3.5.22

Não vão faltar alimentos na Europa - pelo menos por causa da guerra

Tiago Luís, opinião, in Expresso

Áreas anteriormente vedadas à prática agrícola e que têm sido importantes para a natureza e biodiversidade já receberam autorizações para a produção agrícola. Tiago Luís, técnico de Ciências do Ambiente e especialista em Alimentação na Associação Natureza Portugal/World Wild Fund, analisa a questão alimentar neste artigo de opinião

Ao longo das últimas semanas, um pouco por toda a Europa e inclusive em Portugal, algumas confederações e organizações do setor agrícola, a par com algumas personalidades, têm vindo a manifestar publicamente as suas preocupações quanto ao desafio que paira sobre a segurança alimentar da UE, defendendo medidas urgentes a curto e médio prazo. Os argumentos usados para justificar incumprimentos ambientais não são novos, apresentando os compromissos ambientais como um entrave, não ao desenvolvimento económico, mas à mitigação da crise económica e social que já enfrentamos.

Ao longo das últimas semanas, um pouco por toda a Europa e inclusive em Portugal, algumas confederações e organizações do setor agrícola, a par com algumas personalidades, têm vindo a manifestar publicamente as suas preocupações quanto ao desafio que paira sobre a segurança alimentar da UE, defendendo medidas urgentes a curto e médio prazo. Os argumentos usados para justificar incumprimentos ambientais não são novos, apresentando os compromissos ambientais como um entrave, não ao desenvolvimento económico, mas à mitigação da crise económica e social que já enfrentamos.

Acima de tudo, estas preocupações têm-se manifestado através de pressões sobre os governos europeus para diluir as respetivas metas ambientais e climáticas assumidas em vários instrumentos comunitários (como a Estratégia Do Prado Ao Prato e a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, resultantes do Pacto Ecológico Europeu) e nacionais (Planos Estratégicos da Política Agrícola Comum) no que diz respeito ao setor agro-alimentar - servindo os interesses de parte do setor e falhando aos consumidores e aos pequenos agricultores.

Esta narrativa começa a ter efeitos práticos: foram já concedidas a vários países, entre os quais Portugal, autorizações para utilização de áreas importantes para a natureza e biodiversidade para produção agrícola (anteriormente vedadas à prática agrícola). Simultaneamente, o apelo que tem sido feito para a não integração das metas do Pacto Ecológico Europeu (PEE) no âmbito dos Planos Estratégicos da PAC (PEPAC), se bem-sucedido, significará, por exemplo, o recuo do compromisso do setor agro-alimentar para aumentar a produção biológica de alimentos em 25% ou a redução do uso de pesticidas até 50%. O adiamento da Lei do Restauro da Natureza da UE e da Diretiva Quadro do Uso Sustentável dos Pesticidas são também já consequência das pressões que se fazem sentir.

Importa então desmistificar 4 ideias que vamos ouvir ser repetidas à exaustão, mas que não serão mais verdadeiras por isso:

1. “A guerra coloca em causa a nossa segurança alimentar”.

Ao contrário do que esta ideia parece sugerir, os cereais que importamos dos países envolvidos no conflito servem em boa parte para produção de rações animais ou biocombustíveis - ⅔ dos cereais importados têm como destino a alimentação de gado. Precisamente uma das potenciais causas de insegurança alimentar dos europeus é o excesso de consumo de alimentos de origem animal - além dos problemas de saúde e ambientais sobejamente conhecidos.

Ao longo das últimas semanas, um pouco por toda a Europa e inclusive em Portugal, algumas confederações e organizações do setor agrícola, a par com algumas personalidades, têm vindo a manifestar publicamente as suas preocupações quanto ao desafio que paira sobre a segurança alimentar da UE, defendendo medidas urgentes a curto e médio prazo. Os argumentos usados para justificar incumprimentos ambientais não são novos, apresentando os compromissos ambientais como um entrave, não ao desenvolvimento económico, mas à mitigação da crise económica e social que já enfrentamos.

