in Diário de Notícias
Saúde. Encontro em Lisboa discute o problema
Há mais cirroses precoces por álcool, drogas e hepatites
O consumo excessivo de álcool entre os jovens tornou-se mais precoce nos últimos anos e, por causa disso, e do consumo de drogas e das infecções por hepatite C, há agora cada vez mais casos de pessoas na faixa etária dos 30 anos com cirroses hepáticas avançadas. Os números mostram também que entre 2003 e 2005, as mortes por cirrose entre os 30 e os 44 anos aumentaram cerca de 20 por cento.
O alerta é do médico Rui Tato Marinho, hepatologista do Hospital de Santa Maria, que defende a criação de um plano nacional para as hepatites. Isso será aliás proposto hoje no encontro "Hepatites, Droga e Álcool", promovido pela Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado, que reúne mais de 100 especialistas portugueses nesta área para debater o problema.
João Goulão, presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT), admitiu por seu lado, ao DN, que há falhas no controlo e fiscalização da venda de álcool a menores de 16 anos. "Terão que ser aperfeiçoados mecanismos de fiscalização dessas situações e os comerciantes que o fazem terão que ser responsabilizados", afirmou João Goulão.
A tendência para o consumo excessivo de álcool por parte dos mais novos e em idades cada vez mais precoces - nomeadamente a partir dos 13 anos - sobretudo aos fins-de-semana à noite, tem vindo a aumentar.
Os dados mostram, por exemplo, que a proporção de população que iniciou o consumo de bebidas alcoólicas entre os 15 e os 17 anos subiu dez por cento entre 2001 e 2007 - de 30 para 40 por cento.
Segundo João Goulão, esta tendência representa a adopção de comportamentos juvenis dos países do Norte da Europa, conjugada com um ambiente de desresponsabilização, que começa na família e acaba na deficiente fiscalização de situações de venda ilegal de álcool a menores.
Rui Tato Marinho considera por seu lado que, para além de ser uma questão de "moda", as "famílias tornaram-se mais instáveis e existe uma enorme pressão comercial que associa bebida e jovens".
O hepatologista de Santa Maria, que é também o presidente da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF), dá como exemplo a associação frequente entre marcas de bebidas alcoólicas e eventos juvenis, como festivais de música ou iniciativas estudantis. Essas situações, diz Tato Marinho, "não deviam ser permitidas".
A ingestão excessiva de álcool em períodos curtos de tempo, como acontece nas saídas nocturnas de fim-de-semana, é o chamado binge drinking - ou consumo esporádico excessivo - quecorresponde a cinco a seis bebidas no homem e a quatro a cinco bebidas na mulher e ocorre em todas as idades. Mas os números mostram que ele é menor nas faixas etárias mais altas. Nos mais jovens, as consequências são mais nocivas a todos os níveis. A começar pelo problema da dependência. "Os estudos mostram que quem começa a beber, por exemplo, com 14 ou 15 anos, tem mais probabilidades de se tornar alcoólico e que 45 por cento dos jovens que o faz tornam-se dependentes do álcool", explica Rui Tato Marinho.
E se se observa que os jovens estão mais cautelosos com a droga, diz o hepatologista, com o álcool é o contrário, sendo que este pode surgir depois associado também a outros comportamentos de risco, que resultam nomeadamente em acidentes de viação (a principal causa de morte nos jovens), no consumo de drogas e na prática de sexo desprotegido. Isso aumenta por seu lado o risco de doenças sexualmente transmissíveis, como é o caso da hepatite C. É justamente para discutir os problemas gerados pelo conjunto destes três factores - hepatites, álcool e drogas - que os especialistas em hepatologia se reúnem hoje em Lisboa. Além de debater as várias facetas desta problemática, o encontro servirá também para avançar publicamente com a proposta de criação de um plano nacional para as hepatites.
Os especialistas calculam que existam em Portugal cerca de 150 mil pessoas com hepatite C e outras cem mil com hepatite B. |- F. N.


