18.2.09

Reportagem: Um futuro incerto aos 40 anos

Reis Pinto, in Jornal de Notícias

Cozinheira foi despedida em final de gravidez e tem recusado empregos por não ter local onde deixaros dois filhos gémeos, de um ano de idade


Após 14 anos como cozinheira no mesmo restaurante e quase no final de uma gravidez gemelar, Orquídea Sousa, de 40 anos, viu-se, no ano passado, sem emprego. "Por um lado, foi um alívio. O "take-way" onde trabalhava mudou de mãos e os novos patrões fizeram-me a vida negra. Só não estava à espera de tantas dificudades", referiu.

Encontrámos a cozinheira à entrada para o Centro de Emprego do Porto, localizado na Baixa, junto a um dos mais conhecidos hotéis da cidade. Com o enorme carrinho de bebé a necessitar de todas as ajudas, Orquídea Sousa, indiferente aos coloridos cartazes que cobrem as paredes anunciando cursos de formação, não demorou mais de 15 minutos a sair.

Explicou, então, ao JN, como o nascimento dos gémeos - Luís Filipe e da Beatriz Filipa, que completaram um ano no mês passado -, ocorrido já após o desemprego, lhe veio colocar obstáculos inesperados na procura de uma nova ocupação .

"É triste dizer isto, mas hoje [ontem] tive de recusar o quarto trabalho que o Centro de Emprego do Porto me arranjou. Os técnicos têm sido espectaculares comigo. Só que eu quero trabalhar, mas não posso enquanto não tiver onde deixar os bebés", confessou.

A gravidez inesperada aos 39 anos - Orquídea Sousa tem mais uma filha, de 20 anos, que já não vive com ela - e o desemprego vieram perturbar o equilíbrio financeiro da família que, habituada a viver com pouco, não tinha reservas para fazer face a despesas " extras" como o infantário. "É um absurdo. Pedem-me 150 euros por bebé e eu não tenho dinheiro. Com 409 euros de subsídio de desemprego, mais o salário do meu marido que trabalha na construção civil, não dá. Os infantários mais baratos, e que fazem desconto para irmãos, estão cheios. É um desespero, pois gasto uma fortuna por mês com os gémeos. São as fraldas, o leite, a roupa, enfim, tudo o que um bebé precisa, mas a dobrar", referiu.

A esperança de Orquídea Sousa ficou adiada para Setembro, altura em que espera conseguir uma vaga para os pequenos Luís e Beatriz num infantário com mensalidades acessíveis. "Preciso de começar a trabalhar depressas, pois só há um salário a entrar em casa e, pelo que se ouve dizer, as coisas também não andam boas na construção civil", concluiu.

A fazer fé no Instituto Nacional de Estatística, Orquídea Sousa é uma das mais de 237 mil mulheres sem emprego no nosso país.