12.2.09

Mais de dois mil casos de maus tratos em casa

Alexandra Marques, in Jornal de Notícias

APAV registou um aumento da violência entre próximos, incluindo os mais 2% de ocorrências entre pais e filhos


Dos 18.669 crimes denunciados à APAV, em 2008, 16.832 foram de violência doméstica: mais 2.298 do que no ano anterior. A maioria dos crimes ocorre sob o mesmo tecto e em cerca de 35% dos casos agressores não tinham cadastro.

No dia em que o Parlamento debate vários projectos-lei (PSD, CDS, PCP e BE ) e uma proposta do Governo, para fixar o regime jurídico na prevenção da violência doméstica e na assistência das vítimas, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) revela que houve mais 2298 vítimas do que em 2007. Para além das 32 mulheres assassinadas pelos cônjuges ou ex-companheiros só nos primeiros oito meses de 2008.

Os números mostram que 90% dos crimes registados pertencem ao crime de violência doméstica, 87% das vítimas são mulheres, mais de metade (51,6%) é casada, e vive com o marido e os filhos.

Os autores dos crimes são em mais de 85% homens, metade são casados (50%) e 46% tem emprego. Preocupante é que em 35% dos casos, "não apresentavam qualquer condenação anterior".

Este facto importa por poder ser usado como atenuante e ser tido em conta na aplicação, por parte do juiz, de uma medida de coacção menos gravosa.

O diploma governamental - que, aprovado na generalidade, será depois alterado em sede de comissão para resultar, daqui a meses, numa versão melhorada - prevê a aplicação de medidas de coacção urgentes (como a prisão preventiva) nas 48 horas seguintes à constituição de arguido.

A proposta de lei admite ainda que vítima e testemunhas não tenham de fazer depoimento presencial - para não se cruzarem com "o agressor" -, podendo recorrer à vídeo ou teleconferência.

O relatório estatístico da APAV mostra igualmente que os crimes praticados sob o mesmo tecto mantêm-se. A residência comum é (em 67,2% dos casos), o palco onde o crime é perpetrado.

A maioria das relações entre o autor e a vítima são de conjugalidade (entre casais) e constituem mais de metade da totalidade (55,3%). Mas as denúncias entre pais e filhos também têm aumentado em relação a 2007: foram mais 1,9%. Passaram de 15,5% para 17,4% das queixas totais.

Outro traço da violência doméstica é que prevalece anos a fio: é a chamada vitimação continuada que ocorre em cerca de 80% dos casos. A estatística sobre os processos abertos por este crime mostram que, em 2008, 667 mulheres confessaram ter sido violentadas pelos parceiros entre dois a três anos; 529 entre seis a dez anos e 405 foram vitimadas entre 11 e 15 anos.

Das 3554 queixas apresentadas junto das entidades competentes (PSP, GNR, Ministério Público, hospitais ou Institutos de Medicina Legal), 55,7% está a seguir o seu curso, mas houve 270 desistências (7,6%). Em relação aos processos nos 15 Gabinetes de Apoio à Vítima (GAV), aumentaram ligeiramente em Cascais e Lisboa e desceram, também muito pouco, no Porto.

Quem são as vítimas?

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima indica que a vítima-tipo de crimes é mulher, portuguesa, entre os 26 e os 45 anos, casada, com filhos, residente nas grandes cidades e que vive do próprio trabalho.

A caracterização consta do relatório anual estatístico da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), divulgado esta quinta-feira, onde foram reportados em 2008 18669 crimes, dos quais 90 % de violência doméstica.

Segundo a APAV, a tendência sobre o perfil das vítimas que aí recorreram manteve-se inalterável em relação ao género: 87,1 por cento das vítimas eram mulheres.

Em relação à idade, a faixa etária mais atingida, tal como em anos anteriores, mantém-se entre os 26 e os 45 anos de idade (33,1 por cento).

Contrariando um pouco a tendência do passado, além da prevalência dos europeus (83 por cento), as vítimas provenientes do continente africano deixaram de estar em segundo lugar na lista de origem.

Agora em primeiro lugar estão as vítimas do continente americano (3,3 por cento), destacando-se a comunidade brasileira (3,1%).

Quanto ao estado civil, mais de 47 por cento das vítimas era casada e pertence a uma família nuclear com filhos (52 por cento).

Aproximadamente 42 por cento das vítimas não tinha qualquer dependência e quando existe a mais significativa é a de fármacos (6,9 por cento).

As habilitações escolares das vítimas que procuraram a APAV em 2008 distribuem-se de forma bastante equitativa entre o primeiro ciclo e o ensino superior.

No entanto, este último apresenta valores ligeiramente acima dos restantes, com cerca de 09 por cento.

A situação económica da globalidade das vítimas é minimamente estável, uma vez que cerca de 40 por cento estavam empregadas, sendo o seu principal meio de vida o rendimento do próprio trabalho (38 por cento).

O número de desempregados ascendia a 16,6 por cento, de estudantes a 8,4 por cento e de reformados a 11,2 por cento.

As profissões mais citadas são as o grupo de trabalhadores não qualificados do comércio e dos serviços (7,9 por cento) e o pessoal dos serviços directos e particulares (7,5 por cento.

Paralelamente à existência das Unidades Orgânicas da APAV, os distritos de residência das vítimas são as cidades de Lisboa (33 por cento) e Porto (11 por cento), seguindo-se o distrito de Faro (10 por cento).

Quem são os autores de violência doméstica?

O perfil tipo dos autores de crimes é homem, entre os 26 e os 55 anos, casado, português e tem uma relação familiar com a vítima, segundo o relatório anual da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima.

Nas estatísticas sobre 7852 processos envolvendo crimes reportados em 2008 à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), concluiu-se ainda que o autor de crime vive do próprio trabalho e pratica crimes de violência doméstica de forma continuada.

Segundo a APAV, 85 por cento de quem pratica crime é do sexo masculino e 40 por cento tem entre 26 e 55 anos.

As diferenças entre a ausência de dependências e a dependência do consumo de álcool no ano passado é relativamente baixa, já que é de 22,2 por cento e 19,3 por cento, respectivamente.

Mais de metade são casados e, quanto ao seu continente de origem, a Europa lidera, com quase 75 por cento.

Os continentes africano e americano, representaram, no seu conjunto, cerca de 3,4 por cento.

O nível escolar é distribuído de forma transversal e relativamente equitativa entre o primeiro ciclo e o ensino superior, mas com este último a destacar-se com uma percentagem de 7,3.

A maioria (46 por cento) dos autores de crime estava empregada e apenas 12,6 por cento destes eram desempregados e sete por cento reformados.

Por grupos de profissões os operários, artífices e trabalhadores similares da indústria extractiva e da construção civil surgem em primeiro lugar (7 por cento), seguindo-se o pessoal dos serviços directos e particulares (5 por cento).

Tal como nos anos anteriores, mais de metade dos casos deu-se entre cônjuges ou companheiros.

Em 3,1 por cento dos casos os autores não tinham qualquer relação com a vítima e em cerca de 35 por cento das situações não apresentavam qualquer condenação anterior.