Ana Isabel Ribeiro, in Público online
A medida chega depois de uma lei de 2021 proibir a divulgação de conteúdo que “promova a homossexualidade” a menores de idade. Há activistas a distribuir cópias gratuitas dos “livros proibidos”.
As livrarias da Hungria já começaram a embalar em plástico e separar os livros infantis e juvenis com conteúdos LGBT+, para que os menores não os abram ou leiam nas lojas. Outras recusam-se a fazê-lo e enfrentam multas de milhares de euros, que dizem que não vão pagar. A exigência de vender em “embrulhos fechados” livros infantis que considerem promotores da homossexualidade chega depois da lei de “protecção da criança”, que entrou em vigor em 2021 e proíbe a divulgação de conteúdo que “mostre ou promova a sexualidade, mudança de sexo ou homossexualidade” a menores de 18 anos, como é o caso dos livros, filmes, anúncios ou programas televisivos.
Foi ordenado às lojas que os vendam separadamente, sendo que passa mesmo a ser proibido fazê-lo caso o ponto de venda esteja localizado a menos de 200 metros de uma escola ou igreja, escreveu a Reuters.
Esta é apenas uma das repressões do governo ultraconservador contra a comunidade LGBT. Desde que a medida do Governo húngaro entrou em vigor, em Julho deste ano, as livrarias passaram a estar obrigadas a embalar os livros com personagens e histórias LGBT+ em plástico, sob pena de multa. No entanto, nem todas cumprem a ordem.
Segundo a agência AP, a livraria Líra Konyv, a segunda maior do país, foi multada em mais de 30 mil euros por ter colocado na secção juvenil um livro LGBT+ que não estava embalado. Contudo, esclarece a mesma fonte, o proprietário da loja diz que não vai pagar.
Krisztian Nyary, director criativo da Líra e um autor conhecido, disse à Reuters que a multa era desproporcional, que a lei estava redigida de forma vaga e que a livraria iria responder legalmente. Nyary disse que que algumas editoras já tinham embrulhado voluntariamente os livros, tentando cumprir a lei, mas que não era claro se isso era suficiente para colocar as obras afectadas pela lei numa prateleira de literatura destinada a adultos. Outra questão é se os livros de temática LGBT destinados a adultos também têm de ser embrulhados ou se podem ser vendidos sem embalagem. "Tudo isto não é claro", afirmou.
Por outro lado, existem casos de livrarias que cumprem a imposição de Viktor Orbán, mas dizem ser contra a medida. “Considero isto um nível de discriminação. Esta lei é um acto de força que dificilmente pode ser compreendido. É completamente contra meus próprios princípios e pensamentos”, afirmou à AP Eva Redai, de 76 anos.
Os activistas destacam que a lei limita o acesso a obras importantes e “restringe o desenvolvimento social” e tentam encontrar soluções. Esta semana, um grupo de universitários decidiu imprimir 100 cópias gratuitas do que apelidam de “livros proibidos”, como Heartstopper, e distribuí-las em frente a uma das maiores livrarias de Budapeste.
“Queremos que esses livros estejam na vida pública literária húngara e nas conversas quotidianas e é por isso que queremos dá-los gratuitamente às pessoas”, afirmou à AP Vince Sajosi, de 22 anos.
Nos últimos anos, Viktor Orbán tem intensificado a repressão anti-LGBT no país que, entre outros aspectos, proíbe o casamento de pessoas do mesmo sexo, a adopção por casais homossexuais e permite que os cidadãos denunciem às autoridades famílias LGBT de forma anónima.
Por sua vez, o conservadorismo crescente e violação dos direitos LGBT no país levou a Comissão Europeia a agir e processar a Hungria no Tribunal de Justiça da União Europeia com o apoio de 15 Estados-membros, entre os quais França e Alemanha.
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2.8.21
A saúde das pessoas transgénero “não pode estar entregue a sortes e privilégios” — nem a crowdfundings
Nuno Rafael Gomes(texto), Adriano Miranda e Nuno Ferreira Santos (fotografias), in Público on-line
Com as demoradas listas de espera do SNS para as cirurgias que querem fazer, jovens transgénero viram-se para campanhas de angariação de fundos. Há quem consiga, mas isso não é regra — nem deveria, defende Guadalupe Amaro, que reuniu 15 mil euros para uma cirurgia de redesignação sexual em três dias. Falta, por isso, investimento e uma melhor distribuição de serviços. E representatividade, claro.
Guadalupe Amaro decidiu lançar uma campanha de angariação de fundos para a sua cirurgia de redesignação sexual. “Era cada vez mais urgente” iniciar este processo, diz. Publicou o apelo na sua conta do Twitter e criou uma página no Instagram somente dedicada à recolha de donativos. O objectivo era reunir 15 mil euros. Já tinha tudo planeado: como “a estimativa é para que a cirurgia seja feita no final do próximo ano”, iria “republicar” o link para a campanha ao longo do tempo. “Talvez, com sorte”, calculou na altura, pudesse “chegar a metade” do valor.
Enganou-se. No espaço de três dias, somando as contribuições na plataforma GoFundMe às que chegaram via PayPal, MB Way e transferências bancárias, ultrapassou a meta fixada. Apesar de não esperar angariar “tanto dinheiro em tempo-recorde”, sentiu-se ainda mais surpreendida “pelas consequências secundárias” que o “pequeno fenómeno” fez desenrolar. Tocou-lhe a “união das pessoas”: os donativos, que variaram “entre os 50 cêntimos e os 300 euros”, e as mensagens chegaram-lhe de “todos os estratos sociais e quadrantes políticos”, de “todas as faixas etárias”, de gente que não a conhecia até àquele momento e das “pessoas de sempre”. “Foi ‘bué’ lindo”, foi como se lhe estivessem “a sarar as feridas”.
Guadalupe, de 25 anos, vive em Lisboa, onde está a terminar o curso de Medicina Veterinária. Cresceu na Chamusca, Santarém. No início da puberdade e ao longo de parte da adolescência, “que não foi assim há tanto tempo”, não só não sabia “o que se passava” consigo como “não tinha informação” para o perceber. Também não sabia por que razão a sociedade a interpretava e tratava “de uma forma errada”, como escreveu no texto que acompanha a campanha. Era, também, “obrigada a partilhar espaços com rapazes” sem nunca se sentir “segura, a ser constantemente discriminada, assediada e agredida”. “Teria facilitado ter visto alguém ‘trans’ a falar do assunto”, alguma representatividade. E “teria ajudado imenso” contar com apoio psicológico na escola ou alguém em que pudesse confiar. “Sentia que não havia abertura de lado nenhum. Nem de família nem de colegas.” Por isso, refugiava-se no sucesso escolar.
Mesmo tendo “alguma consciência do que se passava”, não tinha “nenhum apoio”, “nem financeiro nem emocional”. Afirmou-se “contra o mundo” e hoje considera ter uma “história feliz”. Alegra-se por saber que pode ter tido influência noutros finais felizes: “A minha mensagem preferida foi a de um rapaz, um adolescente, a contar que, ao ver familiares e o círculo de amigos a partilhar o meu testemunho e a falarem sobre o meu caso, teve força e coragem para afirmar a sua identidade. Nessas pequenas coisas, tomou uma escala que não conseguia prever.”
Explica o porquê: “Durante a maior parte da minha vida senti que foi uma parte da identidade que tive de reprimir e de esconder, pelo que me foi ensinado e passado pela sociedade, e pelo meio em que estava inserida. Que me devia envergonhar. E agora, decidir expor-me tanto e tomar este passo e ver tanta gente diferente a celebrá-lo comigo... É a concretização de um sonho pessoal, mas o resto, esse impacto, foi supercatártico.”
Às pessoas transgénero que se querem submeter a este e a outros processos cirúrgicos são apresentadas “duas opções”: a pública, cuja longa lista de espera faz desesperar, e a privada, com preços “ridiculamente caros”, mas onde a lista é menor, como explicou Guadalupe no GoFundMe. Na última publicação na conta do Instagram criada para este efeito, alerta, contudo, que isto não deve ser norma: “Uma questão de saúde que afecta tanto a comunidade ‘trans’ não pode estar entregue a sortes e privilégios.” Isto porque, como observa, outros não terão a “sorte” que teve — tal como ela não tem “outras sortes”, como “privilégio económico” e apoio familiar. Por isso, defende, “falta mais investimento público” no SNS.
