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26.7.23

75% dos consumidores da geração Z estão dispostos a pagar mais por produtos sustentáveis

Pedro Sousa Carvalho Jornalista, in Expresso


Um estudo da Oliver Wyman traça o perfil de consumo da geração Z (pessoas nascidas entre meados da década de 1990 e o início da década de 2010) e chega à conclusão que 75% estão dispostos a pagar mais por produtos e serviços sustentáveis e 88% acreditam que as empresas devem ajudar a resolver problemas sociais


“São nativos digitais, utilizam as redes sociais como ferramenta de decisão, exigem produtos que correspondam aos seus valores e preferências sociais e ambientais e estão (muito) preocupados com a sua segurança financeira”. É assim que este estudo ‘Generation Z: Shaping the Future of Consumer Trends’ descreve a Geração Z.

Este estudo, baseado em mais de 10 mil entrevistas nos EUA e no Reino Unido, conclui que 88% dos consumidores da geração Z acreditam que as empresas devem ajudar a resolver problemas sociais e ambientais e 82% acreditam que as empresas devem refletir a diversidade do mundo real nas suas campanhas de publicidade e marketing. Pela mesma razão, 75% dos consumidores nesta faixa etária estão dispostos a pagar mais por produtos e serviços sustentáveis.

Este inquérito pretende ajudar as empresas e as marcas a chegarem a estes consumidores que têm hábitos diferentes dos das gerações anteriores, muito focados obviamente nos canais digitais. A consultora Oliver Wyman conclui que a geração Z é a primeira que cresceu inteiramente na era digital e estima que “estes jovens passam, em média, 10 horas por dia a interagir com conteúdos online e têm uma média de cinco contas em diferentes redes sociais, que utilizam constantemente para descobrir novos produtos, procurar recomendações e interagir com as marcas”. E as marcas que os querem encontrar é aqui que os vão encontrar.

Sobre o tema da sustentabilidade, o estudo aponta um grande paradoxo desta geração: apesar de estar muito comprometida com o tema da sustentabilidade, esta geração tem um estilo de vida que resulta num grande nível de consumo. Por exemplo, “os jovens da geração Z têm uma probabilidade 2,6 vezes maior de comprar roupas numa base semanal quando comparados com os de outras gerações”. Os jovens desta geração “falam verde, votam verde e querem trabalhar em empresas verdes”, mas continuam a ser grandes consumidores de fast fashion. E aqui o preço pode ser um fator determinante: “40% destes jovens da geração Z argumentam que a moda sustentável é demasiado cara, o que transforma a fast fashion numa alternativa apelativa”.

O preço dos bens e dos serviços é uma grande preocupação para estes jovens. O estudo conclui que “a incerteza e os desafios económicos que enfrentam moldaram uma mentalidade prudente e cautelosa do ponto de vista financeiro. Por esta razão, 51% deles dão prioridade à relação qualidade/preço quando tomam as suas decisões de compra, que, além disso, não são impulsivas, uma vez que o estudo mostra que 67% dos indivíduos desta geração poupam ativamente”. Ainda a propósito da sua situação financeira, o relatório refere que a geração Z regista uma taxa de desemprego que é quase o dobro da de outras gerações em quase todos os países da OCDE.

Apesar da menor folga financeira da geração Z, a Oliver Wyman assegura que estes jovens “querem que as suas decisões de consumo tenham um impacto positivo nas alterações climáticas”. Caso a descida de preço não seja uma opção para as empresas, “elas devem procurar outras formas de incentivar as compras sustentáveis. Por exemplo, devem apostar mais na rotulagem e na divulgação de informação sobre a sustentabilidade dos produtos que comercializam”. Neste inquérito, 31% dos consumidores da geração Z afirmam que estariam dispostos a comprar mais bens sustentáveis se as empresas fossem mais claras na rotulagem e na etiquetagem, e 29% referem que comprariam mais se tivessem mais informação sobre o impacto dos produtos que estão a comprar.

Este estudo sugere às companhias que criem um nível de liderança alinhado com o propósito da empresa ou com a sustentabilidade (por exemplo, a figura de um “chief purpose officer”) porque os jovens desta faixa etária mais facilmente compram, investem ou querem trabalhar em empresas que estão mais alinhadas com as suas crenças e os seus princípios.

Um em cada cinco dos inquiridos, neste inquérito, revela que deixaria de comprar a sua marca favorita e passaria a comprar outra marca se descobrisse que a fabricante dessa marca favorita tem uma posição contrária à dele nalguns dos princípios em que acredita. “Se as empresas não falarem sobre os temas que interessam a esta geração arriscam-se a perder a próxima geração de consumidores e de trabalhadores”, conclui o estudo que diz que esta geração Z é particularmente sensível a detetar o greenwashing.

27.6.23

Os jovens que não dormem. "A privação de sono é uma dívida ao banco que não conseguimos pagar

Beatriz Lopes, in RR

Portugal tem um problema de privação crónica de sono com impactos graves na saúde, alerta a pneumologista Paula Pinto. A especialista defende mudança de comportamentos e medidas como sestas de 20 minutos e aulas a começar mais tarde.

O problema é transversal a todas as gerações: aos jovens que “adormecem às 3h00 da manhã” e no dia seguinte “chegam a cabecear nas secretárias”, aos pais que “não dão o exemplo” ou até aos idosos que “já ficam também até às tantas ‘nos Facebooks’ ou a ver telenovelas”. “Está na hora de pôr o sono na agenda”, apela Paula Pinto, coordenadora da Unidade de Sono e Ventilação não Invasiva do Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte, que alerta para um aumento de pedidos de ajuda de utentes que negligenciam o tempo de sono.

“Cada vez mais a privação crónica de sono é um motivo muito grande de consulta. As pessoas vão lá por hipersonolência, porque tiveram acidentes, porque têm problemas familiares como estar à beira do divórcio, porque estão quase a perder o emprego, porque não têm rendimento escolar ou laboral, tudo porque têm problemas de sono. Nas consultas fazemos mesmo uma organização de uma agenda por horas, porque temos de ter tempo para dormir”-

Em entrevista ao podcast Geração Z da Renascença, que esta semana aborda as consequências da privação de sono na juventude, a pneumologista lembra que “mais de metade da população dorme menos de seis horas por dia” e os jovens “têm, sem dúvida, a maior responsabilidade”.

“Os jovens, sobretudo os adolescentes, devem dormir cerca de nove a 10 horas. Depois vai-se reduzindo um bocadinho o horário de sono, um adulto deve dormir oito, mas o que somos é uma sociedade 24/7. Estamos permanentemente ligados ao mundo, temos de atender logo aquela chamada, responder a um e-mail, responder aos WhatsApps. Como não podemos deixar de comer, deixar de trabalhar, deixar de estudar, tiramos no sono e não pomos o sono na agenda”.

Paula Pinto admite que as gerações mais novas tendem a desvalorizar as consequências da privação crónica de sono, tanto a curto prazo como “uma maior agressividade, tristeza e falta de rentabilidade” como a longo prazo, “quando começamos a ter doenças mentais, depressão, ansiedade, crises de pânico e acidentes cardiovasculares, nomeadamente enfartes, AVC, arritmias e hipertensão”.

Há ainda outro ponto muito importante para os jovens, alerta: “se não dormirem, há uma redução da própria fertilidade, porque há alterações a nível hormonais quer sexuais masculinos quer femininos".

O problema, sublinha a pneumologista, também membro da direção da Associação Portuguesa de Sono, começa desde logo nos pais que “não dão o exemplo, desde logo à hora da refeição”.

