13.12.07

Líderes da UE assinam hoje em Lisboa o tratado possível

in Jornal Público

No dia 29 de Outubro de 2004, em Roma, na mesma sala do Capitólio onde fora assinado o Tratado fundador da Comunidade Europeia, os líderes europeus reuniram-se para rubricar e saudar um novo e ambicioso tratado constitucional. Nesse dia, o então presidente do Parlamento Europeu, Barón Crespo, lembrou que a "última palavra" sobre o destino da Constituição caberia aos cidadãos. Alguns meses depois, a França e a Holanda rejeitavam-na em referendo, abrindo uma profunda crise europeia.

O Tratado Reformador não tem as mesmas pretensões constitucionais. Foi renegociado e redigido - na forma, sobretudo, mas também no conteúdo - para não vir a tropeçar noutro referendo de destino incerto. É um "tratado simplificado", o termo inventado pelo Presidente francês, Nicolas Sarkozy, para justificar uma mera ratificação parlamentar. Um tratado que se limita a "alterar" os tratados existentes, como gostam de dizer os responsáveis políticos britânicos, para se livrarem da promessa feita por Tony Blair de sujeitar o anterior a referendo. O "tratado possível" como disse ontem no Parlamento o chefe da diplomacia portuguesa.

Luís Amado também sintetizou aquilo que muitos dos participantes da cerimónia de hoje pensarão: "Não sendo o tratado ideal, é o tratado que responde aos grandes desafios com que a Europa se depara hoje."

Será hoje assinado em Lisboa no mesmo Mosteiro dos Jerónimos onde, a 12 de Junho de 1985, Portugal assinou o Tratado de Adesão. Tudo foi preparado ao pormenor para que o momento assinale condignamente o acto pelo qual a presidência portuguesa da UE - a última se, como se prevê, o novo tratado entrar em vigor - ficará na história da integração europeia.

Brown chega mais tarde

Haverá uma ausência pesada na cerimónia dos Jerónimos. Gordon Brown, o primeiro-ministro britânico, não estará presente no acto de assinatura e falhará a foto de família. Chega mais tarde mas ainda a tempo de participar no almoço oferecido pelo Presidente da República aos líderes europeus, depois de o Governo português lhe ter feito saber o seu desagrado pela sua ausência, que chegou a ser anunciada por Downing Street.

Aparentemente, o primeiro-ministro britânico teria uma boa justificação: ir aos Comuns defender que o novo tratado respeita todas as "linhas vermelhas" do Reino Unido e dispensa por isso a realização de um referendo para ratificá-lo. Os críticos da sua atitude dizem que já sabia da data da assinatura quando agendou a reunião em Westminster. Gordon Brown está sob uma pressão enorme dos conservadores e da opinião pública para sujeitar o tratado a consulta popular, como o seu antecessor, Tony Blair, prometera fazer com a Constituição.

De resto, a maioria dos países já optou pela ratificação parlamentar do novo tratado, mesmo aqueles que, como a Dinamarca e a Suécia, costumam recorrer a referendos. A excepção é a Irlanda, cuja Constituição obriga a referendar qualquer alteração aos tratados europeus. Portugal só definirá a sua opção depois de concluída a presidência portuguesa.

González entre os sábios?

O primeiro-ministro português vai aproveitar a vinda a Lisboa dos seus pares europeus para finalizar os contactos políticos preparatórios do último Conselho Europeu a que presidirá, amanhã, em Bruxelas. Precisa de um nome que seja consensual para presidir ao chamado "grupo de sábios" que vai ser constituído por proposta do Presidente francês para pensar a Europa até 2020.

Os líderes europeus devem aprovar amanhã o mandato preparado pela presidência portuguesa para delimitar o âmbito da reflexão do grupo, que deve apresentar um relatório até Junho de 2010. Ficaram de fora algumas das questões que poderiam levantar mais polémica. Não haverá, como teria desejado Nicolas Sarkozy, nenhuma referência à questão das fronteiras da União, para evitar um debate sobre o lugar da Turquia que divide profundamente os Estados-membros. São também expressamente excluídas as questões institucionais ou relativas à reforma do orçamento comunitário, bem como as "políticas actuais" da União. José Sócrates quer deixar para mais tarde a escolha dos restantes membros do grupo, que serão entre 9 e 12, o que quer dizer que nem todos os países terão um nacional.

O nome da antiga Presidente da Letónia, Vaira Vike-Freiberga, chegou a ser posto em cima da mesa por alguns países nórdicos, argumentando a vantagem de ser de um dos novos Estados-membros, mas a ideia acabou por morrer. Agora, é o nome do antigo primeiro-ministro espanhol Felipe González que parece o mais forte. Terá provavelmente o assentimento de Nicolas Sarkozy e da chanceler Angela Merkel, embora outros líderes o considerem como uma figura do passado.