Até que os serviços de saúde públicos consigam dar a resposta necessária, recorre-se à via privada. “Pelo público, não vai lá”, considera Duarte Palmeira. O jovem de 24 anos abriu uma campanha de angariação de fundos na mesma plataforma para poder pagar uma mastectomia. Quer “poder sair à rua” sem se sentir mal, aproveitar o Verão na praia, em Esposende, onde vive, sem ter de usar uma “camisola preta com um casaco por cima”; no fundo, para se sentir “livre” e para fugir ao “sobe e desce” das listas de espera do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Começou a campanha já em Fevereiro, mas, desmotivado pelos parcos donativos, desistiu meses depois. A namorada incentivou-o a voltar a espalhar a palavra e o sucesso da angariação de Guadalupe deu-lhe novo fôlego. A sua meta é de 3300 euros (a 29 de Julho, não tinha ainda chegado a metade do valor).
Na “terra pequena” onde vive, nunca ouviu falar “de um homem ou de uma mulher ‘trans’”. E há “muito preconceito”. Quando tinha uma caravana para vender comida de rua, já ele ouvia “muita coisa” que preferia ignorar: “Tratavam-me mal e já me quiseram bater.” “Eu sempre me vesti à rapaz, tive sorte na escola porque a minha turma foi a mesma do 1.º ao 9.º ano. Mesmo no secundário, não tive grandes problemas. Mas, com o tratamento, a voz vai mudando e, sem mastectomia feita, acho que há pessoas que olham de lado”, conta. E depois vêm as perguntas, “as afirmações sem certezas”. E isso, diz, “dá cabo” da sua saúde mental: “Uma chapada dói menos do que certas palavras.”
Em tratamento hormonal há três anos, Duarte sente que, por vezes, “quanto mais uma pessoa quer, mais longe está”. E isso torna-se “desgastante”: “Nem tenho vontade de sair à rua. O medo vai estar sempre aqui e preciso mesmo de sair, de continuar com a minha vida.” Está desempregado e em Esposende não é fácil encontrar trabalho. Nesta situação, se não fosse a mãe, “nem dinheiro para ir às consultas em Coimbra” teria.
Poucas opções para um país inteiro
É lá que se situa a Unidade de Reconstrução Génito-Urinária e Sexual (URGUS), do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Em 2017, uma circular informativa do Ministério da Saúde estabeleceu-a como “unidade de referência nacional para o acompanhamento dos/as utentes no processo de reatribuição sexual”, existindo ali “competência técnica e científica para acompanhamento multidisciplinar em todo o processo”, que inclui um vasto leque de profissionais de saúde: psicólogos, psiquiatras, sexólogos, urologistas, ginecologistas, endocrinologistas e cirurgiões plásticos
No ano anterior à decisão da tutela, o Centro Hospitalar de São João, no Porto, também começou a fazer cirurgias de redesignação sexual. Contudo, desde 2017 que, para cumprir as “recomendações superiores, as e os utentes neste âmbito (...) são referenciadas/os ao CHUC”, esclareceu fonte do hospital portuense. O São João continua a tratar, ainda assim, quem já se tinha ali iniciado o processo de transição física. Na mesma cidade, o Hospital de Santo António passou a ter disponível “uma nova consulta transgénero, única na região Norte do país, que integra uma equipa médica multidisciplinar de dez especialidades”.
Em 2016, o PÚBLICO noticiava que, na URGUS, quem quisesse levar a cabo “todos os tratamentos e cirurgias” deste processo entrava numa jornada que dura, em média, quatro anos. A Guadalupe deram-lhe uma estimativa bem superior: “Da informação que obtive, o tempo de espera seria de cerca de seis anos. Não sei se a minha saúde mental conseguiria suportar.” Duarte diz que se sente “mesmo parado”, há demasiado tempo à espera do dia em que “uma chamada ou uma carta”, como lhe disseram, anuncie a cirurgia que quer fazer: “Um dia vou à página e estou no número 80, amanhã estou no 68, depois já está no 90. Nunca é certo, ando sempre para cima e para baixo.”
A pandemia agravou o cenário: de acordo com a reportagem O Meu Género, do programa Linha da Frente, da RTP, realizaram-se apenas “quatro cirurgias genitais e à mama” em 2020 na URGUS — nos últimos dez anos, fizeram-se 126. Mas a resposta na esfera pública já era insuficiente antes da covid-19.
Mesmo que a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, tenha dito, em Maio, numa visita à nova unidade do Santo António, que esta reflecte uma estratégia de “não deixar ninguém para trás”, “há poucas unidades de saúde especializadas” em saúde “trans” em Portugal, repara a directora executiva da ILGA, Marta Ramos. No SNS, e de acordo com uma lista de serviços de saúde “trans” da Rede Ex Aequo, o Hospital de Magalhães Lemos, no Porto, tem serviços de acompanhamento psicológico e sexologia. Em Lisboa, esses serviços podem ser encontrados no Hospital Júlio de Matos. No Hospital de Santa Maria, também na capital, há consultas de endocrinologia e realizam-se cirurgias não-genitais (para além dos serviços atrás referidos). Por outro lado, em Braga, no Hospital da Misericórdia de Vila Verde, realizam-se mastectomias. A estes somam-se a URGUS e o Santo António.
É pouco. “São as opções para um país inteiro e não podemos esquecer as ilhas. Há listas de espera e dificuldades de acessibilidade”, aponta a directora executiva da ILGA. Para além das “inúmeras dificuldades” que a centralização dos serviços traz, Marta Ramos afirma ainda que falta “compreensão e vontade política”. O médico João Correia Rodrigues, de 25 anos, defende que cirurgias como mastectomias “não têm de ser feitas num centro especializado”. E, por isso, o também representante da Anémona, um projecto que pretende criar “pontes” entre a comunidade transgénero e o SNS, é da opinião de que este não é um problema de “falta de fundos”, mas antes de “gestão administrativa”.
“Temos sempre a nossa identidade escrutinada”
Dentro das portas dos consultórios médicos também há questões a trabalhar. “É suposto que o processo comece com o médico de família a referenciar [o utente] para uma consulta de sexologia clínica. Mas muitos não têm conhecimento de como se faz esta referenciação, apesar da circular informativa do SNS”, salienta Marta Ramos. E também há um “incumprimento daquilo que são os standards internacionais de saúde nesta área”, definidos pelas Normas de Atenção à Saúde das Pessoas “Trans” e com Variabilidade de Género da Associação Mundial Profissional para a Saúde Transgénero.
No âmbito da sua tese de mestrado, João Rodrigues esteve “voluntariamente seis meses a entrevistar pessoas ‘trans’, na consulta de Sexologia do Hospital Magalhães Lemos”, como escreveu no P3 em Dezembro de 2020. Ouviu o “percurso, queixas e vitórias” de “mais de 100 pessoas”. No final, concluiu que “mais de 50% das pessoas “trans” são discriminadas, pelo menos uma vez, por um profissional de saúde”. Também foram “frequentes” as “confusões com nomes e pronomes” — “e alguns de tal forma repetidos e tão infrutiferamente corrigidos que culminavam na desistência de acompanhamento com o médico de família”.
Para além disso, “Portugal é o único país em que a Ordem dos Médicos tem o poder” de, na prática, decidir “se uma pessoa pode fazer uma cirurgia genital ou não”, caso o deseje, lembra Marta Ramos. Antes, tem de se submeter “a duas avaliações distintas por duas equipas multidisciplinares, que inclui avaliação psicológica, e depois tem de fazer um ou dois anos de tratamento hormonal”, explica o representante da Anémona. Para o fazer, uma pessoa “trans” tem “de receber um diagnóstico de disforia de género, mas nem todas as pessoas “trans” têm disforia de género”. Vale também lembrar que “cada pessoa ‘trans’ é uma pessoa diferente e que o tratamento deve ser individualizado” — até porque “nem toda a gente vai ter as mesmas expectativas e desejos”.
Ou seja: “Tens pessoas cisgénero [pessoa cuja identidade de género corresponde ao género que lhe foi atribuído à nascença] que estão constantemente a pôr a tua identidade em causa”, diz Guadalupe. “Entendo que estejam formadas, mas em alguns testemunhos que li soube que eram muito insensíveis e desactualizadas. Temos sempre a nossa identidade escrutinada por meses por uma pessoa cisgénero.”
Há riscos que não podem ser ignorados
Parte do trabalho de associações como a Anémona ou a ILGA é ajudar a contornar esses obstáculos. A última, por exemplo, tenta “orientar as pessoas” para alguns serviços, já que algumas preferem evitar “os seus médicos de família”. “Através do aconselhamento psicológico, a ILGA faz as cartas de referenciação e estabelece-a de forma directa para as unidades especializadas”, completa Marta Ramos.
