6.6.07

"Não é possível pensar que amanhã Portugal será n.º 1 na flexissegurança"

Alexandra Figueira, in Jornal de Notícias

Poul Rasmussen voltou ontem a Portugal para advogar um novo modelo laboral para a Europa


Hoje lidera o Partido Socialista Europeu e elogia a actuação do Governo (socialista) português, a quem imputa a responsabilidade de lançar o debate sobre a flexissegurança. Poul Rasmussen acredita que um modelo laboral que alie flexibilidade à segurança é inevitável num contexto de globalização, sob pena de se destruir o modelo social europeu.

Relações públicas. É a melhor expressão para classificar a vinda do antigo primeiro ministro da Dinamarca que, pela primeira vez, aplicou a um país as teorias da flexissegurança, que combinam maior flexibilidade e maior segurança no mercado de trabalho. O modelo, avisou, não pode ser simplesmente copiado, mas os parceiros - sindicatos, patrões e Governo - devem sentar-se até chegarem a um entendimento de partida. E caso não consigam, o Executivo tem, diz, a obrigação de actuar.

JN|Como classifica o grau de flexibilidade e segurança em Portugal?

Poul Rasmussen|Portugal está no caminho para uma nova sociedade. É claro que começou de um outro ponto de partida do que os países escandinavos, mas está, neste momento, com um desenvolvimento muito dinâmico. Não é possível imaginar que, por algum milagre, amanhã, Portugal pode ser o Estado europeu n.º1 no que toca à flexissegurança. Portugal deve seguir um caminho para novos empregos, mais empregos, maior educação, melhor polícia social e flexissegurança. O futuro, para Portugal, é tomar as prioridades certas para o caminho para a flexissegurança.

Que prioridades devem ser essas?

Primeiro e antes de tudo seria sensato criar uma espécie de novo entendimento, uma espécie de "new deal", com direitos e deveres para todos os parceiros. Governo, empresas, sindicatos, instituições de educação devem estar juntas para criar uma estratégia comum para Portugal. Em muitos países, uma parte da sociedade só quer falar de flexibilidade e a outra parte só quer falar de segurança social, mas muito poucos falam sobre como combinar segurança social e flexibilidade.

Na semana passada houve uma greve nacional em Portugal e uma das razões foi a flexissegurança. Como é que se convencem os sindicatos a discutirem o assunto?

Todos os parceiros devem assumir co-responsabilidade. As empresas e os sindicatos têm que se sentar à mesa, em conjunto com o Governo, e discutir o futuro. Senão, será uma luta sem fim, em que cada lado tentará fincar o pé no seu conceito. Penso que, neste momento, o Governo é o único parceiro que está a tentar integrar a abordagem de flexibilidade e de segurança. Os outros têm tendência para se concentrarem só na flexibilidade ou só na segurança. Em segundo lugar, é preciso investir, investir, investir, em educação, nova tecnologias e novos mercados, em qualificações. Também se devem encontrar modelos para sectores específicos. Pode existir um sector com uma boa performance ou uma ou duas grandes empresas com boa performance e que podem servir de modelo. Não se trata de ter todas as soluções amanhã, mas sim de ter os modelos certos.

O Governo quer chegar a acordo ainda este ano sobre mudanças na lei laboral. É tempo suficiente para que se faça a necessária discussão?

É necessário, claro, discutir, mas é no interesse da sociedade e dos parceiros sociais que o Governo seja dinâmico. Senão, não se mudam as coisas. O Governo tem que ser o líder.

Mesmo que não seja possível chegar a acordo com todos os parceiros sociais?

O Governo está a fazer tudo o que pode para chegar a acordo com os parceiros, mas também deve assumir a responsabilidade pela mudança, no interesse de todos. Por isso, tem que haver equilíbrio. Por um lado, tem que haver diálogo social eficaz; por outro, não pode deixar que o diálogo social determine se age ou não. É um equilíbrio entre o diálogo social e a responsabilidade do Governo.

Equilíbrio é uma palavra chave no conceito de flexissegurança. Entre as diferentes formas de flexibilidade e de segurança, quais as mais adequadas para Portugal?

Em primeiro lugar é preciso encontrar um acordo alargado quanto à estrutura de um diálogo equilibrado. No meu tempo [como primeiro-ministro], tínhamos em sistema laboral e educativo muito desenvolvidos, com um movimento sindical forte e responsável e associações patronais fortes e responsáveis. É importante perceber que Portugal não pode simplesmente copiar o modelo dinamarquês, os fundamentais são diferentes. Mas o que se pode fazer é tentar traçar um caminho. A ideia da flexissegurança é que não só os sindicatos mas também as empresas chamem a si a co-responsabilidade. Para as empresas, de planear com cuidado a educação e qualificações dos seus trabalhadores, dizendo às escolas públicas quais as suas necessidades. E para os sindicatos, a sua responsabilidade de perceber que educação é tão importante quanto as mais comuns reivindicações na negociação colectiva. Em vez de imaginar que se pode fazer tudo amanhã, tem que se assegurar que as estruturas assumem as suas responsabilidades, mesmo que seja difícil e que demore tempo.