22.6.07

Violência doméstica aumentou

Augusto Correia, in Jornal de Notícias

Mulheres têm mais apoios e denunciam mais a violência doméstica


O aumento, em 50%, do número de queixas de violência doméstica, no Grande Porto, mostra que os contos de fadas não passam efabulações de uma realidade improvável. A crença, arreigada em muitas mentes femininas, de que a bela pode transformar o monstro em príncipe não se confirma. Por norma, a besta não se deixa amansar e acaba por desfigurar a beldade, à força da porrada, da violência física, psicológica, económica e sexual.

"Quando as mulheres percebem que podem encontrar apoio na sociedade, as queixas de violência doméstica disparam", disse Maria José Magalhães, vice-presidente da UMAR. A União de Mulheres, Alternativa e Resposta recebeu 134 novos casos de violência doméstica, em 2006, na Área Metropolitana do Porto (AMP). Um aumento de cerca de 50%, relativamente a 2005, em percentagem idêntica à que se tem sucedido, ano após ano. "A violência doméstica é como um iceberg. Conhecemos apenas o que é visível, resultado da coragem das vítimas em fazer a denúncia", acrescentou.

Segundo os dados da UMAR, a violência afecta mais as mulheres com idades compreendidas entre os 30 e os 50 anos, apesar dos três casos registados entre jovens estudantes. Ao todo, 62% das vítimas são casadas, com filhos, normalmente mais de dois. O fim do casamento não significa o fim da violência 13% das queixas provêm de mulheres divorciadas e 2% de separadas. O fenómeno continua mais localizado entre pessoas com menor formação, apesar de haver 6% de queixosas licenciadas. A nível profissional, há 32% de desempregadas, 10% de reformadas e 6% de domésticas. A violência sexual começa a sobressair entre as denúncias recebidas na UMAR. "Em 2004, era praticamente residual. No ano passado, aumentou bastante", disse Maria José Magalhães.

"A violência atinge níveis preocupante em todos os distritos do país", adverte Maria José Magalhães. No caso do Porto, a associação e evita os números e fala de pessoas, que conhece pelo nome. "A UMAR recebe e acompanha. Fazemos um trabalho integrado, que não se limita a receber as senhoras. Providenciamos ajuda, médica, emocional e nível profissional, com um centro de reconversão sócio-profissional", disse.

Um trabalho de voluntariado, que começa ser escasso. "Sem pessoas a tempo inteiro, é difícil garantir uma resposta profissional, um atendimento permanente", disse Maria José Magalhães. Em luta "pela sustentabilidade financeira", a UMAR não se fica, paciente e bem mandada, à espera do dinheiro. Dia 6 de Julho vai organizar um leilão de obras de arte, na Junta de Freguesia de Aldoar, para angariar fundos, de forma a contratar profissionais e abrir as portas 24 horas por dia.

O apoio à vítima é apenas um parte do trabalho da UMAR, normalmente desenvolvido em três fases primeiro a prevenção (ler caixa), depois quando ocorre a violência, tentando sensibilizar o agressor a parar e a redimir-se; quando tudo o resto falha, ajudar a vítima fugir, a recuperar a vida e a dignidade.

A violência das sms

Um grande amor resulta, muitas vezes, em grande dor, física e psicológica. "Muitas raparigas acham normal que o namorado veja as sms e controle o telemóvel", adverte Ana Paula Canotilho, da Direcção da UMAR. "Não se dão conta de que estão a ser vítimas de violência". Pode ser o início de um ciclo de abusos, que em média dura 12 a 15 anos, que se vai intensificando ao logo dos tempos; de sova ou humilhação ocasional, à porrada diária. "Os alunos com quem trabalhamos têm menos apetência para a violência", disse Ana Paula Canotilho, no resumo dos três anos de um programa de prevenção, iniciado em 2004, em três escolas do Grande Porto Aldoar, Secundária de Valongo e Baguim do Monte. O projecto armou-se com a música e a dança no "combate aos mitos e aos estereótipos de género". Nos jardins-de-infância organizaram sessões de desconstrução dos contos infantis, contando a história ao contrário. "Percebemos que já têm a noção do que se passa em casa deles". Havendo verba, o projecto será alargado a mais escolas, idealmente, do infantário ao 12º ano.