Este acompanhamento pode evitar comportamentos de risco que, por vezes, surgem como reflexo da falta de respostas dos serviços de saúde. “Algumas pessoas tomam hormonas sem prescrição médica. Ouvem dizer que é assim que se faz e isso levanta um conjunto de riscos de saúde a que o SNS e a saúde em geral não podem estar alheios”, avisa. No campo da saúde mental, “quanto temos um objectivo que está directamente relacionado com a identidade e temos barreiras físicas, temporais e relacionadas com a discriminação de indivíduos que não nos deixam avançar, há lugar para perturbações de ansiedade e depressão”, diz João Rodrigues. Alguns dados ajudam a perceber o porquê: a título de exemplo, um estudo norte-americano da associação Trevor Project sobre a saúde mental da juventude LGBT concluiu que 52% dos jovens “trans” ou não-binários teve ideação suicida no último ano.
Actos tão simples como respeitar o pronome de alguém podem prevenir isto: a taxa de tentativa de suicídio duplicou nos casos em que isso não se observou. E aqueles que conseguiram mudar o seu nome ou género em documentos legais “relataram taxas mais baixas”.
Ainda há muito por fazer
Guadalupe “só este ano” concluiu a mudança na documentação legal. A Lei n.º38/2018 estabeleceu o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género e, também, à protecção das características sexuais de cada pessoa nas escolas. Antes, com a lei n.º 7/2011, era preciso apresentar um relatório médico que comprovasse um diagnóstico “de perturbação de identidade de género”. Mudar o nome e o marcador de sexo no cartão de cidadão custava 200 euros, taxa que foi eliminada com o Orçamento do Estado para 2020.
Quando não tinha “o bilhete de identidade alterado”, Duarte teve “uma situação chata”. Prefere não aprofundar o que terá acontecido. Conseguir a alteração “foi muito difícil”: “Aqui na conservatória não queriam alterar. Fui seis ou sete vezes e nem sabiam que já não se pagava os 200 euros. Só mesmo com ameaças é que consegui mudar.”
Para ambos, ainda há muito a fazer. “As pessoas têm de ouvir falar mais, ler mais, saber mais. Acho que há quem afasta para o lado a questão só porque não têm informação suficiente para reagir”, opina Duarte. Guadalupe tenta “combater a desinformação em menor escala” através das redes sociais, mas frisa que os meios de comunicação social também têm essa responsabilidade. “Só é falado quando é polémico: a questão das pessoas ‘trans’ nos desportos de alta competição, a questão das casas de banho que poderia ter sido só falada com o intuito de sensibilizar as pessoas e alertar para falhas no SNS”, aponta. Mas não é só isso que falha: “Falam de determinada pessoa ‘trans’ e apresentam o seu nome morto, o género que não é o dela. E vejo muitas vezes em programas de TV que as pessoas ‘trans’ são tratadas como adereços. Desumanizam-nos e ridicularizam-nos por sermos ‘trans’.”
Havendo sensibilização, haverá mais pessoas a importarem-se com as vidas “trans” e, “eventualmente, estas questões podem ser levadas e discutidas pelas pessoas que nos representam” ao Parlamento e “serem traduzidas em medidas políticas”. Guadalupe sente ter havido progresso em debates como o da orientação sexual ou da questão racial, “mas a questão ‘trans’ tem sido frequentemente ignorada”. Daí que o “pequeno fenómeno” do crowdfunding a tenha surpreendido.
Ela foi a excepção à regra — “o grosso das pessoas não consegue alavancar para si o dinheiro de que precisa”, constata Marta Ramos —, mas Guadalupe chama a atenção para outras campanhas, como a de Duarte, que ainda não teve a mesma sorte. Agora, é altura de falar sobre tudo isto. “E de se unirem por outros como se uniram por mim”, desafia.
Linhas de Apoio e de Prevenção do Suicídio em Portugal
ILGA - Serviço de Apoio Psicológico
Preferencialmente por email.
De segunda-feira a sexta-feira, das 9h às 16h.
sap@ilga-portugal.pt
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Linha Verde gratuita - 800 209 899 (Entre as 21h e as 24h)
Conversa Amiga
Inatel
Das 15h às 22h
808 237 327
210 027 159
Vozes Amigas de Esperança de Portugal
Voades-Portugal
Das 16h às 22h
222 030 707
Telefone da Amizade
Porto - Desde 1982
Das 16h às 23h
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Com as demoradas listas de espera do SNS para as cirurgias que querem fazer, jovens transgénero viram-se para campanhas de angariação de fundos. Há quem consiga, mas isso não é regra — nem deveria, defende Guadalupe Amaro, que reuniu 15 mil euros para uma cirurgia de redesignação sexual em três dias. Falta, por isso, investimento e uma melhor distribuição de serviços. E representatividade, claro.
Guadalupe Amaro decidiu lançar uma campanha de angariação de fundos para a sua cirurgia de redesignação sexual. “Era cada vez mais urgente” iniciar este processo, diz. Publicou o apelo na sua conta do Twitter e criou uma página no Instagram somente dedicada à recolha de donativos. O objectivo era reunir 15 mil euros. Já tinha tudo planeado: como “a estimativa é para que a cirurgia seja feita no final do próximo ano”, iria “republicar” o link para a campanha ao longo do tempo. “Talvez, com sorte”, calculou na altura, pudesse “chegar a metade” do valor.
Enganou-se. No espaço de três dias, somando as contribuições na plataforma GoFundMe às que chegaram via PayPal, MB Way e transferências bancárias, ultrapassou a meta fixada. Apesar de não esperar angariar “tanto dinheiro em tempo-recorde”, sentiu-se ainda mais surpreendida “pelas consequências secundárias” que o “pequeno fenómeno” fez desenrolar. Tocou-lhe a “união das pessoas”: os donativos, que variaram “entre os 50 cêntimos e os 300 euros”, e as mensagens chegaram-lhe de “todos os estratos sociais e quadrantes políticos”, de “todas as faixas etárias”, de gente que não a conhecia até àquele momento e das “pessoas de sempre”. “Foi ‘bué’ lindo”, foi como se lhe estivessem “a sarar as feridas”.
Guadalupe, de 25 anos, vive em Lisboa, onde está a terminar o curso de Medicina Veterinária. Cresceu na Chamusca, Santarém. No início da puberdade e ao longo de parte da adolescência, “que não foi assim há tanto tempo”, não só não sabia “o que se passava” consigo como “não tinha informação” para o perceber. Também não sabia por que razão a sociedade a interpretava e tratava “de uma forma errada”, como escreveu no texto que acompanha a campanha. Era, também, “obrigada a partilhar espaços com rapazes” sem nunca se sentir “segura, a ser constantemente discriminada, assediada e agredida”. “Teria facilitado ter visto alguém ‘trans’ a falar do assunto”, alguma representatividade. E “teria ajudado imenso” contar com apoio psicológico na escola ou alguém em que pudesse confiar. “Sentia que não havia abertura de lado nenhum. Nem de família nem de colegas.” Por isso, refugiava-se no sucesso escolar.
Mesmo tendo “alguma consciência do que se passava”, não tinha “nenhum apoio”, “nem financeiro nem emocional”. Afirmou-se “contra o mundo” e hoje considera ter uma “história feliz”. Alegra-se por saber que pode ter tido influência noutros finais felizes: “A minha mensagem preferida foi a de um rapaz, um adolescente, a contar que, ao ver familiares e o círculo de amigos a partilhar o meu testemunho e a falarem sobre o meu caso, teve força e coragem para afirmar a sua identidade. Nessas pequenas coisas, tomou uma escala que não conseguia prever.”
Explica o porquê: “Durante a maior parte da minha vida senti que foi uma parte da identidade que tive de reprimir e de esconder, pelo que me foi ensinado e passado pela sociedade, e pelo meio em que estava inserida. Que me devia envergonhar. E agora, decidir expor-me tanto e tomar este passo e ver tanta gente diferente a celebrá-lo comigo... É a concretização de um sonho pessoal, mas o resto, esse impacto, foi supercatártico.”
Às pessoas transgénero que se querem submeter a este e a outros processos cirúrgicos são apresentadas “duas opções”: a pública, cuja longa lista de espera faz desesperar, e a privada, com preços “ridiculamente caros”, mas onde a lista é menor, como explicou Guadalupe no GoFundMe. Na última publicação na conta do Instagram criada para este efeito, alerta, contudo, que isto não deve ser norma: “Uma questão de saúde que afecta tanto a comunidade ‘trans’ não pode estar entregue a sortes e privilégios.” Isto porque, como observa, outros não terão a “sorte” que teve — tal como ela não tem “outras sortes”, como “privilégio económico” e apoio familiar. Por isso, defende, “falta mais investimento público” no SNS.
