21.9.07

Eles consideram que é mais grave faltarem ao trabalho do que elas

Clara Viana, in Jornal Público

Os homens portugueses já concluíram que o seu lugar na família está a mudar, mas continuam a relegar para elas a maioria das tarefas da casa


Entre os indivíduos do sexo masculino, "é transversal a ideia de que o homem nunca deve deixar de trabalhar". Esta é uma das constatações do projecto de investigação O Lugar dos Homens na Família em Portugal, que será hoje divulgado em Lisboa, no âmbito de um seminário promovido pelo Instituto de Ciências Sociais, que tem vindo a ser coordenado pela socióloga Karin Wall.

Apesar de a maioria dos homens portugueses se ter adaptado aos sinais dos tempos e não defender já que o papel deles é ganhar dinheiro e o delas ficar em casa, eles continuam a dar como certo de que o seu trabalho profissional é mais importante do que o das suas mulheres. O que se exprime, por exemplo, no modo como são percepcionadas as faltas ao trabalho (ou o deixar de trabalhar seja devido a desemprego, doença ou à necessidade de cuidar de filhos). Quando um homem falta ao trabalho ou deixa de trabalhar, isto tende a ser associado, por eles, a "falhas no cumprimento do dever", a um "questionar da identidade masculina". Já quando é a mulher a deixar de trabalhar, o facto tende a ser encarado como "um tempo de oportunidade para a família".

Esta atitude tem efeitos práticos. Por exemplo, a maioria dos homens que são pais continua a não recorrer às licenças autorizadas por lei. Em 2005, foram cerca de 38 por cento os que gozaram a menos exigente delas (licença de cinco dias). Mesmo assim, uma percentagem já substancialmente superior à registada em 2002 (26 por cento).

Os homens portugueses estão entre duas águas. Também se poderia falar de uma dissociação entre o discurso e a prática. Existe, por um lado, a consciência, também transversal, de "que o lugar do homem na família está a mudar, quer como pai, quer como marido ou companheiro". Uma mudança que eles associam ao facto de a mulher trabalhar agora fora de casa. Mais de 80 por cento dos indivíduos do sexo masculino são da opinião de que deviam ajudar mais em casa.

Mas a realidade da partilha de tarefas não é assim tão risonha: só 0,8 por cento dos homens fazem sozinhos as refeições, só 1,7 por cento trata da louça e só 0,1 trata da roupa. O género é uma fronteira.

Nos dias de hoje, qual será então o seu papel no universo familiar? "Face aos nossos dados, podemos dizer que não existe nem um modelo de homem ganha-pão, autoritário e distante, como marido e pai; nem modelo de homem sempre presente, absolutamente igualitário e empenhado na casa e nos cuidados paternos", referem os investigadores.
Esta existência entre duas águas, a par da consciência da mudança, não está a facilitar a vida aos homens, agora apanhados entre "imperativos e solicitações contraditórias, muitas vezes geradores de tensões". Referem os investigadores que entre elas avultam as que se "prendem com a conciliação família-trabalho e com a gestão de diferentes referências identitárias: o homem e pai afectivo e participante versus o homem profissionalmente bem sucedido e mais dedicado à vida pública".