as suas possibilidades de escolha limitadas, o director da escola de Matosinhos explica que, como têm de recrutar professores depois de todas as outras, nunca conseguiram nos últimos seis anos começar as aulas com todos os docentes colocados: "O que à partida parecia um privilégio transformou-se numa perversidade para a autonomia das escolas."
Perder a cada contrato Limitações legais é queixa que também se repete nesta escola. Basta lembrar - avisa José Alberto Ramos - que para organizar turmas com menos alunos do que o legalmente estipulado, só com autorização da tutela, "mas isso é o que todas escolas têm de fazer". Desde 2007 que o director da secundária de Matosinhos diz que vê a sua autonomia a encolher. Se antes tinham margem para gerir as verbas poupadas nas despesas de funcionamento, esse prémio de gestão foi retirado na renovação do contrato e todas as receitas próprias têm agora de ser entregues ao ministério.
Ainda assim, defende o director do agrupamento de escolas Ferreira de Castro, a autonomia vai permitir uma maior flexibilidade para gerir horários, métodos ou estratégias de avaliação. "Desde que isso não implique ultrapassar as balizas da lei", esclarece António Castel-Branco. São algumas vantagens que, contudo, não chegam para provocar "grandes mudanças" nas rotinas das escolas de Sintra.
Vantagens extra "O quotidiano não se vai alterar muito, teremos uma maior autonomia para gerir por exemplo o currículo, mas a margem de liberdade não é muito grande", conta Maria Gabriela Silva, do agrupamento Filipa de Lencastre, em Lisboa. Se no final deste processo, há mais lamúrias do que motivos para festejar resta perceber então porque é que as direcções escolares aceitaram o desafio que o ministério lançou no início deste Verão. A maior fatia dos pedidos ficou pelo caminho, mas entre uma ronda negocial e outra, os directores dizem que acabaram por conquistar mais alguns recursos e vantagens extra do que as outras escolas.
O agrupamento Filipa de Lencastre ganhou um psicólogo a tempo inteiro, o que para a directora foi uma conquista histórica: "No ano passado tínhamos um a meio tempo para 1500 alunos e nos anos anteriores nenhum." As escolas vão finalmente poder contar com um técnico para fazer orientação vocacional dos alunos e para trabalhar com a equipa de ensino especial. O acordo vai permitir ainda contratar um professor que irá entrar nas salas do 2.º ciclo, acompanhar alunos, articular estratégias com professores ou fazer propostas para melhorar o ensino.
Uma assistente social para acompanhar sobretudo alunos e famílias carenciadas foi a principal vantagem que a Secundária Eça de Queirós teve com os dois contratos de autonomia assinados em 2007 e 2012. Ou uma terapeuta da fala para a integrar a equipa de ensino especial e um professor de português para apoiar os alunos imigrantes foram os prémios para as escolas Ferreira de Castro, em Sintra.
5.9.13
Pais vão poder escolher entre escolas públicas e privadas
in RR
Nuno Crato considera que está aberto “um caminho mais directo a uma liberdade de escolha e a uma concorrência, tanto entre escolas como entre sistemas”.
Está aberta a porta à liberdade de escolha das famílias relativamente ao sistema de ensino que querem para os seus filhos. O ministro da Educação considera que o novo estatuto do ensino particular e cooperativo, aprovado esta quinta-feira em conselho de ministros, vem dar uma maior autonomia curricular ao ensino privado.
Nuno Crato, em conferência de imprensa, disse que foram criadas as condições para que as famílias possam escolher o projecto educativo para os seus educandos entre a oferta disponível, seja no ensino público ou no privado.
A novidade, segundo Crato, é que o diploma “institui uma liberdade de escolha, mas institui uma liberdade de escolha informada entre escolas e sistemas”.
Segundo o ministro, o novo estatuto do ensino particular e cooperativo “estabelece novos princípios naquilo que se refere ao ensino particular e cooperativo salientando a transparência, a obrigatoriedade de informação, tanto de resultados escolares como de projectos educativos”.
Além disso, sublinha o governante, “estabelece o princípio da concorrência” e “estabelece o princípio da avaliação externa para este tipo de ofertas”.
Segundo as novas regras, “o apoio do Estado não se restringe no apoio a turmas, como existe neste momento nos contratos de associação, mas também o apoio a alunos”.
