3.9.21

Mentores em 40 escolas permitiram reduzir até um terço das negativas dos alunos

Samuel Silva, in Público on-line

Resultados são mais positivos no 2.º e 3.º ciclos. Programa lançado pela Fundação Gulbenkian envolveu 1300 estudantes. Intenção é mantê-lo em funcionamento e alargá-lo a 50 mil nos próximos cinco anos.

Os alunos que trabalharam, durante o 2.º e 3.º períodos do último ano lectivo com os mentores de um programa lançado pela Fundação Calouste Gulbenkian melhoraram significativamente os seus resultados. O impacto deste acompanhamento das crianças por jovens com formação superior, mas que não são professores, foi sobretudo sentido no 2.º e 3.º ciclo, permitindo a cerca de um terço dos estudantes transformar as negativas com que tinham terminado o 1.º ciclo em notas positivas no final do ano.

De acordo com o relatório final do projecto GAP, os impactos mais significativos do trabalho dos alunos com os seus mentores foram conseguidos a Inglês. Nesta disciplina, 38,5% dos estudantes que tinham tido negativa no 1.º período (nota inferior a 2), concluíram o ano com nota positiva.

A progressão dos alunos envolvidos no programa da Fundação Gulbenkian foi também evidente às outras duas disciplinas que integram o projecto, Português (33,4% das negativas passaram a positivas) e Matemática (redução de 30% nas notas inferiores a 2).

A avaliação feita por um grupo de especialistas que inclui investigadores da Universidade do Minho e da Universidade do Porto, que acompanhou a implementação do programa, permitiu também avaliar a “progressão do desempenho médio” dos beneficiários do GAP – uma avaliação quantitativa das notas das várias disciplinas. Esse resultado foi depois comparado com o que foi conseguido pelos restantes alunos do mesmo agrupamento escolar.

A Português, os resultados dos estudantes que passaram pelo programa de mentoria melhoraram 45%, bem acima (19%) dos restantes colegas. As diferenças são menos expressivas nas restantes disciplinas, mas sempre favoráveis a quem esteve envolvido no programa: um ponto percentual na Matemática, onde o desempenho médio dos alunos aumentou 37% do 1.º para o 3.º período; e dois pontos percentuais a Inglês, onde os resultados evoluíram positivamente em 42%.

O impacto positivo do projecto surpreendeu até quem o coordena. “Não estávamos à espera de resultados tão bons”, confessa Pedro Cunha, director do programa Gulbenkian Conhecimento. Desde logo porque as experiências anteriores – tanto a nível nacional como internacional – em que o GAP bebeu influências, “não tinham conseguido diferenças tão grandes” nos resultados dos alunos num período tão curto, explica o mesmo responsável. Mas também porque o programa foi atingido pela pandemia logo na sua fase de lançamento.

O GAP iniciou-se em Janeiro, no arranque do 2.º período lectivo e, semanas depois, as escolas encerraram novamente, dando início ao segundo período de confinamento a que a covid-19 obrigou o país. O projecto foi pensado para ajudar na recuperação das matérias perdidas no ano lectivo anterior, devido aos impactos do primeiro período de ensino à distância. Foi desenhado para ser implementado em modo presencial.

No entanto, as novas circunstâncias levaram a que tivessem que ser redesenhado para que o contacto entre alunos e mentores fosse possível em formato digital. “Nessa altura, baixámos as expectativas”, revela Pedro Cunha, da Gulbenkian. Das 9700 horas de mentoria, cerca de um terço aconteceu à distância. Mas, dos 1300 alunos directamente envolvidos no GAP, cerca de 50 receberam apoio permanente de modo presencial, em escolas de acolhimento.
1.º ciclo com resultados mais modestos

Os resultados escolares tiveram também uma evolução positiva para os alunos do 1.º ciclo, mas numa dimensão bem menor do que a registada entre os alunos mais velhos, mostra o relatório de avaliação a que o PÚBLICO teve acesso. O número de negativas entre os estudantes envolvidos no GAP baixou, do 1.º para o 3.º período do ano lectivo passado, 6,8% a Português e 2,6% a Matemática.

A avaliação do projecto concluiu que, para crianças mais pequenas, como as que frequentam o primeiro nível da escolaridade obrigatória, o contacto com os mentores tem que ser mais permanente para ser eficaz – “no mínimo tri-semanal, mas idealmente até devia ser diário”, explica Pedro Cunha.

“Enquanto com um jovem de 15 anos bastará um encontro que aconteça uma ou duas vezes por semana, de modo a estabelecer um programa semanal, com uma criança de 7 anos, para quem a aprendizagem é muito baseada na relação, é mais difícil fazê-lo sem um contacto mais permanente”, acrescenta o director do programa Gulbenkian Conhecimento.

Essa será uma das alterações a fazer à próxima geração do projecto, que tem continuidade assegurada e a intenção de chegar a 50 mil alunos por ano, até 2026.

O programa vai ter, porém, mudanças. A mais significativa destas prende-se com o perfil dos mentores. O GAP funcionou, durante o último ano lectivo, com 42 jovens licenciados, recrutados e formados pela Teach for Portugal, uma Organização Não Governamental. Estes eram contratados para trabalhar nas escolas.

A partir do próximo ano lectivo, os mentores serão jovens que ainda estão a frequentar a sua formação superior, num regime de voluntariado. O projecto arrancará desde já, em fase piloto, com alunos da Universidade do Porto. A Fundação Gulbenkian está a trabalhar em parcerias com outras instituições de ensino superior nacionais para alargar ao resto do país. O início dessa segunda fase está dependente do sucesso de uma candidatura ao apoio do programa de financiamento Portugal Inovação Social.