14.4.07

Cavaco encerra roteiro para inclusão - O arauto das "boas práticas"

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

Com o Roteiro, o presidente da República deu uma atenção especial às mulheres e, em particular, às mulheres vítimas


O presidente da República encerra, hoje, em Santarém, o Roteiro para a Inclusão, um ano após o seu início. Entre vários grupos desfavorecidos, destaca-se a atenção que Cavaco Silva dedicou às mulheres e às mulheres vítimas. As estruturas visadas pelo itinerário, contactadas pelo JN, parecem unânimes num parecer a iniciativa demonstrou ousadia, mas não pode ficar por aqui. "É preciso continuar, para que não se arrisque a parecer show off", concretizou, por exemplo, Inês Fontinha, directora de uma das associações visitadas, "O Ninho", a trabalhar com prostitutas há 40 anos.

E colocar ao lado das pessoas com deficiência, dos idosos e das crianças em risco, a temática da prostituição, constituiu "uma grande surpresa porque o poder político, de um modo geral, ignora a questão. A prostituição é um tabu. Mas as prostitutas [também]são vítimas", alerta Fontinha. Vítimas de um mercado - local, nacional ou internacional - que "rende mais que o tráfico de droga, rivaliza com o de armas e é um verdadeiro cancro social que movimenta, na Europa, biliões de euros; e que cresce sem parar e vertiginosamente em Portugal desde a década de 90", afirma.

A dignidade humana

Uma perspectiva comum à de Cavaco Silva que no decorrer deste roteiro revelou ser contra a legalização da prostituição. Os seus argumentos foram exactamente os mesmos de Inês Fontinha "Não se pode legalizar o que fere severamente a dignidade humana, o que é contra os direitos humanos". "Legalizar seria, obviamente, facilitar a vida dos traficantes", corrobora Fontinha.

"Os traficantes da Alemanha e da Holanda, onde a prostituição é legal, entram em Portugal à vontade para virem buscar mulheres, que assim que passam a fronteira são violadas. É uma forma de lhes dizerem que são mercadoria", informa. Fontinha reitera que Portugal não se limita a ser uma plataforma de recepção. "Continuamos a branquear as milhares de portuguesas que todos os anos são exportadas".

Em nota final, a responsável defende, ainda, que não se acaba com o tráfico - de dimensão local ou internacional - sem se combater a pobreza, a grande causa da prostituição. "A pobreza cria uma subcultura", conclui.

Vergonha nacional

Instalada na nossa cultura está a violência doméstica e conjugal, que, não raramente, leva ao assassinato; e, na maioria das vezes, de mulheres. Só nos últimos dois anos foram contabilizados 50 homicídios. Uma vergonha nacional à qual o presidente da República não mostrou indiferença durante este Roteiro para a Inclusão.

"Neste último ano, este assunto tem tido mais atenção por parte da Comunicação Social, mas, de qualquer forma, tende sempre a cair no esquecimento e este roteiro veio relembrar o tema. Por outro lado, o presidente veio visitar o gabinete do Porto, que é um dos que apresenta números mais expressivos. Com esta visita descentralizou o assunto", argumenta Carmen Rasquete da Associação de Apoio à Vítima (APAV).

Ainda assim, avisa Carmen Rasquete, "estas iniciativas devem ter continuidade, porque a verdade é que poucos sabem o que é isto da inclusão social".

A designação, que significa integrar os que têm menos voz, encontra expressão no Plano Nacional de Acção para a Inclusão, cujo conteúdo poderá encontrar-se em www.portugal.gov.pt.

Nesse documento pode ler-se, logo no índice, que as prioridades políticas para 2006-2008, no âmbito da inclusão social, passam pelo combate à pobreza das crianças e dos idosos (ver caixa ao centro); pela correcção de desigualdades ao nível da educação; e por ultrapassar todas as discriminações, o que inclui - como Cavaco Silva demonstrou neste roteiro - questões ligadas às mulheres e a algumas das realidades mais violentas a que são ou podem ser sujeitas.

Roteiro está conforme Plano Nacional para Inclusão

De Norte a Sul do país, o presidente da República, Cavaco Silva, visitou no último ano estruturas que prestam serviços aos mais idosos; que acolhem crianças em risco; mulheres vítimas de violência conjugal; mulheres vítimas de prostituição; e estruturas que se dedicam à inclusão de pessoas com deficiência. Ouviu histórias, na primeira pessoa, de quem se sente discriminado, tentou sensibilizar o país para estas matérias. Os passos que deu, que são o cumprir de um itinerário de sensibilização, vão na direcção exacta do Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI) - aprovado no Conselho de Ministros de 13 de Setembro de 2006 e apresentado pelo primeiro-ministro em 23 de Outubro de 2006 - e este, sim,com metas ambiciosas a cumprir nos próximos dois anos. No que diz respeito às crianças, por exemplo, o PNAI determina que uma das metas é aumentar em 50% a capacidade instalada em creches; e encaminhar 25% dos jovens em risco que estão institucionalizados (o que representa mais de três mil menores). Relativamente aos mais velhos, o PNAI visa o reforço de equipamentos, criando mais 19 mil vagas até 2009; e uma prestação mensal, para quem tem 65 anos ou mais, caso os seus rendimentos sejam inferiores a 4200 euros anuais. Sobre as pessoas com deficiência, o PNAI obriga a afectar-se quatro mil professores de educação especial, abrangendo 26 mil crianças e jovens com deficiência, até 2008; obrigando ainda a abranger 46 mil pessoas com deficiência em acções de formação. Sobre os imigrantes, o plano quer ajudar 80 mil alunos estrangeiros e pretende, ainda, integrar quase 40 mil imigrantes em acções de formação.

No primeiro discurso à Assembleia da República por ocasião das comemorações do 25 de Abril, Cavaco Silva lançou, há um ano, os "roteiros". Tratou-se de apresentar ao país um guião de boas práticas nas mais variadas áreas da vida social, económica e política, através do contacto directo com "casos de sucesso". Cada tema ou problema abordado pelo presidente correspondeu a uma visita ou iniciativa. Cavaco Silva pôde "tomar conhecimento directo e promover as boas práticas no combate à exclusão social, mobilizar vontades e capacidade de iniciativa para que esses exemplos possam ser replicados, o de despertar na sociedade portuguesa uma maior consciência e responsabilidade social, orientadas para a acção individual e colectiva". É este, segundo a estratégia delineada pela Presidência da República, o caminho que Cavaco seguirá para todas as áreas. O Roteiro para a Inclusão iniciou-se com uma jornada dedicada ao tema "Regiões Periféricas, Envelhecimento e Exclusão" cujo programa se concretizou em Maio do ano passado. Durante um ano realizaram-se ainda outras jornadas dedicadas a crianças em risco e violência doméstica; voluntariado e exclusão social em meio urbano; deficientes: educação, formação e inserção profissional; desemprego, reconversão e reinserção de activos e inclusão digital. Cavaco percorreu o país em busca da novidade na resolução dos problemas referidos e hoje firma um compromisso de não deixar cai no esquecimento o impulso dado durante as várias jornadas que deram forma ao roteiro.

Isabel Teixeira da Mota