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20.7.22

Geração Z e millennials portugueses sentem-se financeiramente ansiosos. Custo de vida é a principal preocupação

Daniela Carmo, in Público

Inquérito da Deloitte mostra que além de inquietos com as finanças a curto e longo prazo, millennials e jovens da geração Z estão também preocupados com as mudanças climáticas. Saúde mental e desemprego estão igualmente entre as principais preocupações.Financeiramente inseguros, stressados, apreensivos quanto à reforma, mas comprometidos com a luta pelo clima. 

É assim que os 400 millennials e jovens da geração Z portugueses que responderam ao inquérito mundial “Gen Z and Millennial Survey 2022” se descrevem. Entre as principais preocupações (que coincidem nas duas gerações e tanto para portugueses como para os outros inquiridos dos restantes 45 países envolvidos no questionário) destacam-se o custo de vida e as alterações climáticas.

No que toca à segurança financeira, a geração nascida entre 1983 e 1994 (millennial) está mais apreensiva e insegura, do que a geração subsequente (de 1995 a 2003). Ao inquérito, que decorreu entre Novembro de 2021 e Janeiro último, responderam 200 millennials e 200 jovens da geração Z. Entre os millennials, 65% não se sente seguro financeiramente. Uma percentagem mais elevada do que os 61% dos jovens da geração Z nacionais que estão inseguros nesse parâmetro.

A nível global o questionário contou com mais de 23 mil inquiridos de 46 países de diversos continentes (Europa, América, África, etc). Nesta 11.ª edição, a Deloitte, empresa que levou a investigação a cabo, incluiu uma análise dedicada a Portugal. Comparando com os outros inquiridos, a inquietação com as finanças dos jovens e adultos nacionais é maior: a percentagem global desce para os 40% e 46%, respectivamente, nos jovens da geração Z e nos millennials que estão inseguros financeiramente.

O estudo analisou várias questões como expectativas sobre segurança financeira, stress, ansiedade e saúde mental ou a expectativa com a possibilidade de vir a receber reforma.

O custo de vida é, aliás, a maior preocupação dos inquiridos quando lhes é pedido que escolham cinco inquietações e lhes dêem uma ordem. A nível nacional mais de um terço dos jovens da geração Z (34%) e quase metade dos millennials (46%) colocam o custo de vida no topo da tabela. No segundo lugar aparecem as alterações climáticas (32% em ambos os grupos etários).

Ansiedade financeira, ansiedade climática

Já o panorama mundial mostra que a percentagem de inquiridos que colocam as alterações climáticas no segundo lugar baixa para os 24% (Geração Z) e para os 25% (millennials). Mas enquanto estão a braços com a ansiedade financeira, estes jovens e adultos lutam pela protecção do ambiente com pequenos gestos diários. Mais de 70% dos inquiridos dos dois grupos etários “concordam que o mundo está num ponto de inflexão na resposta às alterações climáticas e no futuro poderá ir para qualquer um dos lados”, lê-se no estudo.

Entre os comportamentos que tomam diariamente para inverter a situação destacam o uso de plástico/papel reciclados ou recicláveis; o uso de copos e utensílios reutilizáveis; compras em segunda mão (roupa e mobília, por exemplo); comprar no comércio local ou produtos orgânicos.

Por outro lado, aspiram poder vir a, no futuro, a comprar carros eléctricos ou híbridos, melhorar as habitações tornando-as mais sustentáveis (por exemplo, com a instalação de painéis solares) ou aumentar a participação cívica. Os resultados do inquérito indicam ainda que as duas gerações “estão dispostas a gastar dinheiro no curto prazo pela sustentabilidade, mas, actualmente, alguns hesitam em fazer grandes investimentos financeiros a longo prazo, provavelmente devido a restrições financeiras”.

“O stress é outra das marcas das gerações mais novas em Portugal”, destaca o comunicado de imprensa relativo à situação nacional enviado ao PÚBLICO. Mais de metade (53%) dos inquiridos da geração Z e 39% dos millennials relatam sentir-se ansiosos ou stressados na maior parte do tempo (46% e 38% a nível global, respectivamente). Entre as causas de stress destacam o futuro financeiro a longo prazo, as preocupações relacionadas com a saúde mental, a carga laboral, a família e relações pessoais e ainda as finanças diárias.

