15.9.21

Quase dois terços dos jovens portugueses acreditam que o mundo está condenado, diz estudo

Diana Baptista Vicente, in Público on-line

Quase seis em cada dez jovens estão muito ou extremamente preocupados com a crise climática, diz um estudo feito em dez países, que “sugere pela primeira vez que elevados níveis de angústia psicológica nos jovens estão ligados à inércia dos Governos”. Jovens portugueses estão entre os mais preocupados.

Foto Cerca de seis em dez jovens considera que os Governos não estão a proteger os jovens, o planeta, nem as gerações futuras, sentindo-se traídos pelas gerações mais antigas e entidades governamentais 

Oito em cada dez jovens portugueses acreditam que “o futuro é assustador” face às alterações climáticas. E mais de dois terços acreditam que o Governo está a falhar na resposta à crise climática (apenas atrás dos jovens do Brasil). Os resultados fazem parte de um estudo científico com base em inquéritos a jovens de dez países e que revelou que, dos países desenvolvidos analisados, os jovens portugueses são os que demonstram um maior nível de preocupação com a crise ambiental.

O estudo divulgado esta terça-feira ilustra o profundo nível de preocupação que os mais jovens, entre os 16 e os 25 anos, sentem em relação às alterações climáticas, com um impacto na forma como olham para o futuro. No que diz respeito aos pensamentos negativos sobre as alterações climáticas, os jovens portugueses expressam, no geral, uma maior preocupação do que a média dos dez países.

Quase dois terços dos jovens portugueses acreditam que a humanidade está condenada, apenas abaixo dos jovens da Índia (74%) das Filipinas (73%) e do Brasil (67%). E quase nove em dez jovens portugueses afirmaram que as pessoas falharam na protecção do planeta, por oposição aos 83% do total dos inquiridos.

Mais de metade dos portugueses questionados (54%) acredita ter menos oportunidades do que os pais​, apenas um valor percentual abaixo da média. E se 39% dos jovens inquiridos estão reticentes em ter filhos devido à crise climática, em Portugal esse número é só ligeiramente inferior (37%).

Segundo o estudo, quase seis em dez jovens estão muito ou extremamente preocupados com a crise climática. Um número semelhante considera que os Governos não estão a proteger os jovens, o planeta, nem as gerações futuras, sentindo-se traídos pelas gerações mais antigas e entidades governamentais. Neste campo, Portugal é o terceiro país (62%) a sentir que o Governo está a trair esta geração e as próximas, depois do Brasil (77%) e da Índia (66%).

Ao mesmo tempo, 65% dos portugueses inquiridos sentem que o Governo está a ignorar a angústia das pessoas em relação às alterações climáticas, estando acima dos 60% do total de jovens inquiridos.

No total, os autores do estudo referem que os níveis de ansiedade parecem ser superiores nos países onde as políticas ambientais são consideradas menos robustas, tendo sido relatada uma maior preocupação no Sul do globo.

Os activistas ambientais afirmam que a preocupação e ansiedade ligadas às alterações climáticas afectam grande parte da população jovem. Mitzi Tan, de 23 anos e das Filipinas, disse que cresceu com o medo de se “afogar no próprio quarto”. Também se tornou comum os jovens preocuparem-se em ter ou não ter filhos por causa dos problemas do planeta. Segundo Luisa Neubauer, activista de 25 anos e uma das organizadoras do movimento climático estudantil na Alemanha, “é uma questão simples, mas diz tanto sobre a realidade climática onde vivemos.
Ecoansiedade e inércia governamental

Para o estudo, financiado pelo grupo de pesquisa e mobilização Avaaz, fizeram-se inquéritos com jovens de Portugal, Austrália, Brasil, Finlândia, França, Filipinas, Estados Unidos, Índia, Nigéria e Reino Unido. Pré-publicado na Lancet e ainda à espera de revisão pelos pares, o estudo foi conduzido e analisado por sete instituições académicas da Europa e EUA, incluindo a Universidade de Bath e o Oxford Health NHS Foundation Trust. É considerado o maior estudo científico feito até à data sobre a ansiedade climática e os jovens.

Os autores da investigação indicam que o stress crónico ligado às alterações climáticas está a aumentar o risco de desenvolver problemas mentais e físicos. E se os eventos climáticos extremos se intensificarem, vão ser acompanhados por impactos na saúde mental. Os jovens são especialmente afectados, uma vez que estão em processo de desenvolvimento psicológico, físico e social.

Caroline Hickman, da Universidade de Bath e co-autora do estudo, disse que a análise “ilustra a terrível ansiedade climática difundida nas nossas crianças e jovens” e “sugere pela primeira vez que elevados níveis de angústia psicológica nos nossos jovens estão ligados à inércia dos governos”, continuou.

Tom Burke, do think tank E3G, afirmou à BBC que “é lógico que os jovens estejam ansiosos”, porque “estão a ver a evolução [das alterações climáticas] diante dos próprios olhos”.