27.3.23

Padre afastado pela diocese de Lisboa demitiu-se de escola de música nesse mesmo dia

Patrícia Carvalho, in Público

Academia de Música de Santa Cecília aceitou o pedido de demissão, mas frisa que nunca recebeu qualquer “acusação ou indício” de comportamento menos próprio do sacerdote

Um dos quatro padres no activo que a Diocese de Lisboa decidiu afastar do exercício público do ministério no passado dia 21 de Março, por o seu nome constar da lista de alegados abusadores de menores entregue pela comissão independente que investigou estes casos, demitiu-se do cargo de assistente religioso que exercia numa escola de Lisboa nesse mesmo dia. Em comunicado, o conselho administrativo da Academia de Música de Santa Cecília confirma ter recebido o pedido de demissão e que decidiu “prontamente” aceitá-lo, frisando que “nunca tomou conhecimento de qualquer acusação ou indício” imputados ao clérigo.

A notícia da demissão do padre, suspenso das funções de pároco nas paróquias de Malveira e Venda do Pinheiro, pelo cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, foi avançada pela SIC, na noite de domingo, e confirmada ao PÚBLICO pela Academia de Música de Santa Cecília, em comunicado.

No documento, o conselho administrativo da escola refere que o pedido de demissão “fundamentou-se na inclusão do nome deste sacerdote na lista de denúncias compilada no relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, e na decisão do Patriarcado de Lisboa [...] de suspender de imediato os sacerdotes incluídos naquela lista.”

Apesar de garantir desconhecer qualquer “acusação ou indício” de que o padre “não tenha, ao longo dos anos da sua ligação com a escola, desempenhado as suas funções com a maior dignidade sacerdotal”, o conselho directivo decidiu aceitar o pedido de demissão, em reunião realizada a 22 de Março. Em causa, refere-se no comunicado, está a “salvaguarda inequívoca da imagem da Academia de Música de Santa Cecília, e do código intransigente de princípios de humanismo cristão que sempre a norteou na educação e formação integral dos seus alunos”. Isto sem pôr em causa o “legítimo direito de defesa que assiste face a qualquer acusação e da presunção de inocência que deve prevalecer até ao trânsito em julgado do respectivo processo”, refere-se.

Doze padres suspensos

A lista entregue à Diocese de Lisboa pela comissão que foi presidida por Pedro Strecht continha 24 nomes de alegados abusadores, cuja referência por parte das vítimas fora validada pelos membros da comissão independente. Destes, quatro referiam-se a sacerdotes ainda no activo, que a diocese decidiu suspender preventivamente, enquanto decorrem as respectivas averiguações. Um outro, também no activo, “já tinha sido sujeito a medidas cautelares”, indicou o patriarca de Lisboa no comunicado emitido no passado dia 21, sobre esta matéria. Dos restantes nomes, oito eram de padres já falecidos, dois de sacerdotes “doentes e retirados”, três de padres “sem qualquer nomeação”, um de um padre que abandonou entretanto o sacerdócio, um outro de um leigo e os restantes quatro eram de pessoas que a diocese diz desconhecer.

No momento em que anunciou a suspensão dos quatro padres no activo, D. Manuel Clemente frisou, em comunicado, que “não existe uma acusação formal a nenhum destes sacerdotes” e que todos os visados “solicitaram a rápida busca da verdade e da justiça, abrindo-se agora a investigação prévia de cada um dos casos, que posteriormente será enviada ao Dicastério para a Doutrina da Fé”.

Dois dias depois da decisão de afastamento ter sido divulgada, um dos padres visados, que é pároco de São Nicolau e da Madalena, em Lisboa, líder espiritual do líder do Chega, André Ventura, e seguidor da linha mais conservadora da Igreja, escreveu uma carta aos paroquianos classificando a acusação de que foi alvo como “totalmente falsa, caluniosa, sem qualquer elemento útil ou prestável para a investigação”.

Desde que a comissão independente entregou às dioceses portuguesas a lista com mais de cem nomes de alegados abusadores, foram suspensos preventivamente 12 padres. Além dos quatro padres de Lisboa foram afastados três no Porto, dois em Angra do Heroísmo, nos Açores, um em Braga, outro em Évora e um outro na Guarda. A diocese de Leiria-Fátima dispensou de funções um leigo que constava também da lista de suspeitos e o Corpo Nacional de Escutas indicou ter suspendido uma pessoa, enquanto decorre um processo interno de averiguações.