in Agência Ecclesia
Dossier da Agência ECCLESIA reflecte sobre a fome e apresenta as respostas de quem diariamente lida com a crescente pobreza que Portugal enfrenta
Podemos quantificar o número de pobres? Actualmente, quantas pessoas passam fome? Quantificar é quase impossível, mas sabemos – através dos dados fornecidos pelas estatísticas – que são muitos. Olhar para o pobre e esfomeado que nos rodeia faz-nos pensar e, acima de tudo, actuar.
No início da Quaresma, Bento XVI propõe – na sua mensagem para este tempo litúrgico três práticas penitenciais muito queridas à tradição bíblica e cristã: oração, esmola e jejum. E acrescenta: “o jejum ajuda-nos a tomar consciência da situação na qual vivem tantos irmãos nossos”.
Podemos perguntar que valor e que sentido tem para nós, “privar-nos de algo que seria em si bom e útil para o nosso sustento”. “As Sagradas Escrituras e toda a tradição cristã ensinam que o jejum é de grande ajuda para evitar o pecado e tudo o que a ele induz. Por isto, na história da salvação é frequente o convite a jejuar” – lê-se na Mensagem de Bento XVI.
Tanto em Portugal como no exterior, a situação social e económica é sombria. A maratona da pobreza começa em Viana do Castelo e termina em Faro. Ou melhor, viajamos pelo globo e encontramos uma quantidade de bocas a pedir um simples alimento.
Com a Quaresma à porta, revisitei o poeta Daniel Faria. “Depois das Queimadas as chuvas / Fazem as plantas vir à tona”... “A estrela nasce da raiz carbonizada / do caule queimado”. Será que a próxima Quarta-Feira de Cinzas mostrará ao cristão que a fome está no outro lado da rua? A sociedade contemporânea necessita de cinzas fertilizantes que sejam tónico para o nascimento da árvore justa e sem egoísmos.
Diariamente, a comunicação social traz-nos o lado negro da sociedade actual. Mostra-nos as lágrimas de milhares de pessoas e a fome que inunda os lares. A Igreja – através de vários sectores da pastoral – não abandona os pobres. O interesse activo dedicado pela Igreja à questão social, que tem como fim o “desenvolvimento autêntico do homem e da sociedade, por forma a respeitar e promover a pessoa humana em todas as suas dimensões, manifestou-se sempre das mais diversas maneiras” (Sollicitudo Rei Socialis).
As profundas desigualdades na distribuição da riqueza no mundo atingiram, actualmente, proporções verdadeiramente chocantes. Não são poucos os desequilíbrios económicos e sociais que ferem hoje a justiça e a humanidade e “erros gravíssimos ameaçam as actividades, os fins, as estruturas e o funcionamento do mundo económico” – alerta a encíclica «Mater et Magistra».
O número de pobres não pára de crescer. Para a agência da ONU, o dado mais preocupante é a tendência de que esse número aumente até 2015, quando os países menos desenvolvidos poderão passar a ter centenas de milhões de pessoas a viver abaixo da linha da pobreza.
O dossier deste número da Agência ECCLESIA centra-se na paisagem dantesca da fome. Basta percorrer as páginas do Compêndio da Doutrina Social da Igreja para encontrarmos pistas que ajudariam a eliminar o lado negro da sociedade. O amor tem diante de si um vasto campo de trabalho e a Igreja, nesse campo, quer estar presente também com a sua Doutrina Social, que diz respeito ao homem todo e se dirige a todos os homens.
“Como é possível que ainda haja, no nosso tempo, quem morra de fome, quem esteja condenado ao analfabetismo, quem viva privado dos cuidados médicos mais elementares, quem não tenha uma casa para abrigar-se?” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja (CDSI), nº 5) Depois de lançar a questão, o CDSI responde no nº 341: “Não praticar a usura, chaga que ainda nos nossos dias é uma realidade vil, capaz de aniquilar a vida de muitas pessoas”. As regras do comércio internacional também não beneficiam alguns países que ficam penalizados com tais cânones. Com o aumento da dívida externa desses países, os mais sacrificados são pobres.
Na sua mensagem da Quaresma, Bento XVI aconselha a prática do jejum como forma de cultivar o estilo do Bom Samaritano, que “se inclina e socorre o irmão que sofre”. E acrescenta: “Escolhendo livremente privar-nos de algo para ajudar os outros, mostramos concretamente que o próximo em dificuldade não nos é indiferente. Precisamente para manter viva esta atitude de acolhimento e de atenção para com os irmãos, encorajo as paróquias e todas as outras comunidades a intensificar na Quaresma a prática do jejum pessoal e comunitário, cultivando de igual modo a escuta da Palavra de Deus, a oração e a esmola”.