Até que os serviços de saúde públicos consigam dar a resposta necessária, recorre-se à via privada. “Pelo público, não vai lá”, considera Duarte Palmeira. O jovem de 24 anos abriu uma campanha de angariação de fundos na mesma plataforma para poder pagar uma mastectomia. Quer “poder sair à rua” sem se sentir mal, aproveitar o Verão na praia, em Esposende, onde vive, sem ter de usar uma “camisola preta com um casaco por cima”; no fundo, para se sentir “livre” e para fugir ao “sobe e desce” das listas de espera do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Começou a campanha já em Fevereiro, mas, desmotivado pelos parcos donativos, desistiu meses depois. A namorada incentivou-o a voltar a espalhar a palavra e o sucesso da angariação de Guadalupe deu-lhe novo fôlego. A sua meta é de 3300 euros (a 29 de Julho, não tinha ainda chegado a metade do valor).
Na “terra pequena” onde vive, nunca ouviu falar “de um homem ou de uma mulher ‘trans’”. E há “muito preconceito”. Quando tinha uma caravana para vender comida de rua, já ele ouvia “muita coisa” que preferia ignorar: “Tratavam-me mal e já me quiseram bater.” “Eu sempre me vesti à rapaz, tive sorte na escola porque a minha turma foi a mesma do 1.º ao 9.º ano. Mesmo no secundário, não tive grandes problemas. Mas, com o tratamento, a voz vai mudando e, sem mastectomia feita, acho que há pessoas que olham de lado”, conta. E depois vêm as perguntas, “as afirmações sem certezas”. E isso, diz, “dá cabo” da sua saúde mental: “Uma chapada dói menos do que certas palavras.”
Em tratamento hormonal há três anos, Duarte sente que, por vezes, “quanto mais uma pessoa quer, mais longe está”. E isso torna-se “desgastante”: “Nem tenho vontade de sair à rua. O medo vai estar sempre aqui e preciso mesmo de sair, de continuar com a minha vida.” Está desempregado e em Esposende não é fácil encontrar trabalho. Nesta situação, se não fosse a mãe, “nem dinheiro para ir às consultas em Coimbra” teria.
Poucas opções para um país inteiro
É lá que se situa a Unidade de Reconstrução Génito-Urinária e Sexual (URGUS), do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Em 2017, uma circular informativa do Ministério da Saúde estabeleceu-a como “unidade de referência nacional para o acompanhamento dos/as utentes no processo de reatribuição sexual”, existindo ali “competência técnica e científica para acompanhamento multidisciplinar em todo o processo”, que inclui um vasto leque de profissionais de saúde: psicólogos, psiquiatras, sexólogos, urologistas, ginecologistas, endocrinologistas e cirurgiões plásticos
No ano anterior à decisão da tutela, o Centro Hospitalar de São João, no Porto, também começou a fazer cirurgias de redesignação sexual. Contudo, desde 2017 que, para cumprir as “recomendações superiores, as e os utentes neste âmbito (...) são referenciadas/os ao CHUC”, esclareceu fonte do hospital portuense. O São João continua a tratar, ainda assim, quem já se tinha ali iniciado o processo de transição física. Na mesma cidade, o Hospital de Santo António passou a ter disponível “uma nova consulta transgénero, única na região Norte do país, que integra uma equipa médica multidisciplinar de dez especialidades”.
Em 2016, o PÚBLICO noticiava que, na URGUS, quem quisesse levar a cabo “todos os tratamentos e cirurgias” deste processo entrava numa jornada que dura, em média, quatro anos. A Guadalupe deram-lhe uma estimativa bem superior: “Da informação que obtive, o tempo de espera seria de cerca de seis anos. Não sei se a minha saúde mental conseguiria suportar.” Duarte diz que se sente “mesmo parado”, há demasiado tempo à espera do dia em que “uma chamada ou uma carta”, como lhe disseram, anuncie a cirurgia que quer fazer: “Um dia vou à página e estou no número 80, amanhã estou no 68, depois já está no 90. Nunca é certo, ando sempre para cima e para baixo.”
A pandemia agravou o cenário: de acordo com a reportagem O Meu Género, do programa Linha da Frente, da RTP, realizaram-se apenas “quatro cirurgias genitais e à mama” em 2020 na URGUS — nos últimos dez anos, fizeram-se 126. Mas a resposta na esfera pública já era insuficiente antes da covid-19.
Mesmo que a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, tenha dito, em Maio, numa visita à nova unidade do Santo António, que esta reflecte uma estratégia de “não deixar ninguém para trás”, “há poucas unidades de saúde especializadas” em saúde “trans” em Portugal, repara a directora executiva da ILGA, Marta Ramos. No SNS, e de acordo com uma lista de serviços de saúde “trans” da Rede Ex Aequo, o Hospital de Magalhães Lemos, no Porto, tem serviços de acompanhamento psicológico e sexologia. Em Lisboa, esses serviços podem ser encontrados no Hospital Júlio de Matos. No Hospital de Santa Maria, também na capital, há consultas de endocrinologia e realizam-se cirurgias não-genitais (para além dos serviços atrás referidos). Por outro lado, em Braga, no Hospital da Misericórdia de Vila Verde, realizam-se mastectomias. A estes somam-se a URGUS e o Santo António.
É pouco. “São as opções para um país inteiro e não podemos esquecer as ilhas. Há listas de espera e dificuldades de acessibilidade”, aponta a directora executiva da ILGA. Para além das “inúmeras dificuldades” que a centralização dos serviços traz, Marta Ramos afirma ainda que falta “compreensão e vontade política”. O médico João Correia Rodrigues, de 25 anos, defende que cirurgias como mastectomias “não têm de ser feitas num centro especializado”. E, por isso, o também representante da Anémona, um projecto que pretende criar “pontes” entre a comunidade transgénero e o SNS, é da opinião de que este não é um problema de “falta de fundos”, mas antes de “gestão administrativa”.
“Temos sempre a nossa identidade escrutinada”
Dentro das portas dos consultórios médicos também há questões a trabalhar. “É suposto que o processo comece com o médico de família a referenciar [o utente] para uma consulta de sexologia clínica. Mas muitos não têm conhecimento de como se faz esta referenciação, apesar da circular informativa do SNS”, salienta Marta Ramos. E também há um “incumprimento daquilo que são os standards internacionais de saúde nesta área”, definidos pelas Normas de Atenção à Saúde das Pessoas “Trans” e com Variabilidade de Género da Associação Mundial Profissional para a Saúde Transgénero.
No âmbito da sua tese de mestrado, João Rodrigues esteve “voluntariamente seis meses a entrevistar pessoas ‘trans’, na consulta de Sexologia do Hospital Magalhães Lemos”, como escreveu no P3 em Dezembro de 2020. Ouviu o “percurso, queixas e vitórias” de “mais de 100 pessoas”. No final, concluiu que “mais de 50% das pessoas “trans” são discriminadas, pelo menos uma vez, por um profissional de saúde”. Também foram “frequentes” as “confusões com nomes e pronomes” — “e alguns de tal forma repetidos e tão infrutiferamente corrigidos que culminavam na desistência de acompanhamento com o médico de família”.
Para além disso, “Portugal é o único país em que a Ordem dos Médicos tem o poder” de, na prática, decidir “se uma pessoa pode fazer uma cirurgia genital ou não”, caso o deseje, lembra Marta Ramos. Antes, tem de se submeter “a duas avaliações distintas por duas equipas multidisciplinares, que inclui avaliação psicológica, e depois tem de fazer um ou dois anos de tratamento hormonal”, explica o representante da Anémona. Para o fazer, uma pessoa “trans” tem “de receber um diagnóstico de disforia de género, mas nem todas as pessoas “trans” têm disforia de género”. Vale também lembrar que “cada pessoa ‘trans’ é uma pessoa diferente e que o tratamento deve ser individualizado” — até porque “nem toda a gente vai ter as mesmas expectativas e desejos”.
Ou seja: “Tens pessoas cisgénero [pessoa cuja identidade de género corresponde ao género que lhe foi atribuído à nascença] que estão constantemente a pôr a tua identidade em causa”, diz Guadalupe. “Entendo que estejam formadas, mas em alguns testemunhos que li soube que eram muito insensíveis e desactualizadas. Temos sempre a nossa identidade escrutinada por meses por uma pessoa cisgénero.”
Há riscos que não podem ser ignorados
Parte do trabalho de associações como a Anémona ou a ILGA é ajudar a contornar esses obstáculos. A última, por exemplo, tenta “orientar as pessoas” para alguns serviços, já que algumas preferem evitar “os seus médicos de família”. “Através do aconselhamento psicológico, a ILGA faz as cartas de referenciação e estabelece-a de forma directa para as unidades especializadas”, completa Marta Ramos.
