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24.5.22

ONU pede ajuda aos bilionários para acabar com a fome mundial

in JN

O líder do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM) apelou aos bilionários que "é tempo de avançar" contra a ameaça alimentar que cresce no mundo e elogiou o apoio de magnatas, como Elon Musk e Jeff Bezos.

Depois de um impasse mediático que teve com o bilionário Elon Musk no ano passado, o diretor-executivo do PAM, David Beasley, foi desafiado pelo dono da Tesla Motors a comprovar como é que uma doação de seis mil milhões de dólares (aproximadamente 5 mil milhões de euros) às Nações Unidas poderia resolver a fome mundial.

Durante o encontro do Fórum Económico Mundial, que decorre em Davos, na Suíça, até dia 26, Beasley contou à agência Associated Press que o magnata doou o valor acordado a uma fundação, mas que as Nações Unidas ainda não receberam nenhuma parte da quantia.

"Tenho esperança que sim", acrescentou o líder do PAM, que se dirigiu mais tarde a Musk: "Estamos a tentar todos os ângulos possíveis, e Elon, precisamos da tua ajuda, irmão".

Segundo Beasley, esta mensagem era também um apelo para todos os bilionários, porque "o mundo está em grandes problemas".

"Isto não é retórica, nem tretas. Avancem agora, porque o mundo precisa de vocês", pediu o diretor-executivo do PAM.

21.1.22

Um quarto das famílias concentra quase metade dos rendimentos

Maria Caetano, in Dinheiro Vivo

Mesmo antes da chegada da pandemia, a desigualdade aumentou em Portugal, revelam dados do relatório "Balanço Social 2021" apresentado ontem pela Nova SBE.

A distribuição dos rendimentos tornou-se mais desigual no ano antes da pandemia, com um quarto das famílias nacionais a concentrar quase metade dos rendimentos.
Em 2019, os 25% mais ricos passaram a concentrar 45,9% do rendimento disponível das famílias, num salto significativo face aos 42% registados em 2018 e invertendo a tendência de diminuição da desigualdade da última década.

A constatação é feita a partir de cálculos para a distribuição de rendimentos do relatório "Portugal, Balanço Social 2021", apresentado ontem pelo centro Economics for Policy da Nova SBE. No documento, os investigadores coordenados pela economista Susana Peralta analisam microdados com origem no Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos do INE, e que se reportam ao ano de 2019.

A maior concentração de rendimento no topo é acompanhada por uma redução da percentagem de rendimentos entre as famílias mais pobres e de rendimentos medianos, que ficaram a perder .
Segundo o estudo, os 25% mais pobres do país passaram a concentrar 10,9% dos rendimentos (11% em 2018) e o quartil imediatamente a seguir passou de ter 27,7% dos rendimentos para 25,1%. O terceiro quarto da população, por ordem crescente de rendimentos, passou também de concentrar uma fatia de 30,4% do rendimento para 29%.

O documento indica ainda que em média os 25% mais pobres ganhavam por mês 368 euros, com o segundo quartil de entre a população mais pobre a receber uma média de 623,1 euros, e o seguinte nos 867,8 euros. Entre as famílias com maiores rendimentos, a média ficou nesse ano em 1604,6 euros.

O agravamento das desigualdades nesta medida de distribuição de rendimentos contrasta com melhorias noutros indicadores, como o coeficiente de Gini, que compara a distribuição de rendimentos em todas as famílias a uma situação plena de igualdade, traduzindo a distância existente. O coeficiente de Gini ficou em 31,2 no ano de 2019, melhorando face aos 31,9 de um ano antes.

Melhoraram também indicadores relativos ao número de vezes que os rendimentos dos mais ricos superam os rendimentos dos mais pobres. Os 20% mais ricos passaram a deter cinco vezes mais rendimentos que a restante população (o rácio era de 5,2 vezes em 2018). E, bem lá no topo, os 1% mais ricos passaram de ganhar 52,9 vezes mais que os restantes para um rácio bem menor, de 36,6 vezes.

Pobreza prolongada

Os dados apresentados ontem mostram também que a pobreza em Portugal mantém-se, maioritariamente, um fenómeno persistente. Seis em cada indivíduos pobres não conseguiram melhorar rendimentos ao longo de pelo menos três anos entre 2016 e 2019.
Segundo o estudo, 60% daqueles que eram pobres em 2019 eram-no também em pelo menos dois anos de entre os três anteriores. Trata-se de uma melhoria ligeira face a 2018, quando 62,5% dos pobres não conseguiam mudar de vida.

Quando considerado o conjunto da população, a pobreza persistente atingia em 2019 um em cada dez cidadãos, ou 9,8%, que comparam com 12,5% da população que se manteve pobre na maioria dos anos de 2015 a 2018.

Mas, segundo o estudo, "o número mais preocupante é a percentagem substancial de pessoas (6%) que, durante os quatro anos em análise, nunca saiu da situação de pobreza". Esta percentagem foi de 8,6% no período de 2015 a 2018.

Os investigadores alertam para "bolsas de pobreza persistente em Portugal que devem ser objeto de especial atenção no desenho de políticas públicas" e referem ainda que este "quadro de pobreza persistente é especialmente agravado nos desempregados, com uma prevalência de mais do dobro da população em geral". Quase um quarto dos desempregados, 23,7%, mantinham-se em situação de pobreza persistente em 2019. Mas esta pobreza prolongada também atinge 5% dos trabalhadores do país, segundo o relatório.

É também elevada a pobreza persistente entre crianças, entre as quais - à semelhança dos indivíduos com 65 ou mais anos - se agravou a pobreza em 2019, apesar de uma melhoria dos indicadores globais. Nesse ano, 19,1% dos menores do país encontravam-se na pobreza (18,5% em 2018), e eram 11,4% aqueles que viviam em situação prolongada de pobreza de 2016 a 2019. O estudo destaca, aliás, que uma em cada três crianças se manteve na pobreza em pelo menos um ano ao longo de todo esse período.

Os dados agora analisados pelos investigadores refletem ainda o fim de uma trajetória de melhoria nos indicadores de pobreza que foi entretanto interrompida pela pandemia. Os dados preliminares de 2020 já divulgados pelo INE mostram um agravamento acentuado. A taxa de pobreza avançou 2,2 pontos percentuais, passando aos 18,4%, naquela que foi a maior subida no histórico existente.