A saúde mental é, aliás, a terceira das preocupações dos jovens da geração Z, além do custo de vida e do clima. Neste grupo etário, a percentagem a colocar a saúde mental no terceiro lugar das cinco maiores preocupações corresponde a 27% dos inquiridos (a nível global nesta geração, o parâmetro aparece em quarto lugar no Top 5 das preocupações, com 19%). Segue-se o desemprego (19%) e a escassez de recursos (17%).

Os números são mais expressivos quando se percebe que no local de trabalho a percentagem de inquiridos que não se sentiria à vontade para falar abertamente com o gestor directo sobre o facto de se sentirem ansiosos ou sobre outros desafios da saúde mental chega aos 37% nos jovens da geração Z e aos 35% para os millennials.

Já os millennials estão mais inquietos com a desigualdade de rendimento/distribuição de riqueza (25%), com o desemprego (23%) e com a saúde/ prevenção de doenças (17%).
Gerações reavaliam o que é prioritário

De acordo com Nuno Carvalho, responsável pela área de Capital Humano da Deloitte em Portugal, citado no comunicado, “o actual contexto mundial conduziu a um clima generalizado de apreensão com o futuro, a que os millennials e a geração Z não são alheios”. “Os efeitos da pandemia e, mais recentemente, da guerra na Ucrânia têm levado as gerações mais novas a reavaliarem o que é prioritário, contrariamente a algumas das conclusões em edições anteriores. Temas como a flexibilidade no trabalho, o stress ou mesmo a reforma estão agora no topo das prioridades destas gerações e devem ser tidos em consideração pela sociedade e pelas empresas”, sublinha.

O jovens da geração Z mostraram-se com mais vontade de mudar de emprego do que os millennials. “Segundo o estudo, 29% dos Gen Z pretende sair do seu actual trabalho dentro de dois anos e 20% pretende mudar dentro de cinco anos. Nos millennials 27% que sair daqui a dois anos e 28% daqui a cinco anos. Cerca de 36% dos inquiridos da geração Z e 23% dos millennials afirma que abandona o seu empregador mesmo se não tiver outro trabalho garantido para onde mudar”, refere o comunicado.

Quando se fala de reforma no final da carreira profissional, 27% dos jovens da geração Z e um terço (33%) dos millennials dizem sentir-se seguros em relação à sua reforma. Os números são mais baixos do que a nível mundial: 41% nas duas categorias que têm confiança quanto à reforma.



4.5.22

INSEGURANÇA ALIMENTAR GRAVE AFETOU QUASE TRÊS MILHÕES EM MOÇAMBIQUE EM 2021

in Rádio Comercial

De acordo com as Nações Unidas, é o número mais elevado desde a seca de 2016.
Quase três milhões de pessoas em Moçambique tinham em 2021 uma situação alimentar de crise ou emergência, o número mais elevado desde a seca de 2016, conclui um relatório hoje publicado.

De acordo com o relatório, publicado anualmente pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Programa Alimentar Mundial e a União Europeia, no ano passado, 193 milhões de pessoas em 53 países estavam em situação de insegurança alimentar aguda, ou seja, precisavam de assistência urgente para sobreviver.

A classificação engloba os níveis entre 3 e 5 da escala internacional de segurança alimentar: crise, emergência e desastre.

Em Moçambique, segundo o estudo, 2,91 milhões de pessoas estavam no nível 3 ou acima: 2,65 milhões em situação de crise e 260 mil em situação de emergência.

Isto representa 16% da população analisada pela organização, que estudou 33 áreas em 11 províncias e 12 cidades, abrangendo 60% da população total de Moçambique, de 30,1 milhões.

Segundo as conclusões, 15 áreas no leste de Cabo Delgado, no sul de Tete, e na maioria dos distritos de Gaza e Inhambane, assim como no distrito de Dondo, em Sofala, e no de Magude, em Maputo, estavam em situação de crise.

Todas as outras áreas analisadas estavam no nível 2 da escala internacional de segurança alimentar, na qual se encontravam 8,41 milhões de pessoas.

Quase 75 mil crianças com menos de 5 anos tinham baixa estatura em 2021, dos quais 27 mil de forma severa, e metade das crianças da província de Cabo Delgado tinha baixo peso, concluem os investigadores.