“Se num restaurante eles já estão agarrados ao telemóvel, imagine-se em casa, que é um ambiente de rotina. Eles estão todos à mesa com o telemóvel, nem falam. As famílias de hoje não falam. Toda a família tem de mudar. Tem de ter mais tempo para lazer e fazer fronteiras muito boas entre trabalho ou escola e lazer e família. Todos têm de estar integrados nas tarefas de casa, por exemplo, para depois terem tempo de desfrutar e descansar”.

Aos jovens que acreditam que é possível recuperar o sono perdido dormindo mais de 12 horas aos fins de semana, Paula Pinto lembra que “o déficit de sono nunca é reposto”.

“A privação crónica de sono é uma dívida a um banco que, neste caso, é a nossa saúde e que não vamos poder pagar. É impossível pagar. É como se daqui a pouco tivéssemos um milhão de euros para pagar. Só que nós não somos bancos. Não podemos prejudicar assim a nossa saúde. A privação crónica de sono somos nós que estamos a autoinfligir. Que parvoíce. Somos nós que estamos a provocar a nós próprios e à sociedade uma doença”, sublinha.

Quanto às sestas, o ideal seria mesmo que “cochilássemos um bocadinho depois do almoço, 20 minutos, o recomendável” ou adotar mesmo a medida a nível cultural, tal como Espanha, sublinha a coordenadora da Unidade de Sono e Ventilação não Invasiva do Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte.

“Nós sabemos que Espanha faz isso, nomeadamente a zona da Andaluzia e sabemos que Espanha é mais produtiva do que nós. E sabemos também que se dormirmos um bocadinho a seguir ao almoço, há menos taxa de acidentes. Era algo que deveria ser implementado a nível de sociedade. Não custava nada, bastava um sofá. Aqueles 20 minutinhos é mesmo algo fisiológico. Por exemplo, os estudantes vão para casa depois da escola e almoçam e depois estão a cabecear na secretária: nem dormem nem estudam”, critica.

Mas também aqui as escolas poderiam ajudar, rejeitando a tendência de antecipar a hora de início das aulas nos anos escolares mais avançados.

“Está tudo errado. Na América e na Austrália já há trabalhos que mostram que as aulas deveriam começar mais tarde. Nos Estados Unidos, já temos escolas experimentais piloto onde ficou provado que alterar o horário das oito da manhã para as oito e meia, já os fez dormir mais 45 minutos e tiveram maior rendimento escolar e menos sonolência. Queríamos que as escolas começassem mais tarde e os jovens dormissem mais tempo. O problema são os pais que os levam e os seus empregos, tudo isto é muito complicado”, reconhece.

Como isto não é possível, refere Paula Pinto, “o melhor é começar a ensinarem-lhes bons hábitos de sono, para que eles possam dormir as tais oito horas recomendáveis” e não será descabido pensarmos em dar um passo atrás e incentivarmos a compra de despertadores.

“Precisamos dos despertadores clássicos, dos antigos, com campainha, despertadores sem luz, nunca o telemóvel nem o tablet. Porque todos eles são emissores da luz azul, a luz LED, que inibe a produção de melatonina, que é hormona que nos faz mesmo dormir. E depois temos crianças que, ficam com estes aparelhos debaixo dos lençóis e adormecem às três da manhã.”

Uma coisa é certa, garante a pneumologista: “se nos deitarmos e acordarmos sempre à mesma hora, ou seja, ter um horário regular distando só uma hora para a ronha ao fim de semana, não vamos precisar deles”.

11.8.22

​Geração Z. Querem conectar-se com a natureza, mas de férias também pensam no currículo

Beatriz Lopes, in RR

No podcast desta semana, falamos sobre a forma como os interesses dos jovens estão a mudar e deixamos algumas sugestões de projetos de ocupação de tempos livres, iniciativas de voluntariado e até de oportunidades de trabalho internacionais durante as férias.

São mais aventureiros do que as gerações anteriores, estão sempre de malas prontas para viajar, mas preferem fazê-lo lá fora do que no próprio país. Dão mais valor a experiências ao ar livre, porque já têm consciência de que às vezes é preciso fazer um "retiro" para desligar do mundo virtual e pensam mais nas férias como um investimento na formação e não tanto como um mero contemplar de monumentos.

São estas algumas das conclusões dos estudos internacionais feitos por plataformas de reservas - como a Booking e a GetYourGuide - que se têm dedicado a explorar as preferências da Geração Z, a mais disposta a investir poupanças em viagens.

No podcast Geração Z desta semana, falamos sobre a forma como os interesses dos jovens estão a mudar e deixamos algumas sugestões de projetos de ocupação de tempos livres, iniciativas de voluntariado e até de oportunidades de trabalho internacionais.

Que tal fazer um Interrail por 33 países da Europa? Ou participar em projetos com outros jovens no estrangeiro com alojamento, refeições e viagens a custo zero? Ou mesmo por cá, ajudares em ações de vigilância e sensibilização para os incêndios?

São convidados do Geração Z, Carlos Manuel Pereira, do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) e Coordenador Nacional do Ano Europeu da Juventude; e Joana Fialho, de 19 anos, voluntária na H2O - Associação de Jovens de Arrouquelas, uma pequena aldeia de Rio Maior que Joana quer agora tornar "mais jovem", envolvendo todas as gerações em atividades que passam não só pela culinária, mas também pela partilha de experiências com jovens voluntários de outros países.

É a vontade de "sair da zona de conforto" que leva Joana a envolver-se em projetos que a "desafiam intelectualmente" sempre que está de férias. Já esteve em Espanha e na Polónia, no âmbito dos chamados Youth Exchanges, encontros internacionais - geralmente de uma semana - que permitem que grupos de jovens de diferentes países partilhem experiências e conheçam novas culturas.

"Quando fui à Polónia, foi a primeira vez que saí de Portugal e viajei de avião. Consegui fazer amigos, falamos regularmente através das redes sociais, e estes projetos são também muito bons para desenvolvermos a comunicação. Foi através destes projetos que aprendi inglês. Na escola nem sempre conseguimos desenvolver este tipo de competências".
Uma geração que prefere experiências na natureza e não pode ser medida em pixels

Joana dá força às estatísticas e acredita que pertence a uma geração que está cada vez mais consciente de que é preciso viver as experiências e cada momento na sua plenitude, em vez de passar o tempo a tirar fotografias para as redes sociais. Se conseguem fazê-lo? "Sim. É tudo uma questão de equilíbrio".

"Nós é que controlamos o uso que fazemos das redes sociais. E se nós conseguimos viver os momentos e ser proativos, também conseguimos estar um bocadinho no telemóvel. Só temos que ter em atenção se o tempo que passamos na internet é de qualidade ou não."

De acordo com o Bloomberg, que cita dados das Nações Unidas, em 2019 já existiam mais jovens da Geração Z (32%) do que Millennials (31,5%), o que tem levado as indústrias e as agências de viagens a adaptarem-se ao novo perfil destes consumidores que tendem a desligar-se mais das redes e a conectar-se com a natureza. Carlos Manuel Pereira diz também acreditar que esta é já "uma tendência vincada".

"Já há alguns anos que as pessoas procuram regressar ao contacto com a natureza e, sobretudo os jovens, que obviamente têm mais energia, têm uma consciência ambiental mais vincada fruto daquilo também que aprendem e que lhes é passado nas escolas, e também porque sentem que vão ser a geração que vai sentir os eventuais danos que possam ser causados pelo impacto ambiental. Portugal é um país privilegiado para encontrar oportunidades de contacto com a natureza, onde seja possível fazer atividades desportivas ao ar livre, também desenvolver projetos culturais juntamente com os amigos ou com as populações que encontram em cada um desses locais."