Acima de tudo, estas preocupações têm-se manifestado através de pressões sobre os governos europeus para diluir as respetivas metas ambientais e climáticas assumidas em vários instrumentos comunitários (como a Estratégia Do Prado Ao Prato e a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, resultantes do Pacto Ecológico Europeu) e nacionais (Planos Estratégicos da Política Agrícola Comum) no que diz respeito ao setor agro-alimentar - servindo os interesses de parte do setor e falhando aos consumidores e aos pequenos agricultores.

Esta narrativa começa a ter efeitos práticos: foram já concedidas a vários países, entre os quais Portugal, autorizações para utilização de áreas importantes para a natureza e biodiversidade para produção agrícola (anteriormente vedadas à prática agrícola). Simultaneamente, o apelo que tem sido feito para a não integração das metas do Pacto Ecológico Europeu (PEE) no âmbito dos Planos Estratégicos da PAC (PEPAC), se bem-sucedido, significará, por exemplo, o recuo do compromisso do setor agro-alimentar para aumentar a produção biológica de alimentos em 25% ou a redução do uso de pesticidas até 50%. O adiamento da Lei do Restauro da Natureza da UE e da Diretiva Quadro do Uso Sustentável dos Pesticidas são também já consequência das pressões que se fazem sentir.

Importa então desmistificar 4 ideias que vamos ouvir ser repetidas à exaustão, mas que não serão mais verdadeiras por isso:

1. “A guerra coloca em causa a nossa segurança alimentar”.

Ao contrário do que esta ideia parece sugerir, os cereais que importamos dos países envolvidos no conflito servem em boa parte para produção de rações animais ou biocombustíveis - ⅔ dos cereais importados têm como destino a alimentação de gado. Precisamente uma das potenciais causas de insegurança alimentar dos europeus é o excesso de consumo de alimentos de origem animal - além dos problemas de saúde e ambientais sobejamente conhecidos.

Na verdade, uma das formas de tornar o nosso sistema alimentar mais autónomo, resiliente e sustentável, salvaguardando também a saúde dos europeus, seria através da redução do consumo de alimentos de origem animal e do incentivo a formas de produção animal menos dependentes de rações e fertilizantes.

2. “As alterações climáticas não podem ser uma prioridade.”

Os enormes desafios ambientais que enfrentamos não começaram com este conflito, e os seus efeitos não só são duradouros como não ficarão suspensos a aguardar a resolução dos desafios que, entretanto, surgem. Antes pelo contrário: quanto mais tempo demorarmos a agir para reduzir as emissões de gases de efeito de estufa, mais depressa se agravarão estes efeitos, colocando em risco as oportunidades para os resolver. O último relatório do IPCC é um alerta para o facto de os riscos serem superiores ao que estava inicialmente previsto, com alguns efeitos negativos a ocorrerem a níveis de aquecimento global mais baixos do que se previa. Uma das conclusões preocupantes do relatório é que com as alterações climáticas se torna cada vez mais difícil satisfazermos as necessidades humanas de calorias e proteínas, estando previstas perdas não só de produtividade mas também dos nutrientes presentes num vasto grupo de plantas .

Assim, é importante (e urgente) repensar o PEPAC para que este possa contribuir positivamente para a promoção da biodiversidade, a mitigação e adaptação às alterações climáticas e para o bom estado dos recursos água e solo, assim como o desenvolvimento das comunidades rurais de forma inclusiva.

3. “São necessárias medidas excepcionais, devido às circunstâncias”.