Por isso, o ministro Nuno Crato considera que está aberto “um caminho mais directo a uma liberdade de escolha e a uma concorrência, tanto entre escolas como entre sistemas”.
O ministro da Educação garantiu ainda que este novo diploma vem proteger a escola pública: “A escola pública fica defendida com estas regras e é promovida pela existência de uma maior autonomia de uma emulação e de uma concorrência”.
Para Nuno Crato, com o novo diploma “abre-se também caminho a um maior grau de autonomia, em paralelo para as escolas públicas com contratos de autonomia”.
O novo estatuto do ensino particular e cooperativo só começam a entrar em vigor no ano lectivo 2014/2015.
Nuno Crato considera que está aberto “um caminho mais directo a uma liberdade de escolha e a uma concorrência, tanto entre escolas como entre sistemas”.
Está aberta a porta à liberdade de escolha das famílias relativamente ao sistema de ensino que querem para os seus filhos. O ministro da Educação considera que o novo estatuto do ensino particular e cooperativo, aprovado esta quinta-feira em conselho de ministros, vem dar uma maior autonomia curricular ao ensino privado.
Nuno Crato, em conferência de imprensa, disse que foram criadas as condições para que as famílias possam escolher o projecto educativo para os seus educandos entre a oferta disponível, seja no ensino público ou no privado.
A novidade, segundo Crato, é que o diploma “institui uma liberdade de escolha, mas institui uma liberdade de escolha informada entre escolas e sistemas”.
Segundo o ministro, o novo estatuto do ensino particular e cooperativo “estabelece novos princípios naquilo que se refere ao ensino particular e cooperativo salientando a transparência, a obrigatoriedade de informação, tanto de resultados escolares como de projectos educativos”.
Além disso, sublinha o governante, “estabelece o princípio da concorrência” e “estabelece o princípio da avaliação externa para este tipo de ofertas”.
Segundo as novas regras, “o apoio do Estado não se restringe no apoio a turmas, como existe neste momento nos contratos de associação, mas também o apoio a alunos”.
Por isso, o ministro Nuno Crato considera que está aberto “um caminho mais directo a uma liberdade de escolha e a uma concorrência, tanto entre escolas como entre sistemas”.
O ministro da Educação garantiu ainda que este novo diploma vem proteger a escola pública: “A escola pública fica defendida com estas regras e é promovida pela existência de uma maior autonomia de uma emulação e de uma concorrência”.
Para Nuno Crato, com o novo diploma “abre-se também caminho a um maior grau de autonomia, em paralelo para as escolas públicas com contratos de autonomia”.
O novo estatuto do ensino particular e cooperativo só começam a entrar em vigor no ano lectivo 2014/2015.
8.8.13
Afinal, o que se pretende com o cheque-ensino? Pais e especialistas levantam dúvidas
Andreia Sanches, in Público on-line
Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular garante que não há nenhuma "revolução" no que é proposto pelo ministério.
A proposta de revisão do estatuto do ensino particular e cooperativo divulgada nesta quinta-feira pelo PÚBLICO está a suscitar várias críticas. Maria de Lurdes Rodrigues, ex-ministra da Educação, lembra que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) já alertou para os efeitos eventualmente perversos da generalização de medidas, como o cheque-ensino, que garantem às famílias financiamento público quando estas pretendem que os filhos estudem no ensino privado. Em alguns países que adoptaram o modelo, diz, "aumentaram as desigualdades".
Mais: quem beneficiou mais, acrescenta Paulo Guinote, autor do blogue A Educação do Meu Umbigo, foram as melhores escolas e as famílias de classe média, não tendo havido uma melhoria dos resultados dos alunos mais fracos.
Já o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Jorge Ascenção, diz que o princípio da liberdade de escolha é bom, mas que a avançar nos moldes propostos pelo Ministério da Educação seria preciso garantir que as escolas públicas tinham tanta autonomia para definir os seus projectos educativos como as privadas. Isto para, de facto, concorrerem em igualdade de circunstâncias pelos alunos. "Actualmente não é o que acontece. Não me recordo, por exemplo, de o ministério ter ido aos colégios colocar entraves nas actividades de enriquecimento curricular que eles oferecem. No público é o que acontece", diz Ascenção.