O também coordenador nacional do Ano Europeu da Juventude sublinha, por isso, a importância de os jovens olharem para os vários programas disponíveis no âmbito da União Europeia ou outros disponibilizados pelo Instituto Português do Desporto e Juventude e deixa uma garantia: "Há muitas oportunidades e existem muitos recursos, nós gostamos de gastar todos esses recursos e os jovens podem contar connosco para responder aos seus desejos e anseios".

20.7.22

Geração Z e millennials portugueses sentem-se financeiramente ansiosos. Custo de vida é a principal preocupação

Daniela Carmo, in Público

Inquérito da Deloitte mostra que além de inquietos com as finanças a curto e longo prazo, millennials e jovens da geração Z estão também preocupados com as mudanças climáticas. Saúde mental e desemprego estão igualmente entre as principais preocupações.Financeiramente inseguros, stressados, apreensivos quanto à reforma, mas comprometidos com a luta pelo clima. 

É assim que os 400 millennials e jovens da geração Z portugueses que responderam ao inquérito mundial “Gen Z and Millennial Survey 2022” se descrevem. Entre as principais preocupações (que coincidem nas duas gerações e tanto para portugueses como para os outros inquiridos dos restantes 45 países envolvidos no questionário) destacam-se o custo de vida e as alterações climáticas.

No que toca à segurança financeira, a geração nascida entre 1983 e 1994 (millennial) está mais apreensiva e insegura, do que a geração subsequente (de 1995 a 2003). Ao inquérito, que decorreu entre Novembro de 2021 e Janeiro último, responderam 200 millennials e 200 jovens da geração Z. Entre os millennials, 65% não se sente seguro financeiramente. Uma percentagem mais elevada do que os 61% dos jovens da geração Z nacionais que estão inseguros nesse parâmetro.

A nível global o questionário contou com mais de 23 mil inquiridos de 46 países de diversos continentes (Europa, América, África, etc). Nesta 11.ª edição, a Deloitte, empresa que levou a investigação a cabo, incluiu uma análise dedicada a Portugal. Comparando com os outros inquiridos, a inquietação com as finanças dos jovens e adultos nacionais é maior: a percentagem global desce para os 40% e 46%, respectivamente, nos jovens da geração Z e nos millennials que estão inseguros financeiramente.

O estudo analisou várias questões como expectativas sobre segurança financeira, stress, ansiedade e saúde mental ou a expectativa com a possibilidade de vir a receber reforma.

O custo de vida é, aliás, a maior preocupação dos inquiridos quando lhes é pedido que escolham cinco inquietações e lhes dêem uma ordem. A nível nacional mais de um terço dos jovens da geração Z (34%) e quase metade dos millennials (46%) colocam o custo de vida no topo da tabela. No segundo lugar aparecem as alterações climáticas (32% em ambos os grupos etários).

Ansiedade financeira, ansiedade climática

Já o panorama mundial mostra que a percentagem de inquiridos que colocam as alterações climáticas no segundo lugar baixa para os 24% (Geração Z) e para os 25% (millennials). Mas enquanto estão a braços com a ansiedade financeira, estes jovens e adultos lutam pela protecção do ambiente com pequenos gestos diários. Mais de 70% dos inquiridos dos dois grupos etários “concordam que o mundo está num ponto de inflexão na resposta às alterações climáticas e no futuro poderá ir para qualquer um dos lados”, lê-se no estudo.

Entre os comportamentos que tomam diariamente para inverter a situação destacam o uso de plástico/papel reciclados ou recicláveis; o uso de copos e utensílios reutilizáveis; compras em segunda mão (roupa e mobília, por exemplo); comprar no comércio local ou produtos orgânicos.

Por outro lado, aspiram poder vir a, no futuro, a comprar carros eléctricos ou híbridos, melhorar as habitações tornando-as mais sustentáveis (por exemplo, com a instalação de painéis solares) ou aumentar a participação cívica. Os resultados do inquérito indicam ainda que as duas gerações “estão dispostas a gastar dinheiro no curto prazo pela sustentabilidade, mas, actualmente, alguns hesitam em fazer grandes investimentos financeiros a longo prazo, provavelmente devido a restrições financeiras”.

“O stress é outra das marcas das gerações mais novas em Portugal”, destaca o comunicado de imprensa relativo à situação nacional enviado ao PÚBLICO. Mais de metade (53%) dos inquiridos da geração Z e 39% dos millennials relatam sentir-se ansiosos ou stressados na maior parte do tempo (46% e 38% a nível global, respectivamente). Entre as causas de stress destacam o futuro financeiro a longo prazo, as preocupações relacionadas com a saúde mental, a carga laboral, a família e relações pessoais e ainda as finanças diárias.

A saúde mental é, aliás, a terceira das preocupações dos jovens da geração Z, além do custo de vida e do clima. Neste grupo etário, a percentagem a colocar a saúde mental no terceiro lugar das cinco maiores preocupações corresponde a 27% dos inquiridos (a nível global nesta geração, o parâmetro aparece em quarto lugar no Top 5 das preocupações, com 19%). Segue-se o desemprego (19%) e a escassez de recursos (17%).

Os números são mais expressivos quando se percebe que no local de trabalho a percentagem de inquiridos que não se sentiria à vontade para falar abertamente com o gestor directo sobre o facto de se sentirem ansiosos ou sobre outros desafios da saúde mental chega aos 37% nos jovens da geração Z e aos 35% para os millennials.

Já os millennials estão mais inquietos com a desigualdade de rendimento/distribuição de riqueza (25%), com o desemprego (23%) e com a saúde/ prevenção de doenças (17%).
Gerações reavaliam o que é prioritário

De acordo com Nuno Carvalho, responsável pela área de Capital Humano da Deloitte em Portugal, citado no comunicado, “o actual contexto mundial conduziu a um clima generalizado de apreensão com o futuro, a que os millennials e a geração Z não são alheios”. “Os efeitos da pandemia e, mais recentemente, da guerra na Ucrânia têm levado as gerações mais novas a reavaliarem o que é prioritário, contrariamente a algumas das conclusões em edições anteriores. Temas como a flexibilidade no trabalho, o stress ou mesmo a reforma estão agora no topo das prioridades destas gerações e devem ser tidos em consideração pela sociedade e pelas empresas”, sublinha.

O jovens da geração Z mostraram-se com mais vontade de mudar de emprego do que os millennials. “Segundo o estudo, 29% dos Gen Z pretende sair do seu actual trabalho dentro de dois anos e 20% pretende mudar dentro de cinco anos. Nos millennials 27% que sair daqui a dois anos e 28% daqui a cinco anos. Cerca de 36% dos inquiridos da geração Z e 23% dos millennials afirma que abandona o seu empregador mesmo se não tiver outro trabalho garantido para onde mudar”, refere o comunicado.

Quando se fala de reforma no final da carreira profissional, 27% dos jovens da geração Z e um terço (33%) dos millennials dizem sentir-se seguros em relação à sua reforma. Os números são mais baixos do que a nível mundial: 41% nas duas categorias que têm confiança quanto à reforma.



29.12.20

Marcados por 2020, os jovens da geração Z anseiam por um futuro sem covid-19

Reuters e P3

A Reuters falou com dez pessoas jovens à volta do mundo, para descobrir como é que as suas vidas foram afectadas pelo novo coronavírus. Estas são as suas histórias.

Vidas que eram focadas na escola, universidade, desporto ou concertos de k-pop desapareceram de um dia para o outro, para os membros da geração Z.