27.10.20

Países ricos devem quase 5 mil milhões de euros em ajuda aos países pobres

in JN

Os países ricos devem 5,7 mil milhões de dólares (cerca de 4,8 mil milhões de euros) em ajuda internacional aos países pobres por nos últimos 50 anos terem falhado o compromisso de destinar 0,7% do seu rendimento nacional a este fim, estima a ​​​​​​​Oxfam.

Os cálculos da organização Oxfam Internacional constam do relatório "Fifty Years of Broken Promises" (Cinquenta anos de promessas falhadas, em tradução livre), publicado para marcar o 50.º aniversário do compromisso internacional sobre a ajuda pública ao desenvolvimento, assinalado no sábado.

O documento analisa o impacto das contribuições internacionais na melhoria do bem-estar das populações dos países de baixo e médio rendimento e destaca que as promessas não cumpridas dos doadores de atribuir a estes países 0,7% do seu Rendimento Nacional Bruto (RNB) "têm limitado o potencial da ajuda para reduzir a pobreza e a desigualdade".

Em 2019, as nações mais ricas gastaram apenas 0,3% do seu RNB em ajuda internacional e apenas cinco países - Luxemburgo, Noruega, Suécia, Dinamarca, e Reino Unido - atingiram ou ultrapassaram a meta de 0,7%.

A Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) de Portugal caiu 5,4% nesse ano relativamente a 2018, a segunda maior quebra entre 11 países, situando-se nos 373 milhões de dólares (cerca de 350 milhões de euros), valor que representa apenas 0,16% do Rendimento Nacional Bruto.

A Oxfam calcula, por isso, que os países mais ricos "têm uma dívida de 5,7 mil milhões de dólares (4,8 mil milhões de euros) para com as pessoas mais pobres do mundo", um valor "nove vezes maior do que o 'stock' de dívida externa dos países da África Subsaariana no final de 2019.

"A ajuda internacional é um instrumento crítico na luta contra a pobreza e a desigualdade, mas a maioria dos governos ricos tem vindo a faltar sistematicamente aos seus compromissos de ajuda há décadas", afirmou José María Vera, diretor-executivo interino da Oxfam International.

"Esta dívida é paga pelos 260 milhões de crianças que estão fora da escola, pela metade da humanidade que não tem acesso a serviços de saúde essenciais e pelos dois mil milhões de pessoas que não têm o suficiente para comer", acrescentou.

A organização alertou que a crise económica provocada pela pandemia de covid-19 irá aumentar a necessidade de ajuda, mas deverá resultar também numa redução das doações por parte dos países ricos, tornando a mobilização de recursos financeiros pelos países pobres "muito mais difícil".

A pandemia poderá empurrar mais 200 a 500 milhões de pessoas para a pobreza, estima a Oxfam, assinalando que apenas 28% dos 10,19 mil milhões de dólares (cerca de 8,6 mil milhões de euros) que as Nações Unidas pediram para ajudar os países pobres a enfrentar a crise foram conseguidos até à data.

"A pandemia do coronavírus significa que a ajuda internacional nunca foi tão importante ou esteve mais em risco", assinalou Vera.

O relatório destaca, por outro lado, "papel crucial" da ajuda internacional no combate à pobreza e às desigualdades nos últimos 50 anos, nomeadamente nas áreas da saúde e da educação.


De acordo com os dados recolhidos pela Oxfam, os programas de saúde apoiados pelo Fundo Global de Luta contra a SIDA, Tuberculose e Malária salvaram mais de 27 milhões de vidas desde 2000, enquanto a Iniciativa Global para a Erradicação da Poliomielite tem mobilizado fundos para vacinar milhões de crianças, tendo contribuído para salvar 18 milhões de crianças da paralisia e erradicando a doença em muitas partes do mundo.

Na educação, 34 milhões de crianças tiveram a oportunidade de ir à escola em resultado do pacote de ajuda acordado no Fórum Mundial de Educação de Dacar de 2000, enquanto o Fundo de Educação da Sociedade Civil apoiou iniciativas em 60 países para defender melhores políticas e mais recursos para a educação.

A ajuda internacional financia ainda todos os programas de proteção social em sete países da África subsaariana.

O relatório salienta também que uma proporção significativa da ajuda não cumpre as normas internacionalmente reconhecidas em matéria de eficácia, sendo frequentemente utilizada para apoiar os interesses nacionais ou comerciais dos países doadores.

Em 2016, os doadores atribuíram 51% dos contratos de ajuda que reportam à OCDE às suas próprias empresas nacionais e apenas 7% aos fornecedores dos países de rendimento baixo e médio, refere-se no documento.


A Oxfam aponta, em termos comparativos, que a riqueza do homem mais rico do mundo (185,6 mil milhões de dólares em outubro de 2020) é maior do que a soma de todos os orçamentos de ajuda internacional (152,8 mil milhões de dólares em 2019).

Segundo as contas da Oxfam, se os países ricos cumprissem os seus compromissos haveria 4,8 biliões de dólares (cerca de 4 biliões de euros) adicionais necessários entre 2019-2030 para cumprir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas nos 59 países de mais baixo rendimento do mundo.

"Num mundo onde um homem, Jeff Bezos (presidente da Amazon), vale mais do que a soma de todos os orçamentos de ajuda internacional, não há dúvida de que os governos podem e devem fazer mais para cumprir as suas promessas de ajuda", sustentou José María Vera.

12.3.18

Carlos Farinha Rodrigues: ‘A desigualdade é algo que construímos com a nossa economia’

por É Apenas Fumaça

O que vais ouvir, ler ou ver foi produzido pela equipa do É Apenas Fumaça, um projeto de media independente, e foi originalmente publicado emwww.apenasfumaca.pt

Ter um emprego estável não significa uma vida livre de privações. Não significa sequer escapar à pobreza e pode significar ter de apagar as luzes, mesmo quando a luz que entra pela janela não chega.
OInquérito às Condições de Vida e Rendimento, elaborado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que, em 2016, já com a Geringonça no poder e as actualizações ao salário mínimo nacional em vigor, 10,8% dos trabalhadores portugueses permaneciam em risco de pobreza. O que significa isto? Estar em risco de pobreza significa – apesar da tentativa de branqueamento da realidade que o nome do indicador parece procurar – ser-se pobre. Não há como dar a volta. Significa estar-se abaixo do limiar da pobreza. Em Portugal, receber o salário mínimo é viver entre a espada e a parede.

