12.2.09

trimestre em que a economia foi dominada pela crise

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

Exportações, vendas a retalho, construção e indústria caíram no final de 2008. Analistas prevêem recuo de 0,9 por cento no PIB


É uma sucessão de indicadores negativos poucas vezes vista. Os dados económicos que o Instituto Nacional de Estatística tem vindo, nas últimas semanas, a divulgar relativos aos últimos meses de 2008 apontam, invariavelmente, para uma tendência muito negativa. Exportações, vendas a retalho, construção, indústria e serviços estão a cair e o resultado, prevêem os analistas, vai ser o anúncio de uma contracção muito forte da economia durante o último trimestre do ano passado.

Paula Carvalho, do departamento de estudos económicos do BPI, e Rui Constantino, do Santander, têm exactamente a mesma previsão para a variação registada no PIB português no período de Outubro a Dezembro de 2008. Segundo os seus cálculos, a economia vai contrair-se, face ao trimestre imediatamente anterior, 0,9 por cento, o que significa que a variação face ao período homólogo será igualmente negativa em 0,9 por cento. Feitas as contas, o crescimento da economia no total do ano passado ficará reduzido a 0,3 por cento. A confirmar-se esta previsão, o recuo da economia nos últimos três meses do ano será o mais acentuado desde o final de 2002, altura em que, com o país a mudar de governo e a entrar em recessão, o PIB trimestral se reduziu em cadeia a um ritmo de 1,1 por cento. Também agora estaremos perante a entrada em recessão técnica, já que, no terceiro trimestre do ano passado, a economia recuou 0,1 por cento, cumprindo-se deste modo a definição de recessão que consiste em dois trimestres consecutivos de crescimento negativo. O anúncio dos números oficiais do crescimento do quarto trimestre de 2008 será feito pelo INE na próxima sexta-feira.

E se os dois analistas fazem previsões iguais para a evolução do PIB, as frases que utilizam para caracterizar a conjuntura económica a que se assiste em Portugal e no estrangeiro é também muito semelhante. "Parece ter havido uma situação de quase interrupção da actividade económica", afirma Paula Carvalho. "A economia europeia, de um modo geral, parou", diz Rui Constantino.

Efeito da conjuntura

Os indicadores a sustentarem esta visão tão dramática dos acontecimentos são vários, mas em lugar de destaque estão as exportações.

Em Novembro, anunciou na segunda-feira o INE, as vendas de mercadorias portuguesas para o estrangeiro foram 15 por cento menores do que em igual período do ano anterior. As exportações para os parceiros da União Europeia caíram mais de 20 por cento, tornando insuficiente a subida registada nas vendas extracomunitárias.
O sector exportador português está a sofrer de uma forma quase nunca vista com a contracção muito forte e repentina que se verificou no final do ano passado nos principais parceiros comerciais: Espanha, Alemanha, França e Reino Unido.

Esta diminuição do mercado internacional explica também uma parte significativa daquilo que está a acontecer na indústria portuguesa. De acordo com os dados publicados na semana passada pelo INE, a produção industrial registou uma queda em termos homólogos de 3,4 por cento em Outubro, de 11,5 por cento em Novembro e de 12,8 por cento em Dezembro. Um trimestre totalmente negativo que está relacionado com uma diminuição muito grande das vendas para o estrangeiro, mas também com uma redução significativa da procura no mercado interno.

Fragilidades domésticas

E a verdade é que os indicadores não relacionados directamente com a travagem da procura externa também mostram uma tendência negativa. Ontem, ficou a saber-se que a produção na construção e obras públicas caiu 3,7 por cento no mês de Dezembro, o pior resultado de 2008. No sector dos serviços, a quebra no último mês do ano também foi acentuada: 6,3 por cento, depois de um recuo de oito por cento em Novembro. E, para completar este leque de resultados desanimadores, as vendas no comércio a retalho, o indicador mais imediato de como está a evoluir o consumo, recuou 6,3 por cento em Dezembro, indiciando que esta época de Natal teve menos compras do que a do ano passado.

"São indicadores muito fracos, de que já estávamos de alguma forma à espera", afirma Paula Carvalho. Rui Constantino confessa alguma surpresa com os dados tão fracos do comércio a retalho, mas admite que o que se passou foi um adiamento das compras para a época de saldos em Janeiro, um comportamento que se acentua em épocas de crise.
Isto não significa, contudo, que se possa esperar uma recuperação da actividade económica em Portugal já no início do presente ano. "O primeiro trimestre de 2009 deverá manter a mesma tendência do último de 2008 e só na segunda metade do ano se poderá começar a antever sinais de recuperação", prevê o analista do Santander, alertando para o cenário de ainda grande incerteza.

20%
As exportações para os parceiros da União Europeia caíram 20 por cento em Novembro face ao período homólogo