Se muito foi dito sobre o risco das pessoas mais velhas na pandemia de covid-19, esta geração mais jovem, nascida entre o final dos anos 1990 e inícios da década de 2010, também viu os seus mundos virados do avesso em 2020.

Fechados em quartos ou obrigados a voltar à casa dos pais, muitos passaram de ser estudantes, atletas ou trabalhadores para se tornarem cuidadores de familiares doentes. Uma adolescente fez-se mãe. Como tudo nesta pandemia, nenhum caso é igual ao outro. Alguns foram mais atingidos do que outros, dependendo das circunstâncias pessoais, geografias ou eficácia das acções tomadas para conter o vírus.

Enquanto anseia por 2021, esta geração teme que as suas vidas possam ter sido mais abaladas do que as dos seus precedentes, os millennials, durante a crise financeira de 2008/2009. Além dos danos imediatos na educação e perspectivas de emprego futuro, os economistas prevêem que a pandemia também afecte os salários a longo prazo, a formação nas empresas, a evolução da carreira e a saúde mental.

A Reuters falou com dez pessoas jovens à volta do mundo, para descobrir como é que as suas vidas foram afectadas pelo novo coronavírus. Estas são as suas histórias:


Elisa Dossena, 23Crema, Itália

No início de 2020, Elisa Dossena fez 23 anos e estava ansiosa por terminar a licenciatura e inscrever-se num mestrado de uma das universidades mais prestigiadas em Itália.

Ao mesmo tempo, Itália tornou-se o primeiro país europeu a ser atingido pela pandemia. Todos os planos ficaram em suspenso. Elisa foi obrigada a tornar-se a responsável de facto de uma casa debilitada. Enquanto estudava em Milão, a covid-19 devastava os seus familiares na cidade de Crema, a 50 quilómetros da primeira “zona vermelha”, na Lombardia. Ela voltou a casa para ajudar.

“Foi um período muito negativo para mim. Mas também me fez crescer muito.”Elisa Dossena

Tanto a tia de 59 anos como a avó, de 90, morreram depois de o vírus debelar ainda mais os corpos já enfraquecidos por outras doenças. “Tive de tomar conta da casa e gerir tudo para todos porque a minha mãe estava ocupada a tomar conta do meu pai e da minha avó e a ajudar a minha prima, quando os pais dela ficaram doentes. Senti muita pressão. Era muita responsabilidade”, conta. “Foi um período muito negativo para mim. Mas também me fez crescer muito.”

Depois de um confinamento de três meses, em Junho as restrições foram levantadas e Dossena pôde voltar a ver os amigos. Mas um medo constante de serem infectados eliminou a cultura do toque, abraços e beijos pela qual os italianos são famosos.

“As pessoas pararam de confiar em apertar as mãos, abraçarem-se ou conhecerem pessoas novas”, diz, sentada na sala de estar da casa da família. “Quando entrava num espaço fechado conseguia sentir as palpitações, a ansiedade. Claro que algo tinha mudado.”

Um novo aumento dos casos de infecção, no final do Outono, fez com que a sua cerimónia de graduação fosse celebrada por webcam, ficando sem a festa com a família que geralmente acompanha o ritual de passagem à vida adulta.

Agora, está a estudar remotamente para um mestrado em gestão, aguardando por alguma normalidade em 2021. “Espero que as pessoas possam deixar as suas casas livremente. Espero que seja possível sair para tomar um café com os amigos. Espero que seja possível regressar às salas de aula, escritórios e universidades”, anseia. “Não peço muito, mas aguardo por isto.”

Jackline Bosibori, 17Nairobi, Quénia

A adolescente queniana Jackline Bosibori usou camisolas largas para esconder a gravidez da mãe durante o máximo de tempo possível, com medo de trazer ainda mais problemas à família.

“Se estivesse na escola, poderia não estar grávida”, declara a jovem de 17 anos.

Para Bosibori, que deu à luz em Novembro, o fecho das escolas definiu 2020. Muitos grupos activistas do Quénia temem que a gravidez na adolescência aumente, à medida que as jovens mulheres são obrigadas a ficar em casa, enquanto os pais saem para trabalhar.

O pai da bebé, um adulto, evita a família Bosibori desde que soube da gravidez de Jackline. O presidente do Quénia pediu uma investigação após o aumento dos casos de abuso sexual, em Julho, incluindo violações, durante o confinamento.

Os sonhos de se tornar advogada parecem agora longínquos. “Sinto que não progredi de forma alguma, este ano. Se estivesse na escola, teria alcançado os meus objectivos”, lamenta.

Tudo isto deixa-a ansiosa, confessa, na casa com uma só divisão que partilha com outros seis familiares. “Há pessoas que perderam empregos. Há estudantes que não vão voltar à escola”, explica, durante uma pausa nos estudos, enquanto a bebé dorme.

As escolas no Quénia estão fechadas desde Março. Bosibori quer voltar mal abram em Janeiro, mas preocupa-se com as propinas. “2020 foi um mau e um bom ano para mim. Foi mau porque engravidei sem estar à espera. Mas foi um bom ano porque tive a minha bebé e ela está bem.”

Lee Ga-hyeon, 17Cheonan, Coreia do Sul

Lee Ga-hyeon tem um grande desejo para 2021: escapar, finalmente, do seu quarto numa cidade a 100 quilómetros de Seul e ver os seus ídolos, o grupo pop BTS, num concerto ao vivo. “Os BTS são como uma vitamina para mim, mas o coronavírus tirou-me isso e deixou-me muito zangada”, conta, no quarto decorado com fotografias do grupo, bonecos e até um cobertor com a cara de Jin, um dos membros da banda.

A pandemia obrigou os BTS a cancelarem a digressão mundial agendada para 2020, que os levaria à Ásia, Europa e Estados Unidos da América. Para Lee, não houve mais viagens a Seul para ver concertos e estar com amigos. Em vez disso, o quotidiano tornou-se maioritariamente online, onde a hiper-conectividade da Coreia do Sul a ajudou a criar um canal do YouTube com os eventos dos BTS, dos últimos três anos.

“É muito triste que este quarto seja o único sítio onde posso ver os BTS”, disse.

Embora o país tenha sido bem-sucedido a combater o início da pandemia, a terceira e mais forte onda de infecções forçou os fãs a abraçarem o mundo digital, durante o “ano perdido”. A escola também é online, dificultando ainda mais os estudos de quem se prepara para o exame de acesso à universidade, um ritual de passagem visto como um momento definitivo na Coreia do Sul.

Lee espera que o teste cumpra o calendário do próximo ano, livre de coronavírus. Foi atrasado um mês em 2020, quando cerca de meio milhão de candidatos se sentaram para o exame de oito horas, com máscaras.

Foi um ano que a relembrou do quão especial é ter amigos, mesmo que tenham de ficar longe. “No ano passado, passei muito tempo a conversar com amigos cara a cara, durante os intervalos das aulas, mas não o pude fazer este ano”, disse. “Finalmente percebi o quão preciosos esses intervalos eram.”

Valeria Murguia, 21 anos Califórnia

Valeria Murguia estava a terminar o segundo ano de Comunicação, na Universidade do Estado da Califórnia, em Fresno, e a trabalhar em regime de meio horário no centro de saúde do campus quando a pandemia atingiu os Estados Unidos da América.

De repente, as aulas passaram a ser online e o seu salário modesto, do emprego onde escrevia mensagens nas redes sociais para ajudar os estudantes a manterem-se saudáveis, evaporou-se. Viver em Fresno, uma cidade em rápido crescimento onde o custo da habitação está a aumentar, tornou-se demasiado caro. Por isso, em algumas semanas, Murguia estava de volta a casa dos pais, na pequena cidade rural de McFarland.