Isabel Nascimento, retratada pelo semanário Sol na reportagem“Viver com o salário mínimo: o milagre da multiplicação”, de 2014, era uma das faces desta realidade. Recebia o salário mínimo e via-se obrigada a falar aos jornalistas às escuras. Dos 431,65 euros que recebia, 300 perdiam-se imediatamente na renda da casa que dividia com o marido, desempregado, e os dois filhos. Teve que apagar as luzes para poupar. Isabel faz parte daqueles que recebem o salário mínimo nacional. São “trapezistas equilibrados num fio muito fino”. Quem o disse,num artigo do jornal Público, foi Susana Peralta, investigadora e professora na Universidade Nova de Lisboa. O número de trabalhadores a receber o salário mínimo passou de “5% em 2008 para cerca de 25% no final de 2016”. “Preocupante”, considera a economista.

A pobreza em Portugal é uma realidade demasiado abrangente. Em 2016 o INE contava 2,4 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social em Portugal. É o mesmo que dizer 23,3% da população do país, menos 1,8 pontos percentuais em relação a 2015. Mas se a taxa de risco de pobreza desceu neste período, o mesmo não pode dizer-se da taxa de intensidade da pobreza, que mede quão distantes estão os rendimentos mais baixos relativamente ao limiar definido para a pobreza. De 2015 para 2016 esta taxa subiu 0,3 pontos percentuais, para os 27%. A subida é curta, é certo, mas revela uma intensificação da pobreza entre os mais pobres dos pobres.

“A cada 2 dias” aparece um novo bilionário e 82% de toda a riqueza gerada acaba nos bolsos das 1% mais ricas. “Nada para as 50% mais pobres”. Foi assim em 2017, segundo o relatório “Reward Work, Not Wealth”, lançado em 2018 pela Oxfam International. O nome do relatório revela o desejo, longínquo: “Recompensar o Trabalho, Não a Riqueza”. Mas o fosso não para de aumentar, sobretudo quando comparamos os mais ricos e os mais pobres.
Esta semana fomos até ao Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) falar com Carlos Farinha Rodrigues, doutorado em Economia e professor naquela instituição de ensino superior. É membro do Observatório das Desigualdades do CIES-IUL, assessor do INE e um dos mais proeminentes especialistas em pobreza e desigualdade em Portugal.

Qual é o caminho para eliminar a pobreza e reduzir a desigualdade?
Terão os estados os recursos que lhes permitam acabar com a pobreza, quando nas últimas décadas o denominador comum tem sido odeclínio generalizado do capital público perante o aumento desmesurado do capital privado? Quão importante é o papel das transferências sociais na redução da pobreza e da desigualdade? Terá Pedro Ferraz da Costa razão, quando afirma que“as pessoas não querem trabalhar”, ou estaremos nós perante um problema pandémico de precariedade no emprego que nos está a conduzir a situações de pobreza?
Ouve aqui o novo episódio:

Texto: Frederico Raposo
Preparação e entrevista: Frederico Raposo, Pedro Santos e Ricardo Ribeiro
Captação e edição de som: Bernardo Afonso

13.2.17

Papa na audiência aos representantes da Economia de Comunhão

Papa: multiplicar os bens para todos. Capitalismo produz exclusões
in Voz do Vaticano

O Santo Padre recebeu, na manhã deste sábado (04/02), na Sala Paulo VI, mais de mil representantes da “Economia de Comunhão”, promovido pelo Movimento dos Focolares, que realiza um encontro em Castelgandolfo de 1° a 5 de fevereiro.

O Projeto “Economia de Comunhão” (EdC) surgiu em maio de 1991, após uma visita de Chiara Lubich ao Brasil, como resposta concreta ao problema social e ao desequilíbrio econômico do país e do capitalismo em geral.

Com efeito, em seu discurso aos numerosos presentes, provenientes de 49 países, o Papa refletiu sobre os termos “Economia e Comunhão” de particular interesse:
“Economia e comunhão: duas palavras que a cultura de hoje mantém bem separadas e, muitas vezes, até as considera opostas. Duas palavras que, ao invés, vocês uniram, respondendo ao convite que Chiara Lubich fez no Brasil, há 25 anos. Diante das desigualdades que percebeu na cidade de São Paulo, ela exortou aos empresários a se tornarem agentes criativos e competentes de comunhão”.

De fato, ponderou Francisco, o empresário é considerado pelo Movimento dos Focolares como “agente de comunhão”, um novo modo de encarar as empresas e a economia. Uma empresa não deve destruir a comunhão entre as pessoas, mas edificá-la e promovê-la. A comunhão espiritual dos corações é mais plena quando se torna comunhão de bens, de talentos e de lucros.

Aqui o Santo Padre refletiu sobre três aspectos concernentes ao Projeto dos Focolares: o dinheiro, a pobreza e o futuro. Sobre o primeiro aspecto, disse:
“É muito importante que ao centro da economia de comunhão esteja a comunhão das entradas. A economia de comunhão também é comunhão de lucros, expressão da comunhão de vida. Muitas vezes falei sobre o dinheiro como ídolo, quando se torna objetivo de vida e pecado de idolatria. Mas, o dinheiro é importante, sobretudo, quando falta e quando dele dependem a alimentação, a escola e o futuro dos filhos”.
A riqueza, acrescentou o Pontífice, é a mais nova divindade, em nossos dias, que destrói milhões de famílias no mundo. Diante desta realidade, os Focolares escolheram colocar os lucros em comum, compartilhando-os com os pobres e para dar instrução e trabalho aos jovens. Assim, o Papa passou ao segundo aspecto da sua reflexão: a pobreza, um tema central para o Movimento fundado por Chiara Lubich:
“Hoje, são lançadas diversas iniciativas, públicas e particulares, para combater a pobreza, para o crescimento da humanidade. Na Bíblia, os pobres, os órfãos e as viúvas eram descartados pela sociedade. Hoje, foram inventados diversos modos para ajudar, matar a fome e instruir os pobres. Não obstante, o capitalismo continua a produzir descartes e exclusões”.

