18.9.09

Loja Solidária «Custo Zero» ajuda pobres

in Agência Ecclesia

Cáritas de Portalegre Castelo-Branco oferece roupa, alimentação, material escolar e mobiliário doado por empresas e particulares


A Cáritas de Portalegre-Castelo Branco inaugurou a 11 de Setembro a Loja Solidária «Custo Zero», complementando o auxílio que já prestava através da distribuição de roupas e outros bens às pessoas e famílias carenciadas.

“Foi mais uma inauguração simbólica, pois queríamos dar visibilidade a um espaço apropriado, com a roupa exposta como no comércio normal, em que as pessoas vêem e experimentam”, referiu o presidente da Cáritas da Diocese, Elicídio Bilé, em entrevista à Agência ECCLESIA.

A abertura ocorre “num momento em que as famílias portuguesas estão a passar por esta crise, que as está a afectar no plano material e psicológico. As pessoas andam definhadas, deprimidas e perderam um pouco a esperança”, considera o responsável.

Pobres de agora e de sempre

“Temos pobres que sempre o foram e sempre o serão: são pessoas sem emprego e com pouca escolaridade”, explica Elicídio Bilé.

Mas hoje existem “novas formas de pobreza envergonhada”, caracterizada por “pessoas que, há um ano, tinham rendimentos que cobriam as necessidades do dia-a-dia, mas que estão agora numa situação que dói, pois têm dificuldade em assumir a condição de pobres.”

As consequências da crise começam por se fazer sentir na impossibilidade de adquirir bens de primeira necessidade, mas não é invulgar que contribuam para criar instabilidade familiar e até desfazer uniões. O presidente da Cáritas Diocesana dá o exemplo de um casal que perdeu o emprego: depois de os rendimentos diminuírem substancialmente, começaram os episódios de violência doméstica, que terminaram no divórcio. Nem o pai nem a mãe têm condições económicas para criar os filhos, que foram entregues aos avós e aos tios. “É muito difícil olhar para uma família nestas condições”, diz Elicídio Bilé.

O responsável traça um retrato sombrio da região de Portalegre: “Esta crise veio acentuar as dificuldades que já existiam: a agricultura foi-se perdendo e encerraram as indústrias tradicionais que eram a base da economia local, nomeadamente os lanifícios e a cortiça.”

Os sectores primário e secundário estão fragilizados. A taxa de desemprego é superior à média nacional, pelo que os jovens saem da região para procurar trabalho. Por outro lado, a localização junto à fronteira torna mais notórias as “grandes” assimetrias entre Portugal e Espanha.

Quando termina o subsídio de desemprego, “começam a sentir-se as reais necessidades das pessoas, que estão completamente desprotegidas”. “A situação é, de facto, muito aguda”, refere o responsável.

O director da Cáritas Diocesana não esquece as iniciativas estatais, mas não deposita grandes esperanças nos seus efeitos: “A formação profissional seria uma alternativa, mas não consegue dar resposta a todas as situações de carência económica. Quanto ao programa «Novas Oportunidades», concede equivalências académicas, mas pode não dar capacidades para obter trabalho”.

Vestuário, material escolar e mobiliário

O recheio da Loja Solidária foi constituído a partir das existências de uma boutique, que, ao encerrar a actividade, doou todas as suas roupas de homem, senhora e criança. “Era uma pena não valorizarmos esses bens com um espaço apropriado”, referiu Elicídio Bilé.

O «Custo Zero» também disponibiliza material escolar, cedido por livrarias e papelarias. “As crianças são muito sensíveis à publicidade e vão atrás dos cadernos que têm na capa personagens populares; quando as lojas já não têm o que está na moda, os pais fazem a vontade aos filhos e não compram o que está disponível; por isso o comércio fica com artigos que são bons mas que não se vendem”. Há também atoalhados, roupas de cama, cobertores, lençóis e almofadas. À excepção de algum mobiliário, os bens oferecidos são novos.

O espaço contém igualmente géneros alimentares para situações de emergência, complementando as entregas realizadas pela Cáritas, em conjunto com o Banco Alimentar Contra a Fome.

A Loja Solidária apoia a comunidade local e a população da região. “Como a qualidade e a quantidade de roupa que temos é muito grande, podemos apoiar os grupos que, na diocese, se dedicam à sinalização das famílias que estão em situação de carência. Portanto, é uma partilha generalizada”, afirma Elicídio Bilé.

Justiça na caridade

O acesso à Loja Solidária pode ser directo, ou através do encaminhamento pelos grupos da Cáritas e instituições diocesanas.

Para evitar aproveitamentos, o agregado familiar deve apresentar os documentos que comprovem a situação de carência. O regulamento da loja estipula também que cada beneficiário poderá usufruir trimestralmente de dois artigos do mesmo tipo, até um limite máximo de cinco a sete peças, independentemente da natureza das mesmas.

A fim de evitar o excesso da oferta no espaço da Cáritas e na «Loja Social» que a Câmara Municipal de Portalegre vai abrir brevemente, foi determinado que as duas instituições disponibilizariam bens diferentes.

Assistencialismo e libertação

Durante a inauguração da Loja Solidária, o Bispo de Portalegre-Castelo Branco sublinhou que a Cáritas deve seguir não só a via do assistencialismo, mas também a da libertação. Elicídio Bilé concorda com esta perspectiva: “D. Antonino Dias tem uma visão integrada da Pastoral e insere as questões sociais no contexto do todo, o que é muito importante”.

A acção desenvolvida procura dar resposta às emergências, e, num segundo momento, promove a autonomia dos carenciados. Apesar desta dupla vertente, a instituição continua a ter uma imagem redutora: “A Cáritas é, ainda hoje, um serviço da Igreja com algum estigma atrás de si. Quando foi criada, o seu objectivo era meramente assistencialista. Desde os anos 70 [do século XX] até agora, essa ideia ainda se mantém”, explica Elicídio Bilé. “A Cáritas procura ir ao cerne dos problemas: as situações de emergência têm que ter uma resposta; e depois há as questões da promoção, inserção e inclusão, com as quais ajudamos as pessoas a construir um projecto de vida”, acrescenta.

A divulgação do microcrédito tem sido uma das apostas da instituição: “Desde que tenham planos para um negócio, os jovens podem criar uma actividade, recorrendo a um pequeno financiamento bancário. A região tem falta de profissionais especializados, por exemplo na área da construção civil. Há tantas coisas que podem ser feitas... Basta que haja ideias”. A Cáritas ajuda a construir o projecto, encaminha-o para a Associação Nacional de Direito ao Crédito e, no caso de ser aprovado, acompanha a sua realização.

Esta iniciativa não seria viável sem a colaboração de organismos públicos e privados. As empresas têm vantagens não só a nível fiscal, mas também através da notoriedade adquirida com a acção social. O director da Cáritas de Portalegre-Castelo Branco considera que estas parcerias são muito importantes porque “a soma dos pequenos contributos que cada um pode dar tem resultados muito mais justos, válidos e eficazes”.