6.2.09

Plano anticrise retira até 57 mil desempregados das estartísticas

Catarina Almeida Pereira, in Diário de Notícias

Mercado laboral. Independentemente do êxito do Governo na inserção de pessoas à margem do mercado de trabalho, as medidas anunciadas têm o efeito imediato de reduzir o número oficial de desempregados


INE exige três condições ao conceito de desempregado


Se for aplicado integralmente, o plano de ocupação de desempregados desenhado pelo Governo vai implicar que até 57 mil pessoas sem trabalho não sejam consideradas "desempregadas". Esta é uma estimativa conservadora, tendo em conta que algumas das medidas anunciadas são apenas reforços de outras já existentes.

O que é um desempregado? Para o Instituto Nacional de Estatística (INE), responsável pelo apuramento de dados oficiais, é desempregado quem não tem trabalho remunerado, está disponível para trabalhar e procurou activamente emprego durante um período específico.

Uma das medidas da iniciativa "Emprego 2009" prevê o alargamento do programa de estágios a mais de 12 mil jovens de até 35 anos. Os beneficiários trabalham durante um ano em empresas e recebem uma bolsa com o valor mínimo de 629 euros, comparticipada pelo Estado. O plano prevê, por outro lado, a inserção de 10 mil pessoas com mais de 35 anos em estágios de 9 meses, pelos quais recebem um mínimo de 524 euros.

"No Inquérito ao Emprego os aprendizes e estagiários remunerados são considerados empregados", esclarece fonte oficial do INE, em resposta às perguntas do DN.

O plano também aponta para mais 5 mil adultos em cursos pagos de dupla certificação. Além disso, uma das medidas mais abrangentes prevê a inserção de mais 30 mil beneficiários do subsídio de desemprego em autarquias ou entidades sem fins lucrativos. Ontem, foram assinados os primeiros 600 contratos com instituições do sector social. As pessoas recebem uma bolsa equivalente a 20% da prestação de desemprego (ou de 419 euros, se forem beneficiários do rendimento social de inserção). Assumem os horários normais e têm quatro dias livres por mês para procurar emprego.

Questionado sobre como será classificada uma pessoa nesta situação, o INE explica que a pergunta-chave é a seguinte: "Efectuou um trabalho remunerado por conta própria ou de outrem, mesmo que tenha sido ocasional ou de apenas uma hora?" Se a resposta é positiva, a pessoa é considerada empregada.

O Governo nega um impacto directo destas medidas nas estatísticas do emprego. "Nada me leva a crer que essas medidas tenham impacto dessa natureza", responde ao DN Fernando Medina, secretário de Estado do Emprego. "Porquê? Precisamente porque as pessoas que estão em programas ocupacionais mantêm os deveres de procura activa", argumenta. "Mas vai depender das respostas de cada pessoa", reconhece.

O INE esclarece, no entanto, que o facto de a pessoa ter procurado emprego não é suficiente para que seja considerada "desempregada": "O indivíduo tem de cumprir simultaneamente os três requisitos: não ter trabalho remunerado, nem qualquer outro; estar disponível para trabalhar; ter feito diligências activas", refere fonte oficial.

"Nos últimos anos tem havido uma aposta clara neste tipo de decisões. A taxa de desemprego pode não reflectir de uma forma expressiva a realidade", refere Nádia Simões. A investigadora do ISCTE - que considera que o plano "vai no sentido positivo" - acredita que as medidas também são desenhadas com um propósito estatístico: "Se puderem servir vários objectivos, servem. Esse também é um factor de decisão".

A investigadora apela a uma monitorização intensiva da aplicação do plano, salientando os riscos do "emprego subsidiado". "A ocupação pode deixar as pessoas 'presas' a esse tipo de trabalhos, comprometendo a empregabilidade", refere.

"Não sendo legítima, a verdade é que a tentação para a generalidade dos governos para procurar diminuir o número real de desempregados sempre existiu", refere, por outro lado, Glória Rebelo, especialista em emprego e relações laborais. A professora universitária elogia, contudo, o plano apresentado considerando que ao apostar na "qualidade do emprego" - leia-se, contratação sem termo - o Governo "eleva a fasquia", o que torna os resultados estatísticos mais difíceis de obter.