A economia de comunhão, afirmou Francisco, se quiser ser fiel ao seu carisma, deve criar um sistema econômico-social para salvar as vítimas do capitalismo. Um empresário de comunhão deve ser como o pai misericordioso da parábola evangélica do Filho Pródigo. Por fim, o Papa falou sobre o terceiro aspecto da Economia de Comunhão: o futuro:

“Estes 25 anos da história da Economia de Comunhão confirmam que a comunhão e as empresas podem crescer lado a lado. Comunhão é a multiplicação dos bens para todos. A economia de hoje precisa da alma dos empresários e da fraternidade respeitosa e humilde. É preciso compartilhar mais os lucros para combater a idolatria do dinheiro”.

O Santo Padre concluiu seu pronunciamento aos numerosos participantes no encontro de “Economia e Comunhão” convidando o Movimento dos Focolares a continuar a mudar as estruturas sociais para evitar as vítimas do descarte e da exclusão. “Continuem, disse, a ser sal e fermento de uma nova economia, a Economia do Reino, onde os ricos partilham suas riquezas e os pobres são chamados bem-aventurados”.
Representantes brasileiros com Francisco

Antes de o Papa pronunciar o seu discurso, a curitibana Maria Helena Ferreira Fonseca Faller, Presidente da Associação Brasileira de Economia e Comunhão, fez a seguinte saudação:

Origem do Projeto
Dirigida de modo particular às Empresas, a proposta da “Economia de Comunhão”, lançada no Brasil, em 1991, por Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares, coloca em comum a riqueza produzida e fundamenta a dinâmica operacional sobre a comunhão e a fraternidade. Atualmente centenas de empresas, no mundo inteiro, inspiram-se neste Projeto para adotar um controle centralizado na fraternidade e partilhar a riqueza produzida.

A “Economia de Comunhão” suscita o surgimento dos chamados “polos industriais”, inseridos nas Mariápolis permanentes, pequenos “núcleos de testemunho” do Movimento dos Focolares.

Os polos industriais, construídos nestes anos no Brasil, Argentina, Itália, Croácia, Bélgica e Portugal, indicam uma economia onde, produzir e trabalhar, são verdadeiras expressões da lei evangélica do amor recíproco.
O Projeto “Economia de Comunhão”, na sua totalidade, tem o objetivo de trabalhar por uma humanidade “sem indigentes”, em vários níveis. Com a criação de trabalho, pode-se envolver os excluídos do sistema econômico e social, mediante uma cultura da partilha e da comunhão, a criação de iniciativas educativas e culturais e ajudas concretas aos projetos de desenvolvimento. (MT)

26.1.17

E se os oito mais ricos deixassem de ser tão ricos o que ganhavam os pobres com isso?

Helena Matos, in o Observador

Se os oito mais ricos deixassem de ser tão ricos ou até se eles nunca tivessem sido ricos não só os pobres não ganhariam nada com isso como seríamos todos mais pobres.

É um clássico: todos os anos temos aqueles dois a três dias em que somos informados de que o dinheiro de meia dúzia de ricos é idêntico ao de vários milhões de pobres.

Este ano a aritmética da riqueza versus pobreza informou-nos que as “Oito pessoas mais ricas do mundo detêm a mesma riqueza que os 50% mais pobres”. E logo começou o arrazoado da indignação, não tanto com o facto de haver pobres mas sobretudo com o facto de haver ricos. Muito particularmente parecia evidente que os pobres são pobres porque existem ricos e, ainda mais ilusório, que o desaparecimento dos ricos tornaria os pobres menos pobres. Nada mais falso.

Comecemos por ver quem são esses ricos: Bill Gates, fundador da Microsoft; Amancio Ortega, fundador e dono da Inditex (Zara); Warren Buffett investidor e chefe executivo da Berkshire Hathaway; Carlos Slim, empresário mexicano das telecomunicações; Jeff Bezos, fundador da Amazon; Mark Zuckerberg, fundador do Facebook; Larry Ellison, diretor-executivo da Oracle; Michael Bloomberg, ex-autarca de Nova Iorque e fundador da agência de notícias financeiras Bloomberg. Ou seja muitos destes homens são imensamente ricos não porque tenham herdado as suas fortunas mas sim porque tiveram uma abordagem nova do seu negócio ou em alguns casos até porque inventaram o seu negócio. Mais ainda, muitos deles são importantes financiadores de projectos de investigação e solidariedade. Por fim, a sua actividade empresarial gerou empregos e produtos que mudaram para melhor a vida de milhões de pessoas.

Era melhor que eles não tivessem enriquecido? Ficariam os pobres menos pobres caso eles deixassem de ser ricos? Certamente que não. Mas nada disso interessa nestas contas do vamos fazer de conta que acabamos com os pobres dividindo o dinheiro dos ricos.

O que está em causa para muitas das organizações que se especializaram na divulgação destas aritméticas, como é o caso da Oxfam, é que subjacente a tudo isto está uma perspectiva política (legítima mas política) que não pode ser ignorada ou escamoteada: estas organizações não só têm grandes reservas à iniciativa privada como, pelo contrário, defendem um grande intervencionismo estatal e associam quase automaticamente gasto público e estatismo a combate à desigualdade.

A essa presença do Estado na economia chama, por exemplo, a Oxfam “economia humana”. Infelizmente o resultado dessa economia dita humana é quase invariavelmente apenas mais pobreza e mais desigualdade entre os humanos, como aconteceu na Venezuela, país até há pouco muito bem situado nestes relatórios e dado como exemplo de sucesso no campo das políticas de combate à pobreza e à desigualdade.

Dado o pouco escrutínio a tudo o que vem das ONG’s e muito particularmente aos relatórios onde ONG’s e agências das Nações Unidas se cruzam, nunca os produtores deste tipo de dados são confrontados quer com a falácia das suas análises quer com as consequências das propostas que fazem. Por cá, ainda há pouco tempo tivemos a visita de uma senhora apresentada como relatora da ONU sobre “o direito a uma habitação condigna” para quem, nesta área, tudo se resumia à construção de mais habitação social.