Os autores do documento sublinham que o número de pessoas em situação de crise ou emergência em Moçambique em 2021 foi superior ao de 2020 em 240 mil pessoas e foi o maior número registado desde que o país foi fortemente afetado pela seca de 2016, ligada ao fenómeno climático do El-Niño.

A crise alimentar foi agravada pelo conflito e consequente movimento populacional no norte de Moçambique, que provocou uma perturbação da produção agrícola e do fornecimento de alimentos e fez subir os preços, enquanto períodos secos, secas, chuvas intensas e inundações afetaram a produção agrícola em todo o país.

As restrições relacionadas com a pandemia de covid-19 continuaram também a afetar as atividades económicas, pode ler-se no relatório.

Sublinhando que as pessoas obrigadas a abandonar as suas casas estão entre as mais vulneráveis à insegurança alimentar e à malnutrição, os autores do relatório contabilizam em 950 mil os deslocados internos – devido ao conflito e insegurança no norte do país e devido aos danos provocados pelos ciclones dos últimos anos no centro – e em 25 mil os refugiados e requerentes de asilo em Moçambique.

Nas suas projeções para 2022, os autores do relatório antecipam que a situação da insegurança alimentar melhore na maioria do país, exceto na região de Cabo Delgado, onde se estima que esteja 50% da população de Moçambique em crise alimentar ou pior.

O relatório estima que 1,86 milhões de pessoas no país estivessem em situação de crise alimentar ou pior até março de 2022, nomeadamente em Cabo Delgado, Manica, Tete e Gaza.

15.2.16

No país que só tem petróleo e mais nada

in Diário de Notícias

Mulheres às compras num supermercado de Caracas, em que uma estante vazia simboliza a crise alimentar e a escassez na Venezuela

Na capital, a água é tão cara e tão escassa que os habitantes esperam durante horas ao lado de uma montanha de onde ela corre para a estrada. No campo, as plantações de cana-de-açúcar apodrecem e as fábricas de laticínios permanecem ociosas, apesar de as pessoas carregarem sacos de dinheiro com elas para comprar alimentos no mercado negro em todas as cidades e vilas. E aqui, neste porto que em tempos alimentou uma nação, tudo parece deserto. Onde antigamente uma dúzia de navios esperava para entrar, a partir de um forte há muito tempo construído sobre uma colina para proteção contra os ataques marítimos, apenas se consegue avistar quatro.

Ninguém quereria pilhar Puerto Cabello hoje. Já não resta nada para roubar. E tudo está prestes a ficar muito pior. Espera-se que a inflação atinja os 720% neste ano, a mais alta do mundo, fazendo que a Venezuela faça lembrar o Zimbabwe no início do seu colapso. O preço do petróleo, a força vital deste país, entrou em queda abrupta para mínimos jamais vistos em mais de uma década.

Durante o último mês tenho escrito sobre a Venezuela todos os dias, descrevendo o seu povo, a política, a língua, as peculiaridades e a cultura através dos olhos de um correspondente que se mudou para cá no momento em que este país estava a cair cada vez mais fundo no caos económico. Foi um projeto em que momentos fugazes faziam a história: debates aos gritos durante a primeira sessão do Congresso, soldados no túmulo do presidente Hugo Chávez, que morreu em 2013, cartas de expatriados que deixaram a Venezuela devido ao crime e desejavam regressar.

Enquanto escrevia sobre as coisas do quotidiano, alguns temas tornaram-se ainda mais evidentes. Na Venezuela - um país onde os hospitais já não têm seringas, os supermercados têm dificuldade em manter os produtos básicos nas prateleiras e o governo declarou estado de emergência económica, enquanto está sentado em cima das maiores reservas mundiais de petróleo - as tensões aumentam.

Visitei um piscicultor que, após a ração para alimentar os peixes ter acabado, recorreu à moagem de grãos e cana-de-açúcar, atirou-os para o tanque e fez figas. (Obteve peixes pequenos.) Escrevi sobre os pacotes de dinheiro necessários para comprar um pouco de café e água; uma loja que vendia apenas brinquedos estragados; e a lealdade duradoura dos partidários de Chávez. Com a fotógrafa Meridith Kohut, viajei por todo o país no que parecia, para muitos, a véspera de um desastre. Ele era visível nos rostos das pessoas ao longo da jornada, quase 2000 quilómetros no total, a partir da costa, percorrendo os Andes e, finalmente, terminando nas vastas mas moribundas planícies agrícolas da Venezuela.

