Sérgio Aníbal, in Público on-line
Os receios de uma travagem da economia europeia no Inverno, acentuados com o corte do fornecimento russo de gás, voltam a penalizar o euro nos mercados internacionais. BCE poderá acelerar subida dos juros
A três dias do início da reunião onde os responsáveis máximos do Banco Central Europeu (BCE) vão decidir que rumo dar à sua política monetária, o euro voltou a dar motivos para que as taxas de juro sejam elevadas de forma brusca numa tentativa de contrariar a inflação.
Esta segunda-feira de manhã, a moeda única europeia acentuou a tendência de forte depreciação face à divisa norte-americana que já regista há vários meses e chegou mesmo a dado momento a valer menos de 0,99 dólares, algo que já não acontecia desde 2002.
O euro tem vindo, nos últimos meses, a registar uma depreciação acentuada face ao dólar, baixando barreiras que já não eram atingidas há cerca de duas décadas.
Em meados do passado mês de Julho atingiu, pela primeira vez em quase 20 anos, a paridade face à divisa norte-americana, muito longe dos 1,6 dólares que chegou a valer em 2008 e mesmo dos 1,2 dólares que eram o seu valor há pouco mais de 12 meses.
Esta persistente e significativa quebra do euro face ao dólar representa uma pressão acrescida para que o BCE aja rapidamente e de forma ainda mais determinada para controlar a inflação.
De facto, um euro a valer menos face ao dólar significa que as importações europeias (por exemplo de bens transaccionados nos mercados internacionais em dólares como o petróleo e os cereais) ficam automaticamente mais caras. Isto representa uma inflação importada que contribui para a escalada dos preços a que se assiste na economia da zona euro, com a inflação a situar-se acima dos 9% em Agosto.
É por isso que restam poucas dúvidas que, depois de ter realizado a primeira subida das suas taxas de juro de referência desde 2011 em Julho, elevando-as em 0,5 pontos percentuais, a autoridade monetária europeia venha a realizar, na reunião do conselho de governadores agendada para a próxima quinta-feira, um movimento semelhante ou talvez até mais agressivo.
Inicialmente a expectativa, criada com as mensagens transmitidas pela presidente do BCE, Christine Lagarde, no início de Agosto, era a de que viesse a ser decidida uma nova subida de 0,5 pontos nas taxas de juro na reunião de Setembro.
Mas, agora, com o contributo decisivo da forte depreciação do euro face ao dólar, a maior parte dos investidores já está a assumir que a subida de taxas juro a realizar pelo BCE na quinta-feira pode ser de 0,75 pontos percentuais, o ritmo que tem vindo ser assumido pela Reserva Federal na sua própria viragem de rumo na política monetária.
Por seu lado, por trás da depreciação do euro nos mercados, estão as expectativas sombrias que se acumulam relativamente à evolução da economia europeia e que levam os investidores a virarem-se para o seu habitual refúgio em tempos de crise no outro lado do Oceano Atlântico.
A divisa norte-americana está a beneficiar, como é hábito, do seu estatuto de activo financeiro seguro num tempo de grande incerteza e instabilidade na economia mundial, vendo o seu valor a subir face a praticamente todas as outras divisas mundiais. E do lado do euro, a viragem de política monetária mais lenta do BCE (subindo menos as taxas de juro do que a Reserva Federal norte-americana),com continuados receios de uma travagem ou mesmo recuo da economia da zona euro já a partir do terceiro trimestre do ano, estão a contribuir para penalizar o desempenho da moeda única nos mercados.
No sábado, o anúncio russo de que a interrupção dos fluxos do gasoduto Nord Stream por alegados problemas técnicos teria um prazo indeterminado acentuou os receios que vários países da zona euro, como a Alemanha, não venham a ser capazes de reforçar as suas reservas de gás o suficiente para atravessar o próximo Inverno com escassez energética.
Isto cria um dilema a Christine Lagarde e aos seus colegas no BCE: ser mais moderado na subida de taxas de juro para não afundar ainda mais a economia ou aumentar radicalmente o custo do dinheiro, apostando tudo em limitar a queda do euro e a escalada da inflação, mesmo que isso custe à zona euro uma entrada em recessão.