Na verdade, estas aritméticas dos ricos versus pobres replicam no seu ódio às sociedades ocidentais e muito particularmente à iniciativa privada aquelas pretéritas contas das despesas militares nos anos 70 em que todos os dias éramos informados sobre o número de crianças que deixariam de morrer com fome e doenças caso triunfasse o pacifismo e o dinheiro das armas fosse transformado em vacinas e leite em pó. O único senão de todo esse magnífico pensamento é que o desarmamento começaria invariavelmente pela NATO já que os países do então Leste precisavam desse sinal de apaziguamento para em seguida o repetirem! Como felizmente a experiência nunca foi feita nunca se chegou a saber como reagiriam os países do bloco comunista a esse ímpeto pacifista do decadente capitalismo. Mas a convicção da inferioridade moral das economias livres manteve-se e com ele um discurso sobre a pobreza como um problema em crescimento. Nada interessa que o número de pobres esteja a diminuir: hoje contabilizam-se em situação de pobreza extrema 800 milhões de pessoas, ou seja 10,7 % da população mundial. Em 1990 essa percentagem era de 35%. E muito menos se tem em conta que ser pobre no século XXI não é de modo algum o mesmo que ser pobre no início do século XX.

De facto, se os oito mais ricos deixassem de ser tão ricos ou até se eles nunca tivessem sido ricos não só os pobres não ganhariam nada com isso como seríamos todos mais pobres.

17.1.17

Oito empresários acumulam o mesmo que a metade mais pobre da população mundial

in Diário de Notícias

Oito empresários, incluindo Bill Gates, acumulam a mesma riqueza que a metade mais pobre da população mundial, no total de 3,6 mil milhões de pessoas, divulgou hoje a Oxfam, confederação internacional contra a pobreza

Além do antigo patrão da Microsoft, constam na lista Amancio Ortega (fundador da Inditex), Warren Buffett (maior acionista da Berkshire Hathaway), Carlos Slim (proprietário do grupo Carso), Jeff Bezos (Amazon), Mark Zuckerberg (Facebook), Larry Ellison (Oracle) e Michael Bloomberg (da agência de informação económica e financeira Bloomberg). São estes os oito empresários que acumulam a mesma riqueza que a metade mais pobre da população mundial, no total de 3,6 mil milhões de pessoas.

A Oxfam, confederação internacional contra a pobreza, publicou hoje o relatório "Uma economia para 99 por cento", que revela que os novos dados disponíveis, sobretudo da China e da Índia, permitem concluir que "a brecha entre ricos e pobres é muito maior do que se temia".
O relatório é divulgado na véspera do Fórum Económico Mundial de Davos, na Suíça, que reúne, entre terça e sexta-feira, a elite política e empresarial.

Segundo a diretora-executiva da Oxfam, Winnie Byanyima, "a imensa riqueza que acumulam uns poucos resulta obscena quando uma em cada dez pessoas no mundo sobrevive com menos de dois dólares (1,88 euros) por dia".
A responsável salientou, em comunicado, que sete em cada dez pessoas vivem num país em que a desigualdade aumentou nos últimos 30 anos.
A Oxfam pede aos governos para que aumentem os impostos sobre as grandes fortunas, garantam um salário digno para os trabalhadores e travem a evasão fiscal.

22.1.16

Riqueza. Fosso entre ricos e pobres volta a agravar-se

SÓNIA PERES PINTO, in "Jornal I"

Riqueza de 1% da população supera a dos restantes 99%, revela o último relatório da Oxfam

A concentração de riqueza continua imparável. No ano passado, as 62 pessoas mais ricas do mundo tinham a mesma riqueza que a soma da metade mais pobre do planeta. Isto significa que a riqueza acumulada por 1% da população mundial, os mais ricos, superou a dos 99% restantes. Os dados foram revelados no último relatório da Oxfam, “Uma economia ao serviço de 1%”.

No ano passado, a organização não governamental (ONG) britânica estimava que isso acontecesse em 2016. “No entanto, aconteceu em 2015: um ano antes”, sublinha.

Há cinco anos eram necessários 388 milionários. “O fosso entre a franja dos mais ricos e o resto da população (o planeta) aumentou de forma dramática nos últimos 12 meses”, salienta a organização.

Mas as novidades não ficam por aqui. Desde 2010, a riqueza dos mais ricos cresceu 44%, enquanto os mais pobres recuaram 41% no mesmo período.

Face a estes resultados, a ONG apela à necessidade de agir. “Não podemos continuar a deixar que centenas de milhões de pessoas tenham fome quando os recursos para os ajudar estão concentrados, ao mais alto nível, em tão poucas pessoas”, afirma Manon Aubry, diretora dos assuntos de justiça fiscal e desigualdades da Oxfam em França.

Segundo a organização, “desde o início do século xxi que a metade mais pobre da humanidade beneficia de menos de 1% do aumento total da riqueza mundial, enquanto os 1% mais ricos partilharam metade desse mesmo aumento”.

Cerca de metade dos mais ricos residem nos EUA. Há 17 milionários europeus e os restantes vivem em países como a China, Brasil, México, Japão e Arábia Saudita.

Solução

Para a ONG, a forma mais eficaz de combater estas desigualdades é acabar com os paraísos fiscais, que permitem o desvio de fortunas que não são tributadas. “Devemos apelar aos governos, empresas e elites económicas presentes em Davos para que se empenhem em acabar com esta era de paraísos fiscais, que alimentam as desigualdades globais, e impeçam que centenas de milhões de pessoas vivam na pobreza”, diz Winnie Byanyima, diretora-geral da Oxfam International (ver texto ao lado).

E dá o exemplo da riqueza de África, uma vez que se estima que 30 por cento dos rendimentos financeiros do continente não são tributados. Para a Oxfam, este dinheiro chegaria para salvar a vida de 4 milhões de crianças todos os anos, para pagar os salários de professores e educar todas as crianças.

A Oxfam dá ainda sugestões para combater estas desigualdades e dá como exemplo o pagamento de melhores salários, a promoção da igualdade económica das mulheres, o estabelecimento de registos obrigatórios de atividades de lobbying, a separação de empresas do financiamento de campanhas e a priorização de políticas, práticas e gastos que aumentem o financiamento de sistemas públicos de saúde e educação.

“Desde aumentos no salário mínimo a medidas para regular mais eficazmente a evasão fiscal, há muito a fazer para atenuar este cenário e começar a construir uma economia humana que beneficie a todos”, salienta a organização.