Ao descer a encosta em Puerto Cabello vimos uma fila formada à frente de um supermercado, com centenas de pessoas à procura de comida. Muitos tinham chegado às 05.30, quando corriam rumores de que um camião de entregas tinha chegado à loja. Às 10.15, um polícia armado montava guarda à porta, deixando entrar uma dúzia de pessoas de cada vez. No dia anterior, tinha havido feijão, farinha e leite para venda. Nesta manhã, havia apenas óleo de fritar.

Ecio Corredor, que estava na fila, disse-me que tinha perdido o emprego em novembro. Ironicamente, contou ele, o seu trabalho era conduzir os camiões das mercadorias do cais para os supermercados. "Agora já não há mais carregamentos", disse. Falava com Carlos Perozo, um outro motorista, que contou estar sem trabalhar há um ano por precisar de uma bateria nova para o seu veículo. Ele não conseguia encontrar outra e, mesmo que a encontrasse, não a poderia pagar. "Tenham cuidado", avisou Perozo. "Alguém irá atrás da vossa."

Palmeiras alinhadas marcavam o perímetro de uma refinaria de petróleo. "Somos todos Chávez", estava pintado na lateral das instalações. Em Morrocoy, a estrada acabava num cais. Um barqueiro levou-nos através de um pântano que terminava numa praia de areia branca, onde Eduardo Vera e a mulher, Carolina Morillo, tinham levado o seu filho pequeno de férias. O casal, que em tempos tinha pertencido à classe média, sobrevivia agora com dois salários que se tinham desvalorizado até ao equivalente a dois euros por dia. Ambos têm trabalhos suplementares. "Conseguimos viver, mas não confortavelmente", disse a sra. Morillo. As férias eram uma extravagância. Os dois, com cerca de 30 anos, sonham em ter outro filho, embora tal lhes pareça impossível agora. "Mal conseguimos encontrar fraldas ou leite para José Antonio", disse o sr. Vera, falando do filho. Mas esperamos tempos melhores, disse ele, acrescentando: "Queremos conhecer a Disneylândia, um dia."

Da costa começámos a avançar para o interior, uma jornada que começou com a descoberta do ouro negro. Não do petróleo, o qual há muito na Venezuela, mas do feijão preto. Quase não existe aqui. São poucos os produtores que o têm ainda ao preço fixado pelo governo. Octavio Medina comprou-o a um preço 50 vezes superior e ainda o vendeu com uma margem adicional na rua. Ele diz que dezenas de pessoas compram sacos, ao preço de metade de um dia de trabalho de salário mínimo.

Começámos a dirigir-nos para os Andes. A estrada ficou mais estreita e cheia de curvas ao subirmos as encostas rochosas. "Vocês estão aqui para cobrir as notícias?", perguntou-nos um soldado num posto de controlo. "Quais notícias?", perguntámos. "Os sequestros", disse ele. Os resgates são um negócio em todo o país.

Mérida fica entre dois altos grupos de montanhas, uma pitoresca cidade universitária andina. Um teleférico, que dizem ser o mais alto do mundo, oferecia, em tempos, vistas deslumbrantes sobre o vale. Agora jaz por ali avariado.

Frank Tirado comia num restaurante, com um sorriso aberto e uma maneira inocente de falar que desmentia o facto de ter acabado de passar por alguns dos meses mais difíceis da sua vida. Ele mostrou-nos uma cicatriz num dos lados da cabeça, prova de uma cirurgia recente ao cérebro. Alguns meses atrás, ele começou a ter dores de cabeça e perda de visão. O neurologista disse-lhe que tinha um tumor no cérebro. Se não fosse operado, ficaria paralisado. Mas a lista de espera no hospital público era de mais de um mês, tempo demasiado para conseguir sobreviver. Um hospital privado poderia tratar o sr. Tirado imediatamente, mas apenas se ele pudesse pagar. Duas tias na Florida transferiram--lhe o dinheiro, contou. O sr. Tirado apertou nas mãos um livro de orações cristão e maravilhou-se com a sua sorte por ter família a ganhar dólares no estrangeiro.