Rodrigo Queiroz e Melo, director executivo da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular (Aeep), diz que a proposta do ministério de Nuno Crato, que está em cima da mesa para ser debatida com os parceiros, não muda assim tanto o modelo que já existe. "Não há aqui nenhuma revolução." Antes se define de forma mais clara os diferentes tipos de contratos que o Estado pode estabelecer com o ensino privado. A começar pelos contratos simples de apoio às famílias que, lembra Queiroz e Melo, existem na lei desde os anos 80 (Decreto Lei 553/80).
Esse diploma de 80 previa a atribuição de subsídios a alunos do privado e a redução das propinas. A forma como esta norma foi sendo interpretada e regulamentada ao longo dos anos, continua Queiroz e Melo, foi a de que apenas eram financiados os agregados com baixos rendimentos que, querendo pôr os filhos num colégio, se candidatassem a esse apoio. Na prática, diz, "o cheque-ensino existe desde os anos 80, só que nenhum Governo quis implementá-lo" tal qual ele podia ser implementado à luz da lei.
Mais de 20 mil alunos apoiados
Em 2011, os contratos simples abrangiam quase 22.500 alunos — não garantiam a gratuitidade no ensino privado, mas faziam baixar os custos para as famílias com menos recursos. Agora, "a única coisa que muda é que se diz que o valor do apoio financeiro do Estado passa a ter como referência os custos das turmas no ensino público", diz Queiroz e Melo.
Mas na proposta de revisão do estatuto dos privados diz-se ainda, expressamente, que podem beneficiar destes contratos "todos os alunos do ensino básico e do ensino secundário não abrangidos por outros contratos". E é neste "todos" que muitos lêem: "generalização do cheque-ensino".
Queiroz e Melo explica que numa primeira fase continuarão a ser os alunos carenciados os beneficiários, já que as contas públicas do país não permitem actualmente aplicar o "cheque" a toda a gente que pretenda beneficiar dele. "Mas assim que for possível achamos que deve abranger todos." E o estatuto do ensino particular, tal como agora está a ser proposto pelo ministério, permite-o.
Já a Federação Nacional de Professores (Fenprof) emitiu um comunicado onde diz que "o Estado passará a pagar às famílias, com o dinheiro dos impostos dos contribuintes, a tão propalada liberdade de escolha de escola, independentemente de esta ser pública ou privada". Uma situação que "a Fenprof rejeita liminarmente." É "um passo no sentido do desmantelamento da escola pública e da privatização do ensino", acusa.
A ex-ministra da Educação do Governo liderado José Sócrates, Maria de Lurdes Rodrigues, também admite que o diploma proposto pelo Governo seja uma porta aberta para a generalização do cheque-ensino. E levanta sérias dúvidas a essa intenção.
As decisões sobre estas matérias "não podem basear-se só em princípios ideológicos ou crenças", diz Lurdes Rodrigues. Deve-se antes estudar "os resultados práticos" dos modelos aplicados em outros países. E o que os estudos da OCDE mostram, sublinha, é que a ideia de que com a generalização do cheque-ensino se aumenta a liberdade de escolha das famílias "é uma ilusão".
Paulo Guinote tem estudado bem o tema. "Uma coisa é o cheque-ensino para grupos de alunos mais carenciados. O sistema dos vouchers nos Estados Unidos serviu para isso", começa por dizer, e alunos que nunca poderiam pagar um bom colégio, que se adequava mais às suas necessidades, passaram a poder escolher.
Outra coisa, continua Guinote, é a universalização do modelo do cheque-ensino a todas as famílias. "Na Suécia, o primeiro país a aplicar esse modelo, e depois na Dinamarca, o que aconteceu foi um aumento da guetização das escolas" que já tinham piores resultados, ao mesmo tempo que os colégios privados "passaram a seleccionar ainda mais os alunos que entravam". Resultado: "As melhores escolas melhoraram e as da base não".
Há ainda o risco de muitos alunos continuarem simplesmente a não poder escolher. "A rede do ensino privado não cobre o país todo." E o cheque-ensino nunca cobre todas as despesas de frequentar um colégio.
Contactado pela TSF, fonte do Ministério da Educação afirmou que com a proposta de alteração do regime do ensino particular nada muda em relação às comparticipações do Estado para este sector. A mesma fonte sublinha que o estatuto ainda não está fechado e as propostas dos parceiros serão ponderadas.
Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular garante que não há nenhuma "revolução" no que é proposto pelo ministério.
A proposta de revisão do estatuto do ensino particular e cooperativo divulgada nesta quinta-feira pelo PÚBLICO está a suscitar várias críticas. Maria de Lurdes Rodrigues, ex-ministra da Educação, lembra que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) já alertou para os efeitos eventualmente perversos da generalização de medidas, como o cheque-ensino, que garantem às famílias financiamento público quando estas pretendem que os filhos estudem no ensino privado. Em alguns países que adoptaram o modelo, diz, "aumentaram as desigualdades".
Mais: quem beneficiou mais, acrescenta Paulo Guinote, autor do blogue A Educação do Meu Umbigo, foram as melhores escolas e as famílias de classe média, não tendo havido uma melhoria dos resultados dos alunos mais fracos.
Já o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Jorge Ascenção, diz que o princípio da liberdade de escolha é bom, mas que a avançar nos moldes propostos pelo Ministério da Educação seria preciso garantir que as escolas públicas tinham tanta autonomia para definir os seus projectos educativos como as privadas. Isto para, de facto, concorrerem em igualdade de circunstâncias pelos alunos. "Actualmente não é o que acontece. Não me recordo, por exemplo, de o ministério ter ido aos colégios colocar entraves nas actividades de enriquecimento curricular que eles oferecem. No público é o que acontece", diz Ascenção.
Rodrigo Queiroz e Melo, director executivo da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular (Aeep), diz que a proposta do ministério de Nuno Crato, que está em cima da mesa para ser debatida com os parceiros, não muda assim tanto o modelo que já existe. "Não há aqui nenhuma revolução." Antes se define de forma mais clara os diferentes tipos de contratos que o Estado pode estabelecer com o ensino privado. A começar pelos contratos simples de apoio às famílias que, lembra Queiroz e Melo, existem na lei desde os anos 80 (Decreto Lei 553/80).
Esse diploma de 80 previa a atribuição de subsídios a alunos do privado e a redução das propinas. A forma como esta norma foi sendo interpretada e regulamentada ao longo dos anos, continua Queiroz e Melo, foi a de que apenas eram financiados os agregados com baixos rendimentos que, querendo pôr os filhos num colégio, se candidatassem a esse apoio. Na prática, diz, "o cheque-ensino existe desde os anos 80, só que nenhum Governo quis implementá-lo" tal qual ele podia ser implementado à luz da lei.
Mais de 20 mil alunos apoiados
Em 2011, os contratos simples abrangiam quase 22.500 alunos — não garantiam a gratuitidade no ensino privado, mas faziam baixar os custos para as famílias com menos recursos. Agora, "a única coisa que muda é que se diz que o valor do apoio financeiro do Estado passa a ter como referência os custos das turmas no ensino público", diz Queiroz e Melo.
Mas na proposta de revisão do estatuto dos privados diz-se ainda, expressamente, que podem beneficiar destes contratos "todos os alunos do ensino básico e do ensino secundário não abrangidos por outros contratos". E é neste "todos" que muitos lêem: "generalização do cheque-ensino".
Queiroz e Melo explica que numa primeira fase continuarão a ser os alunos carenciados os beneficiários, já que as contas públicas do país não permitem actualmente aplicar o "cheque" a toda a gente que pretenda beneficiar dele. "Mas assim que for possível achamos que deve abranger todos." E o estatuto do ensino particular, tal como agora está a ser proposto pelo ministério, permite-o.
Já a Federação Nacional de Professores (Fenprof) emitiu um comunicado onde diz que "o Estado passará a pagar às famílias, com o dinheiro dos impostos dos contribuintes, a tão propalada liberdade de escolha de escola, independentemente de esta ser pública ou privada". Uma situação que "a Fenprof rejeita liminarmente." É "um passo no sentido do desmantelamento da escola pública e da privatização do ensino", acusa.
A ex-ministra da Educação do Governo liderado José Sócrates, Maria de Lurdes Rodrigues, também admite que o diploma proposto pelo Governo seja uma porta aberta para a generalização do cheque-ensino. E levanta sérias dúvidas a essa intenção.