A organização reconhece, no entanto, que o número de pessoas que viviam no limiar de extrema pobreza caiu para metade entre 1990 e 2010, sendo ainda assim insuficiente para se encontrar uma solução que contorne a desigualdade. “Se a distância entre ricos e pobres dentro dos países não tivesse aumentado no decorrer desse período, outros 200 milhões de pessoas teriam saído da pobreza”, afirma.

Metodologia

O certo é que estes resultados estão longe de chegar a um consenso. Já no passado, vários economistas contestaram a metodologia utilizada pela Oxfam, com a ONG a defender o método utilizado no estudo de forma simples: o cálculo do património líquido, ou seja, os ativos detidos menos dívida.

Por seu lado, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, mostra-se também preocupada com estas desigualdades, tendo afirmado que “se não for controlada, a desigualdade económica vai fazer regredir a luta contra a pobreza e ameaçará a estabilidade global”.

19.12.14

Maria Luís Albuquerque: "Os 10% mais ricos pagam 70% do IRS"

por Eva Gaspar, in Negócios on-line

Maria Luís Albuquerque reitera que é preciso fazer mais para combater as desigualdades e a pobreza, mas assegura que o Governo tem tido a preocupação de proteger os mais vulneráveis.

A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, afirmou esta tarde no Parlamento que é preciso fazer mais para combater as assimetrias e a pobreza, mas assegurou que o Governo tem tido a preocupação de proteger os mais vulneráveis.

"Infelizmente, as desigualdades na distribuição do rendimento são um problema que está connosco há muitos anos", mas a "preocupação deste governo foi sempre proteger os mais desfavorecidos", disse.

Para o exemplificar, citou a actualização das pensões mínimas e rurais, o facto de os cortes não terem afectado mais de 85% dos pensionistas e de as alterações em sede de imposto sobre rendimento de singulares IRS assegurarem que "os 10% com mais rendimentos suportam 70% da receita do IRS". "Se isto não é um imposto progressivo, não sei o que seja". "O risco de pobreza entre os mais idosos reduziu-se efectivamente com este governo", acrescentou.

"O país está confrontado com uma gigantesca e insustentável injustiça na distribuição da riqueza nacional. Portugal cria por ano cerca de 165 mil milhões de euros de riqueza. Para onde vai e como é distribuída?", contrapôs o deputado do PCP Jorge Machado, acusando a "política de direita" de ter como "eixo central" a concentração da riqueza "à custa da exploração de quem trabalha".

Segundo o deputado do PCP, "em 1975, fruto da valorização dos salários alcançada com a revolução de Abril, 73% da riqueza nacional destinava-se ao pagamento de salários" e, "em 2013, os salários representaram apenas 37% da riqueza nacional".

"Já os rendimentos do capital sofreram o processo inverso - em 1975 representavam 27%, mas em 2013 mais de 62% da riqueza nacional foi destinada a rendimentos de capital. Em apenas dois anos, o Governo PSD/CDS, ao mesmo tempo que promovia a concentração de riqueza nos já milionários do nosso país, atirou mais de 500 mil pessoas para a pobreza", disse.

"Para proteger efectivamente os mais desfavorecidos, temos de ter finanças públicas sustentáveis e racionalizar os recursos para garantir que, não só hoje, mas amanhã, os portugueses continuem a ter acesso aos serviços essenciais, para que continuemos a ter credibilidade externa e, quando precisarmos, sejamos capazes de aceder ao financiamento. Nós também nos lembramos de 1975 e do estrago que isso fez ao país e da fatura que todos tivemos de pagar", respondeu a ministra.

Maria Luís Albuquerque falava na Assembleia da República na sequência de uma interpelação do PCP ao Governo sobre o "combate ao empobrecimento, por uma política alternativa de justiça na distribuição de rendimentos".

15.12.14

Ainda a equidade social em tempos de ajustamento

Francisca Almeida, in Expresso

1. Num seminário sobre Economia Social organizado pela União de Misericórdias de Portugal, o Primeiro-Ministro apelou ao jargão popular "quem se lixa é o mexilhão" para o contrariar dizendo que, desta feita, "todos contribuíram e contribuiu mais quem tinha mais". Devo dizer - como nota de pé de página - que não gosto nem da expressão nem do sentido que normalmente lhe está associado. Em todo o caso - diga-se, em abono da verdade - as palavras ditas neste contexto por Pedro Passos Coelho têm sido erradamente citadas ou trucadas na imprensa. E o mesmo sucedeu no debate parlamentar da passada sexta-feira. Mas mais certeiras ou menos certeiras, mais eruditas ou mais populares, as palavras não devem nunca distrair-nos do conteúdo. É um erro que a forma se imponha sobre a substância. E aqui a substância vai, incontestavelmente, além da forma.

2. Vivemos numa sociedade que é ainda desigual e que falha na redistribuição do rendimento. Mais: como salientou o Primeiro-Ministro, vivemos numa sociedade em que não é só o rendimento que está mal distribuído, são-no também as oportunidades o que, naturalmente, gera constrangimentos ao nível da mobilidade social. Mas é também verdade que, ao contrário de algumas opiniões que pululam pelos media e pela blogosfera e, particularmente, ao invés do que a esquerda tenta a todo o transe fazer passar, a crise e a política deste governo não agravaram as desigualdades.

Se olharmos para o coeficiente de Gini , que mede a desigualdade social por via da distribuição do rendimento, verificamos que, à excepção de uma ligeira variação positiva em 2012 (34,5%), este indicador tem vindo a descer de forma relativamente consistentemente. (Note-se que, quanto mais próximo do valor zero mais perfeitamente se encontrará distribuído o rendimento pela população.) E esta descida acentuou-se ligeiramente neste último ano de 2013 em que voltámos aos 34,2%, o segundo valor mais baixo de sempre. Em Portugal, em 2013, o coeficiente de Gini estava 2,6 pontos abaixo do valor pré-crise/2007, contrariamente ao que sucedeu na média dos países da zona Euro que apresentavam um aumento na ordem dos 0,6 pontos.

A estes valores não é alheia a redistribuição de rendimento operada pelos sucessivos Orçamentos de Estado e o impacto das opções políticas deste Governo. Pelo contrário. Basta pensar que, não fossem os mecanismos redistributivos do Orçamento (isto é, olhando para o coeficiente de Gini antes das transferências sociais), entre os anos de 2011 e de 2012 esse coeficiente teria aumentado mais de 5 pontos em apenas um ano: de 50,3% para 55,9%. Não é coisa pouca, bem se vê!

