Rita Siza , em Estrasburgo, in Público on-line
No discurso sobre o estado da União Europeia, no Parlamento Europeu de Estrasburgo, a presidente da Comissão propôs a criação de um novo Centro Comum de Conhecimento da Situação e uma nova missão de resiliência sanitária para que “um vírus não possa tornar uma epidemia local numa pandemia global”
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, propôs esta quarta-feira a criação de uma série de novas agências europeias para melhorar a preparação e capacidade de resposta da União Europeia a crises, que tanto podem ser sanitárias, como a pandemia de covid-19, como de defesa e segurança, como no Afeganistão nas fronteiras externas da Europa, nos sistemas de informação ou no ciberespaço.
No seu discurso sobre o estado da União Europeia no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, a líder do executivo comunitário assinalou a liderança da UE na produção, distribuição, administração e exportação de vacinas contra o novo coronavírus. A resposta da Europa à maior crise sanitária do último século foi um sucesso, argumentou Ursula von der Leyen.
“Temos razões para estar confiantes, mas não complacentes”, disse. Por isso, pediu o apoio dos eurodeputados para um novo investimento de 50 mil milhões de euros para a criação de uma nova missão de preparação e resiliência sanitária, para “garantir que nunca mais um vírus pode transformar uma epidemia local numa pandemia global”.
Além de novos vírus e doenças, Von der Leyen quer que a Europa seja capaz de se defender das ameaças convencionais, mas também híbridas e de cibersegurança, que colocam em risco as fronteiras dos Estados, as suas infra-estruturas e instalações industriais ou as suas democracias: “Para desestabilizar uma eleição basta ter um smartphone e uma ligação à Internet”, assinalou.
A crise no Afeganistão reavivou o debate sobre a constituição de uma força militar de intervenção rápida da UE — que a presidente da Comissão acredita “ser parte da solução”. Mas antes de discutir a mobilização de tropas, Ursula von der Leyen diz que é preciso encontrar um consenso sobre a sua utilização. “Precisamos de desenvolver a nossa vontade política”, afirmou.
Como observou, a UE já desenvolveu um “ecossistema de defesa europeu”. Nesta altura, “o que precisamos é de construir uma união da defesa”, defendeu a líder do executivo comunitário, que quer ter um novo Centro Comum de Conhecimento da Situação (ou Situational Awareness, no original em inglês) em funcionamento tão depressa quanto possível.
Este novo centro será responsável por reunir e fundir todo o conhecimento e informação proveniente de todos os serviços e agências de segurança e defesa, para que os líderes europeus tenham condições para, a cada momento, tomar as melhores decisões. “Temos de estar mais bem preparados e melhor informados para sermos capazes de decidir”, sublinhou.
Com o mundo “em transição para uma nova ordem internacional”, de hipercompetitividade, rivalidades regionais e poderes difusos, a presidente da Comissão Europeia vai convocar uma Cimeira Europeia da Defesa, que será co-organizada pelo Presidente Emmanuel Macron quando a França detiver a presidência do Conselho da UE, e apresentar nova legislação para responder às novas ameaças.
“Neste mundo onde tudo está conectado, tudo pode ser pirateado”, disse Von der Leyen, acrescentando que a Europa deve aspirar a ser líder mundial em cibersegurança.
“Deve ser aqui na Europa que as novas ferramentas de ciberdefesa são desenvolvidas. Para isso, precisamos de uma política europeia para a ciberdefesa, e de nova legislação e standards comuns numa nova lei europeia de ciber-resiliência”, apelou.
Outra novidade que a presidente da Comissão apresentou quando falava sobre a necessidade de tornar a Europa num actor “mais activo” no palco global, tem a ver com a definição de uma nova estratégia de conectividade e parcerias, já baptizada de “Global Gateway”. Von der Leyen não confirmou a data para a divulgação desse plano, mas disse que a estratégia para o Indo-Pacífico, que os líderes europeus acertaram na cimeira informal de Maio, no Porto, serviria de modelo: é um exemplo de como a Europa pode ser mais presente e activa em regiões importantes para a sua segurança e prosperidade, contendo “a expansão da influência de regimes autocráticos” no mundo.
“Com a Global Gateway, vamos construir parcerias com países de todo o mundo. Queremos investir em infra-estruturas de qualidade, para distribuir produtos, ligar pessoas e promover serviços”, com “total transparência”, anunciou Von der Leyen, que fez questão de distinguir o plano europeu “para criar ligações e não dependências” de outras iniciativas, como da Nova Rota da Seda promovida por Pequim. “Não faz nenhum sentido a Europa construir uma estrada perfeita para unir uma mina de cobre detida pela China a um porto que agora pertence aos chineses”, observou, naquela que foi a segunda referência àquele país durante o discurso do estado da União— antes disso, Von der Leyen tinha classificado como “encorajadores” os objectivos fixados por Xi Jinping para uma redução das emissões de CO2 no país.
Em termos de parcerias, ou alianças, nenhuma é mais importante para a UE do que a relação transatlântica com os Estados Unidos da América, reafirmou a presidente da Comissão, para quem a cooperação entre Bruxelas e Washington, por exemplo no financiamento climático, pode fazer a diferença em termos do cumprimento das metas do Acordo de Paris.
A Europa contribuiu actualmente com 25 mil milhões de dólares por ano para a mitigação e adaptação, mas “está preparada para fazer mais”, anunciou Von der Leyen. “Vamos propor um reforço adicional de 4000 milhões de euros para o financiamento climático até 2027, e esperamos que os Estados Unidos também se comprometam com mais”, informou.