Este acompanhamento pode evitar comportamentos de risco que, por vezes, surgem como reflexo da falta de respostas dos serviços de saúde. “Algumas pessoas tomam hormonas sem prescrição médica. Ouvem dizer que é assim que se faz e isso levanta um conjunto de riscos de saúde a que o SNS e a saúde em geral não podem estar alheios”, avisa. No campo da saúde mental, “quanto temos um objectivo que está directamente relacionado com a identidade e temos barreiras físicas, temporais e relacionadas com a discriminação de indivíduos que não nos deixam avançar, há lugar para perturbações de ansiedade e depressão”, diz João Rodrigues. Alguns dados ajudam a perceber o porquê: a título de exemplo, um estudo norte-americano da associação Trevor Project sobre a saúde mental da juventude LGBT concluiu que 52% dos jovens “trans” ou não-binários teve ideação suicida no último ano.
Actos tão simples como respeitar o pronome de alguém podem prevenir isto: a taxa de tentativa de suicídio duplicou nos casos em que isso não se observou. E aqueles que conseguiram mudar o seu nome ou género em documentos legais “relataram taxas mais baixas”.
Ainda há muito por fazer
Guadalupe “só este ano” concluiu a mudança na documentação legal. A Lei n.º38/2018 estabeleceu o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género e, também, à protecção das características sexuais de cada pessoa nas escolas. Antes, com a lei n.º 7/2011, era preciso apresentar um relatório médico que comprovasse um diagnóstico “de perturbação de identidade de género”. Mudar o nome e o marcador de sexo no cartão de cidadão custava 200 euros, taxa que foi eliminada com o Orçamento do Estado para 2020.
Quando não tinha “o bilhete de identidade alterado”, Duarte teve “uma situação chata”. Prefere não aprofundar o que terá acontecido. Conseguir a alteração “foi muito difícil”: “Aqui na conservatória não queriam alterar. Fui seis ou sete vezes e nem sabiam que já não se pagava os 200 euros. Só mesmo com ameaças é que consegui mudar.”
Para ambos, ainda há muito a fazer. “As pessoas têm de ouvir falar mais, ler mais, saber mais. Acho que há quem afasta para o lado a questão só porque não têm informação suficiente para reagir”, opina Duarte. Guadalupe tenta “combater a desinformação em menor escala” através das redes sociais, mas frisa que os meios de comunicação social também têm essa responsabilidade. “Só é falado quando é polémico: a questão das pessoas ‘trans’ nos desportos de alta competição, a questão das casas de banho que poderia ter sido só falada com o intuito de sensibilizar as pessoas e alertar para falhas no SNS”, aponta. Mas não é só isso que falha: “Falam de determinada pessoa ‘trans’ e apresentam o seu nome morto, o género que não é o dela. E vejo muitas vezes em programas de TV que as pessoas ‘trans’ são tratadas como adereços. Desumanizam-nos e ridicularizam-nos por sermos ‘trans’.”
Havendo sensibilização, haverá mais pessoas a importarem-se com as vidas “trans” e, “eventualmente, estas questões podem ser levadas e discutidas pelas pessoas que nos representam” ao Parlamento e “serem traduzidas em medidas políticas”. Guadalupe sente ter havido progresso em debates como o da orientação sexual ou da questão racial, “mas a questão ‘trans’ tem sido frequentemente ignorada”. Daí que o “pequeno fenómeno” do crowdfunding a tenha surpreendido.
Ela foi a excepção à regra — “o grosso das pessoas não consegue alavancar para si o dinheiro de que precisa”, constata Marta Ramos —, mas Guadalupe chama a atenção para outras campanhas, como a de Duarte, que ainda não teve a mesma sorte. Agora, é altura de falar sobre tudo isto. “E de se unirem por outros como se uniram por mim”, desafia.
Linhas de Apoio e de Prevenção do Suicídio em Portugal
ILGA - Serviço de Apoio Psicológico
Preferencialmente por email.
De segunda-feira a sexta-feira, das 9h às 16h.
sap@ilga-portugal.pt
927 247 468
SOS Voz Amiga
Lisboa
Das 16h às 24h
213 544 545 - 912 802 669 - 963 524 660
Linha Verde gratuita - 800 209 899 (Entre as 21h e as 24h)
Conversa Amiga
Inatel
Das 15h às 22h
808 237 327
210 027 159
Vozes Amigas de Esperança de Portugal
Voades-Portugal
Das 16h às 22h
222 030 707
Telefone da Amizade
Porto - Desde 1982
Das 16h às 23h
228 323 535
Voz de Apoio
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Das 21h às 24h
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Todas estas linhas são de duplo anonimato — garantido tanto a quem liga como a quem atende. Para encaminhamento, a linha do SNS24 (808 24 24 24) é assumida por profissionais de saúde.
19.5.20
Covid-19 trouxe solidão e desconforto aos jovens LGBT+
Por Marisa Macedo / REIT, in UP
Estudo conduzido por investigadores da FPCEUP está a analisar a saúde psicológica e as redes de apoio social de jovens LGBT+ durante a pandemia.
Isolados(as) dos amigos(as) e desconfortáveis no núcleo familiar. Segundo o estudo desenvolvido pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da U.Porto (FPCEUP) estas foram as principais dificuldades apontadas pelos jovens LBGT+ durante a pandemia de Covid-19. O objetivo da investigação, que está na sua primeira fase, é avaliar a saúde psicológica e as redes de apoio social de jovens LGBT+, que vivem com os pais, ou outra configuração familiar, durante este período.
No estudo, intitulado “REDES DE APOIO SOCIAL E SAÚDE PSICOLÓGICA EM JOVENS LGBT+ DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19”, participaram mais de 630 jovens LGBT+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e outras minorias sexuais e de género), com uma média de idade de 23 anos. Do total de inquiridos, 95% tem nacionalidade portuguesa, mas o estudo conta com participantes do Brasil e de outras. A maioria dos/as jovens é estudante reside numa área urbana e é maioritariamente proveniente das regiões Norte, Lisboa e Vale do Tejo e Centro.
Grande parte dos jovens participantes reside com a família. No entanto, dada a situação de pandemia de Covid-19 e o confinamento recomendado, 1 em cada 5 regressou a casa dos pais. Segundo os dados, “6 em cada 10 consideraram que a situação afetou muito ou severamente a sua vida” e a maioria sente-se “limitado para realizar as atividades habituais”.
Perto de 60% não se sente “confortável” com a família
De acordo com os resultados – que dizem respeito ao período entre 17 de abril e 4 de maio – cerca de um em cada quatro inquiridos sentiu-se “muito isolado” dos seus amigos(as). Perto de 60% dos jovens confirmou que a situação de confinamento com a família representou também um desafio por não se sentir confortáveis no núcleo familiar.
Face aos resultados encontrados, os investigadores recomendam que os serviços de apoio, abrigos e demais redes de apoio social permaneçam particularmente atentos e disponíveis durante este período para atender às necessidades dos/as jovens LGBT+.
O estudo, liderado por Jorge Gato, investigador da FPCEUP, conta com a colaboração da Ordem dos Psicólogos Portugueses, da CIG – Comissão Para a Cidadania e Igualdade de Género, Associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo, Rede Ex-Aequo – Associação de jovens LGBTI+ e apoiantes, It Gets Better, Casa Qui, e Associação Plano i.
Marcadores: Covid-19, FPCEUP, LGBT, saúde, saúde mental, sexualidade
Estudo conduzido por investigadores da FPCEUP está a analisar a saúde psicológica e as redes de apoio social de jovens LGBT+ durante a pandemia.
Isolados(as) dos amigos(as) e desconfortáveis no núcleo familiar. Segundo o estudo desenvolvido pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da U.Porto (FPCEUP) estas foram as principais dificuldades apontadas pelos jovens LBGT+ durante a pandemia de Covid-19. O objetivo da investigação, que está na sua primeira fase, é avaliar a saúde psicológica e as redes de apoio social de jovens LGBT+, que vivem com os pais, ou outra configuração familiar, durante este período.
No estudo, intitulado “REDES DE APOIO SOCIAL E SAÚDE PSICOLÓGICA EM JOVENS LGBT+ DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19”, participaram mais de 630 jovens LGBT+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e outras minorias sexuais e de género), com uma média de idade de 23 anos. Do total de inquiridos, 95% tem nacionalidade portuguesa, mas o estudo conta com participantes do Brasil e de outras. A maioria dos/as jovens é estudante reside numa área urbana e é maioritariamente proveniente das regiões Norte, Lisboa e Vale do Tejo e Centro.