3. Por outro lado, no recente relatório "Trends in Income Inequality and its Impact on Economic Growth" Cigano, F (2014), OECD Social, Employment and Migration Working papers n. 163.

a OCDE veio confirmar a ideia veiculada pelo Primeiro-Ministro ao dar nota que, em Portugal, a crise e a subsequente política de austeridade retiraram efectivamente mais a quem mais tem. De acordo com esse estudo, entre os anos de 2007/08 e 2011/12, em Portugal, a perda anual média do rendimento disponível das famílias dos 10% mais ricos foi de 3,7%, ao passo que os 10% mais pobres perderam 1,9%. E se frequentemente procurámos lá fora os bons exemplos, saibamos também, quando for o caso, reconhecermo-nos como um. Basta olhar para outros países sob resgate em que a distribuição dos sacrifícios não protegeu os mais pobres em idêntica medida. Na Grécia, por exemplo, apesar da forte penalização dos mais ricos (cujo rendimento disponível diminuiu em 9%) os mais pobres não foram protegidos em igual proporção, já que viram os seus rendimentos diminuir 12,7%. Também na Irlanda os 10% mais pobres perderam 10,2% do rendimento disponível, quando os 10% mais ricos perderam 4,1%. Aqui ao lado, em Espanha, o fosso é ainda mais agravado, já que os mais pobres viram o seu rendimento diminuir em 12,9% ao passo que o dos mais ricos caiu apenas 1,4%. E em França o rendimento disponível dos 10% mais pobres diminuiu 1,3% ao passo que o dos mais ricos aumentou 1,7%. Veremos, mais para a frente, se Hollande será capaz de inverter esta tendência.

4. O Governo português foi, assim, aquele que, durante a crise, melhor soube proteger os rendimentos mais baixos e que mais fortemente penalizou os mais altos. E, valha a verdade, independentemente das palavras, de nada vale ignorar que, em 2013, se reduziram de facto as desigualdades, ainda que ligeiramente.

É fácil criticar e é fácil apontar o dedo às dificuldades (que são ainda muitas) e às injustiças socais. De resto, empiricamente, a experiência pessoal de cada um admite que, de uma forma ou de outra, todos o possamos fazer. Mas, bem vistas as coisas, ignorar a evidência dos números é ignorar e desconsiderar o esforço que todos os portugueses fizeram nos últimos anos. É ignorar a sua valia e o contributo inestimável para que Portugal tenha logrado obter estes resultados. E isso é também, num certo sentido uma tremenda injustiça social. Independentemente do léxico e para lá de quaisquer palavrs

5.12.14

85 milionários têm tanto dinheiro como 3,5 mil milhões de pobres

por Valentina Marcelino, in Diário de Notícias

O ex-presidente da República Jorge Sampaio salientou as desigualdades do mundo e criticou as políticas de austeridade.

Na sessão de abertura das Conferências de Lisboa, que decorrem hoje e amanhã na Fundação Calouste Gulbenkian,em Lisboa, Sampaio partilhou "reflexões" e "perplexidades" com a plateia esgotada do auditório.Uma delas foi o "aumento das disparidades e das desigualdades ao longo das últimas décadas", tanto na Europa, como nos países em vias de desenvolvimento. "Segundo dados da OXFAM, os 85 multimilionários mais ricos do mundo concentram a mesma riqueza que os 50% mais pobres", ou seja, "85 pessoas dispõem de tantos recursos como as 3,5 mil milhões de pessoas mais pobres".

Sem referir Portugal em particular, o ex-presidente da República lembrou ainda o Relatório de Proteção Social no Mundo 2014/2015, da Organização Internacional de Trabalho, que revela "os efeitos sociais mais visíveis das medidas de austeridade tomadas por alguns Governos europeus, na sequência da crise financeira internacional de 2008". No seu entender, "não podemos ignorar que em 2012 havia 123 milhões de pessoas nos 27 estados membros, 24% da população, em risco de pobreza ou exclusão social e que havia mais de 800 mil crianças do que em 2008, que passaram a viver na pobreza".

Sampaio alertou em particular para os países do sul da Europa e Irlanda, como exemplos do efeito da "aplicação drástica e severa, de medidas de austeridade centradas no curto prazo e unicamente movidas pelo intuito da redução dos défices".

Nesta sessão, foram também oradores Artur Santos Silva, presidente da Gulbenkian, Luís Amado, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e presidente da Comissão Organizadora das Conferências e Isaac Murargy, secretário executivo da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP).

22.1.14

Papa pede ao Fórum Económico Mundial melhor distribuição da riqueza

por Aura Miguel, in RR

Francisco considera que não se pode "tolerar" que milhares de pessoas “morram de fome todos os dias, apesar de estarem disponíveis enormes quantidades de alimentos”.

O Papa alerta para a fome que mata numa mensagem aos membros do Fórum Económico Mundial, reunidos em Davos, na Suíça, em que defende políticas e medidas económicas mais humanas.

O desenvolvimento alcançado e os esforços para combater a pobreza têm visto alguns avanços, mas não chega para acabar com a exclusão social, refere Francisco.

Por isso, sublinha, as instâncias políticas e económicas devem promover medidas centradas no bem comum e no respeito pela dignidade de cada pessoa, sobretudo dos mais frágeis e indefesos.

O Papa usa palavras fortes. Diz que não se pode “tolerar” que milhares de pessoas “morram de fome todos os dias, apesar de estarem disponíveis enormes quantidades de alimentos que são simplesmente desperdiçadas”.

Francisco considera que não se pode ficar indiferente perante numerosos refugiados à procura de condições minimamente dignas, pessoas que não são acolhidas e que, às vezes, encontram a morte em viagens desumanas.

Francisco reconhece que usa palavras fortes e dramáticas para desafiar o auditório do Fórum Económico Mundial, pedindo que usem a sua capacidade profissional, o seu engenho e a sua competência para a promoção de um crescimento económico integral, sem esquecer a dimensão transcendente da pessoa porque, só assim, se poderá formar uma nova mentalidade política e empresarial, numa óptica económica e financeira realmente humanas.