Como muitos adultos universitários nos EUA, a vida jovem de Murguia deu uma volta sombria. Tanto ela como os amigos começaram a olhar para a sua saúde de forma mais séria, a estudar mais e a serem mais abertos a relações sérias.

Em casa, Murguia atirou-se aos trabalhos da universidade e ao desenvolvimento de competências que poderá vir a precisar num emprego futuro: aprendeu a construir sites, melhorou as capacidades de design gráfico e estudou organização de eventos. Também trabalhou com os pais, ambos imigrantes do México, nas vindimas.

“Isto tornou as pessoas mais sérias. Vai, certamente, deixar uma marca na nossa geração”, acredita.

Murguia, agora com 21 anos, vai formar-se em Maio, num mercado de trabalho estrangulado. Embora o mercado da publicidade tenha perdido menos empregos do que a maior parte dos sectores, não mostrou um crescimento de postos de trabalho desde Maio.

A jovem não tem dívidas de empréstimos estudantis, o que é menos um peso. E os economistas estão cada vez mais optimistas para 2021, graças aos desenvolvimentos das vacinas de covid-19. Ainda assim, o mercado de trabalho que os espera não se assemelha ao que existia antes da pandemia, onde a menor taxa de desemprego em meio século significava que muitos licenciados podiam escolher entre vários empregos.

“Estou a tentar manter-me positiva, porque se começar a olhar para as coisas negativas, começo a imaginar coisas na minha cabeça. E não quero entrar nesse jogo”, diz.

Xiong Feng, 22Wuhan, China

Xiong Feng lidera a única aula de voguing em Wuhan, um estilo popularizado pelas comunidades LGBT no final dos anos 1980.

O confinamento de 76 dias em Wuhan que, quase sem aviso, cortou as ligações da cidade com o resto da China, a 23 de Janeiro, começou meses antes do resto dos países começarem a sentir as dores da pandemia.

Xiong, como muitas outras pessoas da geração Z em Wuhan, viu a sua vida, educação e negócio envolvidos num tumulto. Ficou impedido de terminar a licenciatura lado a lado com os seus colegas. “Acho que perdi alguns amigos. As relações desapareceram porque não nos mantivemos em contacto durante a epidemia”, disse.

A cidade já regressou ao normal, depois de nenhum caso ser reportado desde Maio. Para a geração Z em Wuhan, as previsões da economia são melhores do que para outras pessoas no estrangeiro, já que os negócios e escritórios reabriram e a China se prepara para se tornar a única grande economia a crescer em 2021.

O período após a pandemia ajudou a atrair novos clientes e Xiong espera manter-se um pioneiro do movimento de dança LGBT, em 2021. “Penso que, depois da pandemia, toda a gente gosta mais de si mesma. As pessoas não trabalham tanto como dantes, por isso é natural que haja mais gente a vir dançar”, refere o professor.

No epicentro do surto de covid-19, os habitantes de Wuhan sofreram um trauma profundo durante os primeiros meses de 2020. Mas Xiong acredita que a experiência trouxe mais lições positivas para as pessoas jovens na China e no resto do mundo. “Acho que o mundo deveria ter mais paz e amor. E as pessoas deveriam parar de estar sempre a lutar umas com as outras”, disse.

Nomvula Mbatha, 32 Diepkloof Township, África do Sul

Quando a esgrimista Nomvula Mbatha terminou em primeiro lugar numa competição sul-africana de sabre, em 2019, parecia lançada para os Olímpicos. Depois, a pandemia de covid-19 começou. Todas as competições foram suspensas e o confinamento que se iniciou no final de Março dificultou os treinos para a equipa da jovem de 23 anos.

“A pandemia tem sido desastrosa para nós”, disse Mbatha, na sua casa em Diepkloof, um township a sudoeste de Joanesburgo. “Basicamente não conseguimos atingir nada. Este ano foi cancelado das nossas vidas.”

Mesmo quando as competições regressaram, Mbatha, a número um com 17 medalhas, teve imensas dificuldades em angariar fundos para participar nos eventos internacionais que lhe assegurariam um lugar nos Jogos Olímpicos de Tóquio, adiados para 2021.
Membro do Soweto Fencing Club, é uma das representantes da nova geração de atletas-estrela com dificuldades em conseguir patrocínios, numa economia marcada por baixo crescimento e elevado desemprego, especialmente para pessoas jovens.

“Não tenho uma resolução para 2021… Não quero ter porque tenho medo.”Nomvula Mbatha

Entre Julho e Setembro, o desemprego entre pessoas dos 15 aos 24 anos aumentou de 52,3% para os 61,3%, de acordo com estatísticas oficiais da África do Sul.

Enquanto os governos procuram estimular o emprego, o foco de Mbatha está nos próximos campeonatos africanos. Mais uma vez, no entanto, a pandemia turva este desejo. Um aumento recente no número de infecções motivou novas restrições. “E se voltamos a confinar?”, diz. “Não tenho uma resolução para 2021… Não quero ter porque tenho medo.”

Solene Tissot, 19 Paris

Sozinha num estúdio minúsculo em Paris, impedida de sair do país para visitar o namorado, separada dos amigos e incerta quanto ao seu futuro, Solene Tissot sentiu o peso da pandemia de covid-19 a aumentar dentro dela.

“Rapidamente te sentes a ficar sobrecarregada com isto tudo. Rapidamente te sentes a sufocar”, explica a jovem de 19 anos.

Tissot, que se mudou para Paris há dois anos para estudar no Instituto de Estudos Políticos de Paris, começou a ter consultas com um psicólogo.

Foi diagnosticada com depressão e ansiedade, duas condições que diz terem sido desencadeadas pela solidão dos confinamentos.

Estas restrições tiveram consequências na saúde mental da juventude francesa. Entre Setembro e Novembro deste ano, quando um novo confinamento foi imposto em Franca, a proporção da população entre 18 e 24 anos com depressão subiu de 11% para 21%, de acordo com a autoridade de saúde pública francesa.

Tissot já não frequenta aulas presenciais porque a universidade as cancelou. Restrições às deslocações tornam visitar amigos um acto ilegal. Há um ano que não vê os avós. A licenciatura que escolheu exige um estágio. Mas com muitas empresas a operarem remotamente, está a ser difícil encontrar uma que a aceite.

No próximo ano, iria estudar no Líbano, onde o namorado vive, mas ainda não sabe se as restrições o irão permitir.

Quando se licenciar, encontrar trabalho será mais difícil. De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, 22% das pessoas francesas entre os 15 e os 24 anos não estavam nem a trabalhar nem a estudar no terceiro quadrante do ano — mais de 19% em relação ao ano anterior.

Tissot está a pensar no futuro. Está a aprender árabe, na antecipação da viagem ao Líbano. “É verdade que 2020 não deixou espaço para grandes ânimos, e eu gostaria de ter isso de volta.”

Abdullah El-Berry, 22Cairo, Egipto

Abdullah El-Berry, um estagiário de jornalismo de desporto, de 22 anos, entrou em 2020 a achar que a vida ia ser difícil. Uma lesão grave no joelho obrigava-o a ir todos os dias à fisioterapia e afectava seriamente as viagens diárias de três horas do Cairo para a sua casa em Shebine al-Qanatir.

A partir do início da pandemia, deixou de poder continuar a fisioterapia, em consequência da sobrelotação dos hospitais do Egipto. Não pôde apresentar a tese. A suspensão de todos os eventos desportivos tornou quase impossível conseguir fazer o seu trabalho. E a sua viagem diária tornou-se ainda mais complicada, após os recolheres obrigatórios.