Grande parte dos jovens participantes reside com a família. No entanto, dada a situação de pandemia de Covid-19 e o confinamento recomendado, 1 em cada 5 regressou a casa dos pais. Segundo os dados, “6 em cada 10 consideraram que a situação afetou muito ou severamente a sua vida” e a maioria sente-se “limitado para realizar as atividades habituais”.
Perto de 60% não se sente “confortável” com a família
De acordo com os resultados – que dizem respeito ao período entre 17 de abril e 4 de maio – cerca de um em cada quatro inquiridos sentiu-se “muito isolado” dos seus amigos(as). Perto de 60% dos jovens confirmou que a situação de confinamento com a família representou também um desafio por não se sentir confortáveis no núcleo familiar.
Face aos resultados encontrados, os investigadores recomendam que os serviços de apoio, abrigos e demais redes de apoio social permaneçam particularmente atentos e disponíveis durante este período para atender às necessidades dos/as jovens LGBT+.
O estudo, liderado por Jorge Gato, investigador da FPCEUP, conta com a colaboração da Ordem dos Psicólogos Portugueses, da CIG – Comissão Para a Cidadania e Igualdade de Género, Associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo, Rede Ex-Aequo – Associação de jovens LGBTI+ e apoiantes, It Gets Better, Casa Qui, e Associação Plano i.
Marcadores: Covid-19, FPCEUP, LGBT, saúde, saúde mental, sexualidade
14.5.20
Portugal é o país da UE em que menos pessoas LGBTI dizem sofrer agressão física ou sexual
Ana Cristina Pereira, in Público on-line
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia lança maior estudo de sempre sobre discriminação e crimes de ódio contra pessoas LGBTI. Nalguns países, a percepção de que a situação melhorou desde 2012 e noutros piorou.
Cada vez mais pessoas lésbicas, gays, bissexuais, “trans” e intersexo (LGBTI) se assumem como são, mas a discriminação perdura e o medo comanda a vida de muitos. No mapa da União Europeia (UE), Portugal sobressai como espaço de tolerância. É o país com menos ataques motivados pela orientação sexual ou identidade de género, revela a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA, na sigla inglesa), num estudo divulgado.
Mais populares
Nunca houve um estudo tão amplo sobre discriminação e crimes de ódio contra pessoas LGBTI. Envolveu 140 mil pessoas da UE, do Reino Unido (que ainda não tinha saído), da Sérvia e da Macedónia do Norte (que desejam entrar) – 4294 das quais de Portugal.
Atendendo ao todo, até parece que se respira mais igualdade do que em 2012, ano do inquérito anterior – 40% das pessoas estão convencidas de que há hoje mais tolerância e menos preconceito. Olhando para cada Estado-membro, percebe-se que a realidade é muito diversa. Nalguns países, a noção de que a situação melhorou ultrapassa os 70% (Irlanda, Malta, Finlândia); noutros é o oposto: por exemplo, na Polónia, são 68% os inquiridos que dizem que a situação piorou.
“Apesar dos importantes passos que têm sido dados em direcção à igualdade, as pessoas LGBTI+ ainda reportam elevados níveis de discriminação”, enfatiza a comissária para a Igualdade, Helena Dalli, numa nota enviada pela FRA. “Mais preocupante: recentemente testemunhamos dentro da UE incidentes anti-LGBTI, como ataques a marchas do orgulho, declarações de ‘zona livre de ideologia LGBTI’, multas por anúncios LGBTI-friendly. Todas as pessoas dentro da União Europeia devem sentir-se seguras e livres para serem elas próprias. ”
Jovens LGBT+ e a pandemia de covid-19: quando a casa não é um porto de abrigo
Em Portugal, 68% dos inquiridos acreditam que o preconceito e a intolerância diminuíram nos últimos cinco anos. Apesar dessa sensação, mais de metade (57%) confessam que ainda evitam sempre ou quase sempre andar de mãos dadas nas ruas de Portugal (a média na UE é 61%). E um quarto revela que evita sempre ou quase sempre determinados locais por medo de agressão (a média a UE é 33%).
“Muitas vezes, senti-me desconfortável ao andar pela rua de mãos dadas”, explicou uma bissexual portuguesa, de 21 anos. “Ouvia comentários de estranhos que passavam. Muitas vezes, senti-me insegura e intimidada na rua por estar com alguém do mesmo sexo e agi como se fosse heterossexual para evitar conflitos.”
A violência persiste, embora a níveis inferiores aos da média: 30% afirmaram que tinham sido vítimas de assédio no ano anterior (38% na UE); 5% que tinham sofrido algum ataque físico ou sexual nos cinco anos precedentes em razão da orientação sexual ou da identidade de género (11% na UE) - uma em cada cinco pessoas “trans" reportou ter passado por isso, muita acima dos outros grupos LGBTI. Foi na Polónia e na Roménia que mais pessoas disseram ter sofrido agressão física (15%). Logo a seguir, a Bélgica e a França (14%).
Sofreram ataque físico e / ou sexual por ser LGBTI, nos cinco anos anteriores à pesquisa (%)
Polónia 15
Roménia 15
Bélgica 14
França 14
Croácia 13
Dinamarca 13
Letónia 13
Bulgária 13
Lituânia 12
Hungria 11
Reino Unido 11
Países Baixos 11
Áustria 11
Estónia 11
Irlanda 11
Suécia 10
Luxemburgo 10
Eslováquia 10
Grécia 9
Finlândia 9
Chipre 9
Dinamarca 8
Espanha 8
República Checa 8
Itália 8
Malta 6
Portugal 5
Fonte: ‘A long way to go for LGBTI equality’
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia
As denúncias de violência e discriminação mantêm-se muito abaixo, o que remete para as tão faladas cifras negras: 14% já foram à polícia em Portugal para denunciar ataques físicos ou sexuais (14% na UE) e 8% já denunciaram as suas experiências de discriminação a um órgão da igualdade ou a outra organização (11% ).
Embora mais seguro, Portugal (36%) fica abaixo da média quando o que está em causa é ser sempre ou quase sempre abertamente LGBTI (a média da UE é 47%). Os olhares de lado, indiciadores de homofobia ou transfobia, podem notar-se em qualquer lugar. Um quarto das pessoas inquiridas sentira discriminação no trabalho no ano anterior (média da UE é 21%). E 40% num café, num restaurante, numa loja ou num hospital (42% na UE).
Será que já se vê o B de LGBT?
As novas gerações dão sinais de maior abertura. Entre os jovens (18-24), há hoje menos pessoas (41%) a esconder ser LGBT no meio escolar/universitário do que em 2012 (47%). E os adolescentes (15-17) já estão a sair do armário: 28% confessam esconder a sua condição (30% na UE); 60% sentem que na escola há quem proteja os seus direitos (48% na UE) e 65% que os colegas ou professores os apoiam (60% na UE). Quase metade (43%) afiança que a sua educação escolar abordou as questões LGBTI de forma positiva ou equilibrada (33% na UE).
“Muitas pessoas LGBTI continuam a viver nas sombras, com medo de serem ridicularizadas, discriminadas ou mesmo atacadas”, comenta o director da FRA, Michael O'Flaherty, na nota à imprensa. “As suas dificuldades profissionais e de saúde podem piorar devido à covid-19. Os fazedores de políticas devem tomar nota disto e fazer mais para promover o pleno respeito pelos direitos das pessoas LGBTI”, remata.
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia lança maior estudo de sempre sobre discriminação e crimes de ódio contra pessoas LGBTI. Nalguns países, a percepção de que a situação melhorou desde 2012 e noutros piorou.
Cada vez mais pessoas lésbicas, gays, bissexuais, “trans” e intersexo (LGBTI) se assumem como são, mas a discriminação perdura e o medo comanda a vida de muitos. No mapa da União Europeia (UE), Portugal sobressai como espaço de tolerância. É o país com menos ataques motivados pela orientação sexual ou identidade de género, revela a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA, na sigla inglesa), num estudo divulgado.
Mais populares
Nunca houve um estudo tão amplo sobre discriminação e crimes de ódio contra pessoas LGBTI. Envolveu 140 mil pessoas da UE, do Reino Unido (que ainda não tinha saído), da Sérvia e da Macedónia do Norte (que desejam entrar) – 4294 das quais de Portugal.