Todos os argumentos parecem ser bons para não cumprir os compromissos ambientais firmados pela Comissão Europeia. Durante o período de negociações do PEPAC, à semelhança do que aconteceu anteriormente noutras reformas da Política Agrícola Comum, muitas foram as pressões e cedências às tentativas de enfraquecimento dos objetivos e metas ambientais e climáticas deste plano. De referir que as ONGAs, a sociedade civil, e as autoridades ambientais nacionais foram completamente ignoradas no processo de construção deste PEPAC - e tememos que este registo persista no futuro. Uma parte importante do financiamento da Rede Natura 2000 provém da PAC, e se as medidas para aplicar este dinheiro forem desenhadas sem o envolvimento do ICNF (responsável pela Rede Natura 2000), dificilmente irão cumprir a sua função.

Ao longo das últimas semanas, um pouco por toda a Europa e inclusive em Portugal, algumas confederações e organizações do setor agrícola, a par com algumas personalidades, têm vindo a manifestar publicamente as suas preocupações quanto ao desafio que paira sobre a segurança alimentar da UE, defendendo medidas urgentes a curto e médio prazo. Os argumentos usados para justificar incumprimentos ambientais não são novos, apresentando os compromissos ambientais como um entrave, não ao desenvolvimento económico, mas à mitigação da crise económica e social que já enfrentamos.

Acima de tudo, estas preocupações têm-se manifestado através de pressões sobre os governos europeus para diluir as respetivas metas ambientais e climáticas assumidas em vários instrumentos comunitários (como a Estratégia Do Prado Ao Prato e a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, resultantes do Pacto Ecológico Europeu) e nacionais (Planos Estratégicos da Política Agrícola Comum) no que diz respeito ao setor agro-alimentar - servindo os interesses de parte do setor e falhando aos consumidores e aos pequenos agricultores.

Esta narrativa começa a ter efeitos práticos: foram já concedidas a vários países, entre os quais Portugal, autorizações para utilização de áreas importantes para a natureza e biodiversidade para produção agrícola (anteriormente vedadas à prática agrícola). Simultaneamente, o apelo que tem sido feito para a não integração das metas do Pacto Ecológico Europeu (PEE) no âmbito dos Planos Estratégicos da PAC (PEPAC), se bem-sucedido, significará, por exemplo, o recuo do compromisso do setor agro-alimentar para aumentar a produção biológica de alimentos em 25% ou a redução do uso de pesticidas até 50%. O adiamento da Lei do Restauro da Natureza da UE e da Diretiva Quadro do Uso Sustentável dos Pesticidas são também já consequência das pressões que se fazem sentir.

Importa então desmistificar 4 ideias que vamos ouvir ser repetidas à exaustão, mas que não serão mais verdadeiras por isso:

1. “A guerra coloca em causa a nossa segurança alimentar”.

Ao contrário do que esta ideia parece sugerir, os cereais que importamos dos países envolvidos no conflito servem em boa parte para produção de rações animais ou biocombustíveis - ⅔ dos cereais importados têm como destino a alimentação de gado. Precisamente uma das potenciais causas de insegurança alimentar dos europeus é o excesso de consumo de alimentos de origem animal - além dos problemas de saúde e ambientais sobejamente conhecidos.

Na verdade, uma das formas de tornar o nosso sistema alimentar mais autónomo, resiliente e sustentável, salvaguardando também a saúde dos europeus, seria através da redução do consumo de alimentos de origem animal e do incentivo a formas de produção animal menos dependentes de rações e fertilizantes.

2. “As alterações climáticas não podem ser uma prioridade.”

Os enormes desafios ambientais que enfrentamos não começaram com este conflito, e os seus efeitos não só são duradouros como não ficarão suspensos a aguardar a resolução dos desafios que, entretanto, surgem. Antes pelo contrário: quanto mais tempo demorarmos a agir para reduzir as emissões de gases de efeito de estufa, mais depressa se agravarão estes efeitos, colocando em risco as oportunidades para os resolver. O último relatório do IPCC é um alerta para o facto de os riscos serem superiores ao que estava inicialmente previsto, com alguns efeitos negativos a ocorrerem a níveis de aquecimento global mais baixos do que se previa. Uma das conclusões preocupantes do relatório é que com as alterações climáticas se torna cada vez mais difícil satisfazermos as necessidades humanas de calorias e proteínas, estando previstas perdas não só de produtividade mas também dos nutrientes presentes num vasto grupo de plantas .