Agora, acha que 2021 vai ser ainda mais difícil. Com o ordenado muito baixo pago por um jornal do estado, o recém-licenciado não está confiante com a procura de emprego. “Antes, já sofríamos para encontrar um trabalho”, disse. “Agora, muitas pessoas perderam o emprego devido à crise económica da covid-19. Vai impactar toda a gente.”

A população do Egipto cresce rapidamente e mais de metade dos 102 milhões de habitantes têm menos de 25 anos, mostram dados da ONU. O desemprego é alto entre as pessoas jovens, mulheres e licenciados. Para mulheres entre os 20 e os 24 anos, com uma licenciatura, chega quase aos 50%.

Depois de anos de reformas económicas e medidas de austeridade, muitos egípcios não sabem como navegar a tempestade da covid-19. Os confinamentos paralisaram o turismo e outros sectores vitais. Berry acredita que o distanciamento físico e o uso de máscaras continuarão a controlar vidas em 2021, fazendo com que as pessoas da sua geração viagem menos e explorem novas oportunidades.

A lista de desejos que tem para o próximo ano inclui avançar na sua carreira e recomeçar o trabalho no canal de YouTube que teve de abandonar, por causa dos estudos e do coronavírus.

Galina Akselrod-Golikova, 23 Moscovo, Rússia

No início de 2020, Galina Akselrod-Golikova, 23, preparava-se para viajar de Moscovo para Itália, para um emprego de marketing e relações públicas no pavilhão russo da bienal de Veneza. Mal podia esperar para começar.

Mas o sonho nunca aconteceu: o evento foi adiado, o trabalho desapareceu e, em vez de viajar para o estrangeiro, acabou isolada dos amigos e família num apartamento em Moscovo, quando um confinamento começou subitamente em Abril.

O choque perturbou-a profundamente. Preocupou-se tanto que desenvolveu problemas de saúde induzidos por stress. Com o passar do tempo, no entanto, disse estar aliviada pela oportunidade de ter tempo para pensar.

Pela primeira vez, diz, abrandou e dedicou a sua energia a decorar o apartamento, que partilha com o namorado, com flores e mobília antiga restaurada. Não se apressou a procurar um novo emprego e, com tempo para reflectir, diz ter-se apercebido que quer inscrever-se num mestrado em estudos alimentares em Roma.

A Rússia resistiu a um segundo confinamento, de forma a diminuir os impactos da pandemia na economia. Akselrod-Golikova acredita que a pandemia trouxe muitas coisas positivas à sua vida, embora reconheça que foi mais fácil para as pessoas jovens adaptarem-se rapidamente.

“Comecei a apreciar o meu tempo como um recurso e a dedicá-lo à minha família, aos meus amigos. Comecei a conhecê-los de formas diferentes”, disse.

João Vitor Cavalcante, 19 São Paulo, Brasil

João Vitor Cavalcante, 19, trabalhou arduamente em 2019 na carreira de ciclista profissional, prestes a rebentar. Pensou que 2020 ia ser o melhor ano, até agora. Mas a pandemia destruiu esse sonho, empurrando-o para um trabalho numa oficina de reparação de carros. “O ciclismo não é fácil, é cruel, embora eu aprecie essa crueldade”, disse Cavalcante, à Reuters. “Agora não quero mais viver disso. Quero viver para fazer isso.”

Cavalcante é um dos milhões de brasileiros da geração Z que tiveram de alterar drasticamente as suas aspirações devido ao efeito da pandemia na economia.

De acordo com um inquérito financiado por várias organizações sem fins lucrativos brasileiras, cerca de 23% dos brasileiros com idades entre os 15 e os 29 anos tiveram de procurar novas formas de compensar perdas de rendimentos durante a pandemia. Cerca de 60% inscreveram-se para receber pagamentos de emergência do governo, que distribuiu mais de metade do salário mínimo no Brasil a qualquer cidadão sem um emprego formal.

Para Cavalcante, não havia outra opção. Os pais foram forçados a fechar a loja de roupa da família durante os primeiros meses da pandemia e o seu patrocinador deixou-o quando as competições foram canceladas.

O tio convidou-o a trabalhar na oficina de que é dono. “Foi a minha salvação”, disse Cavalcante. “Ou aceitava o emprego ou trabalhava por quase nada. O ano passado tinha mais ou menos um futuro, mas isso acabou.”

João trabalha agora oito horas por dia a reparar carros, um trabalho que o ajudou a suportar a família durante momentos difíceis.

Quer competir novamente em 2021, mas apenas como amador. “Em 2021, espero que as coisas regressem ao normal, que as pessoas possam ver os seus amigos e família outra vez e que valorizem os seus afectos”, disse.

Como reagiu a geração Z à covid-19? “É preciso falar dos problemas de ansiedade que a pandemia agravou”


14.12.20

Como reagiu a geração Z à covid-19? “É preciso falar dos problemas de ansiedade que a pandemia agravou”

Mariana Durães (texto), Paulo Pimenta e Nelson Garrido (fotografias), in Público on-line 

O receio de contrair o vírus é provocado pelo medo de infectar familiares. E as incertezas são muitas: “Se tiver que ir trabalhar e não conseguir continuar os estudos, terá que ser.” Cinco depoimentos na primeira pessoa, construídos a partir de entrevista.

“Quando o confinamento foi imposto, fiquei um bocado em choque. Não estava à espera que chegasse a um número tão elevado de casos e que tivéssemos de ficar fechados em casa. Fiquei com saudades dos meus colegas, professores e das aulas presenciais. Às vezes sentia-me um bocado sozinho.

Enquanto estava em casa, fazia videochamadas com colegas para falarmos do que estava a acontecer, jogava computador e tinha aulas online — não eram muito longas, mas ajudavam a passar o tempo.

Houve professores que foram muito rigorosos e souberam organizar-se e adaptar-se a essa nova realidade, mas houve alguns que tiveram um pouco mais de dificuldade. Acho que, no geral, conseguimos aprender, mas não tão bem como aprendemos na escola.

Quando pudemos voltar à escola, senti-me feliz por estar novamente com os meus amigos, mas também havia aquela ansiedade de não nos podermos tocar, nem estar muito próximos. Foi um bocado frustrante não poder dar abraços aos meus colegas, de quem tinha saudades.

Tive medo no princípio, quando o vírus apareceu, porque não tínhamos muita informação, não sabíamos muito bem o que era preciso fazer, ainda havia muitas pessoas que não utilizavam máscara nos locais públicos. Agora que já é obrigatório usar máscara, até na rua, sinto-me mais seguro.

Acho que nos portámos bem no início da pandemia. Fomos dos primeiros países a fechar. Mas quando começamos a desconfinar, não soubemos fazer esse processo bem e, por isso, os casos aumentaram muito. Acho que ainda agora estamos a sair muito de casa.”

“O isolamento piorou muito os meus problemas de ansiedade. O facto de não ter saído de casa durante semanas fez com que me tornasse um pouco mais introvertida e que as relações com as pessoas se tornassem um pouco mais difíceis. Se saísse de casa, ficava muito ansiosa por estar rodeada de pessoas. Antes da pandemia também me acontecia isto, mas era muito raro e não era com agrupamentos de pessoas, era devido a certos pensamentos que tinha (até sobre a crise climática).

Tive que tomar uma decisão importante, que era o que queria seguir no secundário, e a decisão esteve muito condicionada devido à pandemia. O apoio psicológico que tivemos foi muito fraco. Eu gosto de bastantes áreas e foi difícil tomar uma decisão — tanto que agora estou arrependida e vou ter que mudar de curso.