Antes de deixarmos a cidade, fizemos uma paragem na catedral, onde Vladimir Gutiérrez estava sentado nos degraus a pedir moedas. Ele tirou um pão de baixo da sua camisa. O montante que tinha arrecadado, 50 bolívares, não seria suficiente para comprar outro. Mostrou-nos umas feridas recentes resultantes de uma briga de facadas que, segundo ele, começou após um homem ter agarrado a sua filha. "Mas cheguei para ele", afiançou Gutiérrez. Parecia despreocupado com o que estava por vir. Há muito tinha batido no fundo.

A estrada dos Andes desembocava em Los Llanos, coração agrícola da Venezuela. Rodolfo Palencia, um fazendeiro, passou uma tarde na sua rede a cantar-nos músicas que ele escreveu sobre o seu estado de Barinas, a parte mais fértil do país, segundo as letras das canções. Mas as baladas falavam de outros tempos. O sr. Palencia levou-nos a um campo de cana-de--açúcar, que tinha três metros de altura e estava morta. O moinho de açúcar nas proximidades, construído pelo governo no início dos anos 2000, não poderia processar a cana neste ano, disse ele.

Os campos onde antes cresciam os cereais estavam em pousio; tinha havido escassez de fertilizantes neste ano também. Tanto quanto a vista alcançava, estávamos cercados por altas ervas daninhas. E o leite. Aqui também não há nenhum, especialmente em La Batalla, uma atividade que há uma década produzia 126 mil litros anualmente, entre as três fábricas existentes. Foram nacionalizadas e a sua fábrica em La Sabaneta é agora um posto avançado vazio. O único funcionário é o vigia que abriu o portão. Os medidores das bombas eram ilegíveis. O sistema de arrefecimento, aberto, tinha oxidado. Havia morcegos por ali.

"Perda total", começou Alirio Alvarado, olhando para um tanque agrícola onde em tempos tinha cultivado um peixe chamado cachama. Há dois mil tanques nesta área e os agricultores dizem que estão quase todos vazios agora. Foi o sr. Alvarado que colocou os seus próprios grãos e a cana-de-açúcar no tanque. Os peixes cresceram apenas metade do tamanho normal. Depois acabaram-se-lhe os grãos. "Pode-me dizer que eu deveria ter vendido os grãos para que as pessoas pudessem comê-los, mas eu não tinha escolha", disse ele.

A poucos quilómetros de distância, o sr. Palencia, o fazendeiro, levou-nos até à fábrica que se destinava a fornecer alimentação para as explorações piscícolas. Este lugar nunca foi abandonado, porque ele nunca abriu, disseram os fazendeiros. No interior, milhares de dólares em equipamentos não utilizados acumulavam ferrugem. Um manual de instruções estava por abrir num saco de plástico. No chão da fábrica havia faturas espalhadas de uma empresa alemã chamada Andritz Feed & Biofuel. "Que desperdício", disse o sr. Palencia.

Passado pouco tempo apareceu um guarda, admirado por termos entrado. Perguntou ao fazendeiro o que estava ali a fazer. O sr. Palencia não respondeu, virando-se antes para mim. "Se fôssemos governados como deve ser, este país poderia ser mais rico do que a Arábia Saudita", disse Palencia.

Ele mal conseguia conter a raiva, sem saber a quem culpar. Seria o sr. Chávez, morto desde 2013? Seria a maldição da dependência do petróleo? Ou seria o vigia que só agora tinha aparecido? "Eu devia denunciá-lo", disse o fazendeiro, apontando um dedo. "Não me acuse", pediu o guarda. "Você nem sequer está a tomar conta deste equipamento", disse o fazendeiro. "Alguém pode roubá-lo. Você não faz nada." "Eu sou mal pago; você não percebe", disse o vigia. Mas era tarde demais. O senhor Palencia já se tinha afastado.

29.3.13

Roubos a casas batem recorde

por Sónia Graça, in Sol

Nunca tantas casas foram assaltadas em Portugal. No ano passado, quase mil residências foram roubadas.
O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), divulgado esta semana, indica que a criminalidade violenta desceu 7.8%, mas aquele crime foi uma das excepções mais preocupantes.

