15.4.10

Dificuldades em arranjar colocação

Por Luísa Pinto, in Jornal Público

Confrontados com lugares mal pagos, ou postos já preenchidos, muitos desesperam. Mas há quem diga que há males que vêm por bem


À saída do Centro de Emprego do Porto, António Silva (nome fictício), 48 anos, desempregado desde Setembro de 2008, está com ar de missão cumprida. Desta vez, só vinha pedir uma declaração para entregar no centro de saúde, para que o filho possa beneficiar da isenção de taxas moderadoras. Era o objectivo que tinha para aquele dia, ele que garante que todos os dias, de manhã, precisa de sair de casa "para fazer alguma coisa".

António parece ter quase a certeza de que, até Outubro de 2011, altura em que terminará o seu direito a subsídio, as suas ocupações serão deste género... rápidas, casuísticas. A não ser que o centro de emprego o convoque para mais sessões de esclarecimento. De formação, já teve. E até aproveitou para terminar o 9.º ano, completando a escolaridade obrigatória que havia interrompido ao sétimo ano. Arranjar emprego até lá é que já não acredita, porque não pretende aceitar propostas em que ficaria a receber de salário menos do que aufere de subsídio. "Estou a receber 700 euros. E o que tem aparecido é para ganhar 400... Não faz sentido", explica. António Silva diz que é preciso fazer contas, e que ele as faz, até porque tem muitas para pagar. "Ainda se o Estado cobrisse os 300 euros em falta, eu iria trabalhar de bom grado...", insiste.

Sobre a possibilidade de haver alterações em resultado das medidas anunciadas no Pacto de Estabilidade e Crescimento - de impor um tecto às prestações sociais - parece que ainda ninguém ouviu falar. Fernando Monteiro diz que sabe dessa hipótese pelos jornais, mas garante que nunca ninguém lhe falou de nada no centro de emprego, onde está inscrito há já mais de dois anos. "Ainda nem o Governo sabe muito bem o que fazer, que fará esta gente...", conta. Com 48 anos, Fernando Monteiro espera que tenha sido esta a última das romagens àquele centro, e aos muitos outros locais onde foi convocado para assistir a palestras sobre oportunidades de trabalho ou acções de formação ("sobre como escrever um currículo, e outras chachadas que tais"). A partir da próxima semana espera já estar a trabalhar numa empresa sueca radicada em Portugal, e retomar a vida laboral que interrompeu em Julho de 2007. "Mas quem arranjou o trabalho fui eu. Destes senhoras nem uma única proposta de emprego me foi sugerida, nunca!"

Monteiro diz que nunca lhe fizeram uma única proposta, mas também nunca lhe pediram para fazer prova de que estava activamente a procurar colocação. "Isso é outra fantochada." Pedinchar carimbos, ou forjar cartas ao computador... Qualquer um o faz, não serve de nada", insiste. Monteiro era gerente comercial numa empresa em Beja e, garante, ter sido empurrado para "o mundo dos centros de emprego" foi algo que o deixou perturbado. "Não é fácil andar por aqui", sustenta. Antes de Fernando Monteiro, havia saído do centro de emprego uma mulher com cerca de 30 anos: "Peço-lhe desculpa, mas não queria falar sobre este tema. É desesperante."

Maria do Carmo Vilares já passou a fase do desespero. Agora está na fase da ansiedade, na expectativa de saber se lhe aceitam a pré-reforma. Tem 58 anos e uma válvula artificial no coração. Era cozinheira num infantário que fechou há já três anos. "A operação [ao coração] deitou-me abaixo. Lá vou andando, a mostrar os carimbos. Mas até agora nada", conta. No centro de emprego ainda lhe arranjaram duas propostas, para uma cozinha de uma escola, primeiro, e de um hotel, depois. "Mas, cheguei lá e disseram-me que já tinham o lugar ocupado", conta.

Artur Macedo, 28 anos, diz que o facto de a empresa em que trabalhava ter optado por "renovar o stock de pessoal", e não o ter tornado colaborador efectivo quando terminou os três anos de contrato, poderá trazer-lhe a oportunidade de completar a escolaridade obrigatória e de tirar um curso especializado. Inscrito há apenas dois meses, Artur vai agora começar a pôr em prática o plano pessoal de emprego que lhe foi apresentado. "Vou procurar, mostrar carimbos à Junta. Enquanto estiver em formação, para além do subsídio de desemprego recebo um subsídio para alimentação e transportes, e há ainda a possibilidade de me darem uma bolsa para ajudar a pagar a creche do meu filho..." Feitas as contas, não perderá muito poder de compra, e vai aumentar a escolaridade. "Há males que vêm por bem."