Atendendo ao todo, até parece que se respira mais igualdade do que em 2012, ano do inquérito anterior – 40% das pessoas estão convencidas de que há hoje mais tolerância e menos preconceito. Olhando para cada Estado-membro, percebe-se que a realidade é muito diversa. Nalguns países, a noção de que a situação melhorou ultrapassa os 70% (Irlanda, Malta, Finlândia); noutros é o oposto: por exemplo, na Polónia, são 68% os inquiridos que dizem que a situação piorou.
“Apesar dos importantes passos que têm sido dados em direcção à igualdade, as pessoas LGBTI+ ainda reportam elevados níveis de discriminação”, enfatiza a comissária para a Igualdade, Helena Dalli, numa nota enviada pela FRA. “Mais preocupante: recentemente testemunhamos dentro da UE incidentes anti-LGBTI, como ataques a marchas do orgulho, declarações de ‘zona livre de ideologia LGBTI’, multas por anúncios LGBTI-friendly. Todas as pessoas dentro da União Europeia devem sentir-se seguras e livres para serem elas próprias. ”
Jovens LGBT+ e a pandemia de covid-19: quando a casa não é um porto de abrigo
Em Portugal, 68% dos inquiridos acreditam que o preconceito e a intolerância diminuíram nos últimos cinco anos. Apesar dessa sensação, mais de metade (57%) confessam que ainda evitam sempre ou quase sempre andar de mãos dadas nas ruas de Portugal (a média na UE é 61%). E um quarto revela que evita sempre ou quase sempre determinados locais por medo de agressão (a média a UE é 33%).
“Muitas vezes, senti-me desconfortável ao andar pela rua de mãos dadas”, explicou uma bissexual portuguesa, de 21 anos. “Ouvia comentários de estranhos que passavam. Muitas vezes, senti-me insegura e intimidada na rua por estar com alguém do mesmo sexo e agi como se fosse heterossexual para evitar conflitos.”
A violência persiste, embora a níveis inferiores aos da média: 30% afirmaram que tinham sido vítimas de assédio no ano anterior (38% na UE); 5% que tinham sofrido algum ataque físico ou sexual nos cinco anos precedentes em razão da orientação sexual ou da identidade de género (11% na UE) - uma em cada cinco pessoas “trans" reportou ter passado por isso, muita acima dos outros grupos LGBTI. Foi na Polónia e na Roménia que mais pessoas disseram ter sofrido agressão física (15%). Logo a seguir, a Bélgica e a França (14%).
Sofreram ataque físico e / ou sexual por ser LGBTI, nos cinco anos anteriores à pesquisa (%)
Polónia 15
Roménia 15
Bélgica 14
França 14
Croácia 13
Dinamarca 13
Letónia 13
Bulgária 13
Lituânia 12
Hungria 11
Reino Unido 11
Países Baixos 11
Áustria 11
Estónia 11
Irlanda 11
Suécia 10
Luxemburgo 10
Eslováquia 10
Grécia 9
Finlândia 9
Chipre 9
Dinamarca 8
Espanha 8
República Checa 8
Itália 8
Malta 6
Portugal 5
Fonte: ‘A long way to go for LGBTI equality’
Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia
As denúncias de violência e discriminação mantêm-se muito abaixo, o que remete para as tão faladas cifras negras: 14% já foram à polícia em Portugal para denunciar ataques físicos ou sexuais (14% na UE) e 8% já denunciaram as suas experiências de discriminação a um órgão da igualdade ou a outra organização (11% ).
Embora mais seguro, Portugal (36%) fica abaixo da média quando o que está em causa é ser sempre ou quase sempre abertamente LGBTI (a média da UE é 47%). Os olhares de lado, indiciadores de homofobia ou transfobia, podem notar-se em qualquer lugar. Um quarto das pessoas inquiridas sentira discriminação no trabalho no ano anterior (média da UE é 21%). E 40% num café, num restaurante, numa loja ou num hospital (42% na UE).
Será que já se vê o B de LGBT?
As novas gerações dão sinais de maior abertura. Entre os jovens (18-24), há hoje menos pessoas (41%) a esconder ser LGBT no meio escolar/universitário do que em 2012 (47%). E os adolescentes (15-17) já estão a sair do armário: 28% confessam esconder a sua condição (30% na UE); 60% sentem que na escola há quem proteja os seus direitos (48% na UE) e 65% que os colegas ou professores os apoiam (60% na UE). Quase metade (43%) afiança que a sua educação escolar abordou as questões LGBTI de forma positiva ou equilibrada (33% na UE).
“Muitas pessoas LGBTI continuam a viver nas sombras, com medo de serem ridicularizadas, discriminadas ou mesmo atacadas”, comenta o director da FRA, Michael O'Flaherty, na nota à imprensa. “As suas dificuldades profissionais e de saúde podem piorar devido à covid-19. Os fazedores de políticas devem tomar nota disto e fazer mais para promover o pleno respeito pelos direitos das pessoas LGBTI”, remata.
16.1.20
Denunciar crimes homofóbicos é mais fácil — chegou o UNI-FORM
Renata Monteiro, in Público
É "a primeira plataforma online na União Europeia a pôr em contacto organizações LGBTI e as respectivas forças de segurança nacionais". O projecto UNI-FORM quer aumentar as denúncias de crimes homofóbicos e transfóbicos
Basta preencher um formulário online de nove passos para denunciar crimes de ódio e discurso de ódio online contra pessoas LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo) ou outras que sejam percepcionadas como tal. O UNI-FORM, um projecto coordenado pela associação ILGA Portugal, está já disponível em vários países europeus e apresenta-se como a “primeira plataforma online que põe directamente em contacto as organizações LGBTI e as forças de segurança”, já que “qualquer denúncia submetida pode ser enviada para estas duas partes, em simultâneo”, diz Marta Ramos, directora executiva da ILGA, ao P3.
Em Portugal, as denúncias feitas através desta plataforma, que está também disponível numa aplicação móvel, ainda não chegam directamente às autoridades. “Já existe o sistema de queixa electrónica, vamos estudar a hipótese de ligar os dois sistemas com o Ministério da Administração Interna”, que se mostrou “muito interessado” no projecto, diz Marta Ramos. Enquanto isso não acontece, é a própria associação "que reencaminha a queixa para ser investigada”, “caso a pessoa assim queira”, explica.
O objectivo do formulário de queixa é “aumentar o número de denúncias” e “criar uma relação de confiança institucional” entre as associações, as forças de segurança e a população LGBTI, fomentando uma “colaboração mais eficaz no combate aos crimes de ódio contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais e intersexo na Europa”, enumera.
A denúncia, anónima ou não, pode ser feita “por vítimas, testemunhas e/ou por qualquer outra pessoa que queira denunciar um incidente motivado pelo ódio” — ou seja, “em razão da orientação sexual, identidade de género, expressão de género ou características sexuais”, lê-se na descrição da plataforma.
O formulário pede o país onde ocorreu o incidente, “quem está a denunciar (testemunha ou vítima)”, o tipo de acidente (neste campo é possível assinalar a tipologia do incidente), a descrição do que se passou, a localização (facilitada por um mapa), a data, a nacionalidade do queixoso, o contacto e, caso tenhas provas visuais, é possível anexar ficheiros.
Caso pretendas que a denúncia seja enviada à polícia para se proceder à investigação oficial do incidente é obrigatório incluir o nome próprio, a data de nascimento e o telemóvel.
No relatório referente ao ano passado, a ILGA Portugal - Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero diz ter recebido, nesse período e através do Observatório da Discriminação, um total de 179 denúncias; 92 trataram-se de crimes e/ou incidentes "motivados pelo ódio contra pessoas LGBT", sendo que dois destes casos foram descritos como situações de violência física extrema. Marta Ramos diz que os números destes estudos, que a associação divulga anualmente, só levantam a ponta do véu.
Já há um guia para atendimento a LGBT vítimas de violência
Apenas oito países da União Europeia "recolhem e apresentam dados sobre crimes de ódio contra pessoas LGBT“, diz. Em Portugal, o "sistema actualmente em vigor de registo de crimes não desagrega dados em função da motivação” e, por isso, “não se pode ainda perceber quantos são realmente contra pessoas LGBT”, explica a directora-executiva. A plataforma “é mais um passo para conseguir estes dados”, admite.
Co-financiado pela Comissão Europeia, o projecto UNI-FORM será apresentado oficialmente no Parlamento Europeu, em Bruxelas, na quinta-feira de manhã, no âmbito da conferência internacional Towards empowering LGBT Victims of hate crime and online hate speech and building trust with security forces. Para já, é possível usar a plataforma para fazer denúncias junto de organizações não-governamentais na Bélgica, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Espanha, Reino Unido e Portugal, mas há “mais países interessados”, assegura Marta Ramos.