Ao todo, a Polícia investigou 995 roubos em residências em 2012, mais 36% do que em 2011 – o que equivale a uma média de três casos por dia. Em 2010, ano em que se iniciou a contabilização do fenómeno, as autoridades registavam 682 ilícitos.

Não foi por acaso que no ano passado o Governo elegeu este crime como prioritário, mas a verdade é que as polícias não estão a ganhar este combate.

O alarme começou no Algarve quando em 2009 gangues armados do Leste da Europa começaram a invadir moradias com uma violência nunca vista. Desde então, o fenómeno rapidamente alastrou às grandes cidades.

É, aliás, no litoral do país que esta criminalidade atinge maiores proporções. No distrito de Lisboa, foram registados 313 dos 995 assaltos. Logo a seguir, Setúbal concentrou 153 participações, o Porto totalizou 131, Braga 69 e Faro 66.

Foi nos meses de Maio e Dezembro que este crime atingiu o pico das participações – e não no período de Verão, quando os furtos a residências costumam agravar-se, dada a ausência dos proprietários para férias.

Maioria dos roubos são feitos com ameaça

Há, contudo, um ponto semelhante: mais de metade (53%) destes crimes também foram praticados por solitários. «Muitas vezes são indivíduos toxicodependentes ou até vizinhos que conhecem relativamente as vítimas», explica fonte do Sistema de Segurança Interna (SSI), sublinhando que a maioria dos ataques acontece em «zonas mais isoladas e em casas de idosos».

Já esta semana, na madrugada de terça-feira, a mãe do ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amado viu a casa ser invadida por dois jovens, um deles armado. A dupla terá usado um pé-de-cabra para abrir uma porta traseira da vivenda, situada em Porto de Mós (Leiria). Lá dentro, dirigiram-se ao quarto onde a viúva, de 80 anos, dormia e apontaram-lhe a arma à cabeça. Como não tinha dinheiro, a vítima teve de entregar todos os anéis e artigos em ouro que tinha.

No entanto, na maioria dos casos, não há recurso a qualquer tipo de arma. Em 74% dos 995 roubos registados em 2012, nenhuma arma foi usada: a ameaça física ou psicológica foi suficiente para coagir as vítimas. Apenas em 24% dos casos foi exibida uma arma de fogo ou uma arma branca.

Em contrapartida, em quase todos os roubos consumados, os ladrões não conseguiram arrecadar mais do que 250 euros. Só em 9% das investidas é que os criminosos levaram mais de cinco mil euros em dinheiro ou objectos.

Já os furtos de metais não preciosos – que passaram a ser contabilizados pela primeira vez neste RASI – foram bem mais lucrativos. Cerca de 30% dos 15.171 crimes investigados pela PSP e GNR, renderam entre mil€ e cinco mil euros.

Este fenómeno tem sido protagonizado por «grupos criminosos com elevado grau de preparação, profissionalismo e sofisticação», lê-se no RASI. Basta ver que, em 2012, o Ministério Público abriu 8.213 inquéritos mas deduziu apenas 58 acusações contra 2.424 processos que acabaram por ser arquivados.

A verdade é que, pela primeira vez desde 2008, os crimes contra o património (218.236) diminuíram cerca de 4%. Esta descida contribuiu para a quebra de 2% do total de crimes participados à PSP, GNR e Polícia Judiciária (PJ).

Agressões a polícias e menores dispararam

A mesma tendência se verificou na categoria dos crimes contra as pessoas (86.548), que desceram 5%. Os homicídios fugiram a esta regra. No ano passado, a PJ investigou 149 casos (37 dos quais conjugais), mais 32 do que em 2011.

Também as agressões a polícias subiram: 1.863 agentes foram alvo de resistência e coacção, mais 119 do que há dois anos. Foi o valor mais alto desde 2003. Neste capítulo, houve ainda outros acréscimos dignos de registo. Foi o caso da vida privada e violação de segredo (subiram 24,5%) e dos maus tratos ou sobrecarga de menores (mais 20,3%).