Assim, é importante (e urgente) repensar o PEPAC para que este possa contribuir positivamente para a promoção da biodiversidade, a mitigação e adaptação às alterações climáticas e para o bom estado dos recursos água e solo, assim como o desenvolvimento das comunidades rurais de forma inclusiva.

3. “São necessárias medidas excepcionais, devido às circunstâncias”.

Todos os argumentos parecem ser bons para não cumprir os compromissos ambientais firmados pela Comissão Europeia. Durante o período de negociações do PEPAC, à semelhança do que aconteceu anteriormente noutras reformas da Política Agrícola Comum, muitas foram as pressões e cedências às tentativas de enfraquecimento dos objetivos e metas ambientais e climáticas deste plano. De referir que as ONGAs, a sociedade civil, e as autoridades ambientais nacionais foram completamente ignoradas no processo de construção deste PEPAC - e tememos que este registo persista no futuro. Uma parte importante do financiamento da Rede Natura 2000 provém da PAC, e se as medidas para aplicar este dinheiro forem desenhadas sem o envolvimento do ICNF (responsável pela Rede Natura 2000), dificilmente irão cumprir a sua função.


4. “O adiamento das metas do Pacto Ecológico Europeu é absolutamente necessário”.

Maria do Céu Antunes, então Ministra da Agricultura, defendeu em março no Conselho de Agricultura e Pescas o adiamento do cumprimento das metas do PEE para um futuro incerto mas decidiu, no mesmo dia, apoiar a proposta da Áustria de incentivar o potencial das proteínas vegetais em linha com os objetivos do mesmo PEE. Contudo, esta proposta não se refere explicitamente ao consumo humano destas proteínas, o que poderá significar que esta visa apenas o incentivo da utilização para produção de rações e não para contribuir para uma dieta mais saudável e sustentável dos europeus e consequentemente, contribuir para uma maior resiliência a choques futuros. O cumprimento do PEE é absolutamente necessário, nomeadamente da sua Estratégia Do Prado Ao Prato, começando pela promoção do aumento da disponibilidade de alternativas proteicas vegetais para consumo humano.

A produção agroalimentar tem contribuído para a crise ambiental que vivemos: globalmente, a forma como nos alimentamos é responsável por 80% da desflorestação, 70% do uso de água doce, cerca de 30% de emissão de Gases de Efeito Estufa, degradação de 52% das terras agrícolas e 70% da perda de biodiversidade terrestre. Negá-lo é recusar a realidade e tem um efeito pouco útil na medida em que não resolve nenhum destes problemas e não reconhece o enorme potencial que a produção agroalimentar tem para impactar positivamente a nossa saúde e a do nosso planeta desde que se opere uma transformação do sistema de produção virada para as pessoas e para o planeta. Sobre este ponto, a comunidade científica tem sido clara sobre a necessidade de assegurar alimentos suficientes para a população mundial, e simultaneamente transformar a forma como produzimos e consumimos estes alimentos - a degradação da natureza e do clima afetam diretamente a nossa capacidade de produção alimentar já que os efeitos combinados da perda de biodiversidade e do aquecimento global reduzam o rendimento das culturas e a densidade nutricional.

Assim, mais importante do que disseminar ideias nem sempre rigorosas sobre a eventual escassez de alimentos, é urgente repensarmos as nossas prioridades - será que queremos (mais uma vez) colocar em causa a resiliência dos nossos sistemas alimentares a médio-longo prazo e contribuir para a destruição da natureza? Não estaremos a ignorar o facto de, pelo menos em parte, estas perturbações do mercado serem consequência da falta dessa mesma resiliência? A construção e defesa de um sistema alimentar resiliente e que respeita os limites do nosso planeta deve ser a prioridade de todos, agora e no futuro.