23.4.07

Delinquência juvenil sobe com sobrelotação e pobreza urbanas

Alexandra Marques, in Jornal de Notícias

Bairros do Porto são onde a exclusão social mais supera a média

O esvaziamento populacional de Lisboa e do Porto e a sobrelotação dos maiores concelhos das duas Áreas Metropolitanas, associado às bolsas de pobreza concentradas nos bairros sociais, são os factores mais propiciadores da delinquência juvenil urbana.

Estima-se que, em 2011, Sintra terá uma densidade demográfica superior à da capital e o mesmo acontecerá entre Gaia e o Porto, onde um quinto da população - um em cada cinco habitantes - vive em bairros camarários.

Estes dados foram anunciados em Lisboa, sábado, por José Luís Fernandes, director do Centro de Estudos do Comportamento Desviante, da Universidade do Porto, antes do encerramento de um colóquio sobre "direitos da criança e dos jovens", promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) e o Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA).

O investigador salientou que o Porto é, das urbes nacionais, onde a exclusão social mais supera (em larga escala) o número de focos residenciais mais ricos, tendo 40 bairros sociais, num total de 40 mil habitantes, sem que haja equivalência com o estrato social mais favorecido.

A transferência para as áreas suburbanas das metrópoles e os bairros sociais segregados nas mesmas é a causa do crescente número de jovens urbanos pobres - designação oriunda do Brasil -, a maioria dos quais se encontra em situação moratória.

Interiorização do risco

Estar em moratória significa que estes jovens - entre os 12 e os 16 anos - deixaram de estudar, não têm uma família funcional, não lhes é dado emprego porque não têm qualificações e ocupam os dias em actos de marginalidade e delinquência. Nos 700 bairros das Zonas Urbanas Sensíveis, de França, são mais de 230 mil os que, dos 15 aos 25 anos, vivem nestas condições.

Recusando a ideia de que "a cidade está a guetizar-se ou ganguizar-se", como nos EUA, este docente atribui à deslocalização industrial, os casos de desemprego massivo e cenários de miséria que levam a sociedade a rotular estes jovens como vítimas.

"São vítimas do sistema, mas tornam -se visíveis na sociedade como agressores", por isso "são a imagem predatória da cidade que passa a ser vista como um território de risco", realçou.

Depois de recordar os casos da Cova da Moura, dos assaltos na CREL, do "pseudo-arrastão" no Estoril e o ataque a Gisberta, este investigador explicou que existe já "uma interiorização do risco" por parte do cidadão comum.Um sentimento que comparou ao risco de um acidente rodoviário. Mesmo tomando precauções, o automobilista sabe que não está livre de ser envolvido num.

Só 15% dos habitantes da AML vive em Lisboa

A actual população residente nas 53 freguesias do município lisboeta representa apenas 15% do total demográfico de toda a Área Metropolitana de Lisboa (AML).

Bairros sociais do Porto e "a escala da infâmia"

Para José Luís Fernandes, os moradores dos bairros sociais do Porto evitam dizer onde residem porque há um estigma. E justificam que há pior. Quem vive na Pasteleira diz que pior é o Aleixo. Aqui é dito que mau é o bairro S. João de Deus. Só resta apontar onde vivem os ciganos e, no fundo "da escala da infâmia", onde os toxicodependentes, alguns dos quais com Sida, se injectam.

As armas dos Gunas do Porto são as "fusgantes"

Os jovens problemáticos da Área Metropolitana do Porto (AMP) são conhecidos pelos "gunas". Um vídeo sobre uma claque de futebol exibido pelo investigador portuense, alude a ter um brinco na orelha e uma "fusgante" (revólver) na mão. Uma das frases (conotadas com o sentimento de pertença do grupo) diz "Quem entra não sai/Quem vacila, cai".