As decisões sobre estas matérias "não podem basear-se só em princípios ideológicos ou crenças", diz Lurdes Rodrigues. Deve-se antes estudar "os resultados práticos" dos modelos aplicados em outros países. E o que os estudos da OCDE mostram, sublinha, é que a ideia de que com a generalização do cheque-ensino se aumenta a liberdade de escolha das famílias "é uma ilusão".
Paulo Guinote tem estudado bem o tema. "Uma coisa é o cheque-ensino para grupos de alunos mais carenciados. O sistema dos vouchers nos Estados Unidos serviu para isso", começa por dizer, e alunos que nunca poderiam pagar um bom colégio, que se adequava mais às suas necessidades, passaram a poder escolher.
Outra coisa, continua Guinote, é a universalização do modelo do cheque-ensino a todas as famílias. "Na Suécia, o primeiro país a aplicar esse modelo, e depois na Dinamarca, o que aconteceu foi um aumento da guetização das escolas" que já tinham piores resultados, ao mesmo tempo que os colégios privados "passaram a seleccionar ainda mais os alunos que entravam". Resultado: "As melhores escolas melhoraram e as da base não".
Há ainda o risco de muitos alunos continuarem simplesmente a não poder escolher. "A rede do ensino privado não cobre o país todo." E o cheque-ensino nunca cobre todas as despesas de frequentar um colégio.
Contactado pela TSF, fonte do Ministério da Educação afirmou que com a proposta de alteração do regime do ensino particular nada muda em relação às comparticipações do Estado para este sector. A mesma fonte sublinha que o estatuto ainda não está fechado e as propostas dos parceiros serão ponderadas.
Governo quer financiar famílias que escolham o privado
por Ana Bela Ferreira, in Diário de Notícias
Proposta de alteração do ensino particular dá total liberdade de escolha às famílias no básico e secundário.
As famílias que queiram ter os filhos a estudar no privado e não têm dinheiro para o fazer vão poder receber apoios do Estado. Dar liberdade na escolha de uma escola pública ou privada para as crianças é a principal mudança na proposta do Ministério da Educação e Ciência para alterar o regime jurídico do ensino particular e cooperativo.
A porta ao financiamento na escolha da escola fica aberta no artigo sobre os contratos simples, que na nova versão da lei passam a chamar-se contratos simples de apoio à família. Aqui diz-se que "no exercício do direito de opção educativa das famílias, os contratos simples de apoio à família têm por objetivo apoiar a frequência de escolas do ensino particular e cooperativo por parte de todos os alunos do ensino básico e do ensino secundário".
Proposta de alteração do ensino particular dá total liberdade de escolha às famílias no básico e secundário.
As famílias que queiram ter os filhos a estudar no privado e não têm dinheiro para o fazer vão poder receber apoios do Estado. Dar liberdade na escolha de uma escola pública ou privada para as crianças é a principal mudança na proposta do Ministério da Educação e Ciência para alterar o regime jurídico do ensino particular e cooperativo.
A porta ao financiamento na escolha da escola fica aberta no artigo sobre os contratos simples, que na nova versão da lei passam a chamar-se contratos simples de apoio à família. Aqui diz-se que "no exercício do direito de opção educativa das famílias, os contratos simples de apoio à família têm por objetivo apoiar a frequência de escolas do ensino particular e cooperativo por parte de todos os alunos do ensino básico e do ensino secundário".
4.5.12
Há “profundas desigualdades” no custo com alunos, diz Oliveira Martins
in Público on-line
Os alunos que estudam no ensino público português não custam todos o mesmo aos cofres do Estado, existindo “profundas desigualdades” no país, revelou nesta quinta-feira Guilherme D'Oliveira Martins, baseando-se num relatório do Tribunal de Contas.
A pedido da comissão parlamentar de Educação, em Fevereiro do ano passado, o Tribunal de Contas está a terminar um estudo técnico sobre o custo que representa para o Estado cada estudante do ensino público.
“O estudo técnico deverá estar pronto dentro de um mês”, disse aos jornalistas o presidente do Tribunal de Contas, à margem do seminário Serviço Público de Educação, que decorre nesta quinta-feira no Conselho Nacional de Educação, em Lisboa.
De acordo com Oliveira Martins, o estudo mostra que, “em Portugal, a educação não é uma realidade homogénea, mas assimétrica”. “Há profundas desigualdades e o Estado não pode ser indiferente a isso. Tem de introduzir factores para um maior reforço da aprendizagem, para que sejam reforçados com equidade. Ninguém pode ser prejudicado nem privilegiado”, defendeu o ex-ministro da Educação.