A nível de saúde mental, as coisas têm andado um bocado más e acho que afectou muita gente nesse aspecto. Eu percebo por que é que fizeram um confinamento assim e o porquê de termos de ter aulas online, mas teve muitas repercussões. Numa disciplina até aprendi melhor, mas, em geral, para além de serem muitas horas à frente de um computador, era uma sobrecarga maior e exigia mais organização.

Por um lado, foi bom ver que certos países estavam a ter melhorias a nível climático, mas eu sinto, e é um facto, que vai voltar tudo ao mesmo. A recuperação económica que está a ser feita não está virada para medidas que vão mudar o percurso do ecocídio para o qual estamos a caminhar. A nível energético, as grandes indústrias petrolíferas colocaram os preços muito baixos e foi muito difícil as energias renováveis conseguirem competir. Não tiveram tantas ajudas do Estado, nem foram recuperadas por orçamentos enormes do Estado.

Nós estamos numa crise económica e a primeira preocupação não vai ser o clima, mas sim a recuperação de empregos — o que é normal. Só que não é da maneira certa: em vez de retomarem da maneira que estava, deviam apostar numa retoma mais virada para o ambiente, mais sustentável. Tentar não insistir tanto nas indústrias petrolíferas e tentar recuperar ou criar empregos para o clima.

Sinto que as preocupações primárias das pessoas, o não ter dinheiro para pôr comida na mesa, vão tirar o foco da luta climática. Este ano, como não pudemos sair muito à rua, a luta tornou-se muito mais fechada a activistas e a pessoas que já conhecem.

Agora comecei a sair mais de casa por causa da escola. Isso ajudou um bocado, porque o facto de ter que lidar todos os dias com o perigo de poder apanhar a doença foi um pouco mais normalizado. Se saísse todos os dias de casa e ficasse com aquela ansiedade, não ia aguentar. Adaptei-me melhor à situação.”

“Nunca imaginei que a pandemia tomasse a dimensão que tomou. E esperava que o Governo tivesse tomado outras cautelas, visto que o vírus já se estava a alastrar para além da China, mas ainda estava longe de Portugal. O confinamento devia ter começado mais cedo.

Quando começou o confinamento e passámos a ter aulas online, foi uma mudança drástica e ninguém sabia o que fazer. Sou jogador de futebol e também aí foi muito complicado. Os campeonatos terminaram. A retoma também foi muito difícil. Ainda agora surgem casos em várias equipas.

O meu estado de espírito durante o confinamento era de constante espera, de não saber o que ia acontecer. Tive que me entreter com jogos de computador, lendo livros, estando com a família, actualizando-me nas séries da Netflix...

Tive medo do vírus não por mim, mas pelos meus pais, que já têm à volta de 60 anos. Pela minha avó também. O receio agravou-se a partir do momento em que os casos começaram a aumentar e começámos a ter consciência da gravidade da pandemia.

A segunda vaga tem sido mais fácil porque não estamos tão severamente confinados como na primeira. Mas devia ter sido mais bem preparada. Nas escolas, devia ter sido feito o desdobramento de turmas, por exemplo. As restrições nos horários dos cafés, na circulação, deviam ter sido feitas previamente, com mais cuidados e de forma mais rápida e eficaz. O Governo e as autoridades de saúde já deviam ter precavido o aumento de casos.

A vida a seguir à pandemia vai ser complicada, vamos estar numa crise mundial e a nossa geração vai ser muito afectada. Esta situação vai ter muita influência no meu percurso escolar, por exemplo. Para o ano não sei como é que a minha família vai estar financeiramente, não sei se vão ter disponibilidade para eu ir para a faculdade. Se tiver que ir trabalhar e não conseguir continuar os estudos, terá que ser.

Quando a normalidade for retomada, quero, sem dúvida, ir ao estádio de futebol. Também ir à discoteca e voltar a frequentar a vida nocturna que nos foi retirada. E viajar. Gostava de passar um Verão de 2021 muito melhor do que o de 2020. Com os meus amigos e com a minha namorada. Que ainda não tenho.”

“A minha vida estava num ponto bastante bom quando a pandemia começou. Eu era finalista, estava no terceiro ano da licenciatura em Arqueologia. Estava a começar o segundo semestre e a ter cadeiras que ia adorar.

Houve uma altura em que já só se ouvia falar em covid-19, mas nós nunca pensávamos que ia chegar a nós. Até que a secretaria da universidade fechou. Nós pensamos: “Então a secretaria fecha por covid-19 e nós continuamos a ter aulas?” Nesse dia à noite, soubemos pelo telejornal — nem foi pela faculdade — que a Universidade de Coimbra ia fechar. Ficamos um pouco sem saber o que fazer, ou se realmente era verdade.

No primeiro impacto, pensei: “Vou para casa 15 dias, mas depois volto.” Não estava a ter consciência. Ainda pensei se comprava uma máscara para ir no comboio para Arouca. Só quando cheguei a casa, passado um dia ou dois, quando comecei a ter as aulas no Zoom, vi os casos a aumentar, é que senti que isto não ia voltar ao normal e que não ia voltar à universidade.

Foi bastante complicado porque eu estudava fora de casa, tinha lá a biblioteca, gostava de estar naquele ambiente propício ao estudo, calminho, numa biblioteca cheia de livros... E, de repente, ver-me em casa fechada, a ter aulas pelo Zoom, sem poder estar com os meus amigos, ter que criar uma rotina e ter que me obrigar a estudar fechada no quarto… foi bastante complicado. Foi preciso pôr os pés assentes na terra e pensar: “Isto tão cedo não vai ao sítio e tu não podes cair mentalmente...”

Acabou por ser um segundo semestre bastante stressante. Estava a sentir-me estagnada: levantar-me da cama, tomar o pequeno-almoço, ir à aula no Zoom. Sempre sentada, sempre no mesmo espaço.

O meu irmão trabalha, os meus pais trabalham, e saíam constantemente de casa. Eu tinha medo. Não propriamente por mim, mas por eles, porque os meus pais já têm uma certa idade, e também pela minha avó.

Mas talvez tenha mais medo agora. Penso que na primeira vaga foi tudo para casa e acho que, pelo menos durante aqueles três meses, toda a gente teve a noção de que aquilo era preciso. Agora, com o desconfinamento, as pessoas estão a ter menos consciência. O país não pode parar, então é muito complicado voltarmos a um estado de emergência mesmo puro e duro e, então, como não há a obrigatoriedade, não está a haver a mesma consciência.

Vamos ter consequências enormes na nossa economia. Estamos a ver: o sector cultural, da restauração... Vai haver uma ruptura enorme a nível económico em vários sectores. A mim preocupa-me o desemprego. Preocupam-me as questões psicológicas e falo também pela comunidade estudantil: cada vez mais é preciso falar dos problemas de ansiedade e da depressão que, nestes meses de pandemia, se têm agravado.

A pandemia fez-me mudar bastante a forma de pensar. Se calhar, antes achávamos chato ir a casa dos nossos avós. Até nem dávamos um beijinho porque era chato — e agora queremos e não podemos. Quero abraçar a minha avó, que desde Março me cobra beijinhos e não sei quantos abraços. Depois disso, é marcar uma jantarada com os amigos.”

“A primeira impressão, quando se começou a falar do vírus, foi que iria ser uma coisa distante, apesar de vivemos numa aldeia global. Lembro-me que quando começam a surgir casos em Itália e a situação começou a complicar-se nós ainda não tínhamos essas preocupações. A ideia era de que não nos ia afectar.

