6.8.10

Preço do pão aumenta com a suspensão das exportações russas

Por Ana Rute Silva, in Jornal Público

Nova subida do preço do trigo torna inevitável aumento do preço do pão na próxima semana. Portugal depende de importações


O preço do trigo atingiu, ontem, um novo valor recorde, no mesmo dia em que a Rússia anunciou ao mundo que vai cancelar as exportações de cereais até Dezembro. As consequências da escalada de preços - a maior desde Agosto de 2008 - acentuam ainda mais as preocupações da indústria em Portugal, nomeadamente da panificação, que voltou a anunciar subidas no pão a partir da próxima semana.

"É complicado para qualquer empresa não aumentar preços, com subidas de 30 por cento da matéria-prima. Para a semana, haverá aumentos, mas não temos ideia de quanto será", disse ao PÚBLICO Carlos Alberto Santos, presidente da Associação do Comércio e da Indústria da Panificação, Pastelaria e Similares.

A Rússia é o terceiro maior produtor do mundo e está a braços com a pior seca dos últimos 50 anos. As fracas colheitas e o aumento do preço do trigo em 62 por cento desde Junho levaram o Governo a decretar a proibição temporária das exportações. A intenção é garantir o abastecimento do mercado doméstico a preços baixos. "Temos reservas suficientes - 9,5 milhões de toneladas -, mas não podemos permitir que haja uma subida no preço dos alimentos", justificou o primeiro-ministro, Vladimir Putin.

Portugal depende das importações de trigo para se abastecer e, embora não compre directamente à Rússia, pode sofrer com a paragem temporária. Segundo João Machado, presidente da Confederação dos Agricultores Portugueses (CAP), é da União Europeia (sobretudo da França e da Polónia) que importamos esta matéria-prima e, por isso, os impactos não serão visíveis.

Contudo, Bernardo Albino, presidente da Associação Nacional de Produtores de Cereais (ANPOC), defende que se um grande exportador encerra as fronteiras, cria-se tensão no mercado e uma corrida ao cereal.

"A Rússia exporta muito para o Norte de África e nós importamos de França. Não tendo trigo, o Norte de África pode passar a importar de França. As consequências para Portugal são indirectas", lembra. E continua: "Os grandes exportadores são também os maiores consumidores. Há países estúpidos, como nós, completamente dependentes, que sofrem os impactos destas medidas".

Para além do aumento do preço do pão, a alta do trigo também é sentida na fileira animal (as rações são à base de cereais). Contudo, para os produtores, há benefícios a curto prazo. "No imediato, é bom para quem tem cereal em casa e pode vender a um preço mais elevado. Mas a cadeia produtiva tem margens muito apertadas e, a médio prazo, não é bom para ninguém", avisa Bernardo Albino.

Apenas 25 por cento do trigo produzido em Portugal serve o mercado doméstico e, por isso, João Machado lembra que os aumentos no pão que serão sentidos pelos consumidores já na próxima semana não dependem dos produtores nacionais.

Recorda ainda que, depois da crise de 2007/2008, o preço do cereal baixou para metade. Ontem, o trigo era comercializado em Chicago a 7,25 dólares, ou 5,5 euros, por bushel, valor que ainda continua distante dos 13,34 dólares registados há três anos (ver gráfico).