20.1.13

Governo não tem sabido buscar dinheiro aos mais ricos, diz presidente da Cáritas

in Jornal de Notícias

O presidente da Cáritas considera que tem faltado "mestria" aos governantes para ir buscar o dinheiro aos mais ricos em benefício do "bem comum" e deixar de recorrer sempre aos "pobres, que já não podem dar mais".

Em entrevista à agência Lusa, Eugénio Fonseca comentou o corte nas funções do Estado proposto pelo Governo, questionando "se os quatro mil milhões de euros a cortar terão que ser mais uma vez no orçamento familiar" dos portugueses, que já viram "esse orçamento truncado de forma tão drástica nos dois últimos anos".

"Afinal, as tais gorduras parecem que não estavam no aparelho do Estado, parece que estavam nas famílias portuguesas", mas não na maior parte delas, comentou.

"Estariam em muitas famílias que enriqueceram ilicitamente, porque este país nunca conseguiu em termos de desenvolvimento ficar na linha da frente dos 27 da União Europeia, mas conseguimos ir para a linha da frente na disparidade entre os mais ricos e os pobres", criticou.

"Portugal não soube repartir riqueza"

Portugal conseguiu produzir riqueza, mas não a soube repartir justamente. "Mais do que não sabê-la distribuir com justiça, ela agarrou-se às mãos de alguns que praticaram ilícitos para ficar na posse delas".

Para o responsável, "é escandaloso" que essa riqueza continue na posse dessas pessoas "sem ainda nada ter sido feito" para a devolução desse património, "que é de todos e continua a enriquecer alguns".

"Estamos a falar de investimentos que o Estado fez em setores que foi só para beneficiar algumas partes da sociedade e não o todo, porque quando é para penalizar são sempre os mesmos", criticou.

A crise, que "esfrangalhou a classe média," deve "levar a exigir que regresse à política mais ética".

"O que nos tem faltado tem sido a mestria de ir buscar o dinheiro a quem tem mais condições para poder pô-lo ao serviço do bem comum, mas estamos sempre a ir buscá-los aos pobres que já não podem dar mais", disse, considerando que se as propostas do FMI para cortar na despesa do Estado avançarem "vão dar cabo do resto".

Capacidade de reflexão debilitada

Para o responsável, esta não será a melhor altura para fazer a reforma do Estado, porque "a capacidade de reflexão está mais debilitada" e "há uma certa tensão latente".

Na sua opinião, esta é a altura do país criar condições para o pagamento da dívida em prazos razoáveis, com a solidariedade da UE.

"O que sinto dentro da UE é uma correlação de forças entre países de primeira e países de segunda, em que há tratamento desigual", "mais condescendente para os mais poderosos e menos complacente para os países considerados com menor relevância para o desenvolvimento económico da União Europeia".

O que Portugal e seus governantes têm de fazer, "e julgo que não têm conseguido, é manterem-se bem firmes junto dos seus parceiros europeus".

"Não me alegro nada quando dizem" que Portugal tem sido "muito bom aluno" e "muito cumpridor", porque os portugueses são "bons alunos, mas com muito sofrimento, com muitas lágrimas derramadas e muitos sonhos desfeitos".

Lamentou que Portugal "tenha, neste momento, como único desígnio nacional a luta contra o défice e que se tivesse paralisado todas as potencialidades de investimento".

Falta bolsa de ideias

Considerou que tem falhado em Portugal uma bolsa de ideias para possibilidades de negócio para quem está desempregado e dificilmente regressará ao mercado de trabalho.

O presidente da Cáritas diz que há muitos desempregados que preferem pedir às instituições em vez de recorrer ao Rendimento Social de Inserção devido ao estigma em torno da medida, que abrange mais de 280 mil pessoas.

"Há muita gente que não quer aceder à medida porque se criou um estigma de tal forma que há pessoas que têm vergonha de dizer que são beneficiários do RSI", afirmou.

O presidente da Cáritas defende, também, que o Estado deve exercer uma "vigilância muito fina" para prevenir que nenhum idoso seja sujeito a maus-tratos pelos familiares que os retiram dos lares apenas para beneficiar dos seus "parcos rendimentos".

"O problema dos idosos é gravíssimo", afirmou explicando que há famílias que ficaram sem proveitos e vão buscar "os parcos rendimentos dos seus idosos para sobreviver".

Muitos acabam por retirar os idosos dos lares. "Não está mal que os fossem buscar para tratar deles, porque o seu espaço natural é na família".

16.1.13

Portugal é dos mais desiguais da União Europeia

por Lusa, texto publicado por Paula Mourato, in Diário de Notícias

Portugal apresenta um dos mais elevados níveis de desigualdade do rendimento na União Europeia, e o impacto das prestações em dinheiro, na diminuição das desigualdades, é ligeiramente inferior à média europeia, segundo um investigador do Banco de Portugal.

No Boletim Económico de Inverno, ontem publicado, um dos artigos, da autoria de Nuno Alves, do departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal (BdP), debruça-se sobre a redistribuição do rendimento em Portugal e na União Europeia.

O objetivo passou por avaliar a eficiência redistributiva das prestações sociais em dinheiro, nos vários países da União Europeia, sublinhando que estas prestações incluem todas as transferências em dinheiro, recebidas pelos cidadãos ou famílias, relativas a desemprego, doença, acidente, invalidez, exclusão social, educação ou habitação.

O autor lembra que "as políticas redistributivas visam assegurar uma maior equidade e uma maior igualdade de oportunidades entre os cidadãos", e conclui, em primeiro lugar, que "as políticas de redistribuição reduzem significativamente a desigualdade do rendimento na União Europeia, embora com uma elevada heterogeneidade entre países".

"Portugal apresenta um dos mais elevados níveis de desigualdade do rendimento na União Europeia -- particularmente acentuada no rendimento base e na mediana superior da distribuição do rendimento -- e um grau de redistribuição, por via das prestações em dinheiro e dos impostos sobre o rendimento, próximo da média europeia", lê-se no artigo.

Por outro lado, no que diz respeito ao sistema de impostos, Nuno Alves sublinha que este "tem sempre um papel fundamental" no que diz respeito ao financiamento "do instrumento mais poderoso de combate às desigualdades no longo prazo: o investimento em educação".