No período de confinamento voltei para casa dos meus pais e tive algumas aulas online. Para mim, o mais difícil foram as primeiras duas semanas. Não sabia muito bem como é que haveria de reagir, como iria passar o meu tempo e o que poderia fazer. Durante essas semanas não fui nada produtivo. Estive no quarto, via filmes — não consegui ler, trabalhar, ou fazer alguma coisa. Estava apático. Após essas duas semanas, comecei a reagir bem. Até organizei muitas coisas da minha vida e comecei a ser muito mais produtivo. Acho que foi um processo de habituação.

Eu sabia que estava seguro. Estava em casa, não estava com grandes preocupações nesse aspecto. Os meus pais também não estavam a trabalhar, estavam em casa. O pior foi o não saber lidar com o facto de ter tantas tarefas e, de um momento para o outro, deixar de as ter e ter de estar parado em casa.

Acho que no início lidamos muito bem com a pandemia. Basta ver os números e a comparação com o resto dos países. Até fomos bastante elogiados lá fora. Depois acho que — e embora perceba que é uma situação difícil e muito stress acumulado ao fim deste tempo todo — a comunicação não é a melhor. Num período de tanta incerteza e tantas coisas novas a acontecer, a aprender e a saber todos os dias, acho que a comunicação é o principal, e sinto que as pessoas começam a dispersar com ideias diferentes. Não percebem muito bem o que está a acontecer e começam a tirar conclusões muito precipitadas sobre muitos assuntos. O Governo falhou na comunicação. Quanto à prevenção, não gosto de ser muito crítico, porque acho que ninguém estava à espera de uma coisa assim.

Sinto-me um pouco privilegiado e acho que a pandemia não vai afectar tanto a minha vida pessoal, tendo em conta que estou a estudar e que, apesar de tudo, os rendimentos dos meus pais continuam fixos. Sinto que tenho garantias de continuar a estudar e, por isso, sinto-me seguro — sabendo que muita gente não está. A minha preocupação é mais para com quem não vai poder seguir a vida como estava.

O desemprego vai aumentar. Vão surgir muitas crises sociais e económicas e isso, do ponto de vista político, é muito preocupante. Ainda há pouco tempo tivemos uma recessão económica e, se tivermos outra, não sei como é que politicamente, socialmente e economicamente vamos lidar com isso.”


 

27.1.20

Quem diz que a Geração Z não fuma e não bebe? Quem “não faz parte dela”

Mariana Durães (texto) e Teresa Pacheco Miranda (vídeo e fotos), in Público on-line

Dizem que eles não fumam, não bebem, não têm relações sexuais. Que são inclusivos, depressivos ou dependentes da tecnologia. São muitos os estudos, relatórios ou notícias sobre a Geração Z (e todas as outras) — mas até que ponto são rigorosos? “Não há propriamente traços que definam uma geração de forma uniforme”, afiança investigador.

A maior parte não sabe o que é viver sem Internet: os mais velhos lembram-se, no limite, de ter Internet limitada; os mais novos com certeza estarão a rir-se da frase anterior. Cresceram num panorama de crise e recessão económica. Habituaram-se ao termo “terrorismo”. Herdaram os desafios de um planeta degradado.
Falamos da Geração Z, dos jovens nascidos entre meados dos anos 90 e 2010. Em Portugal, são cerca de dois milhões e meio os que pertencem a este grupo — globalmente, segundo dados da Organização das Nações Unidas, deverão representar 32% da população. E o que podemos dizer sobre eles? À partida, quase nada: “Não há propriamente traços que definam uma geração de forma uniforme”, explica o sociólogo Vítor Sérgio Ferreira, autor do livro Geração Milénio? Um Retrato Social e Político e especializado em sociologia da juventude. “Há acontecimentos que são comuns, mas que são experienciados de forma diferente, consoante as condições sociais de existência dos jovens.”

Generalizações postas de lado, quisemos ouvir um retrato na primeira pessoa. Procurámos a Geração Z e convidámo-la a falar dela própria, da percepção que têm dos seus pares e do que pensam em relação aos estudos (nem sempre tão fundamentados) de que são protagonistas. Perguntar-lhes se concordam com as notícias que dizem que estes jovens fumam menos, bebem menos, têm menos relações sexuais. O que acham das investigações que referem que consomem mais drogas e são mais inclusivos, mas também mais depressivos; que dizem como eles vão mudar o mundo — ou que condenam o quão pouco querem saber dele. Que têm conclusões que nem sempre coincidem.

As reacções são semelhantes quando atiramos a primeira provocação: “É verdade que a Geração Z não fuma, não bebe e não tem relações sexuais?”. Uma gargalhada, um revirar de olhos ou um “não” peremptório. “Não concordo. Não fumo, nem bebo — nem quando vou sair. Mas não concordo porque sou a única”, afirma Inês Rodrigues, de 18 anos, estudante de Arquitectura da Universidade do Porto.

Miguel Correia, aluno do mesmo curso, acredita que a teoria só pode ter sido concebida por “pessoas que não estão na Geração Z” e Isabel Fernandes, 20 anos, arrisca dizer que “há, na verdade, um aumento destes hábitos”, principalmente no que toca a beber. Marta Tuna, estudante de Ciências da Comunicação na Universidade do Porto, ressalva que “não se pode generalizar”, mas que “a maior parte das pessoas” com quem se dá, fuma. “E as outras coisas também.”

“Este discurso ‘geracionista’ tem sido muito comum, ultimamente. A ideia de olhar para os jovens desta forma muito uniforme”, quando, na verdade, “o que é comum são determinadas condições”, como o caso da “precarização do mercado de trabalho” — “uma condição estrutural que se acentuou mais durante o período da crise” — e da “digitalização do mundo”, refere Vítor Ferreira. São mudanças “marcantes”, ainda que “silenciosas”, que podem “fazer mudar experiências juvenis” — o que não quer dizer que, a partir desses dois acontecimentos, se possam “generalizar traços de personalidade”.

“Dizemos que existe uma geração quando existem condições que mudaram de tal forma que o curso de vida dos jovens que nasceram nessas condições vai ser bastante diferente do das gerações anteriores”, explica o sociólogo. A partir daí, “há todo um conjunto de estudos sobre gerações que são feitos por empresas de consultoria e de marketing, que têm interesses específicos em generalizações”, considera. “O que essas empresas querem é condicionar determinados tipos de práticas e de consumo.”

Num estudo do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), feito em 2018 com 66 148 jovens que participaram no Dia da Defesa Nacional e completaram 18 anos nesse ano, 88,9% dos inquiridos referiram já ter consumido bebidas alcoólicas, 60,1% já tinham consumido tabaco, 35,6% substâncias ilícitas (drogas) e 7,1% tranquilizantes ou sedativos sem receita médica. “As prevalências de consumo de tabaco, bebidas alcoólicas e tranquilizantes ou sedativos sem receita médica têm-se mantido estáveis entre 2015 [data em que foi realizado o primeiro estudo] e 2018”, lê-se no documento.

Já um relatório da Direcção-Geral de Saúde, feito em 2019, compara o consumo de tabaco junto dos alunos do ensino público entre os 13 e os 18 anos em 2003 e em 2015. Os dados mostram que tem havido uma diminuição em todas as idades: em 2003, a percentagem de jovens com 13 anos que já tinham experimentado fumar era de 29,4%; em 2015, era 11,7%. Quanto aos de 18 anos, os mais velhos da amostra, os valores diminuíram de 69,5%, em 2013, para 58,7%, em 2015. As conclusões do relatório dizem que “embora muitos progressos se tenham alcançado, quer a nível global, quer nacional, as tendências actuais sugerem que o uso do tabaco não está a diminuir tão rapidamente como seria desejável”.