31.3.23

Crimes em contexto escolar atingem valor mais alto dos últimos seis anos

Mariana Oliveira, in Público online

Relatório de segurança interna de 2022 contabiliza 4634 ocorrências de natureza criminal no âmbito do programa Escola Segura no ano lectivo 2021/22. Dois terços são agressões, insultos ou ameaças

Foram contabilizadas no ano lectivo passado 4634 ocorrências de natureza criminal em ambiente escolar, o número mais elevado dos últimos seis anos. Isso mesmo revela o Relatório Anual de Segurança Interna relativo a 2022 que vai ser entregue esta sexta-feira na Assembleia da República.

Os dados a que o PÚBLICO teve acesso dão conta que, no ano lectivo que começou em Setembro de 2021 e terminou em Junho passado, foram registadas no âmbito dos programas Escola Segura um total de 6607 ocorrências. Destas, 70% são de natureza criminal, com destaque para as agressões, os insultos e as ameaças. Estas categorias representam dois terços do total.

Em 2022, como mostram dados divulgados ao longo desta semana, as autoridades receberam 343.845 participações criminais, mais 14% do que no ano anterior. Também a criminalidade violenta e grave cresceu na mesma proporção, registando um total de 13.281 ilícitos, mais 1.667 do que em 2021. Comparados com o período pré-pandemia, ou seja, com os dados de 2019, a criminalidade geral cresceu 2,4%. No entanto, os crimes graves e violentos registados desceram 7,7%.

Com 1687 ocorrências, a delinquência juvenil aumentou 51% o ano passado face a 2021 e 7,6% relativamente a 2019, apresentando o valor mais alto dos últimos sete anos. Estes números dizem respeito a factos qualificados como crimes mas cometidos por jovens entre os 12 e os 16 anos, idade a partir da qual se pode ser responsabilizado por um ilícito criminal. Também a criminalidade grupal cresceu em 2022 (18%) relativamente ao ano anterior, contabilizando 5895 ocorrências, ou seja, mais 11,5% do que as registadas em 2019.



Regressando às ocorrências em contexto escolar verifica-se que as de natureza criminal cresceram 93% no ano lectivo passado face ao anterior, uma subida acentuada que se explica, em parte, porque nos anos lectivos de 2020/21 e 2019/20 este tipo de incidentes desceram consideravelmente. Tudo indica que tal está associado aos longos períodos em que as escolas estiveram fechadas devido à pandemia de covid-19 e às regras apertadas que vigoraram mesmo quando os estabelecimentos de ensino estiveram a funcionar.



Mesmo assim as ocorrências criminais registadas no ano lectivo passado representam uma subida de 41% face às verificadas no de 2018/2019 (3293), antes do aparecimento do novo coronavírus. A diferença vai-se esbatendo à medida que recuamos no tempo, sendo de 13% face ao ano lectivo 2017/18 (4105) e de 3% quando comparado com o de 2016/17 (4496).

A Guarda Nacional Republicana, que participa no programa Escola Segura a par da Polícia de Segurança Pública, ressalva que extraiu os dados do ano passado de uma forma diferente do habitual, com o objectivo de evitar redundâncias e garantir uma maior fiabilidade da informação. Não é possível, contudo, perceber de que forma tal terá impacto na comparação dos números com anos anteriores.

Na última década, o ano lectivo passado só é ultrapassado ao nível das ocorrências de natureza criminal pelos de 2015/16, 2014/15 e 2013/14. Este último apresenta o valor mais elevado deste período contabilizando 4854 actos de natureza criminal no âmbito do Escola Segura, ou seja, mais 4,7% do que no ano lectivo passado. Em 2012/2013 os valores foram inferiores aos do ano lectivo passado (4489) e muito próximo dos verificados em 2016/17.

As agressões foram a ocorrência criminal mais significativa em contexto escolar no ano lectivo passado com 1.860 registos, seguidas pelas injúrias ou ameaças com 1128. Os furtos (711), os actos de vandalismos (298) e as ofensas sexuais (174) ocupam o terceiro, quarto e quinto lugar no ranking. Foram ainda identificadas 127 situações de posse ou consumo de droga, 120 roubos (casos que implicam o uso de violência, ao contrário do furto) e 107 posses ou uso de armas.
Criminalidade grupal

O relatório de segurança interna contabiliza 1811 detenções no âmbito da criminalidade grupal (que implica a existência de pelo menos três suspeitos), explicando que se tem assistido, no período pós-confinamento, "a um acréscimo na conflitualidade e no nível de violência empregue" neste domínio. Destacam-se duas dinâmicas distintas: por um lado, grupos formados por jovens com idades entre os 15 e os 25 anos que cometem crimes devido a rivalidades fúteis com outros grupos e, por outro, redes criminosas organizadas associadas especialmente ao tráfico de droga em que os conflitos são motivados pelo controlo de um dado território ou de uma rota de abastecimento.

As autoridades notam que o primeiro tipo de grupos tem crescido, apresentado características similares a fenómenos registados em Londres e nos Estados Unidos em que a principal forma de expressão do colectivo é a gravação, edição e publicação de videoclips. Assumindo uma identidade expressa através de sinais, tatuagens ou cores estes jovens tem uma presença cada vez mais relevante em redes sociais como o Youtube, o Instagram e o Spotify. É aí que partilham os videos que acabam por potenciar dinâmicas de rivalidade entre grupos, com o registo de crimes contra a integridade física e contra a vida.

Subsistem através de actividades informais e muitas vezes ilícitas, associadas ao tráfico de droga e aos crimes contra o património, cometendo crimes contra as pessoas de forma esporádica e normalmente sem premeditação, recorrendo a armas brancas. Já os grupos ligados a redes internacionais de tráfico de droga costumam ser mais violentos e recorrer habitualmente a armas de fogo.