De acordo com o especialista, existem grandes diferenças entre os alunos do litoral e do interior, assim como entre os dos grandes centros urbanos e das localidades mais pequenas. “Há zonas onde as escolas são mais limitadas”, afirmou.
Evolução demográfica
Esta diferença traz um problema à decisão de, em breve, os encarregados de educação poderem escolher a escola dos seus educandos: “Há zonas onde a escolha pode ser feita, mas existem outras onde é preciso apostar na qualificação, uma vez que não existem opções.”
Para o presidente do Tribunal de Contas, “as escolhas estão limitadas pela oferta e há zonas onde as escolas são mais limitadas”. Perante a crise económica e o orçamento reduzido do Estado e das famílias, Oliveira Martins lembra que existe um factor que poderá reduzir o impacto do desinvestimento na educação: a demografia. “Hoje, um país como Portugal, tem de encarar o sistema educativo com a evolução demográfica”, disse Oliveira Martins, lembrando que “o factor demográfico pode ajudar, porque aponta para uma descida do número de jovens que chegam à escola”.
No entanto, é preciso “uma forte aposta e investimento para conseguir recuperar os alunos com mais dificuldades”. O ex-ministro lembrou que “a educação é um investimento a longo prazo em que a liberdade de escolha tem de vir a par com a qualidade e equidade”.
A decisão de realizar um estudo foi tomada pela comissão parlamentar de Educação, que defendeu ser essencial conhecer quanto custa aos cofres do Estado cada aluno, para se poder avaliar as políticas públicas na área da Educação.
Os alunos que estudam no ensino público português não custam todos o mesmo aos cofres do Estado, existindo “profundas desigualdades” no país, revelou nesta quinta-feira Guilherme D'Oliveira Martins, baseando-se num relatório do Tribunal de Contas.
A pedido da comissão parlamentar de Educação, em Fevereiro do ano passado, o Tribunal de Contas está a terminar um estudo técnico sobre o custo que representa para o Estado cada estudante do ensino público.
“O estudo técnico deverá estar pronto dentro de um mês”, disse aos jornalistas o presidente do Tribunal de Contas, à margem do seminário Serviço Público de Educação, que decorre nesta quinta-feira no Conselho Nacional de Educação, em Lisboa.
De acordo com Oliveira Martins, o estudo mostra que, “em Portugal, a educação não é uma realidade homogénea, mas assimétrica”. “Há profundas desigualdades e o Estado não pode ser indiferente a isso. Tem de introduzir factores para um maior reforço da aprendizagem, para que sejam reforçados com equidade. Ninguém pode ser prejudicado nem privilegiado”, defendeu o ex-ministro da Educação.
De acordo com o especialista, existem grandes diferenças entre os alunos do litoral e do interior, assim como entre os dos grandes centros urbanos e das localidades mais pequenas. “Há zonas onde as escolas são mais limitadas”, afirmou.
Evolução demográfica
Esta diferença traz um problema à decisão de, em breve, os encarregados de educação poderem escolher a escola dos seus educandos: “Há zonas onde a escolha pode ser feita, mas existem outras onde é preciso apostar na qualificação, uma vez que não existem opções.”
Para o presidente do Tribunal de Contas, “as escolhas estão limitadas pela oferta e há zonas onde as escolas são mais limitadas”. Perante a crise económica e o orçamento reduzido do Estado e das famílias, Oliveira Martins lembra que existe um factor que poderá reduzir o impacto do desinvestimento na educação: a demografia. “Hoje, um país como Portugal, tem de encarar o sistema educativo com a evolução demográfica”, disse Oliveira Martins, lembrando que “o factor demográfico pode ajudar, porque aponta para uma descida do número de jovens que chegam à escola”.
No entanto, é preciso “uma forte aposta e investimento para conseguir recuperar os alunos com mais dificuldades”. O ex-ministro lembrou que “a educação é um investimento a longo prazo em que a liberdade de escolha tem de vir a par com a qualidade e equidade”.
A decisão de realizar um estudo foi tomada pela comissão parlamentar de Educação, que defendeu ser essencial conhecer quanto custa aos cofres do Estado cada aluno, para se poder avaliar as políticas públicas na área da Educação.
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