Inês Cardoso, in Jornal de Notícias
Portugal é encarado por outros estados-membros como país muito empenhado na construção europeia
Há vida para além do futuro tratado "reformador". Sendo óbvia a referência à negociação que (ainda) mantém a União Europeia em sentido, as embaixadas dos estados-membros em Portugal traçam um conjunto muito alargado de interesses, quando se trata de escolher as prioridades que gostariam de ver assumidas pela presidência portuguesa, que hoje tem início.
Sendo inevitável olhar para o passado quando se abordam expectativas de desempenho, uma conclusão salta à vista o peso e a vitalidade que ainda hoje a Estratégia de Lisboa preserva colocam a fasquia alta. E mais uma vez, como sublinha o embaixador austríaco, Ewald Jaeger, a capital poderá dar nome a um documento histórico: "Tratado de Lisboa". "A futura evolução da UE estaria assim ligada para sempre aos esforços bem sucedidos da presidência portuguesa", afirma.
Das 13 embaixadas que responderam, em tempo útil, ao desafio do JN, cinco elevam o tratado à máxima potência. Esse não é, contudo, o único denominador comum. Política energética, alargamento, ambiente e alterações climáticas ou competitividade económica são tópicos que motivam vários parceiros.
A proximidade geográfica e cultural contribui para escolhas muito idênticas entre os países do Leste. A Política Europeia de Vizinhança e a valorização do equilíbrio financeiro, sem que isso impeça o respeito pelas "diferenças entre regiões", constam da agenda de Polónia e Estónia. A adesão rápida da Croácia e da Turquia é referida pela generalidade dos novos membros. Também a política energética colhe "votos", a que se junta o da Suécia.
A Suécia apresenta, de resto, a agenda mais diversificada e exigente. Nela há espaço para objectivos de Ambiente ("a meta mais importante é obter um mandato para a negociação de um novo regime ambiental no encontro das partes em Bali, em Dezembro"), para as questões marítimas, a liberalização dos serviços postais, a revisão do mercado interno, a directiva sobre o horário de trabalho ou as relações exteriores (com destaque para o Kosovo).
África aqui tão perto
Como ninguém responde no vazio, ignorando dossiês em aberto e dados já lançados por Portugal, as embaixadas olham com atenção para África e Brasil. A herança histórica confere-nos particular capacidade de diálogo, reconhecem os parceiros, que elogiam a nossa "visão global" como um dos maiores contributos para o projecto europeu (ver destaques em baixo).
A embaixada de França é a que mais ênfase coloca na cimeira UE-África. "Portugal e França partilham um conhecimento aprofundado de África", que deverá ajudar a "lançar as bases de uma relação ambiciosa". Com um "zoom" à margem sul do Mediterrâneo, a "mesma preocupação manifestada pelo presidente da República francesa com o projecto de União Mediterrânica".
Ainda no campo das relações com países terceiros, a embaixada do Chipre destaca a importância de "avançar" em projectos sobre imigração ilegal. Há desafios mais difíceis de concretizar, como um expresso pela Eslováquia "Conseguir uma UE mais compreensiva e próxima dos seus cidadãos".
Já a olhar em frente, a Eslovénia - que sucede a Portugal na presidência - conhece bem o programa tripartido (traçado com a Alemanha) e espera "participar no desempenho" luso. Também a República Checa, que pela primeira vez assume a presidência no início de 2009, nos olha com atenção. Na esperança de que seja dado "novo impulso para ir adiante", antes de ela própria tomar o pulso ao ritmo da União.
Estratégia de Lisboa
Sete anos depois, continua a ser vista como um marco nas reformas da União e na sua competitividade em termos económicos. Mereceu a maior unanimidade no capítulo dos principais contributos de Portugal para o projecto europeu - mesmo entre países que em 2000 não tinham aderido à UE, como Estónia, República Checa, Polónia e Hungria.
Política externa
Os elogios à "visão global do mundo multipolar" (nestes termos traçado pela Eslovénia) são repetidos com nuances, consoante os autores. A ligação a África e à América Latina, que se reflectem no programa do próximo semestre, é particularmente sublinhada por França, Holanda, Áustria, Bélgica e Estónia. Igual realce merece igualmente a aposta no reforço das relações com os países do Mediterrâneo Sul.
Coesão e solidariedade
É sobretudo por parte dos países a Leste que é aplaudido o apoio "sem qualquer egoísmo" a sucessivos alargamentos e ao acesso equilibrado de todos os parceiros aos fundos. Mas não só a Holanda classifica Portugal como "um acérrimo defensor dos valores comunitários" e, "neste sentido, um dos estados-membros mais europeus".
Espaço Schengen
Estónia, França e Eslovénia destacam o empenho na eliminação de fronteiras e o desenvolvimento da solução que permite antecipar a plena adesão dos novos estados-membros ao espaço Schengen (SISone4AllSystem).
Dimensão marítima
A "particular sensibilidade" para a temática é salientada pela França.
Convergência
Com a natural cortesia e diplomacia de quem se dirige ao país prestes a assumir a presidência (ou não fossem as respostas elaboradas pelos próprios embaixadores ou conselheiros), as críticas a aspectos menos positivos do desempenho de Portugal surgem de forma muito suavizada. A maioria dos parceiros optou mesmo por não apontar nenhuma. Ainda assim, a Holanda alerta para a necessidade de Portugal seguir "resolutamente o caminho das reformas e da consolidação orçamental", para poder "aproximar-se cada vez mais da convergência económica".
Canalização de fundos
O tema interessa particularmente aos novos estados-membros, que admitem de forma generalizada ter procurado a experiência de Portugal. Nem sempre para seguir os passos dados, mas para evitar repetir alguns erros. Como assume o embaixador da Eslováquia, Radomír Bohác, para quem "Portugal deu demasiada importância às infra-estruturas, pelo que deverá existir um equilíbrio entre as várias áreas, como a educação, por exemplo".
Globalização
Adaptar-se a um mundo globalizado é, na opinião do embaixador irlandês, "um desafio importante para Portugal".
Periferia
Em relação com o ponto anterior, alguns parceiros destacam a condição periférica do território como factor de enriquecimento, mas também como obstáculo, por vezes, a sua afirmação. Sendo visto como "membro de pleno direito" há duas décadas, Portugal não deixa de ser classificado entre os "pequenos estados" da União.