18.5.11

A pesada herança da desqualificação

Opinião, in Diário de Notícias

A educação dos portugueses há muitas décadas que vai avançando com grandes atrasos em relação ao mundo à sua volta. A República fez dela uma bandeira mas, nas décadas seguintes, para a vasta maioria da população, a opção era entre o analfabetismo e a 4.ª classe. No Estado Novo desconfiava-se do saber: nos anos 50, ouvia-se dizer da boca de um governante que bastava saber ler e escrever o nome e realizar as quatro operações básicas da aritmética. Mais do que isso, seria demasiado já que o saber a mais produzia a infelicidade de um povo.

Nos últimos 37 anos, já em democracia, o País deu um grande salto em frente na escolarização da população. Às gerações mais novas foram sendo apresentados desafios cada vez mais dilatados: seis, nove e, agora, doze anos de escolarização obrigatória. Mesmo assim, o abandono escolar ainda atinge três em cada dez jovens e, no seu conjunto, a escolarização média da população portuguesa regista cerca de oito anos, enquanto o valor correspondente na Europa mais avançada ultrapassa os doze anos de escolarização.

A bela notícia de um cidadão de 77 anos se ter licenciado no Instituto Politécnico em Viana do Castelo é o espelho do que atrás foi dito: perante a regra do antigamente - a ignorância -, mais de 1,5 milhões de concidadãos inscreveram-se para voltar à escola, para saber mais. Hoje, esse programa é alvo de forte polémica em tempo de luta eleitoral. Mas todos os partidos inscrevem nos programas a reentrada dos adultos no sistema escolar, com o fim de melhorar conhecimentos e qualificações. Poder-se-á sempre discutir as melhores vias de o fazer para alcançar bons resultados, para cada um e para o País. Mas, polémicas eleitorais à parte, é extremamente positivo que os partidos, da direita à esquerda, defendam a necessidade de promover a qualificação da população activa, sem a qual a recuperação do atraso histórico neste campo se afigura infindável. Ora tempo é o que os portugueses menos têm em abundância para melhorar o desempenho produtivo.

A Rainha na Irlanda

Durante séculos, os monarcas ingleses reinaram sobre a Irlanda. Foram tempos que ficaram gravados na memória dos irlandeses como de opressão. A língua inglesa foi imposta como substituta do gaélico, e o protestantismo oficial em Londres tudo fez para reduzir a influência católica na ilha. Em meados do século XIX, a denominada "Fome da Batata" desferiu mais um golpe à popularidade da coroa britânica, incapaz de acudir aos seus súbditos que, aos milhares, se viram obrigados a emigrar para não morrer. E em 1916, em plena Primeira Guerra Mundial, a "Revolta da Páscoa" foi afogada em sangue pelas tropas britânicas, que viram como traição o apelo de alguns círculos rebeldes irlandeses a uma intervenção alemã . A independência chegou por fim em 1922, com o nascimento do Estado Livre da Irlanda.

A maioria protestante na Irlanda do Norte, leal à coroa, forçou, porém, uma partição da ilha, dominando assim o Ulster. E os republicanos irlandeses viram adiado até hoje o seu sonho de um só país. Tratados como cidadãos de segunda classe, os católicos norte-irlandeses revoltaram-se mais tarde e uma ala radical criou o IRA, que pelo terrorismo tentou forçar o Reino Unido a retirar as suas tropas do Ulster. Só os Acordos da Sexta-Feira Santa de 1998 conseguiram pacificar o território, com o IRA então a desistir da luta armada.

Mesmo assim, foram precisos mais 13 anos para um monarca inglês pisar pela primeira vez o solo da Irlanda independente. Isabel II teve a coragem de fazer uma visita histórica, que facilitará a normalização das relações entre os dois países. Afinal, existe muito em comum entre ambos os povos. E as afinidades de hoje, e de ontem, têm força suficiente para se impor sobre as razões de queixa.