É "a primeira plataforma online na União Europeia a pôr em contacto organizações LGBTI e as respectivas forças de segurança nacionais". O projecto UNI-FORM quer aumentar as denúncias de crimes homofóbicos e transfóbicos
Basta preencher um formulário online de nove passos para denunciar crimes de ódio e discurso de ódio online contra pessoas LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo) ou outras que sejam percepcionadas como tal. O UNI-FORM, um projecto coordenado pela associação ILGA Portugal, está já disponível em vários países europeus e apresenta-se como a “primeira plataforma online que põe directamente em contacto as organizações LGBTI e as forças de segurança”, já que “qualquer denúncia submetida pode ser enviada para estas duas partes, em simultâneo”, diz Marta Ramos, directora executiva da ILGA, ao P3.
Em Portugal, as denúncias feitas através desta plataforma, que está também disponível numa aplicação móvel, ainda não chegam directamente às autoridades. “Já existe o sistema de queixa electrónica, vamos estudar a hipótese de ligar os dois sistemas com o Ministério da Administração Interna”, que se mostrou “muito interessado” no projecto, diz Marta Ramos. Enquanto isso não acontece, é a própria associação "que reencaminha a queixa para ser investigada”, “caso a pessoa assim queira”, explica.
O objectivo do formulário de queixa é “aumentar o número de denúncias” e “criar uma relação de confiança institucional” entre as associações, as forças de segurança e a população LGBTI, fomentando uma “colaboração mais eficaz no combate aos crimes de ódio contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais e intersexo na Europa”, enumera.
A denúncia, anónima ou não, pode ser feita “por vítimas, testemunhas e/ou por qualquer outra pessoa que queira denunciar um incidente motivado pelo ódio” — ou seja, “em razão da orientação sexual, identidade de género, expressão de género ou características sexuais”, lê-se na descrição da plataforma.
O formulário pede o país onde ocorreu o incidente, “quem está a denunciar (testemunha ou vítima)”, o tipo de acidente (neste campo é possível assinalar a tipologia do incidente), a descrição do que se passou, a localização (facilitada por um mapa), a data, a nacionalidade do queixoso, o contacto e, caso tenhas provas visuais, é possível anexar ficheiros.
Caso pretendas que a denúncia seja enviada à polícia para se proceder à investigação oficial do incidente é obrigatório incluir o nome próprio, a data de nascimento e o telemóvel.
No relatório referente ao ano passado, a ILGA Portugal - Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero diz ter recebido, nesse período e através do Observatório da Discriminação, um total de 179 denúncias; 92 trataram-se de crimes e/ou incidentes "motivados pelo ódio contra pessoas LGBT", sendo que dois destes casos foram descritos como situações de violência física extrema. Marta Ramos diz que os números destes estudos, que a associação divulga anualmente, só levantam a ponta do véu.
Já há um guia para atendimento a LGBT vítimas de violência
Apenas oito países da União Europeia "recolhem e apresentam dados sobre crimes de ódio contra pessoas LGBT“, diz. Em Portugal, o "sistema actualmente em vigor de registo de crimes não desagrega dados em função da motivação” e, por isso, “não se pode ainda perceber quantos são realmente contra pessoas LGBT”, explica a directora-executiva. A plataforma “é mais um passo para conseguir estes dados”, admite.
Co-financiado pela Comissão Europeia, o projecto UNI-FORM será apresentado oficialmente no Parlamento Europeu, em Bruxelas, na quinta-feira de manhã, no âmbito da conferência internacional Towards empowering LGBT Victims of hate crime and online hate speech and building trust with security forces. Para já, é possível usar a plataforma para fazer denúncias junto de organizações não-governamentais na Bélgica, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Espanha, Reino Unido e Portugal, mas há “mais países interessados”, assegura Marta Ramos.
20.4.16
A Gulbenkian será o palco dos Direitos Humanos
Catarina Marques Rodrigues, in "Observador"
O que é que une a crise dos refugiados, ao ambiente, à educação em África e às questões LGBT? Direitos Humanos. O tema estará em discussão na Gulbenkian a 9 e 10 de maio. Conheça os oradores aqui.
Refugiados, conflitos armados, meninas e mulheres sem acesso à educação, direitos LGBT e fragilidade do ambiente. Tudo isto está dentro de um termo maior: Direitos Humanos. E tudo isto será discutido durante dois dias na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, na conferência “Os Direitos Humanos e os Desafios do Século XXI: Globalizar a Dignidade”.
O evento vai acontecer a 9 e 10 de maio e na lista de oradores estão já vários convidados nacionais e internacionais. A abrir e a fechar a conferência vai estar Kerry Kennedy, ativista de Direitos Humanos e presidente da Robert F. Kennedy Human Rights, organização com o nome do seu pai, que foi senador e procurador-geral dos EUA. Robert F. Kennedy foi assassinado cinco anos depois do irmão e presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy. Kerry é também escritora e pertence aos conselhos de administração do U.S. Institute of Peace e da Human Rights First.
À presidente da organização vai juntar-se Jorge Sampaio (ex-presidente da República e presidente da Plataforma Global para Estudantes Sírios), Christian Felber (ativista político e autor de “Economy for the Common Good”), Delphine K. Djiraibe (advogada no Chade e cofundadora da Associação do Chade para a Promoção e Defesa dos Direitos Humanos), Conchita Wurst (cantora e porta-voz dos direitos LGBT), Francisco Ferreira (ex-presidente da Quercus e atual presidente da ZERO) e Susana Gaspar (presidente da Amnistia Internacional), entre outros.
Os painéis de debate vão dividir-se em quatro temas: Direitos Civis e Políticos, Direitos Económicos e Sociais, Direitos Identitários e Individuais e Direitos Humanos no século XXI. No final da tarde de terça, dia 9, será ainda apresentada a Declaração de Lisboa, um documento em que várias organizações se comprometem a defender os direitos humanos e a dignidade humana. Entre as associações que vão assinar a declaração estão o INATEL e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
A conferência “Os Direitos Humanos e os Desafios do Século XXI: Globalizar a Dignidade” é comissariada pelo professor Viriato Soromenho-Marques e é organizada pela Fundação Gulbenkian, pelo Robert F. Kennedy Center for Human Rights e pelas embaixadas da Áustria e dos Estados Unidos da América.
O que é que une a crise dos refugiados, ao ambiente, à educação em África e às questões LGBT? Direitos Humanos. O tema estará em discussão na Gulbenkian a 9 e 10 de maio. Conheça os oradores aqui.
Refugiados, conflitos armados, meninas e mulheres sem acesso à educação, direitos LGBT e fragilidade do ambiente. Tudo isto está dentro de um termo maior: Direitos Humanos. E tudo isto será discutido durante dois dias na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, na conferência “Os Direitos Humanos e os Desafios do Século XXI: Globalizar a Dignidade”.
O evento vai acontecer a 9 e 10 de maio e na lista de oradores estão já vários convidados nacionais e internacionais. A abrir e a fechar a conferência vai estar Kerry Kennedy, ativista de Direitos Humanos e presidente da Robert F. Kennedy Human Rights, organização com o nome do seu pai, que foi senador e procurador-geral dos EUA. Robert F. Kennedy foi assassinado cinco anos depois do irmão e presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy. Kerry é também escritora e pertence aos conselhos de administração do U.S. Institute of Peace e da Human Rights First.
À presidente da organização vai juntar-se Jorge Sampaio (ex-presidente da República e presidente da Plataforma Global para Estudantes Sírios), Christian Felber (ativista político e autor de “Economy for the Common Good”), Delphine K. Djiraibe (advogada no Chade e cofundadora da Associação do Chade para a Promoção e Defesa dos Direitos Humanos), Conchita Wurst (cantora e porta-voz dos direitos LGBT), Francisco Ferreira (ex-presidente da Quercus e atual presidente da ZERO) e Susana Gaspar (presidente da Amnistia Internacional), entre outros.
Os painéis de debate vão dividir-se em quatro temas: Direitos Civis e Políticos, Direitos Económicos e Sociais, Direitos Identitários e Individuais e Direitos Humanos no século XXI. No final da tarde de terça, dia 9, será ainda apresentada a Declaração de Lisboa, um documento em que várias organizações se comprometem a defender os direitos humanos e a dignidade humana. Entre as associações que vão assinar a declaração estão o INATEL e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
A conferência “Os Direitos Humanos e os Desafios do Século XXI: Globalizar a Dignidade” é comissariada pelo professor Viriato Soromenho-Marques e é organizada pela Fundação Gulbenkian, pelo Robert F. Kennedy Center for Human Rights e pelas embaixadas da Áustria e dos Estados Unidos da América.
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