13.10.12

Medidas previstas no Orçamento 2013 são "extremamente prejudiciais" para segurança dos cidadãos

in Jornal de Notícias

Os sindicatos das forças de segurança consideram que as medidas previstas no Orçamento do Estado para 2013, a confirmarem-se, são "extremamente prejudiciais" para a segurança dos cidadãos e põem em causa a operacionalidade.

Em comunicado hoje emitido, a Comissão Coordenadora Permanente dos Sindicatos e Associações dos Profissionais das Forças e Serviços de Segurança (CCP) entende que, "a confirmarem-se, as medidas previstas no OE são extremamente prejudiciais para a segurança pública dos cidadãos, prevista como um direito na Constituição da República, uma vez que os cortes previstos nos diversos ministérios e nas várias forças policiais colocarão em causa a operacionalidade e funcionamento" das referidas forças.

A CCP agendou uma reunião para 23 de outubro, em Lisboa, para discutir as medidas previstas no Orçamento do Estado, bem como "debater objetivamente as consequências no setor da segurança interna" que o diploma possa acarretar.

Também o "brutal aumento da carga fiscal" e o "impacto significativo" que as medidas já conhecidas poderão ter na vida dos profissionais das forças e dos serviços de segurança fazem parte dos assuntos em discussão.

Para a CCP, se tais medidas se confirmarem, a organização "não terá outra alternativa que não seja desencadear as ações que entenda necessárias para a salvaguarda dos profissionais, das instituições e dos demais cidadãos".

A CCP reúne os sindicatos mais representativos da Guarda Nacional Republicana, da Polícia de Segurança Pública, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, da Guarda Prisional e da Polícia Marítima.

A suspensão da passagem à pré-reforma e o fim do transporte gratuito para os polícias são algumas das medidas que constam da versão preliminar da proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2013.


20.3.12

Aumentam os crimes cometidos entre idosos

Emília Monteiro, in Jornal de Notícias

Há dois milhões de pessoas com mais de 65 anos em Portugal, a maioria ativa e saudável, que vive e sente como o resto da população", disse ao JN Daniel Serrão, professor jubilado de Ética Médica na Universidade do Porto. "Temos tendência a pensar nos idosos como vítimas, mas eles são também agressores e autores dos mais diversos crimes", referiu José Eduardo Pinto da Costa, especialista em Medicina Legal.

"A criminalidade dos idosos é um facto, muitas vezes porque as reformas são insuficientes e levam as pessoas a praticar burlas, golpes financeiros, crimes sexuais e homicídios", frisou Pinto da Costa, em Braga, na conferência "Envelhecimento ativo".

27.2.12

Injustiça instiga mais ao crime do que a bolsa vazia, dizem especialistas

in Jornal de Notícias

Especialistas consideraram, esta segunda-feira, no Porto, que o sentimento de injustiça, num contexto de austeridade, pode contribuir mais para o aumento da criminalidade urbana do que o puro estado de necessidade.

"Há uma teia em que diversos fatores, e não apenas a crise económica, podem contribuir para o aumento da criminalidade. Por exemplo, as pessoas que veem o crime de colarinho branco a não ser punido adquirem a perceção de que se os grandes fazem, então também podem roubar num supermercado", ilustrou o antropólogo Daniel Seabra.

A necessidade é "um fator que pode influenciar [o aumento da criminalidade], mas não é o único, nem determinante ou exclusivo", anuiu o segundo comandante da PSP do Porto, intendente Pedro Teles.

"Quando assistimos ao retirar de direitos às pessoas e vemos outros vangloriarem-se de que nem se importam muito sobre quanto vão receber por cargos não executivos (...), temo que a revolta possa surgir e que a legitimação dessa revolta se comece a instalar", afirmou, por seu lado, o inspetor-chefe da PJ Tavares Rijo.

O investigador, que iniciou a sua carreira em 1974, declarou-se "perplexo" por ver "gente com grandes responsabilidades na segurança deste país a anunciar que se vão fazer reuniões ao mais alto nível porque se antevê que a crise económica venha a redundar num aumento da criminalidade".

"São questões demasiado sérias para serem debatidas, em antecipação, na praça pública. Estas questões têm de ser trabalhadas, mas em privado, no silêncio", sublinhou Tavares Rijo, acrescentando que o crime "não se combate por decreto, nem com reuniões palacianas, combate-se com uma grande política social e com